Desperto com a voz embargada de minha mãe, um som que parece ecoar através de uma enorme cortina de dor. Os soluços se misturam com palavras entrecortadas mostrando-me uma angústia profunda, relatando que ela deve ter chorado por bastante tempo. Minha consciência luta para entender tudo ao meu redor, mas as dores que permeiam meu corpo e a pulsação latejante na minha cabeça ameaçam domar meus sentidos.
O ambiente ao meu redor é impregnado com o aroma familiar de antisséptico, e um zumbido suave da máquinas médicas sugere que estou, de fato, em um hospital. Cada piscar dos meus olhos é uma jornada desafiadora, enquanto tento processar o que aconteceu e como cheguei a esse lugar.
A voz da minha mãe se torna mais nítida à medida que minha consciência se estabiliza.
— Você está de volta, meu amor —, ela murmura entre soluços, sua mão segurando a minha com firmeza. — Você nos assustou muito, mas estamos aqui por você.
As palavras dela flutuam no ar, ainda estranhas por causa da minha luta contra a confusão e a dor. Enquanto minha mente tenta se reconciliar com a realidade, a incerteza do que aconteceu paira como uma sombra sobre minha consciência, agora, completamente desperta.
A voz entrecortada de minha mãe tenta formar palavras coerentes enquanto ela segura minha mão com ternura. Entre os soluços, ela compartilha a notícia que meu corpo já indicava: tudo foi uma tragédia, pois sofri um acidente de carro. O impacto da revelação parece reverberar através da minha mente, enquanto tento conectar os fragmentos de memória perdidos com a realidade que se desenha diante de mim.
— O acidente aconteceu durante seu retorno para casa e... — Sua voz treme, incapaz de pronunciar as palavras completas.
Meus pensamentos são como peças de um quebra-cabeça espalhadas, tentando se encaixar para formar a imagem completa. A lembrança do acidente permanece longe de mim, mas as dores persistentes em meu corpo e a atmosfera hospitalar ao meu redor confirmam a gravidade da minha situação.
Ainda tento assimilar a realidade recém-revelada, minha mãe permanece ao meu lado, oferecendo conforto na turbulência do desconhecido. O acidente de carro se mostra não apenas como um evento traumático, mas como o ponto de partida para um longo caminho de recuperação física e emocional que fazem parte do meu futuro aparentemente.
— Ela acordou, finalmente. — A voz que entra pela sala não me parece familiar e os olhos verdes, cheios de esperança, do homem também são desconhecidos para mim. Mas o nome em seu jaleco e sua identificação a cima me relata que estou diante do médico e isso já se torna um alívio. — Fico mais tranquilo em te ver acordada, meu amor.
— Seu... amor? — minha voz falha com a pergunta. A dor em meu peito se mistura a confusão e posso ver que por alguns instantes isso passou pelo olhar dele também, mas logo ele assume uma bela postura profissional e suspira.
— Não me reconhece? — negar em resposta à pergunta dele fez um som desesperador escapar de minha mãe, algo como um susto, mas o médico mantinha sua calma. — Me fale sobre o acidente. O que você se lembra?
— Quando tento lembrar dói...
— E meu rosto? O que você lembra quando olha para ele?
Observei o rosto do médico. Sebastian era seu nome, conforme indicava seu jaleco, mas minha mente não conseguia estabelecer conexões. Tentei puxar o máximo que pude, mas nenhum Sebastian havia feito parte da minha vida até aquele momento. Resolvi me concentrar em seu rosto, buscando encontrá-lo nos registros das minhas lembranças, e então tive um lampejo final.
— Lembro do seu rosto — falei por fim. — Lembro-me de atropelar você com a bicicleta, e logo em seguida, o carro me acertou.
— Se lembra de algo a mais depois disso? — Novamente neguei e minha mãe apertou minha mão.
— Não foi assim que vocês se conheceram? — a pergunta de minha mãe era dirigida ao médico, e ele confirmou a ela sem tirar os olhos de mim. Isso causou dor em minha cabeça, como se eu estivesse forçando minha mente a lembrar.
— Já nos conhecemos? — questionei os dois, e ambos assentiram.
— Há sete anos, você atropelou o doutor Cabral, e isso os aproximou — revelou minha mãe, fazendo-me franzir o cenho, pois essa informação não chegava com clareza em minha mente. Ela seguiu: — Vocês se casaram no ano seguinte.
A informação paira no ar e um véu de incerteza envolve minha mente. Sete anos atrás, um acidente que eu não consigo recordar uniu nossos destinos de maneira inusitada. A revelação do casamento no ano seguinte acrescenta outra camada de surpresa à situação que estou tentando digirir.
— Somos casados? — murmuro, tentando aceitar a ideia enquanto meu olhar vagueia entre o médico, cujo rosto ainda permanece parcialmente nebuloso em minha memória, e minha mãe, cuja expressão reflete uma mistura de esperança e aflição.
O médico, agora identificado como o doutor Cabral, mantém-se calmo, oferecendo-me um olhar compassivo.
