Fiquei ali olhando aquelas flores, andando ao redor da piscina, respirando fundo e sentido aquele perfume que aos poucos parecia me embriagar. Era um cheiro muito familiar, mas por mais que eu puxasse pela memória, não conseguia me lembrar de onde o conhecia. Finalmente me recordo do perfume, e meu corpo se arrepia por completo. Olho para trás apavorado, com o coração batendo acelerado e vejo na janela do andar superior da casa uma sombra a me observar.
Novamente não consigo reagir e com os pés cravados no chão, só consigo fechar os olhos e permaneço assim por alguns segundos. Abro-os novamente e me espanto com o que vejo. Não tem mais ninguém ali, todos foram embora, as flores estão secas e mortas nos vasos.
A casa está sombria e se deteriorando. A água da piscina, que há pouco era límpida, agora está suja e escura. No jardim, a grama está alta e com muitas folhas secas que caíram das árvores, espalhadas por todo o ambiente. A casa está completamente vazia, não tem ninguém, procuro meu amigo e não o encontro. Corro até a rua onde estacionamos o carro e tudo está um completo deserto. As arvores que há pouco estavam com belas copas, agora estão secas e seus galhos caídos na rua em total estado de abandono. Volto para aquela casa estranha e dessa vez não irei correr, quero respostas, quero saber o que está acontecendo. Entro na casa e olho cômodo por cômodo. Subo as escadas alcançando o andar superior. Nos corredores da casa vários quadros velhos, tortos, pendurados na parede, quase caindo.
A casa cheira a mofo. Há muito pó nos moveis. Vejo uma porta em minha frente, provavelmente do cômodo onde vi aquela estranha sombra. Um calafrio assustador percorre meu corpo. Sinto o sangue pulsar em minhas veias, o coração parece que sairá pela boca. Fico em silencio tentando ouvir algo lá dentro, mas só o que ouço é o barulho do vento sobre o telhado semi destruído. Vou apalpando as paredes tentando encontrar um interruptor para acender a luz, está muito escuro e mal enxergo o chão onde piso, mas é em vão, a casa está sem energia elétrica.
Acho tudo isso muito estranho, pois há poucos minutos estava impecavelmente limpa e toda iluminada. Levo a mão à maçaneta e lentamente giro, tentando abrir a porta, mas está trancada, coloco um pouco mais de pressão e nada, ainda não consigo abrir. Afasto-me um pouco e decido arrombar. Tento fazer igual nos filmes dando um pontapé bem forte e nada.Dou mais um pontapé, e outro, e outro. Somente no quinto chute consigo arrebentar a fechadura, escancarando a porta e levantando poeira do chão. O quarto era grande e estava escuro, quase não enxergava nada. Fui entrando a passos lentos, eu podia ouvir o ranger das madeiras se retorcendo com a força do vento que soprava lá fora. Vi uma cama grande, coberta com um lençol branco, porém cheio de pó e telhas quebradas que caíram do telhado.No canto direito, havia uma poltrona de balanço toda rasgada, com um pano todo encardido cobrindo o encosto. Olho atentamente ao redor tentando encontrar algo que me traga respostas.No outro canto, uma escrivaninha velha, de madeira trabalhada, porém toda comida por cupins. Uma gaveta quebrada, pendurada, deixado mostrar que lá dentro um pedaço de papel estava jogado. Com as mãos tremendo, agarro aquele papel e me espanto ainda mais ao ver que se tratava de uma fotografia minha.Dou um passo para trás e com os olhos arregalados fico imóvel olhando aquela foto. Sem entender o que significa isso, fico pensando como uma foto minha veio parar nesse lugar. Vou me afastando até bater com as costas na parede. Viro-me lentamente e vou saindo daquele quarto.Antes que consiga sair, vejo em baixo da cama um par de sapatos que não pareciam estar ali há muito tempo. Os sapatos estavam limpos e pareciam ter sido usados há poucos dias. Fico olhando atento e tentando ver mais alguma coisa que pudesse me dar uma pista de quem poderia ser a dona desses pés tão pequenos. Apanho-os e sigo pelo interior da casa segurando-os nas mãos.
