Hadassa
Enlouqueci diversas vezes, porém para o meu desespero eu sempre retornava à sanidade.
Ensaiei tantos abraços. Ensaiei tantos beijos.
Eu me preparei tanto para esse momento que em algum momento eu deixei de me preparar.
Eu deixei de acreditar.
Deixei de esperar.
Deixei de sentir.
E é por isso que tudo está tão estranho. Eu não pareço eu.
— Muita coisa mudou ao longo dos anos, mas ainda é Hasgueit, você vai se sentir em casa. — Trento diz um pouco receoso depois de eu ter sondado o ambiente pela pequena janela da carruagem, Hasgueit já pode ser vista.
Eu vou me sentir em casa?
Sorrio em resposta.
Não sei o que dizer.
Ensaiei tanto, e agora nada me vem à cabeça.
Eu tinha tantas perguntas... Mas nenhuma resposta me interessa mais.
Tudo o que eu quero é procurar por algo que faça sentido.
<Hadassa(...)A carruagem foi consertada e já estamos bem próximos do castelo, porém já anoiteceu.Eu me sinto muito amedrontada. Não sei o que vai acontecer, não sei se eu deveria estar aqui.Faz tanto tempo desde a última vez...Relapcios da noite em que eu fui atingida pela flecha envenenada há décadas atrás começam a torturar a minha sanidade, forçando-me a mover a cabeça frenéticamente.Trento, percebendo a minha agitação, deposita o seu braço por cima de meus ombros, em total solidariedade e compaixão.— Eu vou te ajudar a enfrentar seus medos, você vai se recuperar e voltar a ser aquela pessoa alegre e guerreira... A doce Hadassa e a temível Valência...— Sim, vai ficar tudo bem... — Torno a repetir a frase que eu tenho repetido todos os dias, desde que eu fui presa.(...)Já nos portões do castelo, quando descemos da carruagem, caminho seguindo o Trento, evitando olhar ao redor. Não me sinto preparada pra enfrentar
Vicent— Entendo, acredite! Entendo perfeitamente o seu proceder, só acalme-se para que possa me entender.— Certo, eu quero muito entender, tente me enrolar, diga-me qualquer besteira, vai, vamos lá.— Hadassa... Ela está...— Morta eu sei, mas isso não te dá o direito de se deitar com a assassina dela.— Viva, ela está viva! Pelos céus! Ela está viva! Para de dizer tolices!Recuo alguns passos na intenção de me proteger.Ele realmente enlouqueceu.É, fui muito duro com ele. É isso. Eu só vi as minhas frustrações e não me importei com o fardo dele... Agora, ele está louco e um louco pode atacar à qualquer momento e é por isso que eu recuei.— Acalme-se e me escute. — Trento aproxima-se mais um passo.— Calma o senhor! Tenha calma!— Já pedi para parar de dizer tolices! Se você me ouvisse pelo menos uma vez, ouvir de verdade, tudo seria mais fácil pra você.— Certo, e onde está a minha mãe?— Está naquele
Trento— Diane? — Surpreendo-me com a abrupta e infeliz surpresa.— Por favor, não se importem comigo, eu irei embora.— Diane, agora não é um bom momento, mais tarde eu prometo que lhe explico tudo.— Não há o que explicar. — Avança pela pela porta, para o meu desespero. — Eu ouvi claramente e entendo tudo.Diane está diante de Hadassa agora, parada, observando-a de cima à baixo.Eu não estava preparado para este momento. Ver o meu passado e o meu presente frente à frente, me corrói por dentro.Definitivamente, eu não estava preparado.— Podemos conversar à sós? — Dou alguns passos em direção à porta, com a intenção de que ela me siga, mas paro os meus passos quando vejo que ela não vai me acompanhar. Diane me olha no fundo dos olhos. — Somos todos adultos aqui, Trento! Por anos e anos eu lutei pacientemente para conquistar o seu amor, acreditando que com o tempo o fantasma da falecida rainha fosse te
