A Secret in the Dark
A Secret in the Dark
Por: Artemis Cassana
ATO I

Seus olhos eram de fato acostumados com a escuridão, por mais que ainda captassem o borrão de luz quando claridade entrasse por eles. Embora gostasse muito de seus olhos, Helena se pusera a acreditar que seus ouvidos assumiram o lugar da visão, pois com a audição conseguia ouvir cores, textos, expressões e qualquer coisa que chegasse aos seus tímpanos.  

— Não acho que ela faça de propósito  — exclamou Helena em uma tentativa falha de não chamar atenção de algumas pessoas que passavam por ali.

— Eu poderia dizer “somente um cego não poderia ver”, mas esqueci que você se encaixa nesse perfil — Layse usou o tom de ironia que Helena nunca aprovava vindo dela, embora ela usasse de vez em quando, não gostava que usassem consigo com tanto afinco. 

— Acho que ela se culpa pela morte de meu pai… 

— Espero que você seja inocente e não burra, Helena — Ela ronronou novamente entre uma palavra e outra. 

Eleanor não era fácil de se lidar. Talvez fosse só a idade que a tomava com o passar dos anos e a estivesse tornando uma mulher ranzinza e consequentemente uma madrasta um tanto peculiar, justamente pela Buxton ter voltado tantas vezes de seus noivados sem ter casado, já que não a sobrava noivo.

— Também acredito que meus noivados fracassados tenham participação nisso.

O som de ventos e folhas se arrastaram pelo chão, alguns cochichos passaram suavemente junto com o ar e ela que quem quer que fosse falava dela.

“A viúva Buxton”

Era assim que toda cidade a conhecia e chamava.

Certo de que Eleanor detestava esse simbólico apelido, pois com o tempo, graças a esta péssima nomenclatura, Helena acabara por afastar todos os cortejos e consequentemente os de suas irmãs, despertando assim a ira de sua madrasta.

— Layse? — Perguntou sem conseguir identificar sua respiração. 

Após alguns longos segundos ela respondeu

— Sim? 

— Acha mesmo que ela pode estar me castigando? No fundo ela também sabia, afinal, não era lá grande felicidade que uma de suas filhas espantasse homens. Muitos acreditavam que sua cegueira fosse uma maldição de deus à família, e por alguns segundos ela de fato acreditou, depois que os últimos três cortejos deram frutos á um noivado que a morte simplesmente os levou. Um a um, sem sequer permitir que fizesse seus votos perante à igreja. 

— Ela não tem esse direito, Helena. Você não é a morte para ceifar a vida de seus noivos, aconteceu porque assim deus quis. — Sentiu a mão suada de Layse sobre o tecido de seu vestido. Tudo que enxergava era um borrão misturado de cores brancas e pretas. Helene quis enxergar, porque sabia que se visse a face de Layse, poderia se tranquilizar quanto ao que Eleanor praguejava sobre ela. 

Ela nunca havia visto o rosto de Layse. Na verdade,  nunca viu o rosto de ninguém, já que a visão havia deixado-lhe quando tão nova e para ajudar, levavam uma vida reclusa  da cidade.

Apenas Elyse antecedida por ela, por suas escolhas e seus gostos. Também havia Eleanor, a adorável camareira dos Buxton, a maior imagem de mãe que pudera ter, já que a sua havia partido tão nova, que ela nunca pode guardar sequer uma lembrança para se recordar. 

Mesmo sabendo que grande parte dos noivos a cortejavam no início da temporada, justamente pelo dote gordo que Eleanor botava sobre a mesa, era triste saber que nem mesmo o dobro de ouro os fazia se aproximar, afinal, com uma noiva amaldiçoada, não havia dinheiro que comprasse suas vidas. 

 — Ela não ficaria chateada se saber que você saiu sem a permissão dela? 

A morena balançou a cabeça sorrindo.

— Ela não está em casa, foi ao banco pouco antes que eu saísse.

