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Visão do inferno

O fim de semana passou como um furacão .“Nada que é bom dura para sempre”, pensava David, ele não cabia em si de tanta felicidade e Nina também se sentia muito realizada.

Algumas semanas a frente, ele viaja novamente para passar dois dias fora, sempre a convidava para ir junto a todos os lugares, mesmo que fossem á reuniões intermináveis em outros países. Ela ia com ele nos primeiros meses, mas depois foi ficando em casa, quando esses eventos eram dispensáveis.

Na noite de segunda-feira, maio de 2021, o celular de Nina toca diversas vezes, “número desconhecido chamando”, ela estava cantando alto em sua banheira de espuma, escutando suas músicas preferidas da sua cantora predileta “Anitta”, que para ela era a maior artista do Brasil.

O celular continuava tocando, vibrando até cair no chão, felizmente não quebrou a tela de proteção, mas chamou a atenção da cantora de banheira. Nina verificou o seu telefone, ficou um pouco cismada com essas ligações, seu celular tinha programas de detecção de spam, programas de proteção e várias outras formas de proteger sua privacidade, devido à, episódios de hackeação e exposição de sua vida íntima num passado não muito distante.

Segurando o aparelho em sua mão, com uma toalha enrolada no cabelo e outra no corpo, ela sente a vibração se iniciar mais uma vez, o mesmo número desconhecido chamando. Nina resolveu atender, seu marido estava em outro país e ela não podia deixar de pensar que poderia ser uma emergência.

— Olá, Nina. Por favor, não desliga! Ouve o que tenho para lhe contar! — Era uma voz de mulher. — Olha as costas do seu namorado quando ele chegar em casa, eu mesma fiz os arranhões no banheiro do set de gravações. Ele tem uma coisa com banheiros...Todas que se envolveram com David foram enganadas, todas passaram pelas mesmas coisas, ele é viciado em sexo, é mais forte do que ele, não consegue controlar! Todos ao redor dele sabe que, desde a camareira de um hotel a atriz mais jovem ou mais velha de seus trabalhos, passam pela mão dele. — Nina desligou o telefone, que voltou a chamar em seguida...

— Eu só quero alertar você. Não desligue! Fique atenta! Sabia que ele era noivo? Ele fez o mesmo com ela, a traiu com a diretora e até com sua assessora, ninguém escapa! David faz tudo para conseguir o que quer, é ambicioso! Eu resolvi te ligar porque estão comentando que vocês vão se casar e que vão ter filhos, ele será um marido que te trairá até com a empregada da sua casa, seja ela feia ou bonita! Ele é um libertino! Escolheu você por ser pobre, anônima, alienada, nunca ficará no caminho dele, diferente das atrizes ricas e famosas que jamais se submeteriam a isso...Você nunca acreditará nas coisas que ele é capaz... — Nina cortou a conversa e desconectou o telefone, dessa vez estava incomunicável, ela estava pasma com tais alegações.

De repente vieram lembranças de duas mulheres passando por ela no corredor de uma das festas de estreia, em Londres, cochichando uma para a outra sobre o fato de todas serem levadas ao banheiro do camarim dele, as vozes ecoaram em sua mente, os risos delas e o fato de saberem que ele colecionava calcinhas...

Nina sentou-se no chão do banheiro, seu coração estava acelerado. Outras cenas de mulheres falando sobre sua fama de mulherengo nos bastidores de um programa, perto do bar de outro evento qualquer, até mesmo os funcionários, pessoas simples, faxineiros comentavam algo desse tipo entre si...

 Ela precisava de muita calma para não se deixar influenciar por terceiros, sabia que tinha muitos inimigos no mundo do showbusinnes, principalmente depois de ter deletado agentes tão renomados e importantes daquele meio artístico.