— Querida... — ele inicia, mas se detém e deixa um pigarro limpar sua forma de me chamar. — Veronica, sua família está aqui para ajudar você a recuperar suas lembranças. É um processo gradual, mas tenha paciência.
A sala do hospital se transforma em um palco de desconcerto, onde os fragmentos do meu passado se entrelaçam com o presente de uma maneira que parece distante e surreal. Durante minha falha tentativa de compreender as peças dispersas do quebra-cabeça da minha vida, percebo que os passos para redescobrir quem sou mal começou.
— Por que não consigo lembrar desses sete anos? — questiono, com a frustração transparecendo em minha voz.
O silêncio na sala é tangível, e tanto minha mãe quanto o doutor Cabral trocam olhares cautelosos mais uma vez. Ele escolhe as palavras com cuidado, tentando acalmar a inquietação que toma conta de mim.
— A amnésia é um fenômeno difícil de compreender. Às vezes, o cérebro bloqueia memórias para proteger a mente do trauma. O processo de recuperação pode ser lento, mas não é certo dizer exatamente como ocorrerá, pois cada pessoa responde de maneira única. Seu corpo e mente precisarão de tempo para reconstruir essas lembranças.
A explicação, embora racional, não dissipa a sensação de vazio que acompanha a lacuna em minha memória. Contemplo o espaço nebuloso dos últimos sete anos e tenho receio de ter algum segredos escondido ali.
Observo o ambiente ao meu redor, e só então meus olhos pousam no acessório em meu pulso. Com clareza, vejo meu nome gravado: Verônica Maia Cabral. O sobrenome ecoa como uma ponte para o passado que ainda se esquiva de mim, mas, pelo menos, o vislumbre do meu nome traz a conexão tangível que procuro em meio à confusão.
— E eu amo você? — essa pergunta martela em minha cabeça, pois meus olhos buscam esse sentimento no homem à minha frente.
O silêncio se estende na sala hospitalar, carregado de expectativas e anseios. Meus olhos buscam desesperadamente nos olhos do homem diante de mim qualquer sinal que responda à pergunta existente em minha mente.
Sebastian, como me foi dito, mantém seu olhar fixo em mim. Seu rosto revela uma mistura de emoções, desde a ansiedade até uma expressão terna. Parece que essa resposta não é simples para ele, assim como não é para mim.
Finalmente, ele suspira e, com um sorriso gentil, responde:
— Eu peço você em casamento todos os dias e você nunca recusou.
O peso da incerteza começa a ser substituído por uma promessa de um futuro onde as peças perdidas da minha vida podem ser encontradas novamente.
— Então você também me ama. — Mesmo que isso não seja uma pergunta, ele afirma para mim, e é nesse momento que um medo me invade. — Mas e se eu nunca lembrar de você ou desses anos todos?
O medo se infiltra em minhas entranhas, um eco de incertezas que ressoa no silêncio que se segue com essa pergunta. Meus olhos encontram os dele, buscando alguma garantia, mas as sombras do desconhecido pairam diante de nós.
Sebastian, com sua expressão ainda gentil, segura minha mão como se tentasse puxar toda minha apreensão para si.
— Vou trazer suas memórias de volta e mesmo que não se lembre de tudo ou que meus esforços não funcionem, eu farei com que se apaixone por mim outra vez.
A promessa dele acalma momentaneamente o tumulto em meu peito. Pois a determinação em seus olhos e a certeza de que terá sua vida de volta criam um vínculo com meu coração que parece iluminar meu caminho.
Ao menos posso agradecê-lo por me dar essa paz, pois saber que posso ter alguém ao meu lado nesse momento, já me conforta.
