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A Chegada ao Hospital

Sentimentos de culpas, e ele ouve um gemido bem fraco vindo daquele ser angelical. Ele se abaixa, leva seu ouvido bem perto dos lábios daquela jovem que o encantara tanto e, ao se aproximar de sua boca, sente a sua respiração tão fraca e ofegante, então ele percebe que ainda existe uma chance para ela; acredita que ainda há um sopro de vida; e agora toda aquela tristeza que ele sentia em seu coração, naquele instante, dá lugar à esperança e à vontade de tentar a todo custo salvá-la, dando assim a seu próprio coração a alegria e a esperança de ver aquela que já era dona de seu coração viva novamente.

Então ele a pega em seus braços com todo carinho, a coloca deitada no banco de trás de seu carro, e sai em disparada em busca de encontrar socorro urgente, onde ela possa ser socorrida, um hospital ou um posto médico! John está dirigindo tão rápido quanto um piloto de Fórmula 1 que está prestes a cruzar a linha de chegada. Agora sabe que tem muitos sentimentos em jogo e que ele tem nas mãos aquela que pode ser a segunda chance que o Ser Maior lhe deu, Aquele que tudo vê e que tudo sabe, a chance de salvar a vida da mulher que ele ama. Parece até muito precipitado dizer que ele a ama, mas, quando John descobriu o rosto dela, tomou um grande susto, pois viu em sua face algo idêntico que nunca o fez esquecer o rosto de sua amada, Elizabeth. Isso fez seu coração bater tão forte, tanto quanto o coração de um adolescente que acabara de ganhar o seu primeiro beijo. Apaixonado, foi isso que o fez estremecer; tanto que John dividia a sua atenção entre dirigir o carro na estrada escura e olhar com admiração aquela bela mulher que naquele momento estava dependendo dele para viver; ou seria o contrário: ele dependesse dela para sua vida continuar. Nisso ele viu um clarão quase à sua frente. Eram as luzes da cidade da qual se aproximava, então ouviu a respiração fraca dela e disse: 

─ Logo estaremos no hospital! Ele fala para aquela a quem ele não gostaria de perder pela segunda vez. John vê a sua frente uma placa que diz “sejam bem-vindos a Novo Paraíso”. A placa indica que eles estão entrando nos limites da pequena cidade; nessa ocasião, John está com o velocímetro do carro a quase 100 quilômetros por hora, então entra na pequena cidade tão veloz que é pego pelo radar de velocidade do policial que está à campana, disparando o sinal de alerta de velocidade. O guarda de trânsito até ficou espantado, pois isso não é fato comum de se ver: um carro correndo a tanta velocidade, por ser uma cidade pequena e também por não ter tantos veículos; o limite de velocidade obrigatório não ultrapassa os meros 30 quilômetros por hora, e aquele veículo parece até estar sendo pilotado por um piloto de corrida de Fórmula 1. Essa era com certeza a oportunidade do soldado de polícia e trânsito, soldado Bernardino, um dos três policiais e que também atuam como guardas de trânsito da cidade. Por ser uma pequena cidade do interior, havia um índice muito baixo de delitos e acidentes de trânsito! Novo Paraíso tem apenas três policiais, que atuam também como policiais militares e guardas de trânsito; agora com essa ocorrência era possível usar o seu talão de multas, que por tanto tempo estava sem utilização, cheio de poeira; ligando a sirene de sua viatura, o policial e guarda de trânsito Bernardino saiu imediatamente atrás daquele carro veloz; ele não poderia perder essa chance por nada, afinal de contas, depois de ele alcançar aquele carro e de verificar todos os documentos daquele motorista louco, quantas outras infrações ele poderia encontrar! Seria a chance de uma vida para aquele policial, a de poder utilizar seu talão de multas que nunca era usado, afinal o índice de criminalidade naquela região é extremamente baixo; já seria muito bom até quem sabe prender o carro e levá-lo para o pátio da delegacia, que normalmente está sempre vazio.

John ouve o som da sirene da viatura, e até olha pelo retrovisor de seu carro, porém nem pensa em parar; olha novamente, vê a viatura e o policial que o está perseguindo, mas nem por um segundo ele cogita a possibilidade de parar o carro. O policial militar acelera o carro e se aproxima do veículo de John; dá até para John ver o rosto sério e zangado do policial Bernardino. Gesticulando com as mãos, ele diz que John diminua a velocidade e pare o veículo – essa não é uma opção aceitável para John Kenny naquele momento, parar o carro: ele tem uma passageira muito preciosa a bordo de seu automóvel. E, após mais uma das muitas curvas por que ele havia passado, enfim vê a placa com o nome do hospital: Pronto-socorro de Novo Paraíso. Esse que é o destino final que ele estava procurando, e John pisa rapidamente o pedal do freio! Cantando pneu e parando o carro por sobre o meio-fio do estacionamento, essa é mais uma das muitas infrações para o enfurecido policial Bernardino multá-lo. John Kenny sai de seu carro acenando e pedindo por socorro aos atendentes do hospital; já o policial Bernardino sai de sua viatura já com arma em punho e dando voz de prisão a John Kenny, o qual tem como único pensamento salvar a vida de sua amada, mas o policial Bernardino, sem nada saber do acontecido e enfurecido por não ter sido respeitada a sua ordem dada para parar o carro, coloca John Kenny contra a porta de seu próprio veículo dando-lhe voz de prisão, mas John neste momento só falava da mulher que estava no banco de trás de seu carro, alertava o policial e apontava com as mãos em sua direção, e insistia que ela estaria precisando de atendimentos médicos. Quando o soldado Bernardino vai pôr-lhe as algemas, observa e vê dentro do carro que realmente há alguém no banco de trás do veículo de seu agora prisioneiro, então soldado o militar pergunta:

─ Quem está ali no banco de trás do carro? John responde:

─ Essa é a pessoa que eu encontrei na estrada. E é só por isso que eu estou aqui, para tentar salvá-la; por isso eu estava correndo tanto.

O policial retirou as algemas e disse:

 ─ Filho! Depois conversaremos; no momento cuidaremos desta moça, mas depois quero falar com você na delegacia! Não saia da cidade antes de falar comigo, ok?

 ─ Sim, senhor policial! Disse John Kenny enquanto abria a porta do passageiro de seu carro, pegando a sua amada nos braços; ele entra no hospital já com o policial Bernardino fazendo sua escolta pessoal, atitude essa que é rara de se ver, até porque esse tipo de ocorrência é um tanto raro nesse lugar, causando com isso uma confusão geral no corredor de entrada do hospital! Todo esse reboliço acabou por chamar a atenção do único médico de plantão no hospital naquele horário, o doutor Osmar Monteiro, que sai da sua sala de atendimentos para saber o que está acontecendo na recepção do hospital e o porquê de toda essa confusão.

Ao chegar até a recepção, o médico depara com uma cena inusitada: um rapaz moreno claro, 1,75m de altura, cabelos castanhos, porte físico atlético, segurando em seus braços uma mulher que aparentemente está inconsciente; e ele com a mulher em seus braços desesperado, pedindo por atendimento médico urgente, sem que os atendentes de plantão lhe deem a atenção necessária. Vendo aquela cena, imediatamente o doutor Osmar manda que tragam uma maca para pôr a moça que estava ali para que se possam fazer os procedimentos iniciais, logo os enfermeiros chegam com a maca solicitada pelo médico, então pegam a moça dos braços de John e a deitam nela, e entram com ela no setor de emergência do hospital. John ainda tenta acompanhá-los, mas é impedido de entrar, já que aquele setor é restrito somente a funcionários do hospital, então o segurança do hospital diz a John que vá até o balcão de atendimento e faça o registro da paciente que ele trouxe. O guarda que faz a segurança no corredor de entrada do hospital é um homem bem forte e sério; raramente esboça um sorriso, controlando a entrada e a saída de pacientes e visitantes. John se dirige então até o balcão de atendimento, onde deverá fazer o registro de entrada da sua paciente.

Chegando lá, ele encontra Karla, a recepcionista que está de plantão, uma garota muito divertida, mas ela não está tendo um bom dia de trabalho, pois nessa ocasião ela terá de dobrar seu turno laboral, visto que a funcionária que fica no turno da noite não apareceu para trabalhar, o que a deixou bastante irritada. John chega ao balcão de atendimento; logo vê a sua cara de poucos amigos e diz:

─ Oi! Boa noite!

