Lívia recuou rapidamente e escondeu o desenho atrás das costas. Entre as respirações irregulares, ela virou-se. — Buongiorno. — disse a governanta ao entrar com a mesinha de café. — Se eu fosse a senhora, não mexeria nisso. — elevou o queixo, indicando o quadro. — O seu marido nunca deixou que outras pessoas entrassem nesse quarto. Apenas eu tenho permissão para limpar uma vez na semana. — Certo! — Lívia concordou. Permaneceu com as mãos atrás das costas. — Trouxe o seu desjejum. — A mulher de cabelos brancos exibiu a mesinha de café. — Obrigada! — É melhor a senhora colocar esse desenho no lugar. A funcionária arrumava aquele quarto desde que Enrico era um menino. Na época, ela ficou chocada com os primeiros desenhos, mas depois de um tempo, ela se habituou ao modo como o pequeno Enrico extravasava toda a sua dor e raiva, já que o tio nunca o levou para um acompanhamento adequado com um psicólogo. Lívia rapidamente, pôs o desenho no lugar. Pegou a mesinha e sentou-se em uma
As luzes se acenderam iluminando o palco do salão vazio. Enfarpelado, Enrico estava sentado em uma das cadeiras escondendo as suas dúvidas por trás de sua máscara sombria enquanto as garotas da casa da Madame Monroe ensaiavam para a apresentação daquela noite.— O que faz aqui docinho? — A dona do estabelecimento segurava uma cigarrilha entre os dedos.— Pensando… — Enrico apoiou o queixo contra o dorso da mão— Soube que estava casado.— Estou! — Corrigiu com dureza em seu tom de voz.— Hum, já sei! Quer experimentar coisas novas?— Não.— Se precisar, pode escolher qualquer uma. — indicou o palco.Ele olhou, avaliando os corpos que se exibiam no palco. Todas eram igualmente belas, mas a sua mente ainda era dominada pela médica. Fazia dias que não tinha contato íntimo. Tinham quase um mês de casado e só tiveram uma única noite de sexo. Enrico poderia esvaziar e lançar toda tensão numa daquelas mulheres que vendiam o corpo por dinheiro. Chegou a cogitar a ideia de passar algumas hora
Duas semanas se passaram desde que Enrico a trancou naquela casa. Lívia passava as manhãs caminhando pelos jardins, cuidava de seu cachorro e fazia suas refeições na cozinha com a governanta. Nos dias em que ficou em casa, reparou que os homens faziam uma pausa para fumar e jogar conversa fora. Outras vezes, ela passeava pelo gramado e notou que um deles estava cochilando enquanto o outro fazia a ronda.Uma cor viva e alaranjada cortou o céu, o sol começou a sumir lentamente, desaparecendo atrás das montanhas. Lívia estava olhando para o belo céu, no momento que abaixou a cabeça, sentiu como se o verde girasse feito um carrossel. Ela pôs a mão na testa, já tinha sentido aquele mal-estar nos outros dias.Durante o jantar, Lívia ficou nauseada ao sentir o cheiro do tempero, o estômago estava embrulhado demais. Saiu da mesa, correu para a lata de lixo e pôs tudo para fora.A governanta pegou um copo com água gelada e colocou metade de um limão. Ficou parada ao lado de Lívia.— Beba, dout
Por um breve segundo, Mattia olhou para a amiga que dormia serenamente no banco ao seu lado. Engoliu em seco algumas vezes refletindo sobre o que faria. Mattia já tinha abastecido o carro e comprado o necessário para se alimentar no esconderijo. O som do trovão despertou Lívia. Com a mão no peito, tratava de acalmar o agitado coração.— Calma, foi apenas um trovão!!! — Os lábios de Mattia se comprimiam num sorriso. — Se me levar para a sua casa, o Enrico vai me econtrar.— Calma! Vou te levar para a fazenda da minha tia.— Não, não! — disse, nervosamente. — Eu não quero envolver mais pessoas nisso.— Fica tranquila, Lívia — Olhou de soslaio para a amiga. — A casa está vazia. A minha tia foi morar com a minha prima na França. — Atentou-se a estrada. — Descansa um pouco! Quando chegarmos, eu vou te acordar.Lívia se sentia segura ao lado dele. Confiava cegamente na boa vontade de seu amigo mesmo sem saber para onde estavam indo.…Logo que o carro parou em frente a casa de dois anda
