FASCÍNIO

Graziella

-Precisamos mesmo vestir essa roupa curta apenas para servir mesas? – Pergunto a Dalila, que acabou de me jogar um conjunto curto de saia na cor preta de couro muito apertada e camiseta branca com um corte em V profundo com os nomes porto di piacere bordado em letras douradas em seu lado direito.

-Basicamente sim, mas é apenas para entreter os frequentadores para que façam mais e mais pedidos e nos deem muitas gorjetas. – Ela me explica enquanto veste o seu conjunto.

Nós duas e outras garotas estamos em uma espécie de camarim equipado com diversa roupas, maquiagem e acessórios para nos preparar para noite de trabalho, na verdade minha primeira noite de trabalho.

A mais ou menos uma semana estou hospedada no porto di piacere, precisei de um pouco de tempo para me acostumar com o que esse lugar representa, mas com o passar dos dias conhecendo algumas outras garotas que me explicaram basicamente o que era para ser feito nas minhas tarefas eu fui relaxando aos poucos.

-Relaxa Grazi, ninguém vai te tocar a não ser que você peça! – Bárbara, uma garota que me aproximei bastante nos últimos dias me tranquiliza.

Sorrio em agradecimento, ela possui cabelos longos loiros que chegam ao comprimento da sua cintura e seu corpo curvilíneo está coberto com o mesmo conjunto que Dalila e eu estamos colocando, ela faz parte da equipe de servir mesas como nós, gostei dela de imediato, muito simpática e um pouco louca as vezes, aprendi que muitas meninas que estavam aqui eram acolhidas pelo sr. K. por que não tinham para onde ir, não tinham família ou passaram por situações traumáticas em suas vidas sendo obrigadas a fugir em busca  do esquecimento, situação semelhante à minha.

- Obrigada meninas vocês estão me ajudando muito! - Digo sorrindo para as duas que me devolvem o gesto.

Visto meu conjunto muito apertado e subo nos saltos Peep toe rosa que fazem parte do "uniforme", me aproximo do amplo espelho que toma quase uma parede inteira do camarim e avalio minha aparência, essa garota simplesmente não parece em nada comigo, a peruca negra em corte reto acima do ombro e franja alinhada que cobre minha testa, maquiagem forte com olhos esfumaçados com sombra negra, batom vermelho intenso e a roupa apertada que mais parece uma segunda pele me torna sexy e despojada, sorrio para o visual que vejo a minha frente, nunca me vesti de forma provocante apenas com vestidos comportados que não passavam do comprimento dos joelhos e agora me vejo com uma saia curta demais que quase não cobre metade das minhas coxas.

Sempre achei que tivesse um corpo sem muitos atrativos, seios médios e empinados, barriga lisa e uma bunda um pouco avantajada, que minha mãe fazia questão de criticar me obrigando a fazer

dietas para diminuí-la, o que não funcionou muito pois ela continua intacta, essa roupa realmente valorizava meu corpo e eu me sentia poderosa com isso.

Me viro para as outras garotas que me encaram embasbacadas.

-Garota você simplesmente vai arrecadar muitas gorjetas. – Dalila diz com uma risadinha e todas nós a acompanhamos.

Somos interrompidas com uma batida na porta e Cléo coloca apenas sua cabeça para dentro do camarim.

-Vocês precisam se apressar, já vamos abrir o bar.- Ela diz e todas acenamos a cabeça e nos aproximamos da porta, vamos começar a noite de trabalho, pessoas normais diriam começar mais um dia de trabalho, mas sei que isso aqui não tem nada de normal, então seria assim mesmo, mais uma noite de trabalho, pelo menos por enquanto.

Cléo é a responsável pelas pessoas que servem as mesas, outra coisa que aprendi nesses poucos dias é que o porto di Piacere  era dividido em grupos, o meu as garotas que serviam as mesas com bebidas e alguns petiscos, as garotas que faziam os espetáculos de dança, as acompanhantes e as acompanhantes com benefícios, que se tratavam das que transavam com alguns frequentadores, que era composto por um grupo pequeno, umas delas , Ada, parece não ter ido com minha cara e a todo momento me lançava olhares hostis, o que eu fazia questão de ignorar.

Seguimos Cléo pelo corredor em direção ao salão principal ao entrar sinto a áurea mudar completamente de calma para sofisticada e sensual, os lustres estavam todos acesos deixando o espaço iluminado, vejo alguns homens de ternos ao redor sentados em suas mesas conversando entre si, alguns notam a nossa presença e percorrem seus olhos por nosso pequeno grupo, nos avaliando, foi dito que não nos tocavam, mas com certeza os olhares de cobiça vindo deles eram inevitáveis.

Todas se dirigiram ao balcão do bar, cada garota pega uma badeja de bebidas que os barmens já deixaram preparadas, segui o gesto pegando uma que estava repleta de taças com algum liquido branco que não identifiquei.

Quando ia começar a seguir as outras meninas ao redor do salão Cléo se põe a minha frente.

-Querida essa bandeja não está muito pesada para seu primeiro dia? – Ela pergunta com um tom de preocupação em sua voz.

