CAPÍTULO 17
Deve haver um lugar onde se possa descansar em paz. Imune ao sofrimento e falsidade do ser humano que vive dia-após-dia de uma forma gananciosa. Todos um dia serão ex-alguma coisa — refletia Melissa debruçada na janela, de onde podia ver o clarão das luzes do povoado de Silvestre.
O céu estava límpido reinando no seu infinito espaço em companhia das estrelas. Dali a poucos dias seria noite de lua cheia. Lembrou-se do convite de Galeano para irem ver as luzes dançantes na igreja de pedra. Ela nem sabia onde ele estava naquele momento. Estaria na estrada viajando de volta para a sua terra natal? No povoado descansando nos braços de outra mulher? Talvez pensando nela? Eram perguntas sem respostas. Apaixonara-se por ele e sofria novamente. Uma mulher praticamente condenada, além de ser enclausurada numa cela estava também condenada a amar um homem que não pertencia ao seu mundo. Sentiu as lágrimas descerem do
CAPÍTULO 18 Um país onde quem tem vez passa por vulgaridade. Uma nação que atropela os mais carentes e enriquece o bolso de quem tem mais. Um Regime Democrático que não investe na saúde, permitindo que as filas se formem em frente aos hospitais. A educação andando de muleta e sem poder sonhar com justiça social. Terminou de escrever o artigo para a revista de turismo. Galeano não era jornalista, enviava a matéria para um jornalista amigo seu. Talvez a denúncia não surtisse efeito, mas tinha a consciência tranquila que estava fazendo a sua parte para diminuir a desigualdade social. O dia estava quente e a poeira dançava na rua. Os cães procuravam sombras nas marquises e calçadas. Haviam oito dias que Márcia desaparecera sem deixar vestígios. Procurou por Teresa, mas, ela também não sabia o paradeiro da irmã. Alguns pontos estavam obscuros no quebra-cabeça. Pressentia que o tempo hábil estava indo embora. Não podia mais
CAPÍTULO 19 Nunca se sabe o que poderá acontecer no outro dia. Sabemos apenas que as ações do presente direcionam o futuro. Acordara com ânimo renovado. Sua imagem refletida no espelho lhe doava um semblante rejuvenescido. Uma autoconfiança que há muito não sentia. Encaminhou-se até o criado mudo e puxou de dentro da gaveta o envelope causador da injeção de ânimo. Para o bem da verdade, os achados não foram os únicos responsáveis pela mudança de hábito. Coração apaixonado, atitudes revolucionárias e investigativas. Estava preste a ir lavar a roupa suja, acumulada há dias, quando uma visita indesejada chegou a sua porta. Carlos Gouveia estava estático na porta da frente, batendo palmas. Pérola respondeu latindo. Melissa mandou que a cadela ficasse quieta. — Pois não? — Acho que devo um pedido de desculpas — comentou Carlos. — Tudo bem. São águas passadas. — Posso entrar para lhe provar que não sou o monstro daque
CAPÍTULO 20 Foi uma viagem cansativa, porém, produtiva. Estava perto de fechar o cerco. Não podia cometer erros infantis. Era notório que os inimigos do alvo sabiam de sua existência, só não sabiam quem o contratara. Temia pela segurança de Melissa. Precisava estar um passo à frente do inimigo se quisesse cumprir a missão. Subiu direto para o quarto sem parar na recepção. Quando abriu a porta teve uma surpresa que o deixou atônito. Estava Márcia sentada na cama olhando em direção à janela. Estava completamente imóvel. Galeano jogou a mochila num canto e se aproximou dela. — Por onde você andava? — Estava visitando uns parentes que moram fora do povoado — respondeu sem se virar para ele. — Eu já estava ficando preocupado. — Só preocupação? Nenhum pouquinho de saudade? — Você é minha amiga — disse evitando olhar para ela — Eu me preocupo com as amigas — concluiu o raciocínio. Márcia se levantou bru
CAPÍTULO 21 Os fantasmas do passado são apenas vozes que não querem calar, assim como o futuro é simplesmente um portal de luzes benéficas ou maldosas. Estranhas figuras paranormais dentro de uma mente presa fora do próprio tempo. Naquela manhã Melissa acordara angustiada. Desde que Severino fora morar com ela sua rotina havia se tornado mais leve. O sogro continuava o martírio de lutar contra o esquecimento. Cada momento de lucidez ele comemorava como se fosse o vencedor do mais cobiçado prêmio. Os dias se tornaram suaves, muitas vezes enfadonhos. Porém, naquele dia Melissa estava com a estranha sensação de que algo estava prestes a acontecer. Não sabia decifrar a intensidade e nem se era bom ou mau. Precisava manter a calma e deixar que o tempo curasse as feridas. Não tinha dúvidas, estava completamente apaixonada, mas julgava que tudo não passava de uma aventura adolescente. Cada dia que passava se aproximava do fim inevit