Um segundo ambiente do andar superior me chama a atenção. Essa segunda porta está aberta e vejo o cômodo completamente vazio, sem nenhum móvel. Entro e noto que é um quarto que possivelmente estaria em reforma quando a casa foi abandonada, pois no cantinho atrás da porta havia uma lata de tinta já seca e um pequeno pincel jogado ao seu lado. É um quarto grande e tem um segundo ambiente integrado a ele, possivelmente um closet.
Dentro desse possível closet, havia muitas caixas espalhadas com vários pertences dentro. A curiosidade e a busca por respostas eram grandes e uma a uma, começo a vasculhar. Nada me trazia uma resposta concreta e quanto mais eu revirava as caixas, menos certezas eu tinha. Até que na quarta caixa, encontro um álbum de fotografias.
Sento no chão e vou folheando aqueles álbuns. Não conheço ninguém das fotos. No fundo da caixa na qual encontrei o álbum, vejo um envelope fechado e noto que tem algo dentro dele. Abro com cuidado para não rasgar o que quer que seja ali dentro. Coração dá um pulo ao ver um rosto conhecido. Era a moça que há pouco me pediu um cigarro à beira da piscina. Eufórico, começo a revirar a caixa tentando encontrar mais alguma foto dela e finalmente encontro varias. Ela na frente da casa. Ela nos cômodos da casa e vejo muito sorriso em seus lábios. Abro outra caixa e dentro tem alguns quadros e porta-retratos com a moça e tudo começa a se encaixar lentamente. Essa casa pertence a ela e vejo então um pequeno quadro com uma foto dela usando os sapatos que encontrei embaixo da cama, no outro quarto. Levanto e vou saindo do quarto pensando que talvez ela esteja por aqui.
Caminho confuso pelos corredores e ao chegar à escada, algo me faz olhar para trás e vejo alguém se movendo em minha direção. Assustado, viro-me para sair correndo, porém me esqueço que estava à beira da escada e acidentalmente rolo degraus abaixo. Sinto degrau por degrau batendo em minhas costas, braços, cabeça.Atordoado e confuso chego ao chão no final da escada, cortes e hematomas pelo corpo todo, vejo um braço e uma perna quebrados e sem conseguir me mexer acabo desmaiando.
Alguns minutos depois acordo com o corpo todo dolorido. Olhando para os lados vejo que estou em meu quarto e o mais estranho é que não há cicatrizes, não há hematomas e nem braço ou perna quebrados.
Sinto-me agora mais confuso ainda, não pode ter sido um sonho, apesar de não ter ferimento sinto ainda às dores. Levanto e fico tentando entender o que houve.
Vou para a cozinha com o pensamento fixo no sonho, se é que tudo foi um sonho, já que parecia tão real e nítido na minha memória. Passo pela sala desarrumada, toda bagunçada e estou sem animo nenhum para organizar qualquer coisa aqui dentro.Procuro alguma coisa para beber e vejo algo que novamente me faz tremer.
Sobre a mesa uma taça com a marca de batom continua do mesmo jeitinho que sempre esteve, porém, uma fotografia se encontra sob a taça. Com a ponta do dedo indicador puxo a foto sem tocar na taça, apenas fazendo-a rolar sobre a mesa e ao olhar a foto minha mente dá um corrupio em conflitos de pensamentos. A foto é a mesma do sonho estranho da noite passada.
Como isso é possível?
Como pode acontecer?
Como a foto de um sonho pode vir parar aqui?
Saio de casa correndo e nem percebo que estava descalço, despenteado, sem camisa, parecendo um louco pela rua. Corro sem parar e sem olhar para trás, corro até não mais aguentar, as pernas latejando pelo esgotamento. Os pés sangrando pelas pedras pontiagudas que nem notei no caminho. Exausto, paro de correr e me atiro no chão de barriga para cima, olhos fechados, respiração ofegante tento me acalmar. Após alguns minutos me restabeleço e me sento.
