Arion desapareceu e não entendi nada até tia Odete aparecer na porta do quarto.
— Bom dia, Maria Cristina. Ouvi vozes. Era você?
— hum... Eu estava cantando.
— Bom ver você feliz. Quer descer para me ajudar?
— Na verdade estou com um pouquinho de dor de cabeça. Vou ficar por aqui mais um pouco.
Tia Odete deu a risadinha que eu já estava me acostumando a ouvir.
— Vai ficar tudo bem. Por isso precisa passar uns dias com o pastor Jonas. Até todas as impurezas que trouxe saírem de seu corpo.
Ela ainda achava que meu sumiço se devia a eu estar hospedada com Jonas. Estremeci ao pensar lembrando-me de minha estada em sua casa.
— Hoje não terá aula — ela falou. — O pastor irá fazer um culto &a
Retornei ao mirante. Era ali que eu gostava de estar para refletir. Eu precisava reconquistar o amor de Krica. Eu passei mais de cem anos sem me incomodar se um dia eu conheceria ou não alguém que me fizesse sentir assim. E se conhecesse teria que ser especial, a pessoa certa. E eu sabia que essa pessoa era Krica. Ela havia me conquistado por ser autêntica, honesta, sincera, mesmo todos achando o contrário. Ela não era má. Estava apenas confusa, em conflito com sua própria personalidade. E eu estranhamente senti sua chegada. Mesmo ela não sendo viajante ainda, nem tendo qualquer conexão comigo, eu a senti chegando. E presumi que minhas dores de cabeça fossem, também, algum tipo de conexão com Krica. Só não entendia como, nem porquê. Resolvi ir procurar pelos outros. Daria a Krica tempo suficiente para pensar e decidir o melhor para si. Mesmo eu tendo medo do resultado.
Passei horas pensando no que acontecera. Iana acusando Arion de me enganar e Arion sendo tão sincero ao expor seu amor. Definitivamente eu acreditava em Arion. Não era possível que o que eu presenciei, a aura de poder que nos envolvia, aquele beijo e todo o amor que eu sentia por ele viesse apenas de um só lado. Apenas do meu lado. Ele acreditava que eu era merecedora de seu poder e seu amor. Eu não tinha tanta certeza disso. Eu explodia com facilidade. Talvez eu não me aproveitasse desse poder para roubar. Mas, mesmo assim, eu tinha minhas dúvidas quanto ao resto. Nunca fui um exemplo de garota. Mas como dizer que eu simplesmente não poderia ficar com ele porque não o merecia? Ele não iria aceitar. Ele achava que me conhecia, mas eu me conhecia melhor do que ninguém e, se eu já fazia merda sendo normal, não queria nem pensar tendo alguns poderes. Arion não podia desconfiar
Eanes bateu à porta dos Siqueira. Ficamos ao lado da casa esperando e ouvindo. — Boa noite, Dona Odete. — Boa noite, Eanes. Tudo bem com você? Ainda não foi se recolher. Seu pai disse para dormimos cedo. O sol já se pôs. — Eu sei. Mas preciso pegar algo que Krica esqueceu. — Claro, minha querida. Entre. Ela deve ter saído quando estávamos no culto. Como ela está? — Muito bem. Está se adaptando. — Fico feliz. Pode subir, Eanes. O quarto dela é à esquerda. — Obrigada. Ouvi os passos de Eanes subindo as escadas e depois somente silêncio. Estava ficando ansioso quando a ouvi dizer: — Ela pegou algumas roupas do armário. Ainda está bagunçado. Parece que se
