Areias e Velas
Areias e Velas
Por: Rosclin Oliveira
"entediada''

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Velas e areia

                                       Entediada!

                                       Como pode ser entediada a vida ribeirinha, estando ao lado da natureza, da paz e do silêncio platônico? - Ai que tédio, frisa a nativa Maria, lá da praia dos Lençóis, onde a areia branca se perde no horizonte e mergulha no azul celeste das águas doces!

                                       Maria ó Maria!!! Por que tu choras ó Maria?

                                      -  Se questiona sempre a sua mãe querida, Dona Justa!  

                                          A praia dos Lençóis, é um beiço de um mar de areia nas bainhas do município de Barreirinhas, é de natureza bruta e pura, mas a Maria não se contenta e sua alma doce clama por uma vida exteriorizada por aventuras que ela lê em seus picotes de romances.

                                         Moça prendada é a Maria, que de tudo sabe fazer em uma casa de sapê e de chão batido, aprendeu a ler com uma professorinha que mal sabe definir a relação entre os íons e as moléculas subatômicas do quartzo! – é outra tadinha, que nasceu ali no pé da areia e que em suas confidências com Maria, lhe conta os segredinhos dos escurinhos com o Pedrinho, hoje seu marido.

                                     Ambas se deleitam com os picotes de revistas de telenovelas ou com sobras de retalhos de jornais que turistas ao passarem por aquelas bandas, sempre deixam pelos caminhos ou nas várias pousadas que existem na cidadezinha.

                                         (...) sim, elas são muto amigas as duas, a Maria por ser devotada nas histórias de romances se pôs em aprender direitinho o “bê-á-bá’’, nas horas de aperreio da professorinha Lia, é a Maria quem a substitui nas aulinhas na pequena escola à beira da prainha. A vida da Maria é bucólica sim senhor, mas em sua cabecinha sonhadora um mundo ela constrói todos os dias e o seu coração de princesa reluz um príncipe montado em um lindo corcel preto e que um dia a carregue dali de seu tímido mundo.

                                         A Maria acaba de completar vinte anos e como ela mora em um lugarejo pequeno, toda a vila faz uma festinha para ela, todos gostam dela. Ela sempre foi tão prestativa e carinhosa com todos e sempre que ela pode faz as cartinhas de um e de outro, ajuda nas atividades de algumas crianças e quando não, ela ajuda até na cozinha da vizinha lendo as receitas de um velho caderno e sem falar nas horas do aperto de dar o remédio para um solitário senhorzinho, ela lê as bulas de todos os remédios e, quando alguém passa mal e não sabe que remédio tomar ou recebe uma carta e não sabe ler, enfim! – esta é a maria.

                                         Maria é porreta mesmo, na leitura e na beleza! – Maria é dos cabelos lisinhos e negros, quase cristalinos de tão brilhosos compridos que são, ela tem pele limpinha e; a sua mãe sempre tratou de banhar maria com sabão de coco e tinham os dias de banho com água de coco e leite de vaca (pode isso?) - a Maria tem o rosto delicado e seus olhos são da cor de um mel silvestre.

                                     Tão bela que é a Maria por dentro e por fora, uma típica donzela do campo. Dessas garotas que fatalmente alimenta os anseios de homens comuns e as faciosidades dos homens tolos.  Maria não tinha sonhos de riquezas ou afins, ela apenas queria conhecer o mundo que ela apenas lia em suas horas vagas de devaneios e Maria tinha sempre debaixo de sua caminha de solteiro, uma caixa de sapato decorada com veludo de tom rosa e dentro sempre repleta com vários recortes de textos românticos, tiras de fotos de lugares distintos de brio e de flores, era sim o único tesouro da Maria.

          Em seu guarda-roupa de uma portinha só, tinham poucas roupas de seu deluze, três vestidinhos de tons parecidos, bastante roupas de baixo, um frasco de perfume que ela dosava sempre com todo cuidado para não gastar, um pente de marfim antigo de sua velha avó, dois pares de sandálias e uma blusinha amarela que ela usa apenas em momentos de total precisão.

