CAPÍTULO 10
Olhou o relógio, eram cinco horas da manhã. Pensou dormir mais uma hora. Vozes discutindo o fizeram levantar rapidamente. Já devidamente vestido saiu em busca do local de onde vinham as vozes. Deu a volta pela lateral da casa e viu um homem de estatura mediana, gordo, bigode espesso cobrindo o lábio superior. Usava calça e camiseta militar. Aproximou-se com cautela até uma distância que lhe permitia ouvir claramente. Entedeu claramente a situação: a cadela permitiu que aquele homem entrasse por ser alguém conhecido.
— Por favor, me deixe em paz — falou Melissa arrumando o cabelo. — Já lhe disse mais de uma vez que no momento não estou a fim de encontros.
— Você se faz de difícil, mas, deitava com qualquer um em troca de uns centavos quando morava no cabaré.
— Seu porco imundo. Não permito tal liberdade... — os soluços afogaram as palavras de Melissa. — Por favor, me deixe terminar de tirar o leite.
C
CAPÍTULO 11 Galeano não pediu para acompanhá-la ao casebre. Também não foi convidado. Enquanto Melissa cumpria a missão noturna, Galeano ficou sentado na calçada apreciando a dança das estrelas no céu. Num momento o céu estava estrelado, minutos depois ficava completamente tomado pela névoa. Estas alterações tornavam o lugar ainda mais agradável. Sua mente discorreu nos detalhes dos últimos acontecimentos da investigação. Sabia que cometera um grave erro ao se envolver com o alvo. Fora fraco quando a beijou. Não cometeria o erro duas vezes. Não queria sofrer e nem a fazer sofrer. Bastava o “rolo” com Márcia. Deveria ter ido embora naquela manhã, estava usando a última muda de roupa que trouxera na mochila. Estava se arriscando demais. Seus planos mentais foram atropelados pelo tom aveludado da voz de Melissa. — Pronto para jantar? Ele sorriu e acenou com a cabeça. Levantou-se e seguiu a anfitriã para dentro da casa. O cardápio
CAPÍTULO 12 Galeano precisou de alguns segundos para ordenar os pensamentos. Sentia-se extremamente feliz pela noite anterior. Olhou para o lado e não encontrou a companheira. Haviam feito amor várias vezes. Ainda sentia o perfume de Melissa em sua pele. Ao longe ouvia o som do rádio. Sentiu-se péssimo por não ter conseguido acordar cedo e ajudar Melissa nos afazeres cotidianos. Tentou se vestir o mais rápido possível, porém, não encontrava as suas roupas em nenhum lugar do quarto. Encontrou uma toalha pendurada na cabeceira da cama. Enrolado na toalha se encaminhou para a cozinha, onde encontrou a anfitriã terminando de preparar o café da manhã. Pela janela aberta contemplou suas roupas penduradas no varal. — Não quis te acordar — Melissa falou sorrindo. — Desculpe pelas roupas. — Tudo bem. Se você não me fizesse esta caridade eu teria que ir até o povoado mudar o estoque da mochila — ele não conseguiu conter também o riso. —
CAPÍTULO 13 Devolveu a moto pagando pelos dias extras de uso e entrou no primeiro bar que encontrou. Colado ao balcão tomou várias cervejas. Já passava da meia noite quando Galeano saiu do bar. Antes de chegar à pensão foi atacado. Um indivíduo o imobilizou por trás prendendo seus pulsos às costas. Se estivesse sóbrio seria difícil escapar dos golpes e estando bêbado era praticamente impossível. Tomou dois golpes no estômago que o fizeram tombar no chão. Não conseguiu ver as fisionomias dos agressores e nem reconheceu o dono da única voz que falou. — Se não parar com a investigação, da próxima vez será pior. Tentou várias vezes se levantar, ação concretizada com a ajuda de Márcia, que havia chegado ao local após o ocorrido. — Você esta bem? — perguntou Márcia. — Estou — respondeu Galeano. Cambaleando mais pelo efeito do álcool do que pelos golpes recebidos, Galeano seguiu rumo à pensão em companhia de Má
