CAPÍTULO IV - O Casamento

Confraternização

No dia seguinte, sábado 10 de novembro, aconteceu a grande surpresa para a recém-chegada. Vieram vários convidados para o jantar de confraternização. Esteve também presentes, alguns colegas de infância, parentes e a presença do coronel Lindolfo, que fez questão de trazer junto seu filho adotivo, Robério.

  —Assim que o coronel Lindolfo apareceu junto como filho, Maria Rita bateu os olhos no rapaz e ficou tomada de encanto.

Em seguida procurou as criadas as interrogando: Quem é o moço que chegou junto com o Coronel?

— É Robério, o filho adotivo do Coronel de quem lhe falei, disse Lulu!

— Virgem santa, que lindo moço!

— Gostou do moço, não é Maria Rita?

— É muito simpático na verdade, mas, não o conheço e nem sei nada a seu respeito.

— Dizem que é o braço direito do pai. Ele o adotou ainda menino quando seus pais biológicos morreram num acidente de trem e o deixou órfão. Ai então o coronel o registrou como legitimo filho.

— Robério, o filho do coronel Lindolfo, também sentiu a mesma reação quando bateu os olhos na moça.

Parecia que desvendava ali naquela hora, um segredo que há muito já estava predestinado a acontecer na hora oportuna!Sentaram-se à mesa para jantarem de modo que Maria Rita e Robério ficavam de frente um para o outro. Seus olhares direcionavam um ao outro de maneira recíproca.

No instante em que jantavam, nascia em seus olhos um

amor à primeira vista. Brotava em ambos os corações a raiz de um grande amor e a certeza de viverem eternamente juntos!Durante o jantar, pouco se falaram, ao mesmo tempo se comunicaram através de olhares e sorrisos! Daqueles olhos reluzia o brilho de um sentimento que só os dois podiam decifrar!

Os convidados, presentes àquele jantar, principalmente os pais de Maria Rita, perceberam a troca de olhares e o comportamento de ambos. Despercebiam e às vezes as respostas eram demoradas quando alguma pergunta lhes eram dirigidas. Porém somente insinuações, nada de afirmativo em suas deduções.

Assim que terminou os comensais se levantaram da mesa, senhor Francisco e dona Margarida foram para a varanda conversar com o coronel Lindolfo e os demais convidados, exceto Maria Rita, Robério e as criadas. Estes saíram para o terraço que dava de frente para o cafezal do lado sul da casa grande, junto às nascentes.

— As criadas percebendo o clima de um aroma amoroso entre os dois, disseram para ficarem à vontade. Saíram sutilmente para desarrumar a mesa do jantar e não mais apareceram por lá até que os dois se retiraram do terraço e fossem para a cozinha onde estavam seus pais.

— Maria Rita disse então a Robério: não me lembro de o

ter visto quando estudava na escolinha do Arraial de Cascalhinho!

—Também não me lembro de ter visto você, respondeu o moço: sempre fui muito apegado à fazenda e depois que meus pais faleceram num acidente, fiquei sobre a guarda do coronel Lindolfo, hoje meu legitimo pai. Após ter me adotado, registrou-me como filho. Enquanto pequeno, estudei na escola da fazenda, mas, depois abandonei os estudos e me firmei na lida de gado.

— Interessante sua história. Bem que você se ingressou naquilo que gosta e sabe fazer muito bem.

— Obrigado, Maria Rita!

— Já esteve aqui antes?

—Algumas vezes!

— É muito agradável conversar com você.

— Digo a mesma coisa.

— Por quanto tempo esteve em Portugal?

— Estive lá durante quatro anos. O suficiente para concluir meus estudos.

— Pretendes voltar?

— Só a passeio. Para morar não!

— Quer dizer que veio para ficar?

— Sim!

— Ótimo!

— Por que dizes isto?Tens algum interesse?

— Ah, sim! Também porque é muito bom viver junto dos pais, respirarem esse ar puro da nossa região esentir a luz dosol brilhando em todas as estações do ano. Penso assim!

— É maravilhoso tudo isso que você falou!

— Parece coincidência, a gente gastar das mesmas coisas,

— Parece coincidência, a gente gastar das mesmas coisas, você não acha Maria Rita?

— Acho sim, Robério!

Enquanto isso, a conversa lá na varanda se estendia noite adentro. Por volta da meia-noite, os convidados se retiraram, ficando apenas o coronel Lindolfo e seu filho Robério. Após alguns instantes o coronel levantou-se, olhou no relógio que marcava uma e meia da manhã. Disse então aos donos da casa: já é tarde, preciso ir.

— Robério, percebendo a hora levantou-se também e disse: meu pai já está de saída. Preciso acompanhá-lo.

— Maria Rita o acompanhou até a varanda e ambos se despediram. Apesar da afinidade que nascia entre os dois jovens, nada mais que um beijo na mão de Maria Rita.

— Robério segurou sua mão e disse: eu volto outra hora se não for inconveniente!

