“Ettore Bianchi”Observo a lágrima solitária escorrendo pelo rosto de Liz, caindo sobre o contrato recém-assinado. A satisfação me faz sorrir.Passei mais de dois anos ao lado dela. Já a vi chorar antes, claro. Mas é a primeira vez que não sinto o impulso de enxugar suas lágrimas.Há alguns anos, eu teria movido montanhas para evitar sua dor. Hoje, cada gota que cai é uma pequena vingança.— Parabéns, piccola — digo, deixando o apelido sair com um veneno sutil. — Acabamos de dar o primeiro passo para o nosso futuro.Ela finge coçar os olhos antes de levantar o rosto para me encarar. Aqueles mesmos olhos que, um dia, prometeram amor eterno, agora estão vermelhos, vulneráveis. Exatamente como os meus estavam da última vez que nos vimos.Perfeito.— Tudo pronto, Max? — pergunto, me levantando com calma.— Quase — ele responde, estendendo uma pasta para Liz. — Aqui está seu cronograma até o casamento. Provas do vestido, detalhes da cerimônia…Ela apenas assente, sem dizer nada, aceitando
“Liz Montesi” Mal tenho tempo de digerir o corte que Ettore acaba de me dar quando percebo que outro desconforto se aproxima. Isabella Ricci. A queridinha da mãe de Ettore. Alta, elegante, longos cabelos castanhos e um sorriso perfeito, daqueles que só servem para disfarçar o veneno. Isabella sempre representou tudo que Chiara Bianchi julgava ser a escolha ideal para o filho: família influente, comportamento impecável… ótima candidata a esposa perfeita de um herdeiro. — Isabella — Ettore diz com um sorriso educado, mas os olhos continuam frios. — Estou tão feliz em ver você — ela responde, alternando o olhar entre nós dois. — E vejo que não está sozinho. Liz, quanto tempo! — Olá, Isabella — digo com meu melhor sorriso falso. — Você está tão elegante quanto me lembrava. — Obrigada — ela esboça um sorriso que não chega aos olhos, então foca na minha aliança. — Vejo que está noiva. Parabéns. Posso saber quem é o… felizardo? Ettore coloca a mão sobre a minha na mesa, um gesto po
Meu coração salta ao ouvir a palavra dita sem nenhum traço de desprezo. Piccola. Pequena. O apelido que ele sussurrava contra meus lábios, contra minha pele, nas noites que passamos juntos. O tempo parece congelar enquanto continuamos assim, imóveis, presos em um instante que se estende além da lógica. Parte de mim quer ceder. Quer realmente beijá-lo. Quer fingir que os últimos três anos nunca aconteceram. Mas a outra parte, a que ainda sente o gosto amargo das palavras frias, a que não esqueceu o olhar de desprezo, resiste. — Não — consigo dizer, quase num sussurro. Minha negação, provavelmente desmentida pela minha respiração ofegante, arranca um sorriso lento dele. Ettore aproxima o rosto um pouco mais, e por um segundo, acho que ele vai me beijar. Mas, em vez disso, seus lábios roçam minha bochecha e seguem até meu ouvido. — Péssima mentirosa — murmura, rouco, provocando um arrepio involuntário que percorre minha espinha. Com um movimento lento, ele apoia uma das
Ettore pega o tablet com uma tranquilidade irritante, como se não tivesse acabado de lançar uma bomba sobre mim, e se afasta. Observo-o caminhar lentamente em direção à saída, e algo ferve dentro de mim. Me levanto rapidamente e sigo atrás, alcançando-o no corredor vazio. — Ettore! — chamo, segurando seu braço. Olho ao redor e abaixo a voz. — Por que tanta pressa? — Achei que tivesse entendido a urgência para ambos — ele responde, sem emoção. — Não estaria surpresa se tivesse lido o cronograma. — Não tive tempo de ler nada! Minha vida virou de cabeça para baixo nas últimas vinte e quatro horas! — Dramática como sempre — ele suspira, olhando o relógio. — Te espero no carro. Cinco minutos. Não se atrase. Ettore solta o braço da minha mão e continua andando, satisfeito por conseguir me provocar mais uma vez. Solto um suspiro pesado e volto para a sala de jantar. — Quatro dias… — murmuro, ainda incrédula, pegando minha bolsa da cadeira. Minutos depois, estamos no carro, indo em