Tento raciocinar com mais calma e desvendar o que está acontecendo. As pessoas passam por mim e nem sequer notam a minha presença, até que uma senhora de cabelos longos e bem branquinhos caminha em minha direção. Percebo que ela me olha fixamente nos olhos e não posso deixar de notar sua cara de espanto. Seus olhos azuis me encaram firmemente. Tento desviar o olhar, mas é praticamente impossível. Ela então para na minha frente, me estende a mão e me ajuda a levantar, pergunta se estou bem e simplesmente aceno que sim com a cabeça. Então ela pergunta o que está acontecendo comigo e por que estou assim tão assustado. Não sei por que, mas senti vontade de me abrir com aquela senhora. Dizer para ela tudo o que estava sentindo. Tudo o que se passava comigo, mas tive receio dela pensar que estava louco. Já que era isso que eu mesmo pensava às vezes.
Simplesmente me viro e saio dizendo que não é nada e que ninguém poderia me ajudar. Ela agarra meu braço e sinto como se uma corrente elétrica percorresse todo meu corpo. Sua mão estava gelada e no momento em que me segurou, uma lagrima escapou de seus olhos. Achei tudo aquilo muito estranho, pois me ajudou a levantar segurando minha mão e não senti nada, mas agora me toca e sinto tudo isso. Percebendo meu espanto ela me solta.
— Você ainda não está pronto. — Então me solta e vai embora.
Volto para casa com muito medo do que encontraria lá, mas não havia outro modo, não tinha outro lugar para ir. Preciso enfrentar esse medo e tentar descobrir o que está acontecendo. Ao chegar à minha casa, tudo estava muito calmo e tranquilo. Entro, pego uma cadeira e me sento. Fico parado ali, pensando em tudo o que me aconteceu e não chego à conclusão nenhuma.
Debruço sobre a mesa e choro, choro como uma criança. Um murmúrio que ecoa pela casa vazia, um pranto que rasga minha alma, uma choradeira sentida e quanto mais eu choro, mais e mais as lagrimas brotam dos meus olhos.
O coração bate apertado no peito, uma saudade dos tempos já passados. Saudade da minha amada que se foi sem ao menos dizer adeus. Olhando para a taça com a marca de batom me recordo do dia em que deixou essa marca.
Ao chegar do trabalho ela estava ali sentada tomando um vinho, toda produzida, com um vestido longo semitransparente, o cabelo estava arrumado como se fosse para uma festa, estava usando o perfume que lhe dei de presente de aniversário. Um perfume tão gostoso, que somente usava em ocasiões especiais, um batom vinho contornava seus lábios carnudos, deixando-os ainda mais sedutores. Havia preparado tudo para que tivéssemos um momento só nosso e confesso que me senti ainda mais apaixonado. Calmamente se levantou e segurou minha mão, beijou minha boca suavemente deixando que eu sentisse o delicioso sabor de seus lábios. O batom que usava tinha um sabor tão bom, que quanto mais a beijava, mais queria beijá-la. Seu batom se espalhou pela boca inteira e ficou marcado em meu pescoço enquanto deslizava me beijando por inteiro. No calor do momento acaba
Geralmente nomes de rua são iguais em várias cidades, vários lugares, não existem nomes de ruas que sejam únicos. Então comecei pela minha cidade. Procurei nos mapas, nos guias e nada. Nessa cidade não existia essa rua, então comecei a procurar nas cidades da região e encontrei em duas cidades não muito próximas, esse mesmo nome de rua. Mas como chegar até essas cidades? Estou sem dinheiro, sem carro, sem condição alguma de fazer qualquer tipo de viagem, mas se eu quisesse encontrar resposta teria que dar um jeito. Arrumei uma mochila com algumas roupas e itens pessoais e sai a pé mesmo. Seria uma longa caminhada, mas estava disposto a qualquer coisa para entender o que estava acontecendo. Caminhei por alguns dias sem novidades, apenas cansaço e esgotamento físico, dormindo na estrada, em baixo de arvores ou galpõe