Ah sim, Eleanor era extremamente consumista, como se a palavra tivesse sido criada especificamente para a mulher, sendo ela mesma o exemplo vivo e dando um sentido muito forte à palavra. Gastava a fortuna de seu pai em jóias e vestidos para as filhas, enquanto Eleanor, na maioria das vezes, precisava trocar sua prataria de herança por vestidos que lhe coubesse o busto. 

— Ela não se preocupa que você possa sair ? Afinal, tem um assassino à solta. 

Nos últimos dias, a cidade havia sido tomada pela notícia de um assassino à solta. Mesmo que o rei tivesse ordenado que mais guardas pudessem estar pelas ruas para a segurança de todos, nunca era o suficiente, quando mais corpos amanheciam jogados nos becos frios e úmidos das vielas da cidade. Alguns degolados, outros secos feito palha, sendo com o sangue drenado e o corpo perfurado. A Igreja por outro lado estava a alimentar os moradores, pregando a ideia que demônios estavam a zanzar por aí, procurando moças virgens, solicitando assim dinheiro dos duques e barões para abençoar as jovens, as deixando a salvo até seu cortejo no inverno.

Helena ronronou enquanto suas mãos acariciavam a gargantilha de prata em seu pescoço. 

— Ela não pode se preocupar com o que não sabe.

Mentira tinha perna curta e contanto que Helena continuasse as escondendo com longos vestidos, não haveria problema. 

— Não tem medo ? 

— Do assassino ?

— Todas corremos perigo, mas você assim… — A rosada sussurrou controlando as palavras para não feri-la. 

— Cega — Completou a morena — Posso ser mais perigosa que esse assassino. 

Riu. 

— Acredito em você. — A amiga disse entrando no espírito da brincadeira.

O pai de Stratus Layse havia sido um grande amigo de seu pai e pelo fato de conviverem junto, criaram uma amizade de longa data desde a infância, inseparáveis até hoje, tanto que Helena a considerava mais sua irmã do que as filhas de sua madrasta. 

Ambas continuaram conversando e mesmo que a Buxton não pudesse ver, ela sentia que o céu estava a se tornar morno, declarando assim que o dia não estava tão longe do fim. 

— Layse, eu gostaria de ir até a catedral, poderia me pôr na carruagem e pedir que Simon me leve até lá?

Helena sabia que ela havia concordado no momento em que sentiu seu braço cruzar com o dela. Sentou-se no que julgou ser o banco de couro sedoso da carruagem. Viraram algumas vezes enquanto o vento rebelde sacudia seus cabelos e abraçava seu corpo, o dia estava quente e pelo espartilho que lhe apertava, ela julgou o calor tardiamente quando o frio se restabeleceu sobre sua pele. 

As mangas de seu vestido de tricoline rebelde não eram o suficiente para lhe agasalhar, seus olhos piscaram pelo vento que os ressecava. 

    — Senhorita Buxton, estamos chegando! — Anunciou Simon enquanto ela podia ouvir ele puxar as cordas dos cavalos que guiavam seu método de transporte. 

    Simon era um tanto tímido, calado e reservado, mesmo sendo um lacaio de sua família, era era educado como um verdadeiro cavaleiro, Helena podia sentir em sua voz a escolha de cada palavra para se direcionar a ela, não só porque ela era a filha do falecido barão de Winterfelt, mas porque ele realmente se importava em lhe lembrar de suas raízes quando Eleanor não o fazia. 

    Ele lhe acompanhou estendendo seu braço e eu dei passos firmes enquanto ele a direcionava. 

    — Há alguém me olhando ? — Helena questionou receosa. 

    — De forma alguma, Senhorita. A Catedral está vazia. — Deram mas alguns passos enquanto ecos deturpados se multiplicavam à medida que seu sapato de madeira ricocheteava na cera do chão. — Degraus, Senhorita. 

    Subiram alguns degraus, parou de contar depois do sexto. Ele a sentou na poltrona aveludada que moldava seu quadril delgado como se fosse feito exatamente para ela. Esticou sua mão sentindo as teclas de sintonia tocarem, cantantes e imponentes. 

    — Meia hora, Simon! — Sussurrou para minimizar o eco e aguardou que o som de seus sapatos se distanciasse o suficiente para que ela pudesse ouvir somente as notas do piano à sua frente. 

    Inalou o máximo que pode em seus pulmões, como se cada centímetro de ar fosse gasolina para seus dedos que só deixaria cada tecla a sua frente quando estivessem fatigados. A música se alastrou pelos espaços vazios da catedral e a sinfonia se fez presente, em notas decadentes que faria o mais odioso homem amar, e o mais apaixonado ter seu coração partido com uma melodia tão rica, lúgubre ou lutuosa. Tombou a cabeça de lado enquanto meus braços tomavam vida própria dançando pelas notas do instrumento como uma mulher desejosa que se sinuase para seu amante uma única e última vez. Mas algo completou sua música, sons vazaram pelas bordas do piano, som adicional aquele que ela já estava a produzir, e só teve certeza disso quando seus dedos abandonaram o piano e ainda sim ele continuou a tocar. Puxou a mão contra o corpo e sentiu a presença ao seu lado, a respiração controlada escapulia de forma mínima justamente tentando esconder sua presença e suas notas entre a música de Helena antes tocada. 

    A música que seu convidado-fantasma tocava era sinuosa, gradativa entre notas curvas e solenes, diminuindo o tom aproximando-se do final de forma magistral e convidativa. Nunca gostara de ser surpreendida, justamente porque mesmo que ela tentasse olhar nunca veria de fato, porque era cega. 

    — Gosta mesmo de Shakespeare...Confesso que prefiro choppin ! — Sua voz era uma mistura de algo rascante, centrado e rústico ao mesmo tempo, e ela pode jurar que suas palavras o atingiram junto com um sorriso nos lábios. — Tocava com tanto afin-

    — Quem é você ? — O Interrompeu. 

    Ela amava tocar Shakespeare. 

    Ele suspirou e pode sentir que seus olhos estavam sobre ela, Helena podia definitivamente saber. 

    — Se veste como uma Senhorita e acredito que seja uma, portanto não é educado que interrompa alguém quando está a falar. 

    Seus dedos tocaram algumas notas do piano, cada nota em ordem. 

    — Se sabe que sou uma Senhorita sabe também que não devo falar com estranhos. — Ele riu, riu de uma forma encantadora. 

    — Uma senhorita afiada — resmungou — gosto de senhoritas afiadas. 

    Não havia passado ao menos quinze minutos ainda e mesmo que gritasse Simon ele não a ouviria já que estava tão longe e ela provavelmente bateria em várias paredes depois de rolar pela escada do salão instrumental da Catedral. 

    — O que vo-oce...— Gaguejou sentindo um fio de medo surgir. 

    — Não planejo lhe causar nenhum tipo de dano se é o que está pensando,  apenas segui o som do piano em que tocava e me senti impelido a me juntar á sua companhia. — Havia diversão em sua voz, ele ficou calado após alguns minutos enquanto ela só tornava a ficar quieta, ainda receosa — Você é…

    — Cega. 

    Essa seria a hora em que ele quem quer que fosse a intitularia como a viúva amaldiçoada e se afastaria e pela primeira vez Helena daria graças a deus por carregar tal nomenclatura. 

    Salva pela maldição. 

    — Não sabia que viúvas eram tão...bonitas — Sibilou e a morena sabia que era entre-dentes. — Me sinto tentado a enfrentar a morte. 