“Ettore Bianchi” Estaciono o carro no lugar reservado, quase batendo no carro ao lado. Meus dedos continuam tensos ao redor do volante, mesmo após desligar o motor. De todas as coisas que poderiam ter permanecido esquecidas no carro, tinha que ser justamente aquele brinco. O mesmo que dei a ela no nosso primeiro mês juntos, quando éramos apenas dois idiotas apaixonados dividindo cafés pela universidade. Atravesso o saguão da empresa, retribuindo os cumprimentos de maneira tão falsa que nem eu acredito. Quando finalmente entro no elevador, encosto a cabeça na parede espelhada. Solto um suspiro pesado ao lembrar da expressão de Liz ao ver o brinco. Aquela mistura de surpresa e… esperança? A ideia me irrita ainda mais. Que direito ela tem de esperar qualquer coisa de mim depois do que fez? As portas se abrem e saio do elevador. Passo direto pela minha assistente sem responder seu “bom dia”, finalmente entrando na minha sala. — Dia difícil, e ainda nem são nove da manhã — a voz d
“Véspera do casamento. Liz Montesi” O cerimonialista continua falando, mas suas palavras se perdem em algum lugar entre nós e minha mente exausta. Os últimos três dias se resumiram em fingir entusiasmo enquanto escolhia flores, vestidos, cardápio… e, sinceramente, isso me esgotou mais do que eu esperava. Ao meu lado, Ettore interpreta o papel do noivo atencioso, fingindo empolgação por faltarem apenas algumas horas para a cerimônia. Ele demonstra real interesse enquanto o homem gesticula animadamente sobre as posições de cada arranjo de flores. — Então, está tudo acertado para amanhã — ele conclui, fechando a pasta. — A cerimônia às 16h, seguida da recepção. A previsão do tempo está excelente. — Isso é ótimo — Ettore responde com um sorriso educado, tão perfeito que quase consigo acreditar que é genuíno. — A senhorita tem alguma dúvida de última hora? — o cerimonialista me pergunta. Dúvidas? Tenho milhões delas. A principal é onde posso encontrar uma sósia para fazer tudo iss
O tecido branco desliza por minhas mãos enquanto encaro meu reflexo no espelho. O vestido, delicado e inegavelmente lindo, cai perfeitamente sobre meu corpo. Cabelos presos em um coque alto, maquiagem impecável. Uma noiva perfeita. Só falta a parte de estar feliz. — Você está deslumbrante, Liz — Giulia comenta, ajustando a barra do vestido. — Ninguém diria que esse vestido foi escolhido às pressas. Forço um sorriso, sem conseguir desviar os olhos do espelho. — Um sonho, né? — murmuro, irônica. — Ainda dá tempo de desistir — ela brinca, mas o olhar pelo espelho entrega que, no fundo, está falando sério. — Podemos pegar um avião para qualquer lugar. Sumir. Recomeçar. Por um segundo, a ideia me atrai com força. Consigo me ver numa praia distante com Giulia, livres, sem contratos, sem obrigações, sem fantasmas do passado. Mas então penso na minha mãe, imóvel em um quarto de hospital. Nos funcionários da Montesi, muitos dos quais me viram crescer. No legado do meu avô, construído co
— Tem certeza de que é uma boa ideia fazer uma surpresa, Liz? — minha melhor amiga pergunta, pela quarta vez só nessa ligação. — Sei lá… surpresas nem sempre acabam bem. E, sinceramente? Não confio nesse seu namorado. — Você implica com o Marco desde que o conheceu, Giulia. Admita, você o odeia porque ele é sério demais, diferente de você. — E você devia desconfiar justamente por isso. — Você disse que estava feliz por mim — sussurro, estacionando em frente à empresa. — E estou, mas… só tome cuidado, ok? Gosto de ver esse brilho voltando aos seus olhos, mas odeio imaginar que alguém possa apagá-lo de novo. Sorrindo diante da proteção excessiva da minha amiga, desligo o motor do carro. Após tudo o que aconteceu há três anos, o simples fato de me envolver com outro homem já é quase um ato de coragem. — Te ligo mais tarde, amiga. Vou tentar convencê-lo a almoçar comigo. Quero comemorar esses seis meses juntos. — Bem, boa sorte, amiga. Encerro a ligação e respiro fundo antes de