Capítulo 5

Queda Livre

Lily olhou para a fachada da casa no Queens, onde ela morou nos últimos dois anos. Diga-se de passagem, os dois piores anos da sua vida. Pandemia, plantões emendados, caos, correria, choro, gritaria, mortes e exaustão.

Ela deveria estar muito feliz por estar deixando aquela parte caótica da sua vida para trás, mas não estava. Tinha algo terrível acontecendo, e ela não conseguia decifrar ao certo o que era.

Homens armados esvaziavam a casa, um caminhão de mudança estava na frente do imóvel pequeno na periferia de Nova Iorque, e o irmão de Leonardo, falava em italiano e gritava ao telefone.

Lily ouviu palavras estranhas como carregamento, cocaína, ópio, AK-47 e suborno. Todas as suas coisas estavam sendo colocadas cuidadosamente no caminhão preto LoneStar da Navistar, e uma BMW preta estava parada na porta da casa, na frente do seu Honda Civic que seria quitado.

Assustada com tudo aquilo, Lily ficou parada na calçada, segurando Toddy pela coleira. Assim como ela, ele também só observava a movimentação. Parecia um fim e um recomeço.

Lennox encerrou a ligação e olhou no relógio. Eram quase dez horas da noite, e ele teria que levar pessoalmente, Lily até o irmão. O fato dela ter o mesmo nome da mãe deles, tornava tudo mais bizarro. Mas se tratando de Leonardo, tudo era estranho.

Reparando bem na enfermeira, ela parecia um ratinho assustado e acuado. Lennox quase sentiu pena dela, e do destino que a aguardava. Ela era muito pequena em tamanho para o seu irmão. Contudo, aquilo não era problema dele.

- Desculpa por todo esse transtorno a essa hora, Lily. Eu estou indo para a Sicília amanhã, e o Leo pediu para mim te levar até ele.

Lily abriu e fechou a boca várias vezes antes de dizer nervosa:

- Eu disse que voltaria amanhã. Por que as minhas coisas estão sendo levadas?

Lennox sorriu. Ela era tão fofa que teria sido difícil Leonardo não ficar de pau duro e obcecado.

- A clínica fica em Jackson e você vai ficar lá por três meses. Não faz sentido você ficar pagando o aluguel. Vamos deixar as suas coisas no depósito da minha casa, mas não se preocupe, tudo lhe será devolvido intacto.

É, não fazia sentido pagar o aluguel. Lily suspirou profundamente e olhou para a última caixa sendo colocada no caminhão.

- Tudo bem. Eu vou dirigindo.

Não era uma pergunta, mas Lennox negou com a cabeça.

- É noite e você está cansada. O Dallas pode cuidar disso. Você vem comigo.

Uma última olhada para a casa, um suspiro e Lily entregou a chave do carro para Dallas que era uma mistura de italiano com mexicano. Ela entrou no banco de trás da BMW junto com Toddy, o outro homem sentou na direção e Lennox no banco do carona. Suas malas foram colocadas no porta malas durante o processo rápido e organizado.

Quando Lily ia perguntar quem levaria o caminhão, um negro saiu da esquina e entrou no veículo. Só então, ela percebeu duas Mercedes se aproximando e um comboio foi formado. Uma Mercedes, seu Honda Civic, a BMW e a outra Mercedes na retaguarda.

Lennox perguntou mexendo no celular:

- Você quer passar em algum lugar? Mercado? Farmácia? Shopping?

- Não.

- Avisa para o locador que a casa está desocupada. Tinha contrato?

- Eu vou avisar. Não tinha contrato.

- O aluguel está ok?

- Está sim.

- Boa garota.

Acariciando Toddy que tinha deitado a cabeça nas suas pernas, Lily fechou os olhos. Se um dia alguém lhe dissesse que ela seria sequestrada por mafiosos, ela teria rido pra valer.

O Doutor West olhou para a folha em branco na prancheta. Fazia duas horas que ele estava sentado na cadeira ao lado da cama de Leonardo. O paciente se recusava a falar.

O médico não teve tempo de pensar sobre Michael. Lennox com seu cabelo impecável, terno engomado e postura fria, chegou e assumiu o B.O. A morte de um funcionário seria um dilema ético e moral. A Clínica Hope tinha se tornado um antro de degenerados. O psiquiatra questionou a sua própria sanidade mental.