Tony e Paul tiveram que responder aos atos cometidos, não foram presos, mas foram multados, expostos e processados. Nina ganhou milhões nessa causa, foram muitos danos morais, psicológicos e físicos a serem ressarcidos, ou passar anos na cadeia. O crime de invasão de privacidade é inafiançável, resultando em 1 a 3 anos de reclusão plus multa e eles também eles foram enquadrados em diversos outros artigos, o que os levariam a sofrer uma pena muito maior.

Não se sabe como, mas outras pessoas responderam a esses crimes por eles, pessoas que ficariam pouquíssimo tempo na cadeia, e Nina ainda desconfiava que elas ficariam ricas depois disso. Eram os famosos “laranjas” da dupla de terroristas do cinema.

David tentava falar com ela, o telefone que só dava fora de área ou desligado, mas Nina nunca desconectava o aparelho ou o deixava sem bateria. Sentado no carro indo para o aeroporto, passou em sua mente lembranças de que ela só desligava o celular nas vezes em que havia acontecido algo, então ele revolve telefonar para a governanta da casa.

Depois de alguns minutos ela bate na porta do banheiro de Nina que levanta do chão e a deixa entrar.

— Com licença! O Senhor Nichols quer falar com a Senhora no telefone!

— Não precisa me chamar de Senhora! — Nina deu um leve sorriso, mas não conseguiu esconder o rosto vermelho e inchado de chorar. — Me chame apenas de Nina! — A mulher entregou o aparelho e saiu.

— Nina?

— Oi. — Sua voz saiu calma e baixa.

— O que há com o seu telefone? Estou te ligando há horas...

— Não há nada! Estou no banho e ele cai deve ter se desligado. Nada de mais!

— Eu estou a caminho de casa.

— Tudo bem.

— Tudo bem? Está tudo bem mesmo? — David sabia na hora que não.

— Nos vemos em casa então.

— Chego daqui a pouco.

— Ok.

Ela se arrumou, devolveu o telefone, verificou o jantar e ficou no andar de baixo o esperando. Assim que ele toca a campainha, ela caminha até a porta quase desfalecendo e a abre, tenta completar seu ritual de boas-vindas pegando os pertences dele, mas ele joga tudo no chão e a abraça com fervor.

— O que é Nina?

— Nada! Eu já disse que não é nada David!

— David? Você não me chama de David! O que aconteceu com amor, bebê, Dave, Rich? — Ela forçou um sorriso no canto da boca e voltou a sala, o jantar logo saiu e os dois tentavam quebrar aquele clima de silêncio entre eles.

Nina tentou contar sobre seus dias, fazia questão de ouvi-lo contar como tinha sido os seus. Queria demonstrar interesse, mas seu olhar era tão esmorecido, que o fez levantar e ir até ela. Eles mal tocaram na comida, logo foram para seus aposentos e Nina nunca esteve tão calada.

Ela não queria sentir o que estava sentindo, mas foi impactada com aquela voz do outro lado da linha, dizendo que havia mantido relações sexuais com o seu futuro marido. Nina não queria ser uma mulher insegura e imatura, embora estivesse agindo como uma, queria ter forças e discernimento para ignorar tal situação, ela tentava ter controle emocional e agir com cautela. Respirava fundo, e até tomou alguns comprimidos para dor de cabeça quando David entrou no banheiro.

— Está doente? Por isso está assim? Eu levo você no médico, ou ele vem aqui! Me fala pelo amor de Deus! O que há com você?

— Para! Não há nada! Eu tenho o direito de ficar de mau-humor por um dia, não tenho? Não posso ser a perfeita esposa sempre! Tenho dias ruins também... você está reagindo com exagero porque está acostumado com o tratamento de deus que eu te dou!

— Estou agindo assim porque te conheço. Você não é assim, não fica com joguinhos, não tem esses problemas de alterações de humor! Eu sei que tem algo, só não sei por que razão você não quer falar comigo. Nós prometemos Nina! Prometemos proteger um ao outro, prometemos não ter segredos, prometemos ser melhores amigos, amantes, parceiros e confidentes.

