Fomos para a casa do meu avô. A família estava na sala de visitas, apreensiva. Titio me abraçou quando cheguei perto de Ha-Jun. Mantive a calma, pelo menos na frente dele. Consegui conter as lágrimas e ordenei às minhas pernas para que parassem de tremer enquanto conversamos.— Já foram contratados mais seguranças? — questionou o vovô.— Sim, pai, e a polícia já está à procura dela — respondeu titio, segurando um pendrive.— Estas imagens mostram como ela escapou da prisão? — perguntei.— Embora as cenas não estejam claramente descritas, é possível dizer que ela pegou as roupas da detenta da biblioteca, permitindo-lhe circular com mais liberdade pelo presídio. Durante a noite, quando era hora de fechar, ela se escondeu em um contêiner de roupas sujas levado para a lavanderia.— A ausência da bibliotecária não foi notada? — Young-Chul quase gritou.— Ela também cuidou disso. Colocou travesseiros por baixo das cobertas na cama dela, simulando que alguém dormia. No dia seguinte, eles enc
A polícia havia instruído minha tia sobre como lançar mensagens nas redes sociais, uma informação que rapidamente se espalhava como fogo em campo seco. O plano meticulosamente planejado estava começando a ganhar vida, as peças se encaixando com precisão. As redes sociais, uma força que moldava o mundo contemporâneo, serviam como um portal tanto para a bondade quanto para a maldade.Enquanto encarava Young-Chul diante das câmeras, um turbilhão de emoções me envolvia. Era difícil acreditar que tudo aquilo estava acontecendo, que estávamos arriscando tanto para alcançar a justiça e a verdade. O cenário ao redor parecia embaçado, as luzes do clube diminuindo de intensidade em comparação com o brilho intenso que eu via em seus olhos.Eu ainda estava inconformada com o dinheiro que seria gasto para forjar uma festa de noivado. Apesar do número reduzido de convidados, a maioria sendo policiais e agentes à paisana, o restaurante do clube foi fechado para o suposto evento. O chef, que nos cont
Após mais um julgamento, a mulher perturbada que havia se passado pela ex-namorada de Young-Chul foi transferida para um presídio de segurança máxima, sob medidas reforçadas de segurança e supervisão psiquiátrica por profissionais do sistema judiciário. Enquanto o sistema judicial seguia seu curso, a vida continuava a trilhar seu caminho. Enquanto eu me dedicava aos meus pacientes no hospital, Young-Chul estava imerso na gravação de seu mais recente álbum, aguardando ansiosamente por um momento especial: o dia em que eu finalmente recuperaria mais uma lembrança, marcando o passo decisivo para o nosso casamento.Simultaneamente, eu ansiava pela chegada do evento cultural das Américas. Apesar da impossibilidade das minhas amigas comparecerem, meu tio havia adquirido o camarote mais privilegiado para mim. Esses camarotes eram designados como "locais de honra".No entorno do local, diversas barracas ofereciam iguarias típicas, enquanto no auditório interno aconteceriam performances de dan
Young-ChulPavilhão culturalAinda me sentindo um tanto deslocado diante dessa cultura tão distinta, não pude evitar estranhar os gestos afetuosos entre Min-Ji e suas amigas. Havia pouco mais de um mês, Ye-Jun me contou sobre a surpresa que estava preparando para a minha amada. As amigas dela tinham mentido, alegando que não poderiam vir à Coreia, enquanto secretamente se preparavam para o show brasileiro na Conferência das Nações.As duas amigas tinham uma beleza notável, uma morena e a outra negra, ostentando corpos tipicamente brasileiros, traços que Min-Ji herdou de sua mãe. Com sorrisos contagiantes, elas conquistaram a todos, em especial Lorena, que fez o chef do restaurante, nosso convidado para celebrar o Brasil, ficar hipnotizado, seus olhos grudados nela como se fosse um encanto irresistível.— Chef parece hipnotizado — comentei, divertindo-me com a cena — Será que seu coração está batendo mais forte?— Apenas a achei bela. Nosso padrão de beleza difere bastante do de vocês.