Doutor West tentou mais uma vez.

- Você e o Lennox parecem ter uma boa relação.

Leonardo fechou os olhos verdes e respirou fundo. Ele estava algemado de novo. Pulsos e tornozelos. E na porta do quarto, não estava mais o banana do Michael. Seu irmão tinha deixado Romeo e Dominic. Os dois irmãos eram o que eles chamavam de a Elite da equipe de segurança. Lennox foi categórico: Nada de assassinatos na Clínica Hope.

- Eu vou matar o meu irmão.

Apesar da afirmativa feita em um tom de voz irritado, Davis não sentiu que Leonardo nutria sentimentos de ódio pelo irmão mais velho. Ele fez uma anotação.

- Quando alguém faz ou diz alguma coisa que você não gosta, você mata. O que vem depois? O que você sente?

Lentamente, Leonardo abriu os olhos e olhou para o médico com descaso.

- Eu sinto alívio.

- Que tipo de alívio?

- Eu nunca mais vou precisar olhar para a cara daquela pessoa.

- Algum tipo de arrependimento?

- Jamais.

O Doutor West ajeitou o óculos no rosto abatido.

- Eu entrei em contato com todas as clínicas psiquiátricas que você esteve nos últimos anos, e além dos remédios que você fez uso, e do diagnóstico de psicopatia, não tem muita coisa no seu histórico médico. Falta de empatia e desprezo por tudo e todos, colocaria você na categoria Antissocial. Entretanto, a violência com que você resolve entre aspas as coisas, mostra que você tem uma personalidade explosiva. A falta de remorso, faz de você um psicopata.

Entediado, Leonardo suspirou.

- Bravo, Doutor. Se me soltar, eu bato palmas.

Davis sorriu.

- Não vamos chegar tão longe. Dessa vez, temos algemas reforçadas. Assim como um prisioneiro sai da cadeia quando cumpre a pena, um doente sai do hospital quando é curado. O mesmo vai acontecer com você. À medida que fizermos progresso, e você pode ter certeza que nós faremos, as algemas serão retiradas, e os cães de guarda, serão dispensados.

O psiquiatra levantou e sorriu para o paciente.

- Não seja prisioneiro na sua própria liberdade, Leo. Você quer a admiração ou a pena da Lily?

O Doutor West não esperou por uma resposta. Ele sabia que tinha feito uma excelente consulta.

Leonardo ficou pensativo. De Lily, ele só queria a boceta, e para tal, ele teria que virar um santo para se livrar das algemas, e do seu temperamento forte. Ao vê-la junto do irmão, ele deu o seu melhor sorriso.

- Oi, Lily. Você voltou.

A enfermeira entrou no quarto e disse séria:

- Eu fui trazida com escolta.

- Lennox foi gentil com você?

- Sim.

O irmão mais velho desdenhou.

- Encomenda entregue. Eu te vejo na semana que vem quando voltar da Itália.

Leonardo fechou o semblante.

- Leve seus cães.

Lennox deu o ultimato.

- Romeo e Dominic ficam para o seu próprio bem e de toda a família. Lily, foi um prazer conhecê-la. Em breve, eu vou te apresentar a minha esposa. Você não vai querer passar os próximos três meses, rodeada apenas de machos escrotos.

Lily forçou um sorriso. Ainda bem que ele reconhecia. E então, ela viu a cama box de solteiro do lado da cômoda.

Ela estava forrada com um edredom rosa das Princesas, combinando com a fronha do travesseiro alto. Ao lado, tinha uma caminha de cachorro azul marinho com uma manta da mesma cor, e um ossinho de borracha.

Cética, Lily olhou para Leonardo. Ele ainda sorria.

- Eu quero que você fique confortável, assim como o Toddy. Tem tapetes para ele fazer as necessidades no banheiro. Eu acredito que você tenha trago as coisinhas dele.

Toddy se aproximou da mão que saiu por entre a grade da cama. Ele cheirou, lambeu e abanou o rabo.

Leonardo lançou um olhar diabólico para Lily. Ele tinha deixado a mão com cheiro de Cheetos, e voltou a olhar para o lindo cachorro marrom.

- Oi, Toddy. É o papai.

Lily deu as costas para o seu paciente cínico e o seu cachorro traidor. Ela começou a desfazer as malas, e pegou um espaço no armário. Ela estava em queda livre. Sem dívidas, mas fodida.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo