Narrado por Elion Já fazia duas semanas desde a última vez que vi Alora, e a ausência dela começava a pesar mais do que eu imaginava. A cada dia, a ansiedade me consumia, e as informações que chegavam até mim através dos soldados eram meu único consolo — e, ao mesmo tempo, uma constante preocupação.Soube que Alora vinha tendo embates com Katya. Isso, por si só, não era surpresa. Conheço Alora melhor do que ninguém; ela nunca foi de abaixar a cabeça. Mas Katya é inflexível, e as coisas estavam tensas entre elas. Até agora, Alora já havia recebido duas advertências. Mais uma, e Katya não hesitaria em puni-la. O pensamento disso fazia meu sangue ferver. Queria intervir, mas sabia que não podia. Não agora.Por outro lado, ouvir sobre o progresso dela me dava um misto de orgulho e alívio. Alora estava se superando. A cada treino, seus movimentos corporais estavam mais ágeis, mais precisos. A dedicação dela era evidente, e até mesmo os soldados comentavam, impressionados, sobre sua habili
Narrado por Alora Eu já estava de saco cheio da Katya. O jeito como ela tratava a todos com soberba, como se fosse uma rainha e nós, seus meros servos, me dava nos nervos. Não era apenas comigo, mas com todos. Ela andava pela base como se fosse intocável, esbanjando sua autoridade de forma mesquinha. Eu não era o tipo de pessoa que abaixava a cabeça, e foi exatamente por isso que já tinha levado minha segunda advertência. A última vez aconteceu quando a vi tratando mal uma das mulheres responsáveis por preparar nossas refeições. Aquilo foi a gota d’água. Encarei Katya de frente, sem me importar com as consequências, e faria isso de novo se necessário.Esses dois meses de treinamento estavam parecendo um verdadeiro inferno, e a ausência de Elion só tornava tudo mais insuportável. Saber que ele estava tão perto, mas que eu não podia vê-lo ou sequer ouvir sua voz, me deixava ainda mais irritada. Por pouco, muito pouco, eu não perdia o controle e partia para cima de Katya, aceitando de b
Narrado por Asael Eu já tinha ouvido tanto sobre os treinos da Alora nas últimas semanas que minha curiosidade estava no limite. Fazia um mês que ela estava lá, e o que me impressionava era que, apesar de toda a tensão com a Katya, ela ainda não tinha levado a terceira advertência. Isso era quase um milagre, considerando o temperamento dela.Mas eu precisava ver por mim mesmo como ela estava. Afinal, quem tinha sido proibido de ir até a base era o Elion, não eu. Então, resolvi agir. Só que, claro, para uma ideia dessas, eu precisava de uma cúmplice.— Havenna, tem um minuto? — perguntei, entrando na sala onde ela estava, ocupada com os relatórios.Ela levantou o olhar, já desconfiada. — O que você quer agora, Asael?— Vamos visitar uma certa menina albina, baixinha, linda e rabugenta.— Você está maluco? Se Elion souber disso, ele arranca a nossa cabeça.Ri, cruzando os braços. — Relaxa, ele não vai saber. E mesmo que soubesse, aposto que ficaria aliviado em saber como ela está. Vamo
Narrado por Elion Eu entendia a raiva de Asael e Havenna, e saber disso me cortava por dentro. Eu podia ver o quanto isso estava afetando-os, principalmente Asael, mas, como sempre, precisava manter as aparências. Alora estava dando tudo de si, se colocando à prova, enfrentando cada desafio para se achar digna de ser esposa de um Don, de mim. Não que precisasse de nada disso, eu a amava do jeito que ela era, mas eu sabia o quanto isso era importante para ela. E por mais que isso me machucasse, eu não me opus, porque a jornada dela precisava ser concluída. Eu tinha que deixar ela seguir em frente, como ela queria.A cada dia, a cada semana que passava, as notícias das melhoras de Alora chegavam até mim e me enchia de um orgulho que eu mal conseguia expressar. Ela estava se superando, provando a todos que não era apenas uma herdeira do nome Blackwood ou uma futura esposa de um Don. Ela era mais do que isso. Era forte, determinada, e nada, nem Katya, poderia quebrá-la.Mas sabia que, ao