Outro dia amanhece e permaneço aqui dentro de casa, tentando encontrar uma resposta, fico juntando os pontos, os acontecimentos. Tudo parece tão vago e sem sentido. Saio para rua na esperança de encontrar aquela senhora. Vou até a pracinha onde a vi pela primeira vez e fico ali sentado por algumas horas, atento a todo movimento e a todas as pessoas que ali transitam. É engraçado à forma em que as coisas vêm acontecendo comigo. Num instante tudo está bem, tudo está perfeito e de uma hora para a outra, tudo se vira contra mim. Não tenho família, não tenho emprego, não tenho ninguém e às vezes, o desespero me faz ter pensamentos tenebrosos. Já pensei em sumir dessa cidade, já pensei em sair pelo mundo caminhando pelas estradas e virar de vez um andarilho, mas o pensam
Agora paira no ar mais um mistério, e como descobrir sem nem sequer uma pista ou uma idéia de quem a levou? Cada vez mais confuso. Cada dia que passa, entendo menos o que está acontecendo. Espero o dia amanhecer para tentar encontrar alguma pista de quem a levou. A noite parece não ter fim, na cabeça mil e uma coisas se passam como um filme. Vejo minha vida diante de meus olhos. O sol vem dando sinais, com seus primeiros raios de luz iluminando o céu. Saio pelas ruas sem saber por onde começar, sem saber o que procurar, mas como um dia Aurora me disse, permito que meu coração me guie e de uma forma estranha sinto uma força me arrastando para o bosque. De cabeça baixa vou andando e chutando algumas pedras no caminho. A força que me impulsiona até o bosque, é intensa, porém me traz uma sensação de calma, algo que eu n&atild
Estou em um lugar estranho. Parece uma fazenda, um sítio, não sei muito bem. Sigo por uma estrada de terra em meio a uma plantação. Uma estrada cheia de buracos e muita poeira, a cada soprar do vento, uma cortina de poeira sobe e impossibilita a visibilidade. O lugar parece abandonado. Há muito mato às margens da estrada, e ao longe vejo uma casa em meio às muitas árvores. Ao lado da casa, épossívelver um barracão com tratores e maquinas agrícolas, todos cobertos de poeira, alguns já estão enferrujados e com cipós e trepadeiras cobrindo parte deles. Do outro lado da casa, um velho paiol de madeira com o telhado destruído, com certeza desabou há muito tempo. A casa parece desabitada. Suas portas e janelas quebradas e a pintura bem deteriorada, com
Paramos em frente a uma sepultura. — Olhe quem está sepultado aqui. Veja se reconhece. — Diz Aurora sem soltar minhamão. — Sinceramente não reconheço. — Respondo sem dar realmente muita atenção. Ela olha fixamente para a foto e diz que conheço sim e pede para eu prestar mais atenção aos detalhes. Concentro-me na foto e olho atentamente. Vejo que é a sepultura de uma criança, um garoto muito bonito. Cabelos negros e olhos escuros. —
A noite vem chegando sorrateiramente. Decido voltar para casa e percorrendo o caminho de volta meus pensamentos vão e vem em Áurea. Quero ver novamente aquele rosto lindo. Aquele sorriso angelical e aqueles olhos cheios de vida me olhando com ternura. Sinto o coração bater mais forte quando chego ao portão de casa e vejo aquela mulher me esperando. Quase não acredito no que vejo. Chego a pensar que é mais um de meus devaneios loucos e logo irei acordar assustado. Aproximo-me e para minha surpresa não é um sonho. Tudo é real, é ela mesma quem está aqui. Ela olha em meus olhos e tem em suas mãos uma sacola com as roupas que lhe ofereci para se trocar na noite anterior.Convido para entrar e conversar um pouco e e
Sem querer acreditar em nada, saio correndo pela rodovia. Quero voltar para casa e desesperado, sem saber o que fazer, caminho pela beira da estrada e os pensamentos me faziam imaginar mil coisas, pensando que Aurora era uma louca e nem sabia o que estava falando, resmungava comigo mesmo. Olho a lua nocéua brilhar e fico contemplando a beleza de suaimensidão.Sigo caminhando, olhando para cima sem nem sequer olhar o caminho por onde andava. Sou levado mais uma vez por uma força que não sei de onde vem.Sou guiado enquanto caminho. Vejo entre as árvores quealguémme observa de longe, escondido naescuridão.Finjo não perceber sua presença e continuo a caminhada.Último capítulo