PRÓLOGO

(Camila)

Estou aqui sentada sozinha no recreio. As meninas daqui não gostam de mim. Tentei ser amiga delas assim que entrei nessa escola, mas a única coisa que recebi foi insultos por ser uma pobretona gordinha e mal vestida. Os meninos vivem puxando meu cabelo e pondo chiclete na minha cadeira para eu sentar em cima e estragar a minha saia de uniforme de segunda mão.

Eu olho para eles e sinto um pouco de pena. Eles podem ser bonitos, ricos e bem vestidos, mas parecem crianças e adolescentes infelizes, já que para se sentirem bem e felizes precisam curtir com pessoas diferentes deles.

Realmente sou uma criança pobre. Moro num casebre na parte mais pobre dessa ilha. Minha mãe é manicura e meu pai é pescador. Os dois são pessoas honestas e trabalhadoras que fazem de tudo para que eu e meu irmão tenhamos uma vida melhor do que a que eles tiveram.

Ao ponto de sacrificarem as finanças deles para colocar meu irmão e eu nessa escola particular, porque eles querem que nós dois sejamos os primeiros da família a ingressar numa faculdade. Eles acreditam que apenas através dos estudos que meu irmão e eu poderemos ter uma vida melhor.

Tento fazer de tudo para que meus pais se sintam orgulhosos de mim, porque quero recompensar o esforço e o trabalho deles para comigo, por isso me esforço o máximo para ser uma das melhores alunas da escola.

Já ganhei várias competições como Soletrando, Competição Matemática, Feira de Ciências e Concursos de Redação, o que sempre deixou os dois muito felizes. Muitas vezes as premiações eram em dinheiro, o que ajudava um pouco o orçamento lá em casa, já que a renda deles é mínima.

Devido o meu destaque do ano passado, esse ano ganhei uma bolsa integral aqui na escola. Meus pais ficaram muito felizes porque sobraria um pouco de dinheiro para melhorar nossa vida em família, já que eles só estão pagando a mensalidade escolar do meu irmão.

O sinal bate avisando que o recreio havia terminado. Saio do meu cantinho e volto silenciosa e calmamente para a minha sala de aula. Agora teremos aula de Artes e eu estou muito feliz, porque essa é a minha matéria predileta.

Modéstia parte sou uma excelente desenhista e pintora. Meu sonho é ter dinheiro um dia para comprar telas, pincéis e as tintas para um dia poder fazer um quadro meu.

Entro na sala de aula e sinto meu coração se apertar ao perceber que o meu caderno de desenho estava rasgado, meus lápis de cor quebrados e minhas tintas guaches abertas e derramadas no chão.

Olho para os lados e vejo meus coleguinhas de sala fazendo algazarra porque meu material de Artes estava inutilizado. Meus olhos se enchem de lágrimas, mas eu disfarço. Não vou chorar na frente deles.

Vou caladinha para a minha carteira e mesinha e começo a juntar o meu material e vê se dá para aproveitar alguma coisa. Infelizmente parece que tudo está destruído. Estou muito triste. Meus pais deram o máximo deles trabalhando para comprar esse material e agora está destruído.

A professora entra na sala e nos cumprimenta. Eu olho para a porta e vejo a orientadora pedagógica. Ela me convida para acompanhá-la e eu me assusto. Nunca tinha sido chamada antes por ela.

Eu me levanto e a acompanho para fora da sala. No corredor encontro meu irmão que é um pouco mais velho que eu. Ele está chorando e eu me assusto.

_ O que foi Átila?

Ele se aproxima de mim e me abraça.

_ Mila, nosso pai sofreu um acidente em alto mar.

Eu fico gelada. Meu coração que já estava apertado começa a ficar mais ainda. As lágrimas que eu estava segurando por causa da brincadeira de mau gosto dos meus coleguinhas rolaram pelo rosto acompanhadas pela dor que estava sentindo por perder o meu herói.

Depois de saber do ocorrido a orientadora levou meu irmão e eu para a nossa casa, onde minha mãe estava aos prantos por causa do meu pai. Ela repetia o tempo todo que não conseguiria sozinha.

Mesmo sendo apenas uma criança de dez anos, sempre soube aquele momento que a minha vida que já não era fácil e feliz como a dos meus colegas de sala, agora seria muito mais difícil.

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