— E por que você acha que tem algo de errado? Você fez algo errado? Algo que talvez eu não possa saber?

— Eu? Não! Por que faria? Abre a boca! Não fale em códigos, não crie essa tensão! É algo relacionado aos seus testes de audição?

— Não. Claro que não! Já disse que iria com você. Ele a apertou em seu peito com seus braços musculosos, toda aquela altura a envolvendo naquele abraço apertado.

— Vem, amor, vamos trocar de roupa e vamos para cama. Vou cuidar de você!

David anda de um lado para outro em seu closet, Nina em frente ao espelho passando seus cremes noturnos, lutando para não olhar as costas dele, pensava apavorada no que iria fazer se realmente comprovasse que ele tinha arranhões feitos por uma mulher no banheiro... “O que temos é tão especial, e se for verdade tudo isso? Por que ele iria jogar todos os nossos sonhos para o alto? Nosso casamento, nossos filhos, tudo o que planejamos?” “Uma mulher não deve ficar em dúvida quanto á uma traição!” “Meu Deus, por que é tão difícil ser traída”? “Não sou o suficiente para ele... ninguém é o suficiente para ninguém!”

 Perdida em seus pensamentos, ela olhava para o chão, quando levanta os olhos percebe David de pé atrás dela, ele vestia apenas uma calça folgada preta e se aproxima beijando seu cabelo, a pega pela mão e conduz até a cama, se vira de costas, Nina, então tem inevitavelmente tem a visão do inferno em sua frente.

Ela para os movimentos das pernas no exato momento em que vê as marcas de unhas em sua pele. O olha com tanta dor, que o faz perder a sensatez, sem entender aquela expressão de horror e espanto ele a segura com toda a sua força, pois ela estava dando sinais de que iria sair correndo dali vestida somente em sua camisola longa de seda branca.

— Me solta! Me solta David! Preciso sair daqui!— Ele tranca a porta do quarto, fica com a chave, a olha bem sério nos olhos, sentando-a na beira da cama e fala:

— Seja lá o que for que está passando em sua cabeça agora, você não vai sair correndo nunca mais quando tivermos uma briga, você está me ouvindo, Nina?

— E o que quer que eu faça? Estou sufocando! Estou sufocando...

— Respire. Se contenha! Quando estiver mais calma comece a falar, pois daqui você não sai!

Nina o entregou seu telefone, mas ele já havia olhado, eles nunca esconderam as senhas de nada um do outro, nem mesmo de suas contas ou cartões de crédito. David já havia visto as inúmeras chamadas perdidas, os números desconhecidos e a ligação que ela atendera. Ele já sabia que algo a estava perturbando.

Nina começou a contar-lhe pausadamente o que a mulher no telefone havia dito e sobre o que as outras mulheres em ocasiões diferentes, em festas públicas também haviam contado. Quando ela terminou de contar tudo ele se ajoelhou em sua frente e disse:

— Essas marcas nas minhas costas, realmente ganhei de uma mulher, lutando, num set com mais de cem pessoas assistindo! Também machuquei meu polegar num aparelho de simulação, e meu pé. Está vendo isso aqui? — Ele mostrava uns machucados roxos nas laterais das costas e outros lugares espalhados pelo corpo...

 — Posso ligar para no mínimo dez pessoas, aqui e agora na sua frente, para que não restem dúvidas. Não vou falar nada, deixarei que eles mesmos contem.

Nina tentou impedi-lo, mas foi em vão, ele segurou a mão dela. David ligava para um, desligava, ligava para outro, até que ela gritou:

— Chega!

— Não, não chega! Eu não preciso provar, mas já que não tenho nada realmente a esconder, por que não fazer? Para que não te reste nenhuma dúvida! Por que eu iria deixar essa oportunidade passar, fazer você entender que não importe o que tentem fazer para nos separar, nunca vão conseguir!?

— O que queria que eu fizesse?

