Estávamos ali, em algum lugar entre o passado e o futuro, tentando entender como lidar com o que nos restava.Ele me fez um gesto para que sentasse, e o silêncio se estendeu por alguns minutos, quase como uma conversa silenciosa, até que ele falou, sua voz baixa, mas firme.— Você não sabe... — ele começou, hesitante, como se quisesse encontrar as palavras certas, mas elas pareciam se perder no ar. — Não sabe como é viver com essa dúvida constante. Esse medo... de falhar. De não ser capaz de ser o homem que todos esperam. Não só para Alice, mas para mim mesmo.Eu o olhei, sem pressa de responder. Ele estava se abrindo, mais do que imaginara que fosse capaz. Eu sabia bem o que ele queria dizer, pois me vi refletido em suas palavras. O medo de ser insuficiente, de não corresponder ao que o mundo espera de você, é algo que consome a alma.— Eu entendo o que você está dizendo, Isaías — minha voz saiu mais suave do que eu esperava.— Eu t
O silêncio da casa parecia ser mais profundo do que o normal, como se o ar estivesse carregado de uma tensão que ninguém conseguia dissipar. Eu observava Isaías, sentindo o peso de seus passos ao lado de Alice, ainda mais agora, sabendo que aquele momento seria decisivo para ambos. Ele estava pronto, eu sabia disso. Mas será que Alice estaria? Será que, com seus cinco anos, ela compreenderia o que aquele reencontro significava?Ela estava brincando na sala, como sempre, espalhada no tapete com seus brinquedos. Alice parecia tranquila, mas o olhar atento dela me dizia que algo estava se passando em sua cabecinha. Ela sabia que algo estava diferente. Seu pequeno corpo parecia vibrar com a curiosidade, mas também com a ansiedade, como se fosse sensível a mudanças que estavam por vir.Isaías parou na porta e me olhou por um momento. Seus olhos estavam nublados, como se o peso do que ele sentia fosse algo difícil de carregar. Ele não m
Eu sabia que aquele dia seria diferente. Não só porque Isaías sugeriu que fizéssemos algo juntos, mas também porque a ideia de um passeio em família ainda me parecia estranha. A palavra “família” ainda carregava um peso, uma responsabilidade que me parecia um pouco fora de lugar. Isaías e eu, apesar de estarmos tentando construir uma amizade, ainda estávamos em territórios inexplorados, e eu, por mais que tentasse parecer leve, não conseguia deixar de me questionar sobre o que realmente significava isso para ele.Alice estava animada. Já esperava um dia divertido, um daqueles que ela tanto adorava, com risadas e aventuras. O que ela não sabia, e talvez nem entendesse ainda, era que aquele passeio tinha um significado muito maior para Isaías e para mim. Não era apenas uma distração para ela. Era um passo em direção a algo novo, a uma realidade onde os laços que construímos, por mais frágeis que ainda fossem, começaram a se firmar.