A chama amarela derretia a cera da vela, não havia eletricidade naquele ambiente inospitaleiro. Depois que Don Bianchi se retirou, Mattia abriu duas latas de sopa e despejou em uma cuia. Parou diante da mulher silenciosa que evitou encará-lo. — Trouxe comida! — Ele puxou a cadeira e sentou-se de frente para ela. A direita de Lívia havia um sofá velho, ela observou o estofado florido com alguns rasgos e desviou o olhar para o cachorrinho que estava deitado ao seus pés. O cãozinho ficou o tempo todo ao lado de sua dona.— Por que fez isso? — Virou a cabeça levemente e se concentrou no rosto dele ao questionar.Por dentro, Mattia sentia como se a angústia fosse um fogo que lhe devorava a alma. Sustentou o olhar triste da mulher que amava:— Não tive outra escolha… — não podia contar muita coisa naquele instante. Ele sabia o que poderia acontecer se não cumprisse as ordens do capo da família Bianchi.— Como não teve? — Lívia retrucou. — Você me drogou, Mattia. Nunca pensei que fosse c
Enquanto Enrico perambulava à procura da esposa, a governanta passou pela sala de estar devagar quando avistou o olhar medonho do chefe.— O senhor deseja alguma bebida? — Não! — Exclamou grosseiramente. — Eu quero que me diga onde está o seu neto? — A voz máscula berrou ao questionar a governanta.As pupilas da idosa estavam dilatadas, pondo a mão no lado esquerdo do peito, ela recuou. Naquela altura do campeonato, o rapaz já devia estar em um trem partindo para a França. Ela já havia combinado tudo com um de seus parentes que daria abrigo ao jovem numa cidadezinha no interior da França. Fez tudo o que estava ao seu alcance para tirar o neto desta vida criminosa.— Eu realmente não a vi, senhor Bianchi! — gaguejou.— Por que continua mentindo? — O olhar inquisidor examinou as atitudes suspeitas da governanta. Tirando a pistola da cintura, ele apontou para o pé de sua funcionária. A atmosfera ficou ainda mais tensa quando Enrico percebeu que ela estava mentindo.— O senhor seria cap
Quando saiu do automóvel, Enrico bateu a porta. As pontas dos dedos tamborilavam no teto do veículo enquanto ele preparava os ouvidos para ouvir as reclamações do tio.— O seu tio está te esperando, chefe!— Eu sei! — Os olhos azuis cintilavam enquanto olhava para a sede onde a gangue se reunia.Enrico demonstrava um distanciamento frio com os homens de seu meio. Ele seguiu sem pressa até a entrada, passou por alguns de seus subordinados que cumprimentaram o herdeiro do clã Bianchi. A maioria deles tinha bolsas em torno dos olhos, pois como todo gângster, eles faziam o turno da noite no submundo e encerravam ao amanhecer.Ao entrar, ele entregou o casaco preto a um dos homens e trocou amenidades com o conselheiro no meio do caminho.— Está atrasado, Enrico! — disse o consigliere.— Caso você não saiba, eu tenho uma vida pessoal, — Enrico retrucou.— Você deveria cuidar melhor dos assuntos da família.— O que você acha que eu estava fazendo!? — Enrico abriu mais os olhos ao inquiri-lo
Vez ou outra, o olhar de Enrico se centralizava em Lívia. Não era para hesitar daquela forma, se fosse em outro momento, já teria estourado os miolos daquela mulher e partido para outra missão; todavia, Enrico estava abalado, tinha algo especial que Lívia carregava.Ele tirou o blazer e pendurou num dos ganchos na parede do lado de fora. Ao retornar, ele tocou na pistola e retirou a semiautomática da cintura e colocou sobre o banquinho de cimento no lado esquerdo.Assustada, a médica sacolejou na cadeira, mas foi contida pelo tio de Enrico. A mão pesada de Don Bianchi ainda apertava os ombros de Lívia.— Você não pode fazer isso comigo, eu salvei a sua vida! — disse num ato desesperado para poupar a própria vida e a do embrião que crescia em seu ventre. — Já basta! A mão pesada de Don Bianchi a calou. O tio de Enrico continuou pressionando a palma contra a boca da médica, esperando que o sobrinho terminasse logo com aquilo.— Mate-a! — O capo ordenou por entre os dentes cerrados.Ap