           O pai da Maria, vivia sempre em alto-mar e durante seis ou até oitos meses vividos dentro de uma embarcação de pesca pesada. Seu Antônio trabalhava como pescador e sempre perdia os melhores momentos de sua única filha, mas ele quando em terra firme, busca suprir sua ausência com todo o carinho de pai e os dengos que ela humildemente pedia a ele. Não era nada assim tão extraordinário, o que ela ora pedia ao seu pai e sim, que ele fosse até a cidade mais próxima e trouxesse para ela uma revistinha da banca de revista e ela sempre anotava direitinho o título e autores em um pedaço de papel, Seu Antônio ia todo cheio de orgulho e montava em um jumentinho que tinha, a viagem durava sempre quatro horas, duas para ir e duas para retornar; ele saia logo pela manhã cedinho para dar tempo de antes do meio-dia, da Maria logo se jogar para dentro de seu quarto e passar os olhos na revistinha nova.

           Sempre que seu pai chegava de alto-mar, era sempre essa rotina entre eles, era como se fosse uma regra e quando ele trazia a revistinha para ela no dia seguinte, ela corria para seu quarto logo depois de abraçar carinhosamente seu pai, toda agradecida pelo dengo e antes de começar a ler, ela cheirava a revista, ela curtia cada linha, ela se abraçava com a revista e depois de uns cinco minutos é que ela abria delicadamente a revista e começa a tecer os textos.

              Mas o seu pai ficava em casa apenas uns quinze dias e logo partia para sua lida, como ele não era um empregado contratado, ele tinha que passar um bom tempo garimpando uma vaga em uma embarcação que logo fosse cortar as ondas gigantes do mar aberto.

   talvez esse fosse o único momento de desalento na vida da Maria e assim mesmo ela buscava se resguardar no aconchego das revistas, ou nas atenções que ela jorrava nos moradores da vila, ou quem sabe ela apenas trancava em seu coraçãozinho suas dores de saudades.

         Enfim, a vida ia se passando no cotidiano de um vento calmo e alusivo, onde o cheiro desse ar era de mar e de Sol. O clima sempre a menos, os risos soltos dos moradores, os afazeres de cada um, a rotina pacata que se seguia durante anos e anos sem trincas ou têmperas quaisquer.

         Mas como no mar, o vento sempre pode mudar de direção ou às vezes, se tornar um furacão mesmo que leve como uma aluvião! – o Sol em um dia de segunda-feira, chegou no guarnecer de uma forma sorrateira e trouxe na garupa de uma moto de rali, um certo moço da cidade grande. Este tal ser, galopando o corcel de metal e coberto de adornos grosseiros, se jogou aos pés da Maria, da maneira mais dolorosa possível.

     Maria tadinha, ia cruzando a rua coberta de areia fina e sem se tocar do barulho que a moto produzia no ar, ela caminhava e cantarolava uma linda canção de ninar e ao mesmo que em sua mente doce, ela estava se recordando dos últimos trechos que havia lido na noite anterior.

  Eis que o moço, indelicadamente surgiu e se esguiando da Maria, jogou sua moto a duna mais próxima que havia bem pertinho da casa da Maria e antes que ela gritasse de susto, ela só ouviu aquele trombone da buzina da moto e o murro que a moto deu na duna. Viu o moço ser lançado uns dois metros para cima da duna e dai sim, ela correu e gritou, adentrou a casa de sua vizinha e trancou-se por lá, ela sem entender aquilo tudo, ela apenas se manteve trancada e observando através da fresta da janela, o que acontecia do lado de fora.

        O tal moço caído ficou por uns bons minutos e como desmaiado estava, ele apenas se manteve sobre a duna e esperou a calmaria do momento. Uma boa parte dos moradores ouviram o barulho e o grito da Maria, mas todos queriam saber onde estava a Maria! – vozes eram ouvidas chamando por ela e nada de perceberem a presença de um motoqueiro caído sobre a duna e uma moto lançada na beira da rua com as rodas girando vagarosamente.

       O motoqueiro finalmente se recompôs e ao se levantar, tira o capacete e, apenas nota as pessoas em busca de alguém que não era ele é claro. Maria já se sentindo melhor do susto, abre a porta bem devagar e ao sair corre para perto de sua mãe, que aflita a abraça logo. As pessoas ao perceberem que a Maria estava bem, passam a olhar para o motoqueiro que mesmo sem o capacete, ainda tinha uma touca branca que escondia todo o seu rosto.

    As pessoas e a Maria vão se chegando para perto do motoqueiro, que encomendo com o rito das coisas, logo tira a touca da cabeça e começa a se defender, dizendo:

- Ei pessoal, se acalmem aí por favor, nada de pior aconteceu com ninguém aqui!