Finalmente, aquilo se tornara uma realidade. O salão estava repleto de convidados, todos ansiosos pela entrada da noiva pela nave central. Vestido impecavelmente em um smoking, Young-Chul irradiava felicidade enquanto sorria para todos. Eu aguardava na lateral, pronta para caminhar. Tínhamos atravessado tantos dias de alegria, mas também enfrentado momentos de tristeza, e agora estávamos ali para celebrar o ápice do nosso amor.Vestidas com trajes azul-celeste, minhas amigas seguravam delicados buquês de flores-do-campo. Após terem participado do espetáculo cultural na Coreia do Sul, elas haviam permanecido no país por quinze dias antes de retornar ao Brasil. Lorena, que havia encontrado o amor no Chef, empolgou-se com a ideia de obter um visto de trabalho e vir trabalhar comigo no hospital. Já Ângela tinha uma ligação profunda com o Brasil e alguém a esperava lá, e ela optou por voltar definitivamente.Com o casamento programado para ocorrer em seis meses, Lorena decidiu permanecer n
Segundo motivo: As datas foram escolhidas meticulosamente, marcando a cerimônia para quinze dias antes do Carnaval. Com isso, consegui comprar um camarote para a família assistir aos desfiles das escolas de samba, além de ingressos para o ensaio da Portela.Terceiro motivo: Era a chance de apresentar a pequena Lili, o xodó mais recente da família Kang, ao país onde sua mãe nascera e onde o avô construíra uma vida com a mulher que ele sempre amara até o fim.Desembarcamos dois dias antes e partimos diretamente para Búzios. Alugamos uma casa em um condomínio fechado, o mesmo local onde, de frente para o mar, minha melhor amiga se tornaria a senhora Camargo. Eu e Young-Chu seríamos os padrinhos, enquanto a pequena Lili, acompanhada de Ângela, traria as alianças.O altar, montado pela manhã, estava simplesmente deslumbrante. Flores rosas e madeira compunham um cenário encantador. As cadeiras, enfeitadas com fitas douradas e arranjos de flores do campo em tons de branco e rosa, conferiam u
INTRODUÇÃOO brilho das lantejoulas prateadas no meu vestido refletia no espelho do quarto. A limusine já aguardava para me levar ao Dolby Theatre. Ao ser indicada para um prêmio da Academia de Cinema de Hollywood como melhor atriz coadjuvante, aos 21 anos, tive a chance de vivenciar o universo artístico que escolhi, onde brilhava como a estrela mais radiante do céu. No entanto, esse sonho me trouxe à tona uma realidade sombria e deteriorada que se escondia por trás das cortinas e das câmeras.Sendo assim, mesmo após estar devidamente trajada, abandonei o deslumbrante conjunto de brilho. Aproveitando que Jack, meu parceiro e também ator, já havia seguido para a cerimônia antes de mim, dei seguimento ao plano de fuga que elaborara.Deslizei a mala, que já estava pronta, para fora debaixo da cama. Coloquei uma peruca preta e lisa e recolhi os documentos falsificados que havia obtido no mercado clandestino. Adotei a identidade de Lily, deixando para trás o nome Sara Jim. Em menos de meia
Sentei-me com uma taça de vinho na mão e aguardei o anúncio da categoria de melhor ator. Jack era o favorito. Apesar de não acompanhar sua carreira, enquanto estive no calçadão, li a respeito. Quando ele subiu ao palco como o grande vencedor da noite e agradeceu ao público, percebi que nunca o havia esquecido, nem por um momento. Deixá-lo foi a decisão mais difícil da minha vida. Não me arrependi da escolha. Na época, forcei-me a acreditar que ele não me amava o suficiente para notar o que acontecia nos bastidores e debaixo do próprio nariz dele. Tentei relaxar tomando a garrafa de vinho e deitei logo após a saída de Jack do palco. Deitei-me exausta, mas lembranças do passado surgiam e desapareciam. Fragmentos de um passado distante. Lembro que, após vislumbrar seu rosto na minha memória, as últimas palavras que sussurrei antes de adormecer foram: “Hoje sou Lily, médica, cirurgiã neurológica.”***Acordei com Candance fazendo barulho na cozinha. Ela alugava o apartamento número dois