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Capítulo 4 - Gianna

Desembarcamos e pegamos nossas malas. Um homem taciturno, vestido com um terno Armani e óculos escuros, segurava uma placa com meu nome.

— Que bom! Vou de carona com vocês, o Dimitri me conhece. — Ela acenou para o homem, que sequer se moveu.

— Como você iria? — perguntei, com as sobrancelhas franzidas.

— De trem. — Sasha deu de ombros e seguiu em direção ao homem. — Oi, Dimitri, essa é a Gianna. Acredita que nos encontramos no voo para cá? Uma coincidência, não é mesmo? Ela será minha colega de quarto! — ela tagarelou, enquanto ele tirava os óculos. Ele era bonito, tinha cabelos loiros e olhos verdes, mas parecia sério demais.

— Senhorita Gianna Diglaviev, é um prazer recebê-la. Bem-vinda à Rússia — Dimitri falou com uma expressão austera, mas parecia sincero.

Ele ignorou a Sasha e se encaminhou para fora do aeroporto.

— Obrigada! — O segui.

Ela pouco se importou e continuou tagarelando durante toda a viagem. Levamos cerca de meia hora por uma estrada escura e sinuosa. Não deu para ver muito do caminho, mas percebi que subimos bastante, pois senti aquele típico zumbido nos ouvidos.

Chegamos à entrada de uma construção antiga, mas muito bem conservada e bonita, parecendo aquelas construções medievais. Era de tijolos vermelhos, com janelas brancas, enorme e rodeada por outras construções grandes.

— Bem-vinda ao Instituto Dmitriev! — Sasha abriu os braços ao descer do carro. Eu quase morri de frio.

— Obrigada, Dimitri — agradeci ao sair do veículo.

— É sempre um prazer, senhorita Diglaviev! — Ele retirou nossas malas e se despediu, partindo com o veículo tão rápido quanto chegou.

— Esse prédio grande é onde ficam as salas de aula, aquele à direita é onde ficam os dormitórios, e no outro ficam a biblioteca, a diretoria e a ala Dmitriev, que é separada dos outros alunos. Venha, vamos deixar suas coisas no quarto e ir à secretaria cuidar da sua matrícula.

Não questionei. Apesar do frio, fiquei encantada com o lugar; era antigo, misterioso e tinha um charme europeu.

Seguimos pela grande entrada. Olhei em volta sem prestar muita atenção e esbarrei de frente com alguém. Alguém muito bonito! Um perfume agradável e quente invadiu o ar. Ele vestia jeans e um casaco preto aberto, com um capuz que cobria seus cabelos, caindo sobre os olhos. Seu abdômen estava à mostra; ele não sentia frio? Vi uma tatuagem em seu peito esquerdo que não consegui identificar. Ele era alto, forte, com olhos de um castanho claro intenso, que pareciam invadir minha cabeça. Seu rosto era perfeito, belos olhos, nariz bonito e lábios cheios, ele parecia… poderoso, ou apenas prepotente mesmo. Aquele olhar dele era bem constrangedor, mas não achei ruim. Me fez congelar por um momento. Meu corpo inteiro aqueceu e, imediatamente, eu quis… tocá-lo? Franzi o cenho; que pensamento louco era esse?

— Prosti! — me desculpei em russo, sem jeito. 

Ele me olhou de cima a baixo. Senti-me exposta sob a estranheza daquele olhar. Sem responder, ele desviou e seguiu seu caminho.

— Uau, quanta educação! — reclamei, virando-me para Sasha, que estava boquiaberta na entrada. — Você viu isso?

— Eu vi! Você é mesmo uma sortuda, garota! — Ela balançou a cabeça.

— E por que diz isso?

— Bem, seu primeiro minuto aqui e você simplesmente esbarra no Nickolae Dmitriev, nosso Conde. Ele é o filho do meio do diretor do Instituto e o cara mais lindo da face da Terra! — ela falou, sem tirar os olhos do tal que agora desaparecia atrás de uma das construções.

— O conde mais sem educação, você quer dizer?

— Ele é um pouco sério, não dá confiança para nenhuma aluna, o que é compreensível, dado seu status. Mas ele praticamente não tirou os olhos de você! Achei que teria um fight com vocês ali — ela disse, com um sorrisinho.