— Que me perguntasse, gritasse, explodisse e desse um ataque de ciúmes! Nem que fosse para me acusar! Pelo menos estaria me dando a chance de defesa..., mas sabe o que eu odeio em você? Sabe o que me machuca? Você apenas ter acreditado! Já estava convencida, assim tão fácil, Nina? Estava indo embora? Ia sair correndo de novo?

— E se fosse eu no seu lugar?

— Se fosse você, eu faria como fiz sobre as milhares de fofocas que saíram na mídia sobre o seu affair com Elo! Eu te mostrei, te defendi, nunca se quer cogitei a possibilidade de poder ter sido verdade, embora tivesse fotos dos dois sorrindo e se olhando nos olhos!

— Não sei o que dizer!

— Pede desculpas caramba! Fala que me ama! Diz que fica cega de ciúmes por isso age assim tão estúpida! Se joga no chão, puxa os cabelos, não sei, faz algo! Demonstra alguma emoção! — Os dois caíram na gargalhada em seguida. Nina se aproximou dele:

— Eu amo você, ainda estou cega de ciúmes, ainda estou com ódio disso tudo! Acredito em você, mas a imagem de uma mulher transando com você não sai da minha cabeça... e os boatos que rolam com o seu nome por todo o campo artístico me deixa desesperada. — Ele a ouvia atentamente.

— Porque, nem por fama, nem riqueza, nem por nada nesse mundo conseguiria aceitar uma traição! Não sou boba, eu sei que milhares de casais comuns traem um ao outro, imagina você com todo esse assédio e tantas mulheres extraordinárias jogadas aos seus pés.

— Não vamos voltar a esse assunto, isso é passado, já dissemos tudo que tínhamos para dizer a respeito disso.

— Sim, eu sei! Mesmo assim estou citando isso. Eu tento David! Eu juro para você que tento, mas sou insegura, porque não consigo imaginar perder você. Eu não espero isso, não fico imaginando nada disso, mas sei dentro de mim, eu sei, que se algo acontecer, não saberei viver... isso é assustador! Amar uma pessoa assim dessa forma deveria ser proibido.

— Nunca vai me perder, Nina. Nem mesmo quando me faz odiá-la por não acreditar em mim do jeito que eu acredito em você.

— E se você visse com seus próprios olhos alguma montagem que fizessem, um vídeo, algo assim? Tem sempre alguém tentando nos separar... não nos dão paz!

. — Diria que é montagem, me certificaria antes de te atacar e investigaríamos juntos se você me olhasse nos olhos e dissesse que jamais me trairia, pois, sei que não temos motivos para trair um ao outro. Por exemplo, já enviei os prints para minha equipe, e todas as pessoas daquele set de gravações serão monitorados até descobrimos o que está havendo. Se alguém ligou para você, um número tão secreto, protegido pela polícia federal, pela Sony etc. E deram informações sobre algo tão detalhado como arranhões em minhas costas, tem que ter sido alguém bem próximo, vou descobrir e isso eu garanto!

Nina ainda estava imóvel o olhando confusa. Ou ele era mestre em manipular e controlar pessoas em qualquer situação, ou ela era muito paranoica, descompassada e ciumenta.

Depois disso os dois já estavam deitados ao lado um do outro com as luzes apagadas, Nina tentava não dá um suspiro se quer, para não fazer barulho. O silêncio tomou conta do ambiente e eles nunca dormiram tão perto e tão separados ao mesmo tempo.

A manhã ensolarada chegou com tudo. Nina havia esquecido de acionar as cortinas anti luz e menor sinal de claridade que fosse, ela despertava. Abriu seus olhos e estava virada de frente para David, nariz com nariz, olhos com olhos, podia sentir sua respiração e seus braços pesados por cima de seus ombros. Ela ficou ali tentando não se mexer, tentando não emitir nenhum som para que ele não despertasse.