Vicent (...) Depois de passar um bom tempo com a minha mãe, infelizmente é hora de deixá-la descansar. É tarde da noite, eu deveria ir dormir, entretanto os meus pensamentos estão em desordem... Tudo o que eu queria era estar com a minha mãe, só perto dela eu não sinto falta de nada... Não me sinto um bosta de vaca. Como eu consegui ser tão repulsivo ao ponto de beijá-la sabendo que não a veria mais? Ela, que cresceu em um mosteiro, completamente escondida de qualquer luxúria e impureza, essas pragas que eu estou atolado desde as pontas dos dedos até os fios do cabelo. Como eu pude? Eu fui muito insensível. Ela deve estar pensando em mim, neste exato momento. Deve estar pensando no quanto se enganou quando pensava que eu era um bom homem... Pois é, ela me achava um bom homem. Depois de ter presenciado a minha frieza em roubar a carruagem sagrada das irmãs, depois de saber que eu estava fugindo, depois de saber que eu era um crim
Vicent Meu pai e minha mãe aos poucos estão se reaproximando, eu os vejo passeando pelas roseiras com sorrisos que entregam os seus sentimentos. Os dias se seguiram perfeitamente alinhados, tudo foi se encaixando como se fosse um quebra-cabeça, Diane partiu de volta para o reino de sua origem apesar de que o meu pai e a minha mãe insistiram para que não fosse, mas ela foi, levando consigo Penélope, eu me senti muito mais sozinho depois disso, Penélope é uma companhia agradável, me fazia esquecer um pouco a amargura que sinto pelo que fiz à Lívia, contudo entendo que a Diane deve estar precisando muito do apoio da filha.— Irá se juntar ao seus pais no banquete dos Julius?— Não, vou deixar que eles aproveitem sozinhos, como antigamente, assim trará um pouco mais de proximidade aos dois, — sorrio me lembrando do pedido de ajuda que recebi do meu pai.— Eles não podem se aprox
LíviaMe vesti lindamente inspirada, minha serva notou o quanto estou animada esta manhã e aceitou me ajudar a escapar. Hoje eu decidi que o dia será melhor. Vou viver a vida que eu tenho e aproveitá-la da melhor maneira possível e a primeira coisa à se fazer é ignorar esse nó na garganta e afastar os pensamentos negativos. Isso.Irei procurar a beleza da vida, vou respirar o ar puro e me inebriar com o perfume das flores, sozinha, para isso eu terei que passar desapercebida por entre os corredores e tentar não ser vista pelos guardas.Consegui.Eu sou a melhor! É que eu me inspiro no mais...Não.Eu não vou pensar nele!(...)Por sorte eu não vou precisar de um cavalo, eu quero mesmo é sentir a terra em meus pés... Seria bem mais complicado se eu tivesse que ir até o estábulo.
VicentEstou na ponta do navio observando a nossa frente impaciente.Foi uma viagem longa, os dias não passavam e ouve momentos em que eu sentia uma enorme necessidade de me atirar na água e seguir nadando até Kahabe, contudo, finalmente aqui estamos nós.- Alegre-se, meu filho! Tudo dará certo! - meu pai deu alguns tapas solidários em minhas costas.- Como o senhor consegue se manter tão confiante? Eu sei que entre o senhor e a minha mãe as coisas fluiram naturalmente, já entre eu e Lívia a conjuntura é diferente, não são favoráveis, na verdade ela pode perfeitamente estar à caminho do altar indo de encontro ao seu novo noivo neste exato momento...- Acalme-se, Vicent, se este for o caso, então poderemos raptá-la - sorri achando graça de seu próprio comentário.- Pois saiba que eu seria capaz disso.- Eu acredito que sim - começa a gargalhar, não entendo o real mo
LíviaNoto a movimentação pelos arredores e ainda não consigo discernir nada, meus ouvidos estão atentos tentando captar algo que faça sentido, porém estou completamente isolada aqui nesse pequeno inferno.Já fazem aproximadamente umas trinta e seis horas que eu estou aqui, juro que vou enlouquecer! Eu reclamava do mosteiro? Pff, lá era o paraíso... como eu fui ingrata por todos esses anos...Me pergunto se lhes digo ou não o que eu sei sobre Vicent, acredito veementemente que não seria algo bom, por isso ainda não disse nada, ao mesmo tempo eu penso que tudo seria mais rápido se eles se decidissem de uma vez e pedissem o resgate por mim.— Olá? Podem por gentileza me deixarem por dentro do que está acontecendo? — perguntei pela fresta da porta — eu preciso muito de um banho! minhas roupas estão cheirando a suor!Ouço passos pesados correndo em direção ao meu atual lugar, passos rápidos de uma pesso