— Você não é dessas que gostam de romances impossíveis, que só fala sobre garotos, é? Vamos, estou congelando aqui fora. — Entramos e senti os pelos da nuca eriçarem, como se estivesse sendo observada. 

Olhei para trás, mas não vi nada.

Entramos e eu arfei. O lugar era lindo! O piso de madeira de lei, bem polido e conservado; as paredes, em um bege aconchegante; o pé direito alto. O hall de entrada era amplo e aquecido. Havia grandes colunas em estilo grego em toda a construção, e até as portas eram bonitas, grandes e de madeira maciça escura. Nas paredes, havia quadros de pessoas impressionantes; todos eram muito bonitos.

— Aqui estão os fundadores da escola, mas vou deixar essa parte para o professor Sidorov. Eu fico com a parte legal — Sasha disse enquanto subíamos uma grande escada em espiral. — Todo o Instituto é coligado, ou seja, é bem grande e tem muitas portas. Não recomendo que ande sozinha por aqui a princípio; você pode se perder. Contudo, vou te explicar como chegar aos pontos principais, como a ala de refeições, a biblioteca e as salas de aula.

— É muito bonito aqui, e quente! — Parei para olhar uma das pinturas. 

Uma lágrima escapou. Era minha mãe. No quadro, seus cabelos estavam soltos, emoldurando o rosto, e ela parecia mais jovem, provavelmente no auge da carreira. Tinha um sorriso sedutor e parecia feliz ali.

— Nossa, sua mãe era linda mesmo, Gianna, e você é muito parecida com ela. — Sasha afagou meu ombro.

— Sinto tanta falta dela e do meu pai… eles eram importantes para mim.

— Eu imagino que sim. — Sasha suspirou. — Vamos… temos que ver sua matrícula. — Ela me puxou gentilmente e seguimos por um longo corredor, que tinha várias portas brancas com plaquinhas prateadas com os nomes dos ocupantes. 

Sasha começou a falar, mas eu não conseguia mais ouvir; ainda estava mexida com o quadro da minha mãe.

Paramos em frente a uma das portas brancas. Nela, havia duas placas, como nas outras portas: uma com meu nome e a outra com o nome da Sasha, em letras elegantes. Ela abriu a porta e me surpreendi. O quarto não era tão grande, mas tinha um bom tamanho. O papel de parede era rosa escuro com detalhes dourados, lindo. O lustre era luxuoso e pendia no meio do cômodo. Havia duas camas, uma de cada lado, cada uma com um gaveteiro de madeira, pequeno. Na parede posterior, havia outra porta, e no canto, uma pequena porta de madeira.

As camas pareciam confortáveis. Uma estava perfeitamente arrumada, a outra nem tanto. Sasha sorriu e corou.

— Desculpe a bagunça! — Ela começou a arrumar sem jeito.

— Sem problemas!

— Bem, essa é sua cama. Aquela porta de madeira ao lado é seu closet. Aquela outra, lá no canto, é nosso banheiro. Temos um banheiro comunitário no fim desse corredor; quase ninguém usa, mas serve para uma emergência — disse, jogando-se em sua cama. — Estava com saudades daqui.

— Mora aqui há quanto tempo? — Me sentei e, no mesmo momento, tive vontade de deitar; era muito confortável.

— Estou aqui há dois anos. Gosto desse lugar. Somos bem tratados, as aulas são boas, a maior parte, ao menos — ela se interrompeu. — Bem, precisamos ir. Quero conversar com você direito, e para isso, precisamos ir até a secretaria.

— Mas não disse que estão de férias? — perguntei, pegando os papéis que minha mãe me deu e meus documentos. 

Eu ainda não queria ficar, mas algo aqui era tão acolhedor; tinha a sensação de lar… enfim. Peguei meu celular e vi muitas chamadas do Diego. Eu havia esquecido completamente do meu amigo. Quando voltasse para o quarto, tentaria ligar. Tirei o casaco e fiquei com a blusa mais fina que usei por baixo; a temperatura aqui dentro era bem agradável e favorecia o conforto das roupas.

— Sim, mas os assuntos acadêmicos não tiram férias; sempre tem alguém lá. E não se preocupe quanto ao idioma. Apesar de estarmos na Rússia, aqui geralmente falamos inglês, embora aconteça de alguém falar russo. Você sabe alguma coisa?

— Ah, sei sim. Minha mãe me ensinou, mas ando enferrujada. Seria bom relembrar — recordei das aulas. Nesse momento, meu cérebro repassava apenas as palavras mais básicas; teria que estudar.

— Eu imaginei que soubesse. Depois passamos na biblioteca e veremos algo para te ajudar.

Caminhamos pelos longos corredores do Instituto. As paredes eram perfeitamente pintadas e cheias de quadros de pessoas lindas e meio surreal. Sasha me ensinou a chegar ao refeitório, ou melhor, à ala de refeições, à biblioteca e, finalmente, à secretaria. Não gravei nada; teria que pedir um mapa. Eram muitas portas e muitos corredores.

Entramos na secretaria, onde havia uma senhora bonita, com cabelos negros presos em um coque bem apertado. Ela sorriu gentilmente ao nos avistar.

— Ah, meu Deus! Gianna Diglaviev. Você é tão linda quanto Lenore! — disse em inglês, dando a volta no balcão e me dando um abraço de urso.

— O-obrigada. — Fiquei envergonhada, não esperava por isso.

— Ai, querida, me desculpe. Sua mãe e eu estudamos aqui juntas; éramos boas amigas — disse com um sorriso triste. — Sinto muito por sua perda. Espero que aqui consiga se sentir mais próxima de Lenore, mas sem se sentir triste. — Ela falava da minha mãe com tanta intimidade; eu nunca soube de amizades dela longe do Brasil. 

Minha mãe era muito reservada. 

— Me chamo Natasha Ovalenka, sou a secretária daqui. O que precisar sobre horários, aulas perdidas, livros e matérias, é só me avisar. — Ela voltou ao balcão e pegou uma ficha.

— Senhorita Ovalenka, vou aguardar lá fora. — Sasha deu uma piscadinha.

— Oh, me desculpe, Sasha. Fiquei tão feliz ao ver Gianna que não a cumprimentei. Perdoe-me, querida.

— Está tudo bem! — Sasha deu um sorriso gentil e se retirou.

— Essa mocinha é um encanto, uma ótima companheira de quarto — elogiou, e depois retornou à ficha. — Gianna, vejo que terminou a graduação em letras. Muito bom! Tem um ótimo currículo acadêmico. Bem, esses são seus horários, e aqui estão seus livros. Só um minuto que vou pegar sua agenda curricular. — Ela falava sem parar; não tive tempo de dizer nada. 

Quando saiu, peguei os livros. Os títulos pareciam livros de autoajuda. Nada contra, mas não faziam meu estilo. Eram intitulados "O Poder da Persuasão", "Autocontrole para Não Persuadir Indevidamente", "Regras de um Varivat"... entre outros. 

— Aqui está, querida. Essa agenda é muito importante; nela estão os horários das aulas com Sidorov, seu instrutor acadêmico. — A senhora Natasha me entregou a agenda elegante, que tinha meu nome nela.

— Bem, é que eu vim para conhecer… não sei se vou ficar — comentei, e ela sorriu.

— Não se preocupe. Se não se habituar, poderá trancar sua matrícula a qualquer momento, mas acho que vai gostar. Fazemos todo o possível para que os alunos sejam bem tratados e se sintam em casa.

— Bom saber, obrigada. Onde encontro o professor Sidorov? — Queria aprender sobre essa coisa o quanto antes.

— Ele retorna na próxima semana. Como não sabíamos que viria, ele saiu de férias com a família; foram para os Alpes Suíços. Ai, que inveja! — Ela suspirou, sorrindo. Eu ri também. 

— O Instituto está vazio. Sasha vai te explicar algumas coisas. Você pode aproveitar para conhecer melhor nossa biblioteca e pode usar o ginásio leste para correr, usar a piscina aquecida e tudo mais. Apenas tome cuidado para não acessar a área sul; é privativa dos Dmitriev e proibida aos alunos.

— Não se preocupe, obrigada, senhorita Natasha.

— Me chame de Natasha, querida. Assim, a saudade da sua mãe fica um tantinho menor. Ela me chamava de Nat. — Vi um brilho em seus olhos e imaginei que fossem lágrimas. Peguei sua mão.

— Muito obrigada, Natasha. Tenho certeza de que ela ficaria feliz em te ver — a consolei, e ela sorriu.

— Obrigada, querida. Tenha uma boa estadia.

Nos despedimos e saí da sala com mais dúvidas do que quando entrei.

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