    Sentiu-se ofendida, o desconhecido não só se pôs ao seu lado sem ser convidado como fez uma piada de muito mal gosto com o apelido que a cidade lhe pusera, e todo plano de o espantar fora por água abaixo. Ele parecia empenhado em socializar consigo mas ela tinha o péssimo hábito de repelir aqueles que não lhe conheciam ou aqueles que achavam conhecer “a viuva”.

    — Não me casei, portanto não sou uma viúva. 

    — Uma noiva solitária ? — O estranho sugeriu. 

    — Aborda dessa forma as mulheres à sua volta ? — Ela perguntou estarrecida. 

    — Não tenho o hábito de abordar mulheres. 

    Subiu uma sobrancelha pelas palavras que obviamente eram mentirosas, pois era obviamente o que ele estava fazendo consigo, invadindo seu espaço como todos os homens que não tinham interesses em cortejos mas sim em coisas mais depravantes.

    — É exatamente o que está a fazer comigo. — Helena o acusou praticamente. 

    O piano voltou a tocar em notas baixas, pausadas, para que ela entendesse suas palavras entre as pausas de cada toque. 

    — Já disse que fui atraído pelo piano, gosto de Shakespeare apesar de preferir Choppin. — Ele riu suspirando como se tivesse um desejo em mente — Mas fiquei ainda mais curioso como uma senhorita ousa estar sozinha nesta catedral enquanto há um assassino à solta.

    Como ela pudera se esquecer ? Um arrepio subiu em minha coluna sumindo entre seus fios capilares. Mesmo que este homem ao seu lado não fosse tal assassino em potencial, ele tinha razão. Da mesma forma que seus chamados não chegariam a Simon quando ela quisera ir embora, eles também não chegariam se seus gritos fossem de socorro. 

    — Você tem um bom potencial — Manifestou-se

    — Posso considerar um elogio de sua parte ?

— Considere uma acusação. 

    — Seu pai também pagou ao bispo que lhe abençoasse para que o demônio não lhe atacasse ? 

    A morena riu, havia claramente uma tentativa falha de fazê-la temer.

    — Talvez! — Ele riu em resposta. 

Hinata respirou fundo. Ele estava se tornando um tanto irritante. 

— Pela familiaridade de seus dedos no piano eu devo chutar que essa não é a primeira e muito menos sua segunda vez aqui na catedral. 

Um a zero para o desconhecido. 

— Você mesmo respondeu sua pergunta. 

Ele estalou a língua descontente com suas respostas de prontidão, sorriu afiado sem mostrar os dentes.

— Pelo que falam da "Viúva" eu esperava encontrar uma menina indefesa e não uma mulher preparada com dentes e facas e um belo decote. — Ela o ouviu se remexer na cadeira qualquer que ele usara para se sentar ao seu lado e sua voz foi ficado um pouco mais distante à medida que ele falava, ele estava ficando de pé, provavelmente se preparando para partir. Sentiu seu rosto aquecer com suas últimas palavras. 

— E o que falam de mim ? 

Ele riu de forma ladina, desconcertando-a. Ficou curiosa para saber sua aparência. 

— Muitas coisas, inclusive suposições de como seus noivos provavelmente morrerão.

Já havia visto e ouvidos algumas, é claro, mas nenhuma das vezes que especularam, acertaram. Certo de que não conseguia ver graça em nenhum de seus noivos, aos seus olhos todos estavam apenas interessados em encherem seus cofres de dinheiro com a gorda quantia que teria após a levar ao altar. Já havia ouvido diversas coisas em relação a si, inclusive que seu marido a trairia com uma roda de mulheres e Hinata nunca enxergaria a infidelidade mesmo que fosse debaixo do seu próprio teto.

 Ela estava curiosa e no fundo nem mesmo sabia a resposta. 

    — Então você listou todas as suposições ? — Ela se virou para o piano novamente, pressionando seus dedos enquanto tocava levemente uma melodia digna de um funeral. 

    — Não é como se eu quisesse guardar em minha cabeça, é que é algo impossível de esquecer. 

