Mas a maldição de uma rajada de vento entra pela janela do passageiro e alcança meu nariz.
E como num passe de mágica sou levado a dias aos quais eu não queria ter me lembrado, não agora.Aquele sorriso, aquela alegria, aqueles momentos felizes começam a surgir em minha mente.Momentos que eu não queria me lembrar.Dias que eu queria de fato me esquecer.Eu não posso com essas malditas lembranças, essa menina faz essa caixa tão fechada por mim se abrir de maneira que eu nunca vi acontecer.De forma inesperada paro o carro, desço e vou até a traseira da Silverado.Preciso de espaço, assim não irei conseguir levá-la para a casa sede.Que maldição!Porque reviver tudo isso agora?!?]Já não basta ter vivido uma vez, não preciso de reprise.Eu sei que já fui feliz!Eu sei que já tive alguém especial em minha vida.Mas isso é passado, jurei nunca mais me deixar ser enganado assim!E como se não pudesse ser ainda pior, ela sai“Ela precisou voltar para a cidade” Hum, por essa eu não esperava, estava já me organizando para sair fora e então com isso, não preciso sair da fazenda, menos mal. “Ela conseguiu alguns dias para descansar, mas precisou voltar, espero que volte em breve. Você iria gostar de conhecê-la!” “Vocẽ sabe que não estou a procura de companhia, não é?” “Urias, não estou falando de amor eterno, estou falando de amizade. Você precisa da convivência com pessoas da sua idade de vez em quando. Fica o tempo todo do bangalô para o laboratório, do laboratório para o bangalo. Só vem aqui quando precisa de algo e enfim, não acha que é muito novo para viver uma vida tão silenciosa e reclusa assim?” “Moni, minha cota de sociedade já deu! Prefiro o canto dos pássaros, as conversas vazias. Prefiro o som do riacho, a falação desnecessárias” “Ah Urias, a vida não é só isso menino!” “Para mim é, e estou bem satisfeito com isso”
Minha mãe parece desacreditar no que ouve. "Não é possível!!!”, fala meu irmão descrente com o que acabara de ouvir. O horror alcança o rosto de todos. "Mas e agora?!?”, pergunta Marcela, já à beira do desespero pelo que percebo. Nem dou atenção, porque nem sei o que ela está fazendo aqui. Não tenho tempo para frescuras de mulherzinha. Vejo o medo alçando o rosto de todo mundo e para amenizar as coisas saio falando: "Peguei um outro vinho que já estava pronto, fiz os demais testes, mas o problema é que só poderei disponibilizar para vendas semana que vem" "Mas, quantas garrafas temos prontas agora?", me pergunta Ícaro. "O suficiente para cobrir apenas esse evento" Meu irmão está pensando no que fazer, sei muito bem como funciona a cabeça dele, pois em alguns aspectos somos muito parecidos. Não deixamos o desespero nos peg
Acabamos de resolver um problema e agora estou pensando em várias maneiras de fazer aquele rostinho lindo sorrir ainda mais. Urias, se liga cara, isso é furada e furada, das grandes! E quando estou fechando o carro ouço: "Urias, você tem onde ficar essa noite?", me pergunta Hugo. Vejo Marcela arregalar os olhos e não entendo o porquê. "Não, Hugo, mas acho que vou pegar a estrada de volta", acabo respondendo. "Não vai não, segue meu carro. Você vem para casa conosco!" E falando isso, ele fala para Marcela: "Vamos, filha!” Ela apenas entra no carro, sem dizer nada a respeito do convite do pai. Fico indeciso no que fazer, pois vejo que a donzela não gostou muito que seu pai me convidasse, mas quer saber, vou aceitar, não tenho porque não aceitar. Estou bem cansado para encarar qualquer outra coisa agora. E assim, acabo fazendo o que Hugo falou.
Tempos depois estamos comendo, Hugo pediu guacamole, com tacos, tortillas e parece que ovos mexidos também. Ele nos serviu suco de uva e a comida caiu bem demais! Há algum tempo não tenho me sentado à mesa com minha família. As coisas não estavam tão boas depois da morte do meu pai, mas ficaram ainda mais complicadas depois que vivi aquela merda toda. Queria poder não ter perdido tanto. "Bom, não é Urias???""Desculpa, eu não ouvi", sou pego de surpresa pela voz do Hugo. "Eu disse, que a comida está muito boa!"Fico sem graça, porque está mais do que boa, está com aquele gostinho de família que eu nem sabia que sentia falta e acabo compartilhando com eles. "Nossa, para ser bem sincero ela me trouxe recordações boas"Hugo sorri. Acho que ele gostou de saber que a noite estava sendo boa."Isso é bom!!!", acaba falando.Marcela parece estar se deliciando com a comida, pois não fala nada. Seguimos comendo, cada um com seus pr
Vai ficar tudo bemE nos largamos na hora, cada um tomando uma direção diferente. "Ah, vocês ainda estão em casa… filhota, quer carona?"Saio em sentido a pia da cozinha, buscando encontrar sei lá o que. Marcela parece também tão perdida quanto eu, muito provavelmente por quase ter sido pega aos beijos comigo. Somos adultos, e daí?Pai é sempre pai! Ao menos, é o que vejo entre eles. Mesmo ela sendo adulta e tudo mais, ela o respeita muito e em situações assim, não tem essa de: Ah, eles são adultos!"Não papai, vou ficar o dia fora""Tudo bem então… vou só pegar uma pasta de documentos lá em cima"Ela me olha, mas eu sigo procurando sei lá o que nas bancadas da cozinha.Não tenho que me justificar ou prometer nada, eu queria sentir sua boca e assim eu fiz. Nada demais! Foi só um beijo e nada mais!É o que falo para mim mesmo. Estranho, algo nela me é familiar, só não sei o que é.Parece que eu já a beijei.
E assim todos são convidados a brindarem com nosso lançamento.Eu também acabo celebrando o momento com as pessoas que estão ao meu redor.Vejo satisfação nos olhares dos convidados e sei que mais uma vez acertei na composição do vinho. Busco olhar para Hugo que parece muito feliz com o sabor do vinho, assim como Gregori.Fico ainda mais satisfeito.Olho para minha mãe e irmão, e eles parecem também muito felizes com nosso produto novo. Marcela parece ainda mais feliz que todos, pois não apenas seu rosto transmite alegria como seu corpo também. E que corpo aquela mulher tem! Ela se delicia com a bebida, se permitindo se entregar a tudo o que o vinho oferece. Ela fecha seus olhos deixando as sensações surgirem e quando os está abrindo, eles me alcançam, mesmo eu estando meio que escondido.Vejo gratidão em seu rosto, porque esse não seria o vinho que eles iriam servir.Mas fico feliz que tenha sido esse, porque assim vivo esse mom
Passo minhas mãos por meus cabelos, tentando entender porque um empregado da fazenda que está me contando uma coisa dessa e não minha própria… mãe!Respiro fundo para não surtar, afinal, não vou descarregar em quem não tem culpa, prefiro guardar essa raiva para quem de fato a mereça.“Faz tempo que eles embarcaram?”“Não senhor, foram de aeronave particular”“Telefone para o aeroporto e mande eles enviarem um helicóptero para mim o mais rápido que puderem”“Pode deixar Urias… mas olha, seja o que for… vai ficar tudo bem!”Olho para Jardel e sua simplicidade, e falo: “Assim espero Jardel, assim espero!” E em menos de uma hora já estou a caminho da capital, seja lá o que esteja acontecendo, que Deus me ajude a não perder a cabeça.Assim que desembarco, um carro de aluguel já está disponível para mim.Jardel!Ele sabia que eu iria precisar. “Senhor Martelli aqui estão as chaves do carro (me fala um recepcionista) e seu assessor pediu p
Nem percebo quando a Marcela chega perto de mim, apenas quando ouço: "Não importa o porquê não lhe contaram… o mais importante é que você está aqui, Urias!"Não falo nada, ninguém de verdade sabe o que está acontecendo dentro de mim.Mas Marcela continua falando: "Seu irmão está sendo bem cuidado e nesse momento ele precisa que você tenha um pouco de controle, para que ele possa também conseguir se cuidar""Como ter controle Marcela, Syrah fez isso por maldade… porque se ela me quisesse bem como sempre fala, não deixaria que eu ficasse sabendo disso pelos empregados da fazenda… que merda… sou tão Martelli, quanto ela!!!”Enquanto falo, meu olhar alcança minha mãe, mas meu desprezo chega até ela através do meu olhar."Se você quiser, vou lá pedir para que você possa ver seu irmão", me propõe Marcela.Passo uma das minhas mãos pelo meu cabelo, respiro fundo e olho para ela.Fico ali parado, olhando para ela ali na minha frente, me desligando de tudo e de todos, como se estivéssemo