§ Capítulo 4 §

°°°°Livia Cárter°°°°

Saio do elevador praticamente carregada de sacolas. Por algum motivo, Summer insistiu que eu deveria comprar algo "especial" para usar com Christopher amanhã à noite. Levei quase meia hora para convencê-la de que eu não iria para a cama com ele.

Sim, passamos quase uma hora em uma loja de lingeries, para no fim simplesmente voltarmos a andar pelo shopping, carregando inúmeras sacolas enquanto Summer fazia planos para a noite seguinte, na qual ela não participaria.

Agora são quase 22h40, seguimos pelo corredor, e Summer está radiante enquanto se dirige até a porta de seu apartamento.

— Você ficará perfeita naquele vestido. — A ruiva diz com entusiasmo, me fazendo rir de suas expressões.

— Não acredito que me fez gastar trezentos dólares em um vestido. — digo um pouco decepcionada agora que a ficha caiu, enquanto olho para a sacola onde a peça está.

— Vai valer a pena.

— Christopher realmente terá de fazer valer a pena todo o dinheiro gasto. — digo rindo, e um sorriso malicioso se forma em seus lábios. — Não dessa forma, Summer.

— Se você diz. — ela ri de minhas palavras e abre a porta de seu apartamento. — Vejo você amanhã, não esqueça que vamos almoçar com meus pais e logo depois vamos ao salão. — diz sorrindo e me lembrando do almoço com sua família.

— Eu não sou louca, tia me mandaria com uma passagem só de ida para o paraíso. — digo rindo, e ela gargalha de minhas palavras.

— Se bem que não é necessário, já que o irmão do meu cunhado parece ser o próprio paraíso em pessoa. — ela diz rindo e me fazendo revirar os olhos.

— Vejo você amanhã, Summer. — digo ao abrir a porta de meu apartamento, que coincidentemente fica em frente ao dela.

O lugar está escuro, apenas iluminado pela pouca luz da rua que entra pelas janelas, e com exceção dos enormes olhos amