03

Quando eu era criança, meu pai costumava ler histórias de princesas que eram resgatadas por príncipes encantados. Eu me lembro de imaginar todos os detalhes contados na história, criando um filme na minha cabeça para viver e me sentir parte dela. Meu pai sempre me contava o quão maravilhosa minha mãe era, como ele se apaixonou perdidamente por ela e como foi difícil ficar sozinho comigo. Eu tinha cinco anos quando minha mãe faleceu, não me lembro de muitas coisas, mas as histórias que ouvi sobre a mulher que me deu a vida permitem que eu tenha em memória aquelas experiências que não pude desfrutar por conta própria.

Ouvir essa história de amor dos meus pais me fez ter grandes expectativas ao procurar pela pessoa certa para mim, não acreditava em almas gêmeas, muito menos em metades de laranjas. Na verdade, não espero que meu parceiro ideal seja perfeito, mas que ele me mostre que, apesar dos problemas que possam surgir no futuro, estaremos um ao lado do outro, assim como meus pais.

No entanto, parece um pouco difícil de encontrar.

Eu me olho detalhadamente no espelho na parede, antes de sair do meu quarto nervosa. Ainda não pedi permissão ao meu pai para sair, não sei o que dizer sem que ele interprete mal a situação ao ver o Luke. Desço o último degrau e furtivamente vou para a cozinha, onde vejo meu pai cortando alguns vegetais para o ensopado que ele tanto gosta.

— Uau, cheira maravilhoso —comento me aproximando dele e roubando um pedaço de carne.

Meu pai me repreende com o olhar ao perceber o que eu fiz, ele não aprova que eu roube sua comida. Ele franze o cenho ao notar minha roupa, normalmente não costumo me arrumar para lugar nenhum.

— Aonde você vai? —ele pergunta.

Hesito por alguns minutos antes de responder.

— Vou sair um momento, posso? —faço um bico e ele concorda apertando minha bochecha.

— Mas não se atrase, e diga para a Nora dirigir com cuidado, tá? —desvio o olhar para o ensopado que começou a ferver.

Sou péssima em mentir, então não leva nem um minuto para que meu pai perceba que não vou sair com minha amiga. Então, me adianto para falar.

— E-ei, na verdade, marquei de encontrar um amigo da faculdade que... —a campainha toca, interrompendo-me.

Eu viro a cabeça em direção à porta e, antes que eu possa me dirigir a ela, meu pai já está abrindo.

Oh não... Isso não pode estar acontecendo!

— Boa noite, senhor —o loiro saúda.

— Boa noite, o que deseja? —meu pai pergunta, soando sério.

Eu caminho até eles dando passos largos até ficar na frente de Luke.

— Oi! —eu digo com muita empolgação, mais do que gostaria—. Eu estava te esperando.

— Sim, desculpe pela demora, surgiram algumas coisas antes de sair —ele explica educadamente.

— Não se preocupe, eu entendo —digo sorrindo.

Então, escuto um pigarro alto atrás de mim. Eu viro a cabeça e vejo meu pai nos observando com curiosidade.

— Ah, sim, quero te apresentar meu pai —eu aponto.

— Luke, prazer em conhecê-lo, senhor...

— Alexander —meu pai completa, apertando a mão do loiro. Ele aperta com força, fazendo Luke fazer uma careta de dor, mas ele disfarça com um sorriso amigável—. Volte antes das dez, caso contrário, eu...

Eu abro os olhos desmesuradamente e reajo rápido antes que ele comece seu discurso de pai protetor, então eu intervino segurando o braço de Luke e o arrastando para o carro estacionado na rua.

— Tchau, pai, vemos você em breve! —me despeço entrando no carro.

Eu solto o ar que estava segurando sem perceber, ainda bem que agi rápido, às vezes meu pai pode ser um pouco... peculiar.

— Você não tinha dito com quem ia sair? —Luke pergunta, ligando o motor.

— Ah, não. Quer dizer, eu comentei há alguns minutos antes de você chegar —brinco com as mãos, sem coragem de sustentar seu olhar.

— Ah, entendi.

O silêncio prevalece entre nós durante a jornada, nenhum de nós diz uma palavra novamente. Eu observo seu perfil quando ele para o carro em um dos semáforos, meus olhos percorrem seu cabelo loiro que cai na testa, depois descendo pelo nariz arrebitado e pelo queixo marcado. Sua beleza chama atenção a metros de distância, fazendo sentido ele ser conhecido como o "modelo" da faculdade.

— Já te disseram que você é curiosa? —ele fala de repente, me tirando do meu devaneio.

Eu afasto o olhar dele, fingindo olhar pela janela, mas é evidente que ele percebeu como eu estava o observando. Tola.

— Não sou, talvez quando eu gosto de algo, mas de resto, não... —Eu calo subitamente ao perceber o que acabei de dizer. Por outro lado, ele ri da minha torpeza ao falar—. Quero dizer, normalmente sou, embora prefira chamar de observadora.

Silêncio, você só está piorando as coisas.

— Sério mesmo? —ele concorda, sorrindo.

— A distraída sou eu, talvez —comento em tom de brincadeira, o que causa uma leve ruborização nas minhas bochechas—. Às vezes pensamos que somos invisíveis para os outros, que passamos despercebidos. Mas a verdade é que sempre há alguém que nos admira de longe.

Meu coração dá um salto com suas palavras, fico muda e sem saber como responder. Ele sai do carro e demoro um pouco para perceber que chegamos, é um lugar um pouco distante da cidade. De repente meu alarme interno dispara imaginando que os casos que vi naquele programa de TV são reais. Onde o homem bonito leva a garota para um lugar isolado para matá-la.

Oh não! E se o Luke é realmente um assassino? Não deveria ter aceitado sair, mas agora não sei como voltar para casa sem que...

—Você está bem? — ele me olha preocupado.

Eu balanço a cabeça, voltando à realidade.

—Eu? — gaguejo nervosa.

—Sim, de repente você ficou pálida e seu rosto ficou com expressão de medo. Você está se sentindo bem? — eu assinto lentamente, afastando qualquer pensamento intruso que me deixa paranóica.

—Sim, sim. Foi só uma dor... de estômago — minto, acariciando minha barriga.

—Você precisa ir ao banheiro?

Sério, Eveline? Pelo menos seja mais inteligente ao mentir.

—O quê? Não, não! — nego, sentindo-me envergonhada pelo que soltei.

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