CAPÍTULO 22 Galeano sentiu o cheiro de café fervendo no fogo. O sol ainda não havia acordado ou a névoa não o deixava aparecer. Ele olhou para o lado, Melissa não estava. Encontrou ela na cozinha, que ao vê-lo chegar, serviu o desejado líquido em duas xícaras. Sentaram-se e foi ele quem tomou a iniciativa do diálogo. — Percebi uma nova fresta no telhado. Ela o encarou dentro dos olhos. Tomou outro gole do café e falou: — Fruto de um tijolo com uma mensagem presa ordenando que eu parasse com a investigação. Você por acaso sabe algo a respeito? — Não! — respondeu Galeano sem convicção mudando rapidamente de assunto. — Gostei por ter conseguido convencer Severino a morar contigo. Vamos tirar o leite? Melissa nada respondeu. Ela se levantou pegou um balde e se encaminhou para o curral seguido de perto por ele. O frio estava insuportável. Enquanto ele ficou de braços cruzados encostado numa estaca, el
CAPÍTULO 23 Dois dias haviam se passado. A rotina aparentemente tinha voltado ao normal. O casal conseguia brincar e a felicidade se instalou no lar. Até Severino sentia o efeito da harmonia e teve uma rápida melhora. Galeano tomava as rédeas e se ocupou dos afazeres da horta e com o gado. Aprendeu até a tirar o leite das vacas. As peças se encaixavam como uma verdadeira família. Galeano até esqueceu-se totalmente da missão e dos perigos que eram provenientes dela. Márcia era apenas uma distante lembrança. Achara seu lugar no mundo e na vida de uma mulher que amava verdadeiramente. Pela primeira vez em toda a sua trajetória estava feliz. Não sabia ainda como, mas precisava de uma fórmula para resolver o caso e não perder Melissa. *** Naquela manhã Melissa ficou cuidando do lar, hábito que perdera há muito. Assobiava uma música que aprendeu ainda na infância vivida nas ruas de Santo Antonio. Já havia recolhido a roupa suja
CAPÍTULO 24 Quando acordou era madrugada. Tentou se levantar, mas um peso pressionava seu corpo para baixo. Com muito esforço se desvencilhou do corpo nu de uma mulher. Reconheceu Márcia. Odiava quando ela lhe visitava sem avisar. Tentou não olhar para ela. Precisava dar um basta naquela situação. De posse de uma toalha se encaminhou para o banheiro. Tentava relaxar debaixo do chuveiro quando foi acariciado pelas delicadas mãos da moça. O instinto masculino foi mais forte. No minuto seguinte estava entregue aos caprichos femininos. *** Acordou antes do sol. Márcia havia ido embora. Detestava quando surgia e sumia sem aviso prévio. Até aquele momento não entendia qual o verdadeiro objetivo dela. Preocupação que ficaria para outra oportunidade. Tinha outras coisas mais urgentes. Arrumou a bagagem. Desceu e fechou a conta. — O senhor está indo embora? — perguntou Teresa. Galeano observou que Teresa em nada se parec
CAPÍTULO 25 Era noite de lua cheia. Estava sentada na ponta da calçada, no mesmo local onde fizera amor com Galeano. As lembranças a perturbavam. A tristeza provocava sofrimento. Se ela não tivesse descoberto ou se ele não tivesse mentido, provavelmente àquela hora estariam assistindo o baile das luzes mágicas na igreja de pedra. A promessa fora quebrada. Desde que Galeano partiu Melissa tentava retornar a rotina de antes. Naquele intervalo de tempo ela desencorajou Carlos diversas vezes. A presença de Severino na casa intimidava as pretensões de Carlos. Mesmo convalescente o sogro era uma ponte de apoio. Temia pela vida dele quando ela fosse para a prisão. Melissa chorava copiosamente com o rosto preso entre as coxas. Depois abraçou pérola, a sua protetora e amiga verdadeira. Nunca a abandonara e nem traíra seu amor. O vento batia nas árvores. A lua cheia desfilava com sua beleza no infinito espaço. Já havia pensado em desaparecer sem