Karla é uma mulher de trinta e cinco anos, morena, de longos cabelos negros e cacheados, olhos castanho-claros, pele macia, grandes e belos seios. Quando olha e vê John, paralisa o seu olhar e o fita de cima a baixo, levantando as sobrancelhas finas e negras, dizendo-lhe:

 ─ Como posso ajudá-lo, meu anjo? John responde:

 ─ Boa noite! Mandaram-me aqui para fazer uma ficha de atendimento! Karla pega o fichário de atendimento. Seu semblante mostra que ela não está muito feliz nessa hora, mas seu olhar em direção a John diz outra coisa. Karla pediu então a identificação do paciente! John ainda está um pouco confuso com tudo aquilo que aconteceu. Ele sabe que a pessoa em questão não tinha qualquer documento em seu poder no momento em que a encontrou. John então resolve fazer de conta que ele não sabe nada sobre ela, embora em seu coração ele já saiba quem ela é de verdade, tendo que esconder a identidade dela por não poder provar quem ela é, então diz:

─ Querida, eu não tenho os documentos da paciente! Realmente não a conheço; apenas a encontrei e a trouxe até aqui!

─ Preciso de algum documento ou pelo menos o nome da paciente para poder fazer o registro de entrada no hospital, disse Karla.

─ Eu também não sei o nome dela, diz John.

─ Assim fica difícil, meu querido! Ela tem que ter um nome.

 ─ É verdade, moça. Eu não a conheço; vinha passando por aquela estrada e de repente vi à minha frente essa moça ali, caída. Parei e prestei socorro a ela. Acho que você ou qualquer pessoa faria isso também, certo? Karla o olha bem nos olhos, enquanto mastiga uma goma de mascar, como se duvidasse de sua história e diz:

─ Me diz ao menos um nome, o qual eu possa colocar na ficha dela! 

Então John teve a ideia de pôr o nome de sua ex-mulher nela, assim seria mais fácil para ele lembrar quando de novo precisasse.

─ Elizabeth! Seu nome é Elizabeth!

─ Huuum! Lembrou foi, esquecidinho?! Exclamou Karla, com um ar de desconfiança, e o liberou logo em seguida de sua angustiante presença, então John se dirigiu à sala de espera, sem ter uma única notícia sobre sua amada, o que lhe deixava ainda mais preocupado, a ponto de ficar a andar de um canto a outro da sala incansavelmente, então, em meio à sua espera agonizante, uma notícia o trouxe de volta à sua realidade: o médico de plantão, doutor Osmar, quebrou o silêncio de seus pensamentos, chegando para acalmar o seu coração:

─ Olá! Quem é o responsável pela paciente, a senhorita Elizabeth? John logo responde:

─ Como ela está, doutor?

 ─ Bem! Muito bem! Foram feitos alguns procedimentos na paciente, mas nada de grave foi detectado; aparentemente essa moça está apenas dormindo, como se ela estivesse em um sono profundo; só dormindo; não há nenhum trauma nem escoriações. Você disse na ficha dela que ela havia sofrido um acidente? Pergunta o médico.

 ─ Não? Pergunta John.

─ Não? Não tem nada de errado com ela; ela está muito bem, no meu entender; e como médico eu digo a você que essa moça está em uma espécie de sono profundo; é como se ela estivesse hibernando como fazem os ursos. Mas, para deixá-lo tranquilizado, ela ficará em observação; pela manhã, quando ela acordar, saberei mais a seu respeito. Por hora, é isso. E o médico volta para a sua sala.

─ Tudo bem para você? Pergunta o segurança do hospital.

─ Sim. Tudo bem sim, senhor – responde John.

─ O senhor pode ir para sua casa dormir um pouco e pode voltar pela manhã!  Mas o horário de visita é somente às 16h, diz a atendente.

 ─ Tudo bem! Eu vou embora sim.