Os dias passaram e tive alta do hospital. Estava na hora de voltar para minha casa, mesmo que eu não me recordasse nem do meu endereço.Ao deixar o hospital, o mundo exterior se estende diante de mim como um livro em branco, aguardando ser preenchido com as páginas da minha vida que ainda precisam ser reescritas. Mesmo sem as recordações do meu mundo, o apoio de Sebastian torna-se meu guia constante.Ele me ajuda a explorar a cidade que deveria ser familiar. Cada esquina, cada rua, se torna uma busca por pistas que possam desencadear memórias esquecidas. A casa, agora apenas um local no mapa, aguarda silenciosa como um enigma a ser desvendado.Sebastian, com paciência e carinho, torna-se minha bússola para todos os lados, guiando-me por ruas talvez conhecidas, mas em sua maioria desconhecidas. A cada passo, a esperança de encontrar fragmentos do passado se entrelaça com a ansiedade do desconhecido.À medida que chegamos à porta de uma casa, meu coração pulsa mais rápido. Será esta a m
Mesmo com falhas em minhas memórias, os pesadelos frequentes me tomam e essas noites tumultuadas se tornam um eco doloroso das escolhas equivocadas que agora assombram meus sonhos. Em meio a esse labirinto de remorso, busco compreender as razões que me levaram a trair a confiança de Sebastian, tento confrontar a sombra de uma versão anterior de mim que, embora esquecida, ressurgia nos pesadelos como um lembrete implacável do impacto das minhas escolhas. No silêncio das noites inquietas, confrontei meu passado para forjar um uma desculpa que fosse mesmo que não tivessem motivos plausíveis para isso.Eu me vejo envolta apenas em culpa, mesmo que esse mal pertença a uma eu que ficou perdida em algum lugar. A consciência de ter traído Sebastian me causa essa grande angústia.Cada pensamento, mascarado pela amnésia, ainda carrega o peso da sensação horrível de ver os olhos de Sebastian lutarem entre o amor e a decepção. A sensação de pesar persiste, deixando meu entendimento borrado, enqua
A antiga Verônica sempre teve uma vida de luxo e conforto depois de se casar com Sebastian, afinal ele se tornou um médico renomado e rico. Ela não precisou trabalhar, apenas aproveitou as viagens pelo mundo, as compras nas melhores lojas e as festas mais badaladas. Tudo isso estava registrado nas redes sociais dela e mesmo que minhas lembranças tivessem ido embora, percebi pelos meus olhos nas imagens que nunca me senti feliz e completa com essa vida superficial. Senti que faltava algo ali, talvez um propósito, uma paixão, um sentido. Algo a se agarrar.— Como eu me tornei tão vazia? — me pergunto, olhando o roteiro de viagem para a próxima aventura que a antiga eu faria antes de toda a confusão acontecer. Ela iria para Paris, mas tudo indicava que iria sozinha.— Você está infeliz com o que você é? — Sebastian pergunta, entrando na sala e tirando os sapatos. O cansaço é evidente em seu corpo, após um dia longo e estressante de trabalho. Acho que deu para minha tristeza no tom da min
Sinto uma pontada de injustiça por não ter memória. Observo o corpo de Sebastian se movimentar na barra, exibindo seus músculos definidos. É uma tortura que a academia dentro da casa seja uma sala envidraçada, bem na frente da sala de jantar onde eu me esforço para comer meus cereais sem salivar. Sou pega em flagrante pelo meu olhar fixo quando o leite mancha a minha blusa, após a colher deixar cair uma bolinha de cereal. Passo a língua pelos lábios e desvio o olhar, envergonhada. Capturo o sorriso encantador dele por um instante e me questiono como pude ser infiel com aquele homem ali.— O que eu tinha na cabeça? — murmuro para mim mesma e me questiono se ele era ruim na cama. Não entendo o motivo, mas comecei a tentar compreender o que a antiga Verônica pensava.— Bom dia. — Sebastian diz após abrir a porta que nos separava. Pego o guardanapo em cima da mesa para limpar minha blusa e dou um sorriso tímido para ele. — Acordou animado — falo me referindo a sua rotina de exercícios e
Minha mãe não insisti. Sebastian lhe diz que eu não me sinto bem e até pergunta se ela quer entrar para me ver, mas minha mãe prefere me deixar descansar. Não sei como ele persuadiu ela tão fácil, mas quando o vejo entrar pela porta do quarto com o peito exposto e os olhos marcados pelo desejo, eu só consigo perder o ar.Seus braços me envolvem e seus lábios tomam os meus. Ele me coloca sob seus pés e caminha comigo pelo quarto até a cama, onde me coloca entre as cobertas e se põe entre minhas pernas. Sinto sua excitação e arqueio os quadris de encontro aos dele. — Olha para mim — pede e fixo meu olhar no dele. — Sinto saudades de você. Tive tanto medo de perder você.Ele beija cada parte do meu corpo enquanto diz aquelas palavras fazendo-me suspirar. Eu o ajudo a se livrar da minha blusa deixando meus seios completamente expostos para ele que não faz rodeios. Sebastian abocanha meu seio esquerdo, chupando-o com precisão. Isso acaba me fazendo curvar as costas empurrando meu peito ma
Desperto no quarto que era nosso antes do acidente. Ainda não tenho as memórias dos últimos sete anos, mas as novas que Sebastian constrói ao decorrer dos dias deixa meu coração aquecido. Ele me conta sobre nossa vida antes dos conflitos e me dá centenas de emoções diferentes. Posso ver sua paciência e gentileza durante nossas horas juntos. Sinto que ele é tudo o que eu preciso para me recuperar. Mas às vezes, eu sinto uma pontada de dúvida. Algo que tento expulsar quando o sinto me tocar, mesmo sem sucesso.Semanas se passaram desde minha saída do hospital. Mesmo que minhas memórias estejam perdidas no tempo, preciso ter uma rotina, mas parece que a minha antiga versão era uma dondoca mimada e isso me entristece. Decido fazer algo para não me tornar vazia novamente. Levanto-me da cama, saindo do quarto e pensando no que fazer da minha vida.Vejo que Sebastian deixou um bilhete na mesa da cozinha, dizendo que foi trabalhar e que volta logo. Ele também me deixou um café da manhã capr