    Seu sapato era de couro, quase não causava barulho na cera dura do chão, mas o suficiente para que Helena distinguisse. 

    — Então me diga. 

    — Eu não seria cavalheiro em dizer coisas inapropriadas a uma moça sozinha. 

    A música cessou enquanto o rosto de Helena estagnou no ar e sentiu as bochechas quentes o suficiente para ter certeza que agora elas estavam tão vermelhas quanto um par de maçãs maduras. 

    — Apenas uma…

    — Levou o homem à loucura sem conseguir esperar as núpcias-

    Ela pulou de seu assento horrorizada. 

    — Céus, que absurdo! Nenhum homem jamais me tocou e eu jamais desonraria meu pai de tal forma. 

    O estranho suspirou.

    — É uma pena, me vi alegre por alguns instantes. 

    Ele a havia irritado. 

    — Depravado! Não sei porque estou a conversar com você. 

    Verdadeiramente escrupuloso, seus olhos piscaram várias vezes ainda enxergando o borrão escuro. Nenhum homem jamais havia falado assim consigo, com tanta falta de respeito, falando coisas depravadas e quase lhe ofertando o que não deveria. Logo ela, uma moça solteira e sem um noivo. 

    Tentou seguir o mesmo caminho de mais cedo, mas tudo que fez foi tropeçar em meus próprios pés quando o chão desnivelou e ela soube que havia pisado de forma errada nos degraus. Seu pé torceu para o lado contrário de uma forma não natural e ela só sentiu a dor, e antes de cair no chão sentiu-se amparada pela pele quente de um braço que rodeou sua cintura em um reflexo brilhante.

Helena sentiu a vergonha lhe tomar e o pé doer de maneira que nem sequer encostava no chão de maneira firme.

— Me solte, deixe-me! — praguejou — Quem é você ? Diga o seu nome!

Ele soltou o aperto saliente de sua cintura, desvinculando seu dorso largo de suas costas reclamando pela falta da Buxton

— Um agradecimento seria o suficiente. — exclamou sério — na próxima vez que a ver, lhe darei um presente para que nunca se esqueça de mim. 

Ela esticou o braço encontrando  uma pilastra qualquer, fria de encontro a sua mão enquanto o frio e o vazio preenchia cada espaço á seu lado. 

— Não haverá próxima vez.

— Senhorita ? Que próxima? — Era a voz de Simon. Havia se passado tantos minutos em pouco tempo que Renata sequer se deu conta. seu rosto se virou com o som da voz familiar, enquanto sentia uma dor considerável ao tentar por seus pé no chão.

—  Deus, é você Simon ?— exclamou assustada, Ainda temendo que não estivesse sozinha, seria difícil explicar para Simon o que estava fazendo sozinha com um homem que nem conhecia.

— Sim senhorita, você me pediu meia hora você lembra? — Onde estava com a cabeça ?

— Estamos... sozinhos?! — Voltou a indagar.

Ele permaneceu quieto por alguns segundos e a Buxton sabia que ele olhava para os lados.

— E por que não estaríamos ?

Helena sorriu.

— Então vamos para casa.

(...)

O trotar dos cavalos era barulhento demais, o frio já atingia a parte interna de suas roupas e seus cabelos já estavam cheios pelo sereno presente. Ela coçou os olhos cansada pelo dia longo e quando a carruagem solavancou-a para frente ela soube que haviam chegado, espalmou a mão sobre a porta de marfim fria, sentindo a brisa gélida beijar seu rosto. 

— Eleanor chegou ? — Indagou baixo sabendo que o lacaio estava de prontidão para ampará-la. Já que a noite provavelmente havia tomado o lugar no céu, sua madrasta já estava de volta e mesmo que sempre tomasse o cuidado de voltar para casa antes dela, Helena às vezes não tinha tanta sorte, como provavelmente agora. 