Enquanto sai pela porta, já estando lá fora, John pensa onde iria passar o resto da noite, pois estava a quilômetros longe de sua casa. Já era madrugada, tarde demais para encontrar uma pensão onde ele pudesse ficar; só lhe restava mesmo o banco de seu carro para dormir, e isso foi o que ele fez, afinal de contas seriam somente algumas horas, e logo o novo dia daria o ar de sua graça. John se arrumou no banco de seu carro, deitou-se e olhou para o teto do carro, enquanto pensava no que o médico lhe falou: “Ela está somente dormindo”. Mas como ela está só dormindo? Para isso ser verdade ela tem que ter o sono muito pesado para não acordar com tantos movimentos que foram feitos com seu corpo – pensa John. Até que em um piscar de olhos ele adormeceu entregando-se ao mundo dos sonhos. Também devido ao cansaço do dia se entrega a um sono profundo e acolhedor, pelo resto da noite que ainda havia, o que não demorou em nada para acabar e logo amanhecer. Os primeiros raios de sol da manhã atravessavam o vidro da janela de seu carro despertando-o, mas o que ele nem imaginava aconteceu durante a noite, pois, enquanto ele dormia, sua amada Elizabeth despertou de seu sono e, mesmo com pouco equilíbrio e segurando-se pelas paredes, fugiu do hospital sem deixar rastros, afinal ela era uma pessoa desconhecida aos olhos das pessoas que ali estavam. E, como ela estava inconsciente quando John a encontrou, não lembrava nada dele. Ele só tomara conhecimento do acontecido às 16h, ao ir visitá-la no hospital. No momento ele está acordando e nem desconfia que sua amada não se encontre mais no lugar onde ele a deixou. Ela acordou e saiu sem saber que alguém esperava o seu despertar.

John acordou em seu carro ainda cansado. Foi uma noite muito conturbada, cheia de emoções fortes, e no final de tudo ainda teve que dormir no banco de seu carro. Isso deixaria qualquer ser humano exausto. O cansaço era grande, mas a vontade de vê-la era ainda maior; ele sabe que só poderá entrar no hospital após as 16h, por isso ele tem que se manter calmo até lá. Sabe ele que isso não será fácil; ter que esperar até à tarde para vê-la. Como falou o médico do hospital, ele ainda não sabe quanto tempo ela vai ter que ficar internada naquele hospital, por esse motivo ele tem que encontrar um lugar onde possa ficar mais algum tempo se for necessário, um lugar com uma boa cama para dormir e um banheiro para tomar aquele merecido banho, e então poder descansar o seu corpo cansado. Ele sabe que não poderá ir a lugar algum naquele momento; não sem saber como Elizabeth está; ele não pretende perdê-la de vista novamente; até chegou a sonhar que estava com ela, e até ensaiou em sua mente algumas conversas que poderia ter com ela no momento em que a encontrasse de novo. Quem sabe até tentar uma aproximação com seu amor, Elizabeth!

John se hospedou em uma pensão, tomou o seu tão desejado banho; já se passavam das 12h; ele saiu em busca de um restaurante, um lugar para comer uma boa refeição. O garçom lhe mostrou o cardápio e sugeriu o prato do dia – carne assada de panela, feijão, arroz branco, macarrão, batatas fritas e salada – tudo acompanhado de um delicioso copo de suco de acerola. E John aceitou a sua sugestão; logo após o almoço, John saiu em direção ao hospital. Ainda não estava na hora de visita, contudo ele não estava disposto a esperar por tanto tempo e preferiu esperar as horas restantes se passarem lá mesmo, no hospital; não estava suportando esperar tanto tempo assim até ter notícia da pessoa que ele acredita conhecer, afinal, desde que John a encontrou, ele é assombrado por muitas lembranças de seu passado; o súbito aparecimento daquela pessoa em seu caminho só aumentou e avivou as suas lembranças ainda mais em sua mente. A imagem daquela mulher vive em suas lembranças e em seus sonhos, e é difícil para John entender tudo isso, afinal ele enterrou sua esposa em uma sepultura; estiveram lá alguns de seus amigos mais íntimos, e ele não poderia estar louco, pois a viu morrer, e agora essa mulher surgiu do nada, com um rosto parecidíssimo com o de sua mulher; seu corpo, seus cabelos, tudo parecia com ela. Ele precisa saber quem realmente é aquela mulher, a mulher a quem ele hipoteticamente salvou, então sai caminhando em direção ao hospital, a passos rápidos pelas ruas, mostrando sua total ansiedade e sua preocupação em saber tudo o que ele não está entendendo e descobrir quem é aquela mulher que o encanta, sua suposta amada Elizabeth. Embora ele saiba da grande semelhança entre elas, ele terá que tratá-la como uma desconhecida até descobrir o que está acontecendo de verdade. Ele sempre se agarrou à esperança de que tudo aquilo não tivesse acontecido, de que tudo o que aconteceu não se passasse apenas de um triste sonho, e que a qualquer momento ele fosse acordar daquele sonho terrível e tudo voltasse a ser normal como era antes, mas infelizmente nada disso aconteceu naquele dia. Ela não despertou, e ele viveu todo esse tempo com suas lembranças, mas agora de repente ele encontra alguém que é simplesmente a cópia fiel de sua amada. Parece tanto que ele chegou a pensar na possibilidade de ser ela mesma, todavia a dúvida que paira em sua mente é se ela poderia ser realmente aquela mesma mulher a quem ele encontrou naquela noite na estrada. Na ocasião em que ele a encontrou, ela estava inconsciente, então ela poderá não lembrar-se dele, afinal ela estava sem sentidos, ele sabe que ela não se lembrará de nada do que aconteceu na estrada pelo menos a partir do encontro deles dois naquele lugar. Todos esses pensamentos passavam pela mente de John.