— Maria Rita então disse a ele: claro que não! Promessa é dívida; estarei esperando por esse momento. Até mais ver!

No dia seguinte Francisco e o coronel se encontram na estrada que dava para o Arraial. No meio da conversa, sem querer, o coronel tocou no assunto dos filhos dizendo: parece que nossos filhos estão se interessando um pelo outro? Aposto que estão.

— Francisco concordando assegurou que faria muito gosto se acontecesse um suposto casamento entre os dois.

—Eu também faria muito gostos e acontecesse uma união entre eles. Aposto que foi amor à primeira vista!

— Disse Francisco: posso lhe garantir que o amor já está plantado há tempos naqueles dois corações apaixonados.

— Eu também acho. Acho também que a gente podia dar um empurrãozinho para facilitar mais as coisas.

— É isso mesmo coronel, afinal ela já completou vinte anos e já é uma moça formada.

— Robério também.

— Há, tive uma idéia!

— E qual é Francisco?

— Mande Robério vir em minha casa amanhã que eu preciso que ele dome um dos meus poldros que ainda se encontra pagão.

— Boa idéia! E desse assunto ele entende perfeitamen-

  1. Pode esperar que ele vai topar essa parada!

— Até amanhã Francisco!

— Até amanhã!

Os dois se apartaram e no dia seguinte, conforme haviam combinado, o rapaz apareceu e foi logo entrando em ação. Pegou o jovem animal e dentro de poucas horas o bicho já estava domado. Entregou o animal prontinho para a sela como se já estivesse adestrado a tempos.

Maria Rita apareceu e o convidou para o almoço. Robério não se fez de arrogado e aceitou o convite para almoçar comeles. Maria Rita não hesitou em dar uma mãozinha na preparação do almoço com algumas receitas que havia aprendido em Portugal com as famosas cozinheiras de lá. A partir desse momento, começa entre os dois o tão esperado namoro. Conversaram entre si e logo veio a boa notícia.

— Maria Rita chamou seus pais e disse: Robério tem uma coisa importante para falar com vocês!

— Pois diga moço!

— Meio embaraçado e um pouco tenso disse: Olham! Se

for do agrado de vocês, gostaria de pedir a mão de vossa filha em casamento.

— Até que enfim rapaz, isto não é nenhuma surpresa

— Até que enfim rapaz, isto não é nenhuma surpresa para nós, já havíamos percebido. Quanto ao agrado, é de nosso agrado sim! Afinal de contas, para quando marcamos a data?

— Gostaríamos que fosse em maio — mês das noivas.

— Excelente! Disse dona Margarida.

— Então vamos começar a cuidar dos preparativos. Afinal, restam só três meses, estamos em janeiro.

— E o coronel Lindolfo, será que já está sabendo das novidades?

— Se está Margarida; foi ele quem mandou Robério hoje aqui para abreviar as coisas!

Os dois namorados disseram dando gargalhadas; vejam só a ousadia, de nossos pais!

— Deus abençoes esta união! Tenham nossa benção!

— Obrigada papai, mamãe e ao coronel Lindolfo!

— De nada, minha filha, estamos muito felizes.

Sem antes se conhecerem nascia entre dois jovens, um amor com promessas eternas. Sem aviso prévio cupido os feriu com a ponta aguçada de sua flecha, alojando-a em ambos os corações! Os dias pareciam grandes demais e a certeza daquela união, crescia cada vez mais com o passar do tempo.

Os preparativos para o casamento iam acontecendo enquanto a data se aproximava. Na fazenda Laranjeira não se falava em outra coisa a não ser a celebração daquela propicia união, que nascera de olhares recíprocos e repentinos.

Finalmente chega o grande dia.

D

ia 11 de maio de 1895, véspera do dia das mães era celebrado na Capela de Nossa Senhora do Rosário o Enlace Matrimonial de Maria Rita e Robério que passaram a se chamar Maria Rita Sampaio e Robério Sampaio.

— Belinha, me chame Tiãozinho imediatamente!

— Estou indo dona Margarida. Tiãozinho, Tiãozinho!

— O que é Belinha?

— A patroa quer falar com você, se apresse menino!

— É pra já! Saiu correndo e disse: mandou me chamar, dona Margarida?

— Mandei sim menino, prepare a carruagem para levar Maria Rita a Igreja para o casamento. Está marcado para as cinco e meia.

— Francisco!

— Se apressa homem!

— Estou indo!

— Disse Belinha: veja como ficou Maria Rita!

— Ah! Ficou uma maravilha!

Disse dona Margarida! Está parecendo uma princesa com esse vestido de noiva, minha filha.

— Ah mamãe, não exagera.

— Está bem! Vamos que está quase na hora.

— É mesmo gente, os convidados já estão todos lá esperando pela chegada da noiva para o matrimônio.

— E o noivo coitado, deve estar bastante nervoso a essas

horas. Faltando dez minutos para o início da celebração do enlace matrimonial de Maria Rita e Robério, a Igreja de Cascalhinho se encontrava repleta de convidados e o noivo esperando pela noiva em frente o altar.