Sorrio por seu gesto, Cléo tem se mostrando que além de chefe do grupo era uma espécie de mãe para todas, mesmo com a pouca idade.

-Está leve Cléo não se preocupe. – A tranquilizo, e continuo andando em direção as mesas.

Durante algum tempo me dediquei a servir algumas mesas, o que eu não achei uma tarefa difícil, a cada gorjeta que desembolsava me dedicava mais e mais ao trabalho, os olhares maliciosos, não passaram de apenas olhares, parece que não tocar as garotas que serviam as mesas era uma espécie de regra da casa, o que eu não achei ruim, pelo contrário, agradeci internamente.

O ambiente estava cheio, além das mesas alguns homens estavam sentados nas baquetas ao redor do bar com alguma garota sentada em seu colo, essas eram o tipo acompanhante com benefícios, eu sabia muito bem aonde a noite desses iam acabar.

Enquanto eu servia pequenos drinques de whisky próximo ao bar, ouvi uma voz estridente chamar meu nome e logo identifiquei Ada sentada e uma banqueta próximo a um homem que não consegui ver o rosto pois estava de frente para o bar falando com um dos barmens.

Engoli meu nervosismo e me aproximei dela, que tinha um sorriso presunçoso nos lábios.

-O que deseja? – Pergunto com minha voz firme, não ia me deixar intimidar por ela.

No instante em que termino de pronunciar as palavras o homem ao seu lado gira o seu corpo ficando de frente para mim, prendo minha respiração, nunca vi uma beleza masculina tão marcante, seu olhos castanhos escuros avaliam meu corpo e quando ele volta a olhar novamente para o meu rosto noto que seus olhos estão ainda mais escuros, sua mandíbula bem desenhada está tensa, vejo o quanto seu rosto é viril, com traços fortes, pele um pouco bronzeada, seu cabelos são curtos, mas alguns fios negros caem sobre sua testa o deixando ainda mais perfeito, o terno cinza bem alinhado e com certeza de grife está marcando seu corpo forte, mesmo estando sentado percebo que ele é muito alto, um certo nervosismo me invade pelo seu olhar penetrante cravado em mim, volto meu olhar para Ada que tem uma sobrancelha perfeita arqueada como se esperasse uma resposta para algo.

-É-o- que? –Pergunto um pouco desorientada.

-Quero uma bebida Graziela! – Diz como se fosse óbvio, rapidamente lhe entrego o que pediu e me afasto sentindo um olhar em minhas costas que tenho certeza não ser de Ada.

O restante da noite transcorreu assim com aquele estranho me olhando de forma intensa, mesmo eu evitando a todo custo chegar perto dele, algumas vezes nossos olhos se encontravam, mas rapidamente desviava o meu e focava em minhas atividades, durante o espetáculo de dança , onde os lustres se apagavam permitindo que apenas as luzes do pequeno palco iluminassem o local, parecia que eu era a única atração ali, pois o sentia seguir cada um dos meus movimentos com seus olhos, o que me deixou um pouco assustada, será que minha aparência está tão ruim assim?

E quando a noite se deu por encerrada com apenas alguns homens pagando a conta no caixa, percorri meus olhos por todo o salão em busca dele, mas constatei que não estava mais lá, vi Ada em um canto com uma carranca, com certeza ele a dispensou já que ela ficou a noite toda em cima dele, me pergunto se eles tinham algum envolvimento, mas rapidamente minha memória estala e lembro que o vi saindo com ela uma semana atrás antes de vir trabalhar aqui, essa lembrança faz meu humor ir de mal a pior, simplesmente não gostei de pensar nos dois juntos, mais o que estou fazendo? Ele deve ter dormindo com a metade do porto di piacere já que é um frequentador, encerro esses pensamentos e decido não pensar naquele estranho, quando me aproximei do bar Jorge um dos barmens recolhe minha badeja e sorrio em agradecimento, quando faço menção de me afastar ele me chama.

-Grazi, deixaram algo para você! – Ele diz me entregando um pequeno papel dobrado.

-Ah... E quem deixou? –Pergunto curiosa.

-Ele não disse o nome, mas já o vi por aqui, é um dos frequentadores. – Esclarece.

Aceno para Jorge e me afasto indo em direção ao corredor onde fica os quartos me despedindo das outras meninas.

Depois de um banho rápido, visto um vestido de algodão azul e me jogo na cama, a ansiedade de abri o pequeno pedaço de papel e saber o que tem escrito nele toma conta do meu corpo.

Você é muito boa de se olhar

M. B.

A pequena frase escrita em uma caligrafia elegante martela em minha cabeça durante alguns minutos, sei quem a escreveu, e por incrível que pareça não estou mais assustada, uma sensação diferente invade meu corpo, fascínio. Guardo o papel em uma das gavetas da mesinha de cabeceira e fecho os olhos, um sorriso brota em meus lábios ao saber que aquele lindo estranho me olhou durante quase toda a noite, esse é meu último pensamento antes do cansaço da noite cair sobre meus ombros e eu apagar em um sono tranquilo.

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