A madrugada parecia uma noite qualquer, até que o som da respiração ofegante de Alice me acordou. Ela estava em pé ao lado da cama, tremendo, com as mãos no estômago. O suor escorria pelo rosto dela, e seus olhos estavam inchados, como se a febre tivesse feito um estrago. Quando olhei para o relógio, o coração disparou. Era tarde demais para esperar. Algo estava errado, algo muito errado.— Alice... — Eu chamei, tentando manter a calma, mas minha voz estava trêmula.Ela não respondeu. Apenas abaixou a cabeça e começou a vomitar no chão. A visão me paralisou, a cada revirar do seu estômago revoltado.Algo muito ruim estava acontecendo. Eu sabia que não podia esperar mais. Sem conseguir processar a gravidade da situação, agarrei-a nos braços e tentei acalmá-la.— Tudo vai ficar bem, meu amor. Vai passar, eu prometo. É só um mal estar — Eu disse, tentando engolir o pavor que começava a tomar conta de mim.Ela parecia tão
A sala estava abafada. O único som que eu conseguia ouvir era o das máquinas monitorando Alice e os batimentos frenéticos do meu coração. A medicação que administrei não estava funcionando. A febre de Alice não cedia, e o vômito continuava sem parar. Eu podia ver o rosto dela empalidecendo mais a cada minuto. O medo tomava conta de mim, mas eu não podia demonstrar isso. Não para Alby, não para ninguém. Eu resolvi deixar Alby acreditar que as coisas estavam sob controle, para não apavorar ela ainda mais. Ela já tinha uma maldita bagagem de perda e eu não iria deixar ela ir para esse caminho.Eu precisava estar forte por elas. Eu precisava ser a rocha que ela precisava, mas a verdade é que eu estava apavorado. A cada segundo, a situação ficava mais grave.O que parecia ser uma simples infecção alimentar havia se transformado em algo muito mais sério. Algo que eu não conseguia controlar. Eu olhei para Alby, que estava
O som estridente do telefone cortou o silêncio da casa assim que entrei. Eu tinha acabado de chegar, exausto, apenas para trocar de roupa antes de enfrentar mais um longo dia.O toque insistente ecoava pelo ambiente vazio, fazendo um arrepio subir por minha espinha. Chamadas naquele horário nunca traziam boas notícias.— Doutor Castellar, o senhor precisa vir ao hospital. Agora. — A voz do outro lado da linha era urgente, mas contida.Franzi a testa, sentindo a tensão crescer no peito.— O que houve? Alice está bem? — Minha voz soou mais áspera do que pretendia, carregada de um medo que não queria admitir sentir.— É melhor o senhor vir imediatamente. Esperamos sua chegada. A linha caiu, e junto com ela, qualquer resquício de racionalidade. Peguei as chaves do carro e saí em disparada, o coração trovejando no peito. No caminho, tentei me convencer de que era apenas um susto, um problema menor que logo se resolveria. Que nada tinha ha
A adrenalina estava pulsando nas minhas veias, uma mistura de medo e determinação. O maldito sonho empregnou em mim, como um grude e de fato, eu não iria deixar aquilo acontecer.Nem que para isso eu tivesse que descer ao inferno ou subir ao mais alto céu. Nada iria me parar de achar a cura para nossa Alice. As últimas horas haviam sido um turbilhão de ação, de ligações desesperadas e corre-corre. Mas finalmente, depois de tudo, depois de ter mexido céus e terra, eu tinha em mãos a medicação que poderia salvar Alice. Eu tinha a última chance de fazer a diferença. Eu sabia que o tempo estava contra mim. Não havia mais espaço para erros, para hesitações. Cada segundo parecia crucial, e o peso da responsabilidade me esmagava. A sensação de impotência que eu sentia, a cada instante que ela passava mal, ainda ecoava dentro de mim. Mas agora não havia tempo para fraqueza. Eu precisava agir, e precisava fazer isso agora.D
Alice já estava melhorando, a febre que antes parecia não ceder agora não passava de um vestígio, e os vômitos, que pareciam intermináveis, haviam cessado. Ela ainda estava fraca, mas seu sorriso, ainda frágil, era o suficiente para encher o ambiente de uma luz renovada. Ela tinha vencido a batalha, e agora tudo o que precisávamos fazer era garantir que ela descansasse, que se recuperasse completamente. Dei alta a ela, pois o ambiente hospitalar em situações assim não é favorável e como eu iria cuidar dela pessoalmente durante todo o tempo, achei melhor agir com prudência. E assim, levamos Alice para a casa, em uma ambulância, o que deixou a pequena eufórica. Eu sabia que ela iria gostar da viagem na ambulância, o que eu havia pensado aconteceu. Alby me perguntou se era necessário, falei que não, que era apenas mais uma aventura para Alice poder contar aos amigos. E Alby balançou a cabeça, sabendo que eu esta