• Por Alivia...
As palavras da jovem deixaram Vanessa assustada num primeiro momento, e num segundo, ela estava confusa e preocupada.
Ir ao cemitério era a última coisa que Alivia devia fazer naquele momento. Seria doloroso demais, uma emoção desnecessária no momento em que estava.
--- Como assim, minha filha? --- Vanessa ainda estava em choque, e seu cérebro se esforçava para acompanhar.
A decisão havia sido muito repentina, e a mais velha não esperava que a filha fosse querer algo assim tão depressa. Alivia não estava preparada. Não, Vanessa não podia deixar a filha ir. Ela sabia o que era melhor para sua menina.
--- Você não está sendo precipitada? --- Vanessa tentou argumentar --- Não precisa fazer isso agora.
--- Eu tenho todo o direito de visitar os túmulos deles! --- Alivia se levantou, indignada com as respostas da mãe --- Eu não estava em seus enterros, e quero ir lá, colocar flores e chorar.
Ela lutava para manter as lágrimas contidas. O que era aquilo? Frustração? Raiva? Ela estava irritada com sua mãe, ou com ela mesma?
--- Eu sei que você tem esse direito, mas não precisa apressar nada. --- Vanessa rebateu --- Você voltou ontem, vamos com calma.
--- Calma? Como quer que eu vá com calma? --- Alivia riu com amargura, cruzando os braços --- Eu estive em coma por quase dois anos! A última coisa que quero é adiar alguma coisa!
Ela balançou a cabeça, saindo da cozinha, seus longos cabelos pretos estavam presos em um coque mal feito, e seus passos estavam firmes enquanto atravessava o corredor.
--- Se a senhora não quiser vir comigo... então eu vou sozinha. --- Alivia seguiu pela sala limpando todo e qualquer rastro das lágrimas em seu rosto --- Agora é o meu luto.
--- Filha, espere! --- Vanessa pediu seguindo atrás da filha que já batia a porta da casa --- Droga!
Vanessa prendeu os cabelos castanhos em um rabo de cavalo baixo, e subiu ao andar de cima as pressas para buscar as chaves do carro. Alivia não iria sozinha de jeito nenhum.
O luto é algo pessoal demais para montar um padrão a seguir. Você não pode comparar o seu luto, e a sua forma de vivê-lo, com os das outras pessoas. Cada um tinha seu tempo, e para a jovem de cabelos negros, o luto estava atrasado.
Alivia sentia os olhos azuis arderem, havia saido as pressas pela porta de casa, e não estava muito longe quando sentiu um tranco na perna e no quadril, indo ao chão com violência e um baque surdo.
--- JAKE! --- Ela ouviu uma voz masculina gritar, não muito longe --- O quê foi que você fez, pirralho?!
Alivia sentiu a perna latejar, a calça jeans quase rasgou ao raspar na calçada, os cabelos que estavam presos se soltaram e espalharam, caindo em cascatas negras e desgrenhadas pelas costas e pelo rosto pálido da jovem.
Que havia acontecido? Por pouco ela não caiu de cara no chão e quebrou o nariz.
--- Sai daqui com essa bicicleta, agora! --- Alivia ouviu alguém se aproximar e se abaixar ao seu lado --- Ei, você esta bem?
--- Eu... --- A jovem engoliu em seco, sentindo mãos fortes segurarem seus ombros e cintura, a levantando um pouco do chão, fazendo-a ficar sentada --- Porra. --- Murmurou.
--- Você bateu a cabeça? --- O estranho perguntou, parecendo preocupado.
Alivia tentou focar sua visão no rosto dele, mas as madeixas de seu cabelo a atrapalhavam, ela piscou algumas vezes, enquanto sentia os fios serem afastados de seu rosto e colocados atrás de sua orelha pela mão do estranho, então pode enxergar quem era.
Joshua. Seu novo vizinho.
--- O quê bateu... em mim? --- Alivia perguntou encarando os olhos azuis dele.
Não era um azul normal, ela só tinha visto aquele tom de cinza-azulado tão intenso em um par de olhos. Nos seus. A oscilação entre cinza, azul e preto variava por conta da luz, mas naquele momento, eram os olhos mais azuis que ela já havia visto.
--- Meu irmão... --- Joshua respondeu após alguns segundos de silêncio, parecia estar saindo de um transe, encarou os olhos de Alivia e continuou --- Ele não é muito bom com a bicicleta... sinto muito!
--- Tudo bem...sem problemas. --- Alivia tentou sorrir, não tinha muita vontade, mas Joshua sorriu formando covinhas em suas bochechas, ele segurou em um braço dela e em sua cintura a pondo de pé --- Obrigada.
--- Imagina! --- Ele ainda tinha um sorriso no rosto --- E sua perna não está doendo? --- Ela negou --- Certeza?
Alivia devia admitir que ele era lindo, a jovem desviou o olhar, pegando uma mecha do cabelo, que insistia em cair no rosto, e colocando atrás da orelha.
Era estranho ficar tão perto de alguém que não fosse Luige.
Joshua pareceu prestes a dizer algo, Alivia o encarou, mas o loiro abriu e fechou a boca, não dizendo nada.
--- Filha! Você não devia ter saído assim de casa! --- Vanessa apareceu na porta, como um furacão chegando até os jovens poucos segundos depois --- O quê aconteceu aqui?
--- Fui atropelada. --- Alivia encarou a fachada da casa.
--- Como?! --- Os olhos de Vanessa quase saíram das órbitas --- Você está bem? Como isso aconteceu? Quem foi? --- A mulher passou a examinar a filha minuciosamente.
--- Foi uma bicicleta senhora... --- Joshua interviu com um sorriso divertido e tímido, ao mesmo tempo.
--- Quê? --- Vanessa encarou o rapaz com a cabeça tombada de lado --- Você é o filho da Angeline, certo?
Alivia sorriu discreta. O loiro assentiu.
--- Meu irmão... --- Joshua apontou para Jake, alguns metros de distância deles, montado em sua bicicleta azul com preto --- Bateu na sua filha sem querer, sinto muito. --- Esclareceu com um sorriso discreto.
--- Entendi...você me assustou filha. --- Vanessa encarou Alvia de modo sério, a jovem deu de ombros, ocupada demais em prender o revolto cabelo negro --- Bem... --- Ela suspirou, desistindo de um diálogo --- Vou tirar o carro, e então vamos onde você queria, querida.
--- Ok.
Foi tudo que Alivia disse como resposta, enquanto Vanessa andava ate a garagem para pegar o carro, a jovem finalmente conseguiu prender os cabelos outra vez, e então encarou Joshua que continuava parado, com um sorriso de canto.
--- Que foi? --- Ela levantou as sobrancelhas.
--- Nada... --- Ele respondeu, meio sem graça olhando para o lado e vendo o irmão ainda parado --- Jake vem aqui. Agora. --- Ele mandou num tom sério que quase nunca usasa, apenas com Jake.
Jake se afastou da bicicleta a escorando na parede branca da casa, e andando a passos lentos e arrastados ate o irmão, parecia saber que levaria uma bronca daquelas, parou ao lado de Joshua.
--- Quê é? ---- Perguntou o mais novo sem encarar Joshua e evitando fazer contato visual com Alivia.
O menino vestia uma bermuda jeans verde escuro e uma blusa azul claro, com o desenho de uma âncora preta, e mangas longas azul escuro.
--- Pessa desculpas para ela. --- Joshua mandou encarando o irmão de cima, o loiro era um rapaz de 1,78 de altura e seu irmão de 1,40 ficava ainda menor perto dele.
--- Desculpa... --- Ele finalmente encarou Alivia, que sorriu ao ver os olhos castanhos tão meigos do menino a encarando --- Eu não queria ter batido em você...
--- Tudo bem, lindinho. --- Ela se inclinou, ficando frente a frente com ele e jogando seus cabelos revoltos para trás --- Jake, não é? --- Perguntou e ele assentiu --- Jake, não precisa se preocupar, eu estou bem.
--- Que bom. --- Ele sorriu, se afastando e correndo até sua bicicleta no momento em que Vanessa saía da garagem com o carro prata --- Sinto muito, mesmo!
Ele gritou e acenou, sumindo rua abaixo.
--- Jake não consegue ficar quieto nem por um minuto.
Alivia ouviu a voz de Joshua dizer e o encarou, ele olhava o irmão brincar com um sorriso, ela assentiu, costumava sorrir assim para seu irmão.
--- A maior parte das crianças é assim... --- Ela falou ainda o encarando, com as mãos nos bolsos da calça jeans.
--- Você tem toda razão, senhorita...? --- Ele se virou para ela com uma sombrancelha dourada arqueada.
A jovem sorriu de canto e abriu a boca para o responder, mas foi interrompida pelo som da buzina do carro de Vanessa parado na rua. Estava na hora de ir, de enfrentar seus traumas.
--- Já estou indo, mãe! --- Gritou revirando os olhos e voltando a encarar o rapaz encantador a sua frente, ele a encarava com expectativa --- Dion, Alivia Dion, muito prazer. --- Falou por fim.
--- Sou Joshua Dortmund. --- Ele estendeu a mão para ela que a segurou com um sorriso discreto, a reação que ele esperava e não a que tinha normalmente --- O prazer é meu.
--- Bem Joshua, eu tenho que ir agora. --- A jovem soltou a mão dele, e começou a se afastar antes que sua mãe saísse do carro para buscá-la.
--- Onde vai com tanta pressa? --- Ele perguntou franzindo as sombrancelhas, era muito curioso e admitia isso --- Se me permite perguntar.
Alivia o encarou por sob o ombro com um sorriso triste. Não eram os sorrisos que estava acostumada, mas agora eram involuntárias.
--- Ao cemitério. --- Respondeu ela, aumentando o passo ate o carro de Vanessa, que logo partiu rua afora.
--- Cemitério...? --- Joshua tombou a cabeça de lado, foi quando sentiu algo passar rapidamente ao seu lado quase o acertando --- JAKE!
● Por AliviaVer o túmulo de Paul fez com que a ficha de Alivia finalmente caísse, e não foi algo bom. Doeu. Mais do que ela podia aguentar. A jovem ainda tinha esperança de ser tudo um sonho ruim, do qual acordaria a qualquer momento, assim que achasse um jeito. Mas não era um sonho. E ela não acordou. Ver o túmulo de Claire foi igualmente doloroso para ela, sua melhor amiga era uma pessoa tão boa, tão meiga, tão gentil, e foi sua primeira amiga de verdade e a primeira garota que Paul levou a sério, os dois estavam tão felizes juntos... Era muito injus
● Por JoshuaHaviam duas semanas inteiras que Joshua não via Alivia, e ele estava mais preocupado do que achou que ficaria. Nem sequer a janela do quarto dela estava aberta, e ficou as duas semanas fechada e coberta com cortinas escuras que não permitiam ver nada lá dentro, nem uma luz ou qualquer sinal de que a jovem estava lá. Joshua passou a ficar muito preocupado, ele queria ir até lá, mas não teve coragem, não conhecia muito bem Alivia, mas sabia, pelos olhos dela, que a jovem precisava conversar, parecia solitária, triste e até deprimida demais... --- Joshua? --- Ouviu a voz de sua mãe o chamar e se virou, vendo Angeline parada na porta da cozinha --- Fi
● Por JoshuaEle havia ficado assustado com a jovem de cabelos pretos e olhos puxados que entrou na sala como um furacão de macacão florido. O olhar de desconfiança não sumiu nos segundos que se seguiram a entrada dela. --- Por que você está aqui? --- Ela perguntou, tentando acalmar a crise de choro de Alivia --- Qual seu nome? Sinto que te conheço. --- Sou Joshua, vim trazer umas coisas para a mãe dela e ela estava assim, a mão está cortada. --- Avisou. --- Sou Lin Mei, prima dela. --- A morena pegou a mão da outra, haviam cacos presos lá --- Preciso tirar isso, fique aqui, vou pegar o kit médico.