CAPÍTULO 14 Deixara se envolver facilmente. Há tempos não sentia tais sensações. A solidão a fazia sofrer. A responsabilidade era muito pesada para as suas condições psicológicas. Melissa havia analisado naquela manhã que fizera a coisa certa ao se entregar a Galeano. Se fosse condenada, como achava que seria, nunca mais na vida encontraria ele novamente. Acordara naquele dia descontrolada emocionalmente. Há dois dias vivera um conto de fadas e agora, era obrigada a voltar para a dura realidade. Continuaria vivendo os últimos dias de liberdade cuidando do fardo que lhe cabia. Sua maior preocupação era com o sogro. Como ele iria viver depois de sua prisão? Planejava pedir à Justiça que o encaminhasse para um abrigo. A noite havia chegado rapidamente. Hora da visita ao sogro. — Os olhos do abismo engoliram meu filho — falou Severino. — De que o senhor esta falando? — quis saber Melissa. — Oxe menina, está esquecida? Manoe
CAPÍTULO 15 Ser capitão deste mundo, poder navegar em todos os mares e fronteiras, conhecer a realidade de cada povo. Os costumes de uma nação estão contidos naqueles que são eleitos para administrar o destino do povo — refletia Galeano enquanto analisava e organizava as provas que conseguira. Tudo se encaminhava para uma conclusão prévia daquele crime nebuloso. Naquela manhã não precisou da moto para viajar. O rumo que tomaria seria oposto ao local do crime. Havia dois dias que não via Márcia. Não sentia saudades, mas, era estranho o fato dela não o procurar. Deixou a preocupação de lado e saiu em disparada no veículo, entrando num território até então desconhecido. Se tudo corresse como o previsto, chegaria ao destino antes do almoço. Não poderia decepcionar quem estava a sua espera. *** Cinquenta quilômetros separava o povoado de Silvestre da cidade de Torrões, onde ficava situada a Diocese. Encantou-se com
CAPÍTULO 16 Pouco antes do meio dia Galeano estacionava o carro na lateral de uma casa abandonada a poucos metros da estrada. Antes de descer do veículo fez uma rápida análise do lugar. Não conhecia pessoalmente o contato. Não sabia como ele ficou sabendo da investigação. Há dois dias recebera uma ligação no orelhão que ficava em frente à pensão onde estava hospedado. Um menino brincava próximo ao local e atendera a ligação e foi chamá-lo. Dizendo que um homem queria falar com o forasteiro que estava ali hospedado. — Alô? — disse quando atendeu. — É o forasteiro que está investigando o caso do coronel Manoel Vargas? — perguntou a voz do outro do lado da linha. — Quem fala? — perguntou ele. — Não posso me identificar. Só me fale se está interessado no caso ou não. — E caso eu esteja? — Tenho provas que podem lhe interessar. Galeano refletira um pouco antes de prosseguir com o diálogo.
CAPÍTULO 17 Deve haver um lugar onde se possa descansar em paz. Imune ao sofrimento e falsidade do ser humano que vive dia-após-dia de uma forma gananciosa. Todos um dia serão ex-alguma coisa — refletia Melissa debruçada na janela, de onde podia ver o clarão das luzes do povoado de Silvestre. O céu estava límpido reinando no seu infinito espaço em companhia das estrelas. Dali a poucos dias seria noite de lua cheia. Lembrou-se do convite de Galeano para irem ver as luzes dançantes na igreja de pedra. Ela nem sabia onde ele estava naquele momento. Estaria na estrada viajando de volta para a sua terra natal? No povoado descansando nos braços de outra mulher? Talvez pensando nela? Eram perguntas sem respostas. Apaixonara-se por ele e sofria novamente. Uma mulher praticamente condenada, além de ser enclausurada numa cela estava também condenada a amar um homem que não pertencia ao seu mundo. Sentiu as lágrimas descerem do
CAPÍTULO 18 Um país onde quem tem vez passa por vulgaridade. Uma nação que atropela os mais carentes e enriquece o bolso de quem tem mais. Um Regime Democrático que não investe na saúde, permitindo que as filas se formem em frente aos hospitais. A educação andando de muleta e sem poder sonhar com justiça social. Terminou de escrever o artigo para a revista de turismo. Galeano não era jornalista, enviava a matéria para um jornalista amigo seu. Talvez a denúncia não surtisse efeito, mas tinha a consciência tranquila que estava fazendo a sua parte para diminuir a desigualdade social. O dia estava quente e a poeira dançava na rua. Os cães procuravam sombras nas marquises e calçadas. Haviam oito dias que Márcia desaparecera sem deixar vestígios. Procurou por Teresa, mas, ela também não sabia o paradeiro da irmã. Alguns pontos estavam obscuros no quebra-cabeça. Pressentia que o tempo hábil estava indo embora. Não podia mais