Capítulo 30 Ezequiel Costa Júnior O beijo dela me deixou tonto. Não pela surpresa, ou pela ousadia — mas pela sensação que explodiu em mim, como se um fio mal conectado dentro da minha cabeça tivesse dado curto-circuito e reiniciado tudo. Sua boca era macia, quente, e havia um desespero tão humano naquele gesto que por um segundo não consegui me mover. Mariana me segurou com domínio e, ao mesmo tempo, com uma inexperiência que doía. Meus dedos se fecharam involuntariamente no tecido de sua blusa, como se meu corpo quisesse gravar aquele momento antes que minha mente tentasse apagá-lo também. Mas foi rápido. Ela já havia se afastado, os olhos marejados, respirando como se tivesse corrido quilômetros só para me alcançar. — Lembra de mim, Ezequiel! Por favor! — sua voz mexeu comigo. Sua boca vermelha me hipnotizou — Você precisa lembrar! Pisquei. Senti o gosto dela nos meus lábios. Algo latejou em algum lugar. Como se... estivesse ali, mas encoberto. Embaciado. Uma silh
Capítulo 31 Ezequiel Costa Júnior Yulssef entrou com a expressão contida, o corpo tenso como se já soubesse o que eu iria perguntar. — Quem matou meu pai, Yulssef? A pergunta pairou no ar como um estalo seco. Dessa vez não hesitou. — Sidnei Bazzi. Pisquei. O nome me atingiu como uma onda gelada. Um nome comum, um rosto que minha mente não conseguia trazer à tona. — Sidnei... Seria o pai da Mariana? — minha voz saiu rouca, quase incrédula. Yulssef assentiu lentamente. — Foi ele, Don. Há provas. Escutas, testemunhas, e até confissão. Posso trazer pra você de novo, sem problemas. Matou seu pai pra roubar a clientela. Queria dominar o ramo. Era um invejoso infeliz. Quis arrancar o império das suas mãos antes mesmo de você crescer o suficiente pra protegê-lo. É por isso que você trás Mariana consigo, para fazê-la pagar. Permaneci em silêncio, sentindo um nó se formar na base do estômago. Uma parte de mim se encolheu. A outra... endureceu. — Tem certeza?
Capítulo 32 Mariana Bazzi Assim que Ezequiel passou pela porta com o terno alinhado e o olhar de aço, eu senti uma onda de pânico me atravessar o peito. Mas não foi ele o gatilho. Foi o outro. O homem encostado na parede, sorrindo como quem já sabia o final da história. O Consigliere. Yulssef. Aquele olhar... Eu conhecia aquele olhar. Não era lealdade. Era cálculo, era traição. Assim que a porta fechou, me virei para a doutora Samira com urgência na voz. — Ele vai matar o Don — soltei, com as mãos trêmulas. — O Consigliere. Ele tá planejando alguma coisa. Vai matar o Ezequiel. Samira franziu a testa, surpresa com minha afirmação. — Mariana, calma. Você está impressionada. O Yulssef tem sido cauteloso, tem feito tudo certo. Até agora, ele não representou nenhuma ameaça. — Não, doutora. Eu conheço esse tipo. Eu vi aquilo nos olhos dele. O mesmo brilho que vi no meu pai antes de me entregar. O mesmo silêncio antes da emboscada com os poloneses. É traição.
Capítulo 33 Mariana Bazzi O carro parecia um touro nervoso nas mãos da doutora Samira. A cada curva errada, a cada freada brusca, eu me agarrava ao painel como se ele fosse me salvar da morte. E ainda assim, nada disso era mais assustador do que o que nos esperava no final da estrada. — Eu nunca dirigi à noite nessa estrada — murmurou ela, estreitando os olhos para o asfalto irregular. — E, honestamente, esse farol está meio... oblíquo? — Você não devia dizer isso em voz alta — respondi entre os dentes. — E, por favor, se alguém olhar demais, diminui. Vai devagar, discreta. Lembra? — Eu sou clínica e terapeuta Mariana, não agente secreta — rebateu, mas logo soltou um suspiro tenso. — Mas... certo. Vou tentar — sorriu pra mim. As mãos dela tremiam no volante, mas não tanto quanto as minhas. Eu mantinha os olhos grudados no retrovisor, como se fosse capaz de detectar a ameaça antes que ela surgisse. O carro escorregava sutilmente na lama à beira da estrada, mas o farol,
Capítulo 34 Mariana Bazzi A sala caiu em um silêncio pesado. Até a música lá fora parecia abafada, como se o mundo esperasse a resposta dele tanto quanto eu. Ezequiel não se moveu. Não afastou as mulheres. Não soltou o copo. Nem se deu ao trabalho de se levantar. Apenas me encarou, olhos semicerrados, o tom arrastado de quem tinha bebido mais do que devia — ou fingia muito bem. — Você não tinha autorização pra sair — disse ele, a voz cortante, fria como gelo recém tirado do balde de uísque — É minha prisioneira, porra! Eu estremeci, mas não retrocedi. — Você tá falando sério? — Prefere voltar pra casa... — ele continuou, passando a mão distraidamente no braço da garota sentada à esquerda, que sorriu como uma idiota — ...ou quer que um dos meus homens te carregue de volta e te tranque no quarto até eu chegar? Meu coração desceu até o estômago. — Tenta — desafiei, sem nem saber de onde tirei força. — Mas vai precisar de mais que um deles pra conseguir. Minha
Capítulo 35 Ezequiel Costa Júnior Meu sangue fervia nas veias. Isso não pode ser possível... — Porque veio até aqui? Por que veio, porra!? — perguntei furioso enquanto arrastava Mariana até o portão de saída. — Me solta! Eu vou onde quiser! — ousou me provocar. A puxei e vi a porra da mulher que se diz "doutora" dela, atrás. Quando chegamos no estacionamento, eu fiquei enlouquecido. — Vá pra puta que pariu, Samira! No meu carro você não entra! — Mas e a Mariana? Como... — Volte como veio. Desaparece! — dei as costas a ela, bati com a porta e entrei no carro, pisando fundo, cantando pneu. Enquanto a imagem da tal médica sumia das minhas vistas e os malditos filhos da puta, paravam de olhar pra Mariana. O carro rugia enquanto eu pisava fundo no acelerador, como se a velocidade pudesse calar o caos que tomava conta da minha cabeça. Mariana sentada ao meu lado, tensa, respirando rápido, mas sem dizer uma palavra. Eu queria gritar. Queria explodir. Queria que
Capítulo 36 Ezequiel Costa Júnior Aquele sorrisinho maroto no canto da boca dela... foi como uma vitória. Mas uma vitória diferente. A porra da confiança que essa mulher me exige de um jeito que ninguém jamais ousou, me enlouquece. Encostei meu corpo de leve no dela, só pra sentir se ela recuava. Não recuou. A pele quente, os olhos desafiadores. Mariana é um misto de força e fragilidade que me desmonta por dentro. E ela sabe disso. — Isso parece interessante. O que quer, bonequinha? — perguntei de novo, com a voz mais baixa, quase num sussurro, como se nossas respirações tivessem criado uma bolha onde só nós dois existíamos. Ela me olhou firme, sem medo, sem hesitação. — Quero que pare de ouvir o Consigliere. Quero que me dê um voto de confiança. Você me quer, Ezequiel? Então cada vez que me ouvir, que confiar em mim... eu vou deixar você se aproximar. Vou me esforçar. Aquilo me pegou de surpresa. — E isso inclui o quê exatamente? — aproximei meu rosto do dela, a b
Capítulo 37 Ezequiel Costa Júnior Peguei o celular antes de entrar no carro. Mandei uma mensagem rápida para um dos meus homens mais afastados de Yulssef. Um cara de confiança, que eu sabia que não tinha rabo preso nem medo de contrariar ordens. "Preciso das imagens do bordel. Agora. Sem comentar com ninguém." Olhei de soslaio para Mariana, que já se ajeitava no banco do passageiro. Dei a partida. A estrada vazia se estendia na frente e no meio do caminho, não resisti. Estiquei a mão até a coxa dela, de leve, querendo senti-la. Mariana respirou fundo, meio trêmula. Quase imperceptível... mas eu percebi. Tirei a mão de lá pra depois não surtar, também não queria invadir o espaço dela, ainda mais depois do que ela me contou. Mas, pra minha surpresa, ela mesma pegou minha mão no ar, devagar, e colocou de volta sobre a dela, na coxa. Segurou firme. Como se dissesse que estava tudo bem. Caralho! Só se for pra ela. Como uma mulher não sabe que sentir a coxa é o início para