● Por AliviaLin Mei ficou com Alivia até Vanessa voltar do trabalho, e explicou para a tia tudo que aconteceu naquela manhã, como Alivia cortou a mão, como ela e o vizinho ajudaram a prima com o machucado, e que ela deveria sair mais de casa, que a jovem estava muito deprimida. --- Eu não acredito que você socou um espelho! O quê você tem na cabeça?! Porquê fez isso Alivia?! --- Vanessa estava furiosa. --- Tia, vai com calma...não precisa gritar com ela. --- Lin interveio com a voz calma --- Desnecessário.Alivia estava sentada no sofá com Vanessa em pé a sua direita e Lin Mei a esquerda, ao seu
● Por JoshuaJá fazia alguns minutos que Alivia e Joshua estavam andando pelas calçadas da rua principal, a jovem se sentia bem ao lado do loiro, ele era um rapaz divertido, bem humorado, capaz de lhe arrancar sorrisos. --- Seu irmão é impossível. Não acredito que ele fala coisas assim, é muito inteligente. --- Alivia deu um sorriso --- Jake parece um adulto falando! Mais esperto que nós dois juntos! A conversa dos jovens havia se prolongando por todo caminho, não faltava assunto com Joshua, ele sempre tinha algo a falar ou comentar, era contagiante. --- Pois é, você não sabe o que eu tenho que aturar em casa! --- Joshua deu risada rápida, eles es
● Por JoshuaJoshua percebeu que Alivia estava, de alguma forma, mais leve, mais alegre e mais feliz também, podia ver que o azul de seus olhos apareciam mais nitidamente do quê das outras vezes que estivera com a jovem. E ele ficava muito feliz por ela. --- E você pretende voltar a estudar? --- Ele perguntou, pegando uma batatinha empanada e colocando na boca. A conversa havia rodado até chegar nos estudos, Joshua começaria a faculdade em alguns meses. --- Não sei, mas acho que sim. --- Alivia respondeu dando um gole no seu milkshake --- Eu ia começar o 2° ano do Ensino Médio e não sei como vai ser voltar a estudar
● Por AliviaDepois do passeio pela cidade, que já fazia dois dias, Alivia não havia visto Joshua, talvez tenha sido pelo fato da jovem nem ao menos sair de casa depois daquele dia. Nem na janela ela aparecia, estava sempre fechada, não recebia visitas, não queria ver ninguém. Alivia não sabia explicar o que estava sentindo, era um estranho misto de emoções por ter se divertido tanto quando devia estar de luto. Nas últimas duas semanas, desde que voltara, havia recebido a visita de três exs-colegas, com quem tinha mais intimidade quando estudava, agora eles estavam na faculdade, mas não podiam ser considerados seus amigos. --- Filha vou sair com a Angeline e co
● Por Alivia Ela sabia que seria difícil. Sabia que iria chorar, que iria sofrer. Um sofrimento necessário. Mesmo assim, precisava fazer isso, caso contrário nunca deixaria essa parte de sua vida para trás, e precisava seguir em frente, virar mais essa página. Superar faz parte do ciclo de vida de todo ser humano, e era hora dela superar e seguir sua vida. Por mais doloroso que fosse. --- Mãe? --- Alivia chamou, parando na porta da cozinha. Domingo havia amanhecido com poucas nuvens e um céu cinzen