Logo em seguida a Orquestra deu inicia a Marcha Nupcial para a entrada da noiva.

Ali diante do Altar, perante testemunhas, fora celebrada

pelo sacerdote a união entre Maria Rita e Robério que segundo a tradição, fizeram juras de amor e fidelidade com o sim de ambas as partes. Receberam a benção do celebrante com a seguinte frase: Eu vos declaro Marido e Mulher! Que dure para sempre!

Na porta da Igreja, esperavam ansiosos os convidados para parabenizá-los.

— Parabéns Maria Ria e Robério, felicidades.

Parabéns! Parabéns! Parabéns...!

Voltaram para casa e uma grande festa selou a realização daquela união tão bonita e venturosa. Ao mesmo tempo, o início de uma nova aurora na vida dos dois.

Enquanto isso, no Arraial de Cascalhinho Aníbal afogava as mágoas na mesa dos bares e pelas ruas do Arraial. Estava colhendo o que havia plantado segundo diz o velho provérbio. Era muito difícil para ele aceitar.

O casal recém-casado aceitou morar na Fazenda Laranjeira onde passaram a viver uma nova vida a dois. O casarão da fazenda era enorme e a pedido de seus pais o novo casal aceitou ficar em companhia dos velhos.

Com o casamento que veio tão logo ela havia acabado de voltar de Portugal, seus planos com relação à Escola da Fazenda, fora adiado para o próximo ano. Com isso, Maria Rita fez questão de acompanhar seu esposo em algumas viagens feitas pela redondeza, levando e trazendo o gado para o controle das pastagens.

Ninguém podia imaginar a habilidade e perfeição com que cavalgava no lombo dos cavalos pelas estradas daquele sertão sem fim.

Porém, isto não era nenhuma novidade para quem nasceu e cresceu no meio dos mais dóceis e habilidosos animais de sela da fazenda.

Passando um dia, o casal pelo Arraial de Cascalhinho teve a desonrosa decepção ao defrontar-se com Aníbal, que, se encontrando bastante embriagado, os ofendia com palavras desqualificadas e um tanto descabidas, tentando desabafar de alguma forma.

— Disse ele aos dois: Quer dizer que a grã-fina se interessou por um peãozinho pé rapado do Coronel?

— Disse então Maria Rita: Olha bem e reflita sobre o que estás dizendo. Saiba que não temos tempo nem estômagos para ficarmos aqui ouvindo suas ironias.

— Esse capataz de boiadeiro atravessou meu caminho e roubou você de mim!

— Olha aqui, seu moço! Em primeiro lugar, sou um homem honrado e honesto! Você não tem o direito de nos atacar dessa maneira, senhor Aníbal, vê como fala.

—Eu ia me casar com ela, se não estivesse atravessado meu caminho!

— Olha que engraçado! Ninguém rouba uma pessoa da outra, havendo sentimento de amor entre ambas as partes...

Casei-me com Maria Rita por livre e espontânea vontade dela e de todos seus familiares.

— Vocês nunca vão ser felizes, se depender de mim!

— Ah, é? O que pretendes fazer?

— Aníbal sacou um revólver e o apontou para Robério que em fração de segundos jogou a pinhola e com um golpe certeiro tirou das mãos de agressor a arma antes que o maluco puxasse o gatilho.

— Apeou do cavalo, o agarrou pelo colarinho e disse:

Saiba que estás lidando com um peão bem traquejado e acostumado domar animais. Pena que o senhor me pareceu um animal precisando ser cuidado!

— Mas eu não sou um animal!

— De certo que não! Animal xucro a gente doma.

Mas pessoas a gente respeita e trata como merecem!

— O senhor me desculpe!

— Com toda certeza meu caro jovem. Ouça bem um conselho. Muda de vida e não jogue sua juventude na sarjeta. A vida tem valor quando vivida com dignidade! Cuida-se enquanto é tempo. O futuro trará de volta sua dignidade e saúde com toda certeza.

— Vocês podem estar certos de que nunca mais vou importunar vocês! Podem acreditar!

— Espero te ver novamente Aníbal, mas com saúde e

 sobriedade. É tudo que desejo pra você!

Aquele momento desagradável, o qual poderia ter sido a causa de uma tragédia, não fosse a habilidade e confiança da parte de Robério, passou como um relâmpago.

Os dois voltaram e fizeram questão de dar por encerrada aquela infantilidade do rapaz.

— Maria Rita lamentou a inconveniência de Aníbal e assegurou que sentia muita pena dele. Também admirou a atitude de Robério por não o ter machucado, não levando em conta as suas ameaças!

— Disse ele a sua esposa: também admiro você cada dia mais por ter um coração generoso e amável, com tamanha bondade e serenidade!

— Obrigada amor! Que pense assim por toda a vida!

Percebendo que Aníbal andava muito doente e preste a

contrair uma cirrose generalizada, invés de tomar como ofensa suas ameaças, procuraram seus pais e prontificaram a ajudá-los no que fosse preciso.

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