Enquanto ele caminhava pelas ruas em direção ao hospital, com seu rosto sério e sereno, passava por outras pessoas, para quem era um completo estranho naquele lugar. Elas não o conheciam e nunca o tinham visto por ali; algumas poucas pessoas o cumprimentavam. Em sua caminhada, ele carrega consigo todas as dúvidas e certezas que alguém pode ter! Certezas de que ela é muito especial para ele; John também alimenta um sentimento profundo em seu coração de que ela venha a ser aquela a quem tanto deseja, pois a ama tanto, mesmo sem saber quem ela é realmente, por dentro, ou seja, no coração, mas ele também sabe que ela pode não o reconhecer, muito menos lembrar o que ele fez por ela; não que ele estivesse buscando gratidão; não é isso que ele busca neste momento, mas sim acalentar seu coração com o amor de sua vida. Ele caminha pelas ruas, sente o suor escorrer pelo seu rosto; o sol está quente; já se passara das 14h30min; o tempo está calmo, sem um sopro de vento, pois já é verão, e o termômetro marca 40º à sombra durante o dia; só as noites são frias como o gelo. Ele caminha a passos longos e firmes, e as pessoas o observam passar; ele olha e vê pessoas conversando em frente às suas casas. Enquanto caminha, vê crianças que brincam sob a sombra das árvores de suas casas. Ele sente como se a cada passo que dá para frente ganhasse dois a mais para caminhar, dando a impressão de ficar mais e mais distante o seu destino. É como se ele estivesse andando em círculo, de forma que o caminho, em vez de diminuir, se alongasse mais e mais.

Já é quase a hora de visita, e se aproxima o momento tão esperado por ele, a hora de novamente reencontrar aquela que não sai de sua mente, e a hora de saber como ela está, e quem sabe dela mesma ouvir as palavras saindo de sua própria boca; ele perguntando a ela Como é o seu nome?, Onde mora?; aproxima-se a hora de olhar dentro de seus olhos e tentar encontrar as respostas que ele tanto deseja saber. As horas se aproximam, mas ainda falta um pouco para chegar o momento certo; os minutos demoram a passar, e ele anseia por esse encontro, o momento em que ele poderá ficar bem perto dela, o momento em que ele vai poder descobrir tudo a seu respeito, e acalmar o seu coração. Ele olha para o relógio na parede; agora já são 15h26min, mas ainda restam 34 minutos. Essas horas passam tão devagar que os minutos que ainda faltam são quase que uma eternidade para quem espera por uma nova chance de viver, de renovar a sua alegria e ser feliz. Ele sabe que terá que suportar toda essa espera, pois agora já está mais perto do que já esteve antes. Um grande vazio que o atormentava, a dor e a tristeza que caminhavam com ele incansavelmente por anos agora se transformam em um sentimento que ele não sentia há muito tempo, mas que agora está sentindo, minando suas forças, tirando dele toda a sua razão, fazendo que ele aja apenas com o coração, como se algo faltasse em seu coração; um sentimento que só se pode comparar igual a perder alguém de muita importância na vida, alguém que se ama tanto, como seu amor perdido, e seu coração anseia por notícias, sofre calado; ninguém pode sentir ou imaginar sua dor; por fora ele está firme e forte e aparenta estar bem, mas por dentro a dor, a tristeza, a angústia e a incerteza o maltratam por causa de um amor que no momento só existe em seu coração. Esses sentimentos o esmagam de dentro para fora, fazendo John entrar em sua realidade, a realidade que antecede aquele momento, e ele se põe a pensar que só um dos lados desse coração está cheio de amor: o dele mesmo que a viu, que a ama perdidamente; já a outra parte, que é o dela, talvez não. Ele não tem tanta certeza se está em sintonia com o seu amor, pois ela não o viu, já que se encontrava adormecida na ocasião do encontro, inconsciente. Ele nem sabe se ela é realmente quem ele pensa que seja. E se for? Ainda sentirá o mesmo amor que sentiu? O mesmo que eles sentiram? Ele sabe que talvez tenha que conquistá-la novamente, se ela não se lembrar mais dele, só assim poderão ser preenchidas as duas partes desse coração com muito amor, completando-se assim um ao outro, e então seus corações poderiam se tornar um só e viver esse sentimento mágico que é o amor, tornando-se esse o seu maior desafio: conquistar o coração de quem tudo indica que, um dia, já foi seu – esse amor que ele tanto deseja. Esse é o desafio que ele irá encarar para ser feliz.