— As luzes estão acesas, Senhorita. — Ele respondeu. Deixou a morena rente a porta enquanto ela abria a maçaneta gelada que rangeu em um grito quase chamando o nome da “matriarca”. Seus pés pesados rangeram sobre a madeira no chão enquanto suas mãos seguiam pelas paredes lisas pela tinta uniforme que Eleanor havia importado de outro continente no mês anterior, a última era áspera e arranhava suas mãos, como não podia ver ou enxergar se guiava pelo tato.

— Onde estava ? — Curta e direta, essa era sua madrasta. Sua voz soou série e um arrepio correu por seu corpo. Ela não era uma mulher de poucas palavras. 

— Eleanor ? — Não precisava perguntar pois ela já sabia, mas sua cabeça automaticamente lhe fazia prolongar aos fins de fato.

— Não rodeie minha pergunta. 

Um silêncio martirizou pelas entranhas de Hinata enquanto tomava o fôlego roubado pelo medo para tornar a falar novamente. 

— Me encontrei com Layse no Jardim da cidade. — Disse por fim. 

Os passos de Eleanor eram ouvidos, seus sapatos de salto grosso teciam um barulho medonho na madeira do chão, como um tic toc temeroso sobre seus tímpanos que engoliam cada barulho que se aproximava. 

— Encontrei Layse antes de entardecer sozinha indo para casa e como você também sabe, do Jardim até aqui leva menos de uma hora, levando em consideração tudo que eu acabei de lhe dizer, quero que me diga onde esteve. 

Sua saliva rasgou a garganta seca.

— Fui à catedral, tocar piano ! Eu juro que não estou a mentir, Simon me levou pode perguntar a ele-—

De repente o dedo fino e gelado tocou sua pele, uma carícia rude em seu queixo.

— Como ousa sair sem minha permissão ainda mais com um assassino á solta ? — Sentiu o hálito azedo se aproximar de seu rosto — Menina estúpida. 

Helena respirou fundo, aguardando mais algumas palavras que não vieram de imediato. Pelo que conhecia de seu pai, ela sabia que ele jamais seria conivente com o tratamento megéro que Eleanor disponibilizava a ela, e sabia também que sua realidade seria outra se ele estivesse entre os vivos. 

— Me perdoe. — Fora tudo o que conseguiu dizer. 

— A perdoarei, desde que mereça. — Sua voz se distanciou um pouco enquanto ecoava repetidamente pelo cômodo grande. — À sua direita há cinco candelabros, sujos com a cera de quatro velas que estão agarradas sobre suas pontas, limpe-os, deixe-os brilhando e então perdoarei sua desobediência. Caso contrário ficará trancada nesta casa sem ver o sol por um mês, Helena. 

Já era de se esperar. Tarefas impossíveis que somente sua madrasta era capaz de lhe designar, já esperando que a falha tombasse sobre ela como uma desgraça infame. 

Seus joelhos flexionaram-se para sair do cômodo, mas a voz da madrasta infernal a impediu.

— Onde vai ?

— Pedir uma esponja à Nerida. 

Eleanor riu feito fogo e fel.

— Não sairá deste cômodo até limpar as velas, sem ajuda de ninguém. —

suspirou se afastando ainda mais — Aliás, as velas estão acesas, Helena e algumas estão curtas demais, então tenha...cuidado para não se queimar.  

Seus olhos piscaram algumas vezes ainda sem visualizar nada, cegueira infinita, maldiga cegueira que a impedia de quase tudo. Sua noite seria longa. Tateou as mãos pela bancada da lareira no centro da sala encontrando o primeiro candelabro e logo na base pôde sentir as camadas grossas e duras de cera que concentravam-se cada vez mais espessas à medida que seus dedos subiam o ferro. Mas foi com a sede de terminar logo que o fogo atingiu seus dedos, dando a ela a primeira de muitas queimaduras que iria tomar suas mãos, pela tarefa que ocuparia o restante de suas horas até provavelmente o amanhecer.

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