— Bom dia! — Disse ele de olhos ainda fechados. Então os abriu.

— Bom dia! —ela sussurrou.

Eles ficaram se encarando sem dizer nada por um bom tempo, ele esperava que ela pulasse em cima de si, o enchesse de beijos dos pés à cabeça e tentasse compensar a briga da noite anterior, mas ela permaneceu quieta, com seus grandes olhos amarelos fixados em seus olhos azuis repuxados.

David levantou e foi tomar um banho, quando ficou pronto, fez a barba, pôs sua roupa de treino e desceu. Nina permanecia na cama, não sabia ao certo se ele estava muito zangado, ou se estava punindo-a e a ignorando de propósito. Os dois eram muito dependentes e estavam acostumados a se agradar e ceder aos caprichos um do outro, na menor falta de atenção, eles sentiam mil vezes mais que qualquer outra pessoa.

Nina se aprontou, tomou café da manhã sozinha e desceu ao estúdio de treino no subsolo da casa, como ele não avisou que sairia para correr na rua, ela deu de cara com um quarto esportivo vazio.

Ela pôs sua roupa de treino, o que era raro, nunca tinha treinado antes dele começar a motivá-la, e gastou toda a sua energia naquela sala cheia de aparelhos de academia. Passou horas ali em frente ao espelho e pôs sua lista de reprodução de dança para tocar. Nina não havia percebido que David estava de pé parado encostado em uma das portas que dava acesso ao jardim, mas quando percebeu, desligou o som, deu um sorriso gelado para ele e subiu as escadas na velocidade da luz.

Ele deu um sorriso no canto da boca, sabia que ela estava retribuindo o gelo. Então ele subiu, a procurou pela casa e não encontrou, pois, ela também saiu para correr sem ele. Havia uma inquietude dentro dela que precisava ser banida de seu corpo através de esforços físicos. Ouvindo suas músicas em seu headset, ela explorava a vizinhança, foi então que resolveu sair dos muros do condomínio onde morava.

Nina parou para fazer uma sequência de alongamentos, quando de repente se deu conta que haviam várias pessoas a filmando e tirando fotos, pensou em apressar os passos, mas alguns repórteres já haviam a alcançado. Dezenas de perguntas ao mesmo tempo, ela quase teve um ataque de pânico; eles a fecharam e ela estava longe de casa, sabia que iriam persegui-la até os portões do condomínio. Então respirou fundo, continuou seu alongamento, sua caminhada e virou o jogo!

— Nina, Nina, onde está seu marido?

— Vocês brigaram?

— Vocês terminaram?

— Por que vocês correram separados?

— Temos fotos dele correndo sem você!

— É verdade que seu marido mal vem em casa. Ele estava fora? Vocês irão terminar? Você vai voltar para a Noruega?

As perguntas eram incessantes. Ela os olhou com um sorriso bem sarcástico e respondeu a todas as perguntas, queria m****r vários recados as pessoas que estavam de olho nela, inclusive David.

— Meu marido? Que eu saiba eu ainda não me casei! Ele é meu namorado.

— Se terminamos? Não, nunca vamos terminar, nunca!

— Isso é sério? Por que corremos separados? Acho que é porque não nascemos colados! É bom de vez em quando andar com as próprias pernas, sabe? Vocês são casados? — Muitos responderam que sim, ou que tinham namorada. — Eu não estou vendo-as aqui! — Todos riram.

— Meu namorado trabalha muito, sabe, assim como eu, e sim, às vezes ele fica fora de casa. Quando não estou com ele, é porque estou trabalhando, mas sempre estamos juntos. Isso é bom, ficar um pouco longe, sentir um pouco de saudades. Vocês não acham? — Os fotógrafos gostavam dela. — Agora peço por favor, com licença, eu nem terminei meu treino ainda e como vocês mesmo disseram, David está me esperando em casa!— Nina entrou nos domínios privados de sua residência, podendo assim parar de tremer e ficar calma.

Ela estava pensativa a respeito dos fotógrafos saberem que ela estaria ali — não era um fotografo, mas vários — e refletia sobre as perguntas do fim do namoro. Parecia serviço de amadores! Alguém estava deixando muitas pontas soltas!

Ao entrar em casa subiu para seu quarto e passou horas em sua banheira. David já estava perdendo a paciência com esse jogo de pirraças, ele sabia que ela era assim, quanto mais eles insistissem nesse clima, mais ela iria se retrair, se isolar. Ele deu um sorriso para si mesmo e pensou: “É David, você quem está jogando. E está jogando sozinho”.

Dave foi em direção as escadas, convencido de que estava se torturando à-toa, os dois não conseguiam ficar zangados um com o outro e toda essa distância só servia para castigá-los. Chegando ao andar de cima ele não a encontrou em lugar algum, olhou pela janela e a viu indo em direção ao carro toda arrumada, desceu as escadas novamente, porém dessa vez correndo, quase tropeçava e caía, mas finalmente conseguiu alcançá-la no último segundo. David se abaixou, Nina desceu o vidro e ele mal conseguia falar.

— Está indo aonde?

— Ao shopping!

David deu a volta no carro e entrou. Ele estava descalço.

— Ao shopping?

— Sim.

— Sozinha, Nina?

— Eu já disse que não sou uma prisioneira!

— Você sabe que tem paparazzis, uma multidão pode se formar ao seu redor e até machucá-la. Os fãs não fazem de propósito, mas quando há aglomerações tudo pode acontecer.

— Não tenho fãs enlouquecidos. Meus trabalhos em causas humanitárias me dá a liberdade de ir e vir.

— Não quando se é a noiva de David Nichols!

— Nada vai acontecer. Relaxa! Eu só vou sair um pouco, comprar umas coisas para casa.

— Eu posso ir junto?

— Aí sim, vai ter tumultuo. Você não estava sem falar comigo?

— E você também não estava? Agora está falando sem parar! — eles nem conseguiam ficar sérios.

— Sai do carro David! — Ele não podia acreditar em seus ouvidos.

— O quê?

— Você precisa pôr um sapato. Eu espero!

— Não saio do carro sem você. Sei que você está chateada e vai arrancar com o carro quando eu sair!

— Eu não faria isso!

— Com raiva? Com essa cara de quem vai aprontar comigo? Faria sim! — Os dois seguravam o sorriso. Não queriam dar o braço a torcer.

— Vem, Nina. Vem comigo!

— Não! Eu conheço você! Se eu entrar não vamos a lugar algum. Pega as chaves, minha bolsa, o que quiser, meu telefone, eu espero aqui.

— Pior ainda você sair sem bolsa, sem cartões e sem telefone.

 — E como eu vou dirigir sem o cartão do carro ou sem o telefone para ligá-lo?

— Ou você vem comigo, ou eu vou descalço! — Os dois riram.

— Meu Deus do céu! Que briga boba! Nós somos inacreditáveis... Você fica o dia me evitando e quando eu vou sair sem você, resolve que não pode ficar umas horas sem mim? Droga! Estou bem brava com você. Vamos logo pegar a merda desse sapato...

De volta ao carro, Nina dirigia.

— Você não é uma adolescente rebelde Nina, sabe muito bem que as coisas não funcionam mais assim para você!

— Então pare de falar comigo como se eu fosse uma!

— Logo, irá descobrir que sua vida mudou. Teve a pandemia, o mundo de quarentena até um, dois meses atrás e você não teve esse contato direto com o público desde que tudo aconteceu. Desde o primeiro escândalo na Itália envolvendo seu nome e seu rosto, de lá para cá muita coisa aconteceu. Você é um dos assuntos mais falados em todas as redes sociais durante um ano.

— Claro né! Depois de tudo o que foi publicado. Virei meme oficial!