Narrado por Alora A sirene tocou às 5:30 da manhã, como sempre. Meu corpo começava a se acostumar ao horário, mas a dor persistente nos músculos me lembrava que ainda havia muito a melhorar. A rotina de treinos era exaustiva, e cada segundo parecia durar uma eternidade. Katya parecia se deleitar em me desafiar, criando obstáculos que, curiosamente, pareciam ser direcionados apenas a mim.Hoje, no entanto, havia algo diferente. Um burburinho tomava conta do campo de treinamento. Os olhares direcionados a mim se intensificaram, e logo entendi o motivo quando Katya cruzou o espaço com aquele olhar gelado fixo em mim.— Alora, parece que você continua atraindo visitas inesperadas — disse ela, com desdém evidente na voz.Ver Asael e Havenna, mesmo que por poucos minutos, havia renovado minhas energias. Era exatamente o que eu precisava para erguer a cabeça e continuar enfrentando tudo isso. Mas Katya não parou por aí.— Já que acha que pode ser especial o suficiente para atrair atenção, t
Narrado por Amália Minha vida parece uma piada de mau gosto. Às vezes, penso que nasci com a má sorte que todos dizem que me persegue, como se o azar estivesse presente desde o primeiro suspiro.Eu não sei quem são meus pais, nunca os conheci. Fui deixada, ainda bebê, em frente a um orfanato em Londres, no meio de um inverno impiedoso. Meu nome, Amália, foi escolhido por causa de um medalhão que pendia no meu pescoço quando me encontraram, como se esse pequeno objeto fosse a única pista do que eu poderia ter sido.Cresci naquele orfanato, cercada sempre pelas mesmas pessoas. Elas são as únicas que conheço, a única “família” que já tive. Mas, como eu disse, minha vida sempre foi marcada pelo o azar. Eu não sei o que o destino planeja para mim, mas até agora ele parece não saber equilibrar as coisas.Toda vez que algo parecia caminhar bem, alguma tragédia ou decepção estava logo ali, à espreita, como uma sombra que nunca me abandona.Não estou sendo dramática; é a verdade nua e crua. A
Narrado por Amália Horas e horas se passaram enquanto eu ficava ali, naquele ponto de ônibus. Perdi a noção do tempo, nem me dei conta de que o céu já estava escurecendo. Só percebi quando o medo começou a apertar o meu peito. O medo do que a noite podia trazer, do que estava por vir agora que eu não tinha mais lugar no mundo.Mesmo com as roupas velhas, rasgadas e caindo aos pedaços, eu ainda sabia que havia algo em mim que chamava atenção. Era uma beleza peculiar, uma beleza que eu nunca desejei, mas que o destino, com sua ironia cruel, decidiu me dar. Outra jogada de azar — ah, sempre o azar.Os olhares me seguiam por onde eu passava, mas não era pelas roupas. Era por mim. Algumas pessoas me olhavam com curiosidade, outras com nojo, e eu sentia o medo em seus olhos. Minha pele, branca como papel, ou melhor, albina. Minha aparência parecia afastá-los, como se eu fosse uma aberração.Isso sempre foi assim. As crianças no orfanato, os professores na escola, até estranhos nas ruas. Nã
Narrado por Amália Antes mesmo que eu pudesse lhe responder, ela acrescentou:— Sei que não é a melhor proposta de todas, mas é bem melhor do que não ter um teto sob a sua cabeça durante as noites de Londres.E por mais que eu não quisesse admitir, ela estava certa. O frio que começava a se instalar na cidade me lembrava de como era perigoso estar sozinha nas ruas à noite.Parei para pensar. O orfanato já não era mais uma opção. O vazio em meu estômago, a insegurança no meu coração, tudo isso pesava sobre mim como uma âncora. Por mais indecente que sua proposta fosse, eu não tinha escolha. Não havia um lugar seguro para ir, ninguém que pudesse me ajudar. Aceitar essa oferta poderia ser uma forma de escapar desse desespero.— Está bem — finalmente disse, a voz baixa, mas decidida. — Eu aceito.Um misto de alívio e ansiedade tomou conta de mim. Ao mesmo tempo em que me sentia como se estivesse me entregando a um destino incerto, também sentia a esperança de que, talvez, essa fosse a mi