Em sua chegada ao hospital, John se vê em meio a um dilema: esperar até o momento determinado pela direção do hospital para sua entrada ou tentar mudar esse momento, antecipando sua entrada, sua visita e pôr fim a essa aflição, e ele acaba não resistindo em esperar ainda mais e se aproxima do balcão de informações. Do outro lado, uma mulher de estatura mediana, cabelos loiros desbotados, já quase voltando a sua cor original, preto; seu corpo cheio de saliências que chegam a escapar pelo decote de sua blusa, devido ao sobrepeso com que ela está, o que denuncia a sua falta de cuidados pelos muitos anos consumindo alimentos à base de frituras e gorduras e o frequente abuso de refrigerantes, ingeridos durante e após as suas refeições. Seu corpo não é mais tão atraente como no passado, quando Lívia ainda era a mocinha, a mais cobiçada dentre as outras amigas pelos rapazes da rua onde morava. Agora, a poucos dias de completar seus trinta e nove anos, ainda solteira, vive com sua mãe em uma pequena casa, na periferia da cidade. Ela ainda sonha com o dia em que o seu príncipe encantado irá aparecer e, como em um conto de fadas, a levará para morar com ele em seu castelo encantado. Lívia, sempre alegre, nunca perdeu a esperança nem deixa passar a oportunidade de testar seu charme com os homens bonitões e bem apresentáveis que por ali passam e aguardam por informações sobre os pacientes, pois têm que falar com ela e, se são um bom partido, esse é o momento para ela investir em seus sonhos dourados – alguns diriam que esse hábito de Lívia seria uma falta de ética, mas ela não liga para essa filosofia moral quando se trata de preencher o seu coração tão carente de amor; o que ela quer mesmo é ser feliz, e as informações sobre os pacientes só ela pode fornecer. John passa pela porta de entrada do hospital, se aproxima do balcão da recepção, sobre o qual põe os braços, e diz:

─ Por favor, gostaria de saber informações sobre uma paciente que está internada aqui. Eu a trouxe para cá ontem à noite! Lívia ouviu aquela voz que ela ainda não havia ouvido por ali, levantou a cabeça lentamente; estava um pouco ocupada naquele momento, fazendo o que mais gosta de fazer para passar o tempo: palavras cruzadas. Sempre que ela não tem nada para fazer, costuma preencher os quadradinhos do livreto só para passar o tempo. Levantando a cabeça, deu uma boa olhada naquele rapaz bonitão de quase um metro e oitenta cinco de altura, cabelos castanhos, barba ruiva ainda por fazer, pele morena, olhos verdes. Ela olhou e suspirou por alguns segundos antes de lhe responder, chegando até a imaginar coisas enquanto ele lhe fazia as perguntas. Lívia suspirou mais uma vez para ele e então disse somente em seus pensamentos: “Bem que ele poderia me levar daqui com ele agora, e eu nem perguntaria a quem ele está procurando aqui. Queria mesmo que fosse era eu para não quebrar o encanto! Rsrsrs”.  John então volta a refazer a pergunta, pois a primeira ela nem ouviu.

─ Olá! Você pode me ajudar?  Lívia responde então:

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