— Não são só críticas! Pelo menos o lado bom você deveria acompanhar de vez em quando. Você tem muitos admiradores, pessoas que apoiam o seu trabalho na luta a favor dos desfavorecidos. Não pode sair por aí sozinha!

— Já entendi!

— Para onde estamos indo? — David olhava constantemente o celular.

— Seus seguranças que estão nos seguindo, mandaram mensagens?

— Sim, como também o GPS do carro, do relógio, do telefone, etc.

— Chegamos! — David sai do carro desconfiado e segue atrás dela, que não o espera.

 O local era uma espécie de teatro antigo. Nina abre uma porta enorme, é recebida por algumas pessoas que imediatamente ficam eufóricas ao reconhecer David. Havia um acordo entre Nina e as pessoas que a aguardavam, nada de fotos!

Ela cumprimenta a todos na recepção, apresenta David apenas pelo primeiro nome e como seu namorado. As moças o acompanham até o auditório e seguem com Nina, David estava sentado na última fileira da plateia com alguns seguranças confusos. As luzes se apagam e Nina entra no palco, ela vestia um figurino estranho, nos lábios um batom forte vermelho, os cabelos pretos e longos estavam soltos, então começa sua fala.

Citava um poema com fortes expressões. Sorria, gargalhava, chorava de verdade, as lágrimas escorriam em seu rosto, mas voltava a sorrir um segundo depois, seu nome era Clara, Samantha, Melissa, Bea, Mia e Alfredo. Ela estava fazendo um teste de audição, para a surpresa de David, que a olhava atordoado, tamanho era seu fascínio!

Esse era o motivo dela não ter viajado com ele, estava frequentando uma escola de teatro em segredo, fazendo testes e trabalhando duro até nos fins de semana. Ela queria muito enchê-lo de orgulho, e conseguiu! David filmava toda a apresentação, pois queria guardar aquele momento para sempre.

De repente outros atores entram em cena, era uma peça na qual eles iriam estrear em breve. Nina não errou uma palavra, e ela não trazia os manuscritos consigo. Porém, chegou a hora que ela mais temia, a hora que teria que cantar para finalizar o show. Ela não iria cantar na peça, mas precisava fazê-lo ali para ser aprovada.

David ficou atônito! Ele nem sabia que ela cantava , mas a aplaudiu de pé! Nina e os outros atores trocaram de roupa, e voltaram ao palco para receber as suas críticas por escrito.

Ela estava parada olhando os jurados, e eles anunciaram que havia conseguido o papel. Seria a protagonista. Nina se despediu e correu com toda a pressa que pôde para pular nos braços de David.

Os dois se abraçavam muito, esqueceram todas as brigas e comemoravam juntos! Apesar, dele não estar ao certo convencido de que espécie de contrato ela assinaria, e outras burocracias, que certamente iria verificar minuciosamente mais tarde.

Os pombinhos conversavam sobre esse curso de teatro no caminho até o shopping. Ele conseguia extrair cada detalhe de que precisava, fazia as perguntas certas e não se conformava com o fato dela ter guardado esse segredo. Era impossível que ela tivesse conseguido não contar nada a ele, pensava David.

 Nina não queria ir ao shopping de verdade, só falou para irritá-lo, ela não iria se expor assim daquela maneira. E ele sabia disso, falaram sobre isso, mesmo assim foi até lá com ela.

— Não quero descer do carro, David.

— Mas vai!

— Você não manda em mim! E vou se eu quiser! Quem você pensa que é para falar assim comigo? Desde ontem à noite está falando comigo com muita autoridade... eu até deixei passar algumas frases, mas agora, já chega! Baixa o tom!

Ele a olhava... Não sabia se havia odiado ou amado aquela resposta.

— Me perdoe, não foi a minha intensão. Só queria fazer essa sua insegurança passar. Às vezes você só funciona assim...

— Eu sei! Me desculpe também... Você não merece que eu fale com você como uma bruxa. Não merece que eu lhe destrate, nunca! — os dois trocavam olhares meigos...