 A professorinha logo interrompe a fala do motoqueiro e retruca:

- Como assim rapaz, nada de pior aconteceu, você diz? – olha o estado de todos nós aqui, todo esse alvoroço e o tombo que você se deu, sem falar do grito de nossa Maria, que o mundo inteiro ouviu!

     Neste momento Maria se escondia por trás de sua mãe e sobre os ombros dela, os olhos de mel da Maria espiavam o rapaz, deslisando a vista da cabeça às botas pretas e trabalhadas do estanho moço. Sem compreender a tenção das pessoas, o motoqueiro tenta olhar a garota que timidamente se escondia e ao se dirigir até ela para lhe pedir desculpas, ele é barrado por dois garotinhos albinos e estes cheios de marra contra o cavaleiro de armadura de borracha e ferro.

     Eis que chegam os demais motoqueiros naquele instante, eram uns vinte motoqueiros com toda aquela “zuada’’ infernal de motos de rali, roncos altíssimos e aos poucos iam desligando suas motos um por um. Quando finalmente o barulho acabou, um dos pilotos pergunta o motivo daquela arruaça toda e se havia ocorrido algum acidente ou algo do tipo!

Foi então que depois de alguns instantes e olhando dentro dos olhos deste que perguntou, que a professorinha novamente interrompe e fala:

- Ei, você eu acho que te conheço bem! Você não é o Pedro, filho do prefeito da cidade?

- Sim sou eu sim, e meus amigos e eu estamos fazendo uma trilha para divulgar melhor o nosso município. Eu espero que nada tenha acontecido por aqui de grave com ninguém, isto é o que não precisamos neste momento! – fala meio que com um ar de um ser pedante.

     A mãe da Maria, ao perceber que se tratava deste rapaz incômodo, logo pega pelas mãos de sua filha e leva pra dentro de casa, dizendo que estava tudo bem e que nada de ruim aconteceu ali. Dona Justa tinha um ódio tremendo daquele rapaz desde de sempre e sempre que que ela se lembra da família do Pedro ela fica mal.

    Anos atrás, Dona justa trabalhava para esta família como lavadeira e um certo dia em que ela teve de levar a Maria consigo, ela teve uma decepção na vida: - na casa grande, eram o pai e a mãe do Pedro e mais cinco irmãos maiores, o Pedro era o caçula e tinha apenas um ano a mais que Maria. Por um leve momento de descuido, Maria havia sido levada por um dos irmãos de Pedro para um dos vários quartos da casa enorme. Mas como coração de mãe é uma parte da alma de sua cria, ela logo pressentiu algum de ruim e foi em busca de sua filha por toda a casa e graças a Deus, chegou no tempo certo de evitar o pior com a Maria.

             Dona Justa ao perceber dois dos irmãos de Pedro no quarto com a Maria, entrou sem medo e pegou Maria pelo colo, levando-a dali correndo sem olhar para trás. Claro que para uma mãe, ao perceber tal cena, não podia ter pensado nada do contrário a não ser uma possível ação abusiva em sua filha.

   No dia seguinte, ela retorna à casa grande e tenta se explicar para a mãe do Pedro o que havia acontecido, para que ela não tivesse terminado a lavagem de toda a roupa da família e óbvio como o esperado, a mãe dos monstros nem a ouviu e destratando dona Justa pede para que ela saia da casa e vá embora sem ao menos pagar pelas horas perdidas do dia anterior.

     Pedro não teve nada de participação com o ato de seus irmãos, mas como mãe, dona Justa tomou um ódio terrível de toda a família e nunca mais trocou se quer um olhar com os membros da família de Pedro e assim o fez seu esposo e pai da Maria. Por anos nunca falaram com ninguém da família de Pedro e ele crescendo nunca entendera a causa do ódio de alguns membros da cidade para com sua família. Pedro era sempre pacato e seu jeito bem diferente do resto de sua família, ele buscava outros ares para se sobressair e viver sua vida.

   Morou boa parte de sua vida, longe dali e em outras cidades e países curtiu aprendeu de quase um tudo da vida, a motocross era sua paixão e levou para as dunas essa nova visão turística, mas ele se esqueceu de avisar aos ribeirinhos sobre os “monstrinhos zuadentos’’!

  

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