Acordei zonza. O rosto colado à terra úmida e fria. Sentei-me e abaixei a cabeça apertando as têmporas com as mãos. Senti algo molhado. Olhei para minhas mãos e havia sangue em uma delas. Eu bati a cabeça no chão quando caí. Lembrei-me da visão. Iana e Arion sujos de sangue. Fechei os olhos e tentei me concentrar ao máximo. Eu tentaria ter outra visão. Gerd havia dito que ficariam mais frequentes e que as teria acordada também. Talvez eu pudesse controlá-las. Fiquei algum tempo esperando que algo aparecesse em minha mente. Mas nada. Levantei-me e suspirei esperando que tivesse sobrado poder suficiente para voltar. E novamente fiquei tonta. — Merda! Sentei-me no chão e o turbilhão de imagens começou. Concentrei-me e pude ver Jonas envolto em um escudo. Como o de Olaf. Vi-me entrando no escudo por trás de Jona
Krica desapareceu de repente. Eu estava atordoado. Não entendi o que ela pretendia fazer. Minha cabeça doía e havia sangue escorrendo por meu rosto. O céu estava encoberto por uma nuvem azulada que descia em forma de espiral em direção a Jonas e Gerd. Levantei-me com dificuldade e me aproximei dos dois. Gerd olhava para cima. — O que faremos? Como vamos impedir que isso continue avançando? — eu perguntei para Gerd. — Não podemos. Eu calei Jonas, mas elas continuam vindo em nossa direção. — Mate-o, Gerd! — Não antes de saber se posso. A espiral de fumaça azulada estava descendo lentamente, mas estava muito próxima a nós. Jonas sorria debilmente ancorado ao chão pelo poder de Gerd. Krica reapareceu. — Gerd! Mate-o!
Eu não queria sair dali. Não queria deixar os braços de Arion. Mas precisávamos voltar. Puxei o ar sentindo o frescor da manhã no alto da montanha. Limpei o rosto com as mãos. — Vamos para mansão. Não podemos ficar aqui pra sempre. Arion sorriu. — Bem que eu queria. Aparecemos na sala, mas não havia ninguém ali. Surgimos no quarto de Dami e Iana estava deitada ao seu lado. Os outros estavam em volta. Apesar de não gostar de Iana, meu coração partiu vendo a cena. Arion soltou minha mão e deu a volta na cama para chegar próximo à ela. Eu fiquei ao lado de Dami, com o coração apertado. — O que aconteceu com ela? Vocês não a curaram? — Os ferimentos sim. — Gerd disse. — Mas ela lutou
Eu não queria fazer isso. Queria correr atrás de Krica. Mas deixar Iana morrer não era uma opção. Sentei-me ao seu lado, apoiei meu peso esticando o braço sobre seu corpo e coloquei a mão sobre a cama entre ela e a Srª Ruschel. Inclinei-me devagar, tomando o cuidado de não tocar em nada além de seus lábios. Levei um susto. Levantei o tronco e olhei para o lado. A mão da Srª Ruschel agarrava meu pulso fortemente. Depois de alguns segundos soltou, caindo flácida para o lado. Olhei para os outros. Gerd e Eanes também viram, pois estavam tão assustados quanto eu. Gerd deslocou-se para o lado de Ansur. — Vá buscar Krica. — e vendo a expressão assustada de Ansur que nada entendeu, acrescentou: — Agora! Ansur desapareceu com cara de espanto voltando logo em seguida com Krica. Antes que qualquer um do
Eu estava no ponto de ônibus com minha tia e Bê esperando a condução que os levaria para a casa que alugaram no centro da cidade. Eles haviam ficado em nosso apartamento apertado até que encontraram uma casinha com um aluguel que conseguiriam pagar com o que Be receberia de seu novo emprego como inspetor do Educandário. Eles ficariam bem. Be ainda andava arrumadinho mas, pelo menos, voltara a me chamar de Krica. Tia Odete continuava um pouco triste, mas essa semana eu a vi sorrir com mais frequência. Não o sorriso bobo resultante da hipnose de Jonas. Mas um sorriso sincero. O ônibus encostou e os dois foram embora com promessas de visitas frequentes. Senti a presença de alguém e me virei esperando ver Arion, mas foi Henrique quem estava caminhando em minha direção. Achei aquilo bem estranho. — Oi. Eu fiquei sabendo que