— Vamos comprar o que você quer comprar, iremos agir normalmente, os seguranças ficaram de longe e não demoraremos. Vem, não tenha medo, deixa que nos vejam, vai ser bom para as pessoas que estão pensando que um dia vão conseguir nos afastar um do outro...

Eles entraram de mãos dadas no edifício, Nina comprou uma bolsa dourada feita de metal, estilo estojo, comprou outros acessórios em diversas lojas, e então entrou numa joalheria. Ele a esperava do lado de fora tomando um sorvete , cumprimentava as pessoas que paravam e já estava tirando fotos com elas. Os seguranças estavam planejando como os tirariam de lá, pois logo perceberam o aglomeração de pessoas se formando.

Nina realizou um sonho aquela tarde, passeou de loja em loja num shopping com ele em Londres, depois da grande pandemia que durara tanto tempo. As pessoas os apontavam, os seguiam, os filmavam e gritavam por seus nomes. E cada vez mais pessoas iam chegando.

Os seguranças já haviam o alertado de que era hora de ir, David respondeu que iriam quando Nina quisesse, ele a deixou livre para ver de perto o que sua vida havia se tornado. Ele sabia que seria a última vez que ela cogitaria a possibilidade de passear sozinha por aí, sem seguranças. Quando eles cansaram de explorar os diversos andares, o tempo todo sendo abordados, sendo vigiados, ela percebeu o quanto era difícil para ele viver uma vida normal, o olhou com ternura como se estivesse com pena dele.

Enquanto ele pagava as compras, Nina olhava para fora da loja, estava assustada, pois, não teria como eles saírem dali, eram tantas pessoas que até mesmo os lojistas , sentiam dificuldade em atendê-los, eles tiveram que trancar o casal lá dentro e acionar os seguranças extras do Shopping Center para ajudar os particulares de David. O tumultuo estava formado e as pessoas ainda faziam lives!

Nina sentiu muita pena dele. Ela o olhava com amor, segurava sua mão e o abraçando com força... não o largaria!

— O que foi, amor? — Perguntou ele.

— Coitado de você, bebê! Eu sinto muito por você! Sinto muito...

— Não sinta! Eu amo os meus fãs, amo essa recepção e amo receber esse carinho, é recíproco! — Ela só o olhava assustada...

— Eu sei, não posso sair, não posso muitas coisas, mas é a vida que escolhi, é um pequeno preço a se pagar! Está vendo essas pessoas? Muitos são apenas curiosos, outros estão realizando um sonho que nunca vão esquecer, o sonho de ver seu ídolo de perto! Sem eles, jamais teria tanta visibilidade, tantos convites de trabalho e tantas oportunidades. Eles me apoiam, eles fazem minhas publicações serem um sucesso! Devo tudo a eles!

— Então vai lá dizer, oi, deixa eles te fotografarem, vai lá interagir com eles, amor!

— Não é tão simples, pode virar um empurra-empurra e eles podem se machucar, me machucar, podem dar prejuízo ao Shopping, são muitas coisas envolvidas. Já estão filmando, vão tirar fotos quando eu sair. Os seguranças estarão aqui em alguns segundos e vão nos levar direto para o carro na saída dos fundos. Logo, estaremos em casa, meu bem, vem cá!

Os dois permaneciam abraçados. David acena para seus fãs e eles são levados rapidamente para fora dali. Um verdadeiro circo se forma na internet dentro de pouco tempo. Logo, o mundo todo compartilhará essa aparição repentina dele no meio de um Shopping no centro de Londres. As fãs mais ciumentas questionavam: “David aparecendo assim, no meio de um centro comercial? O que essa mulher está fazendo com ele?” Outra afirmava: “Ele não é assim, a culpa é dela que quer aparecer!”, e outras ainda diziam que era maravilhoso ver o casal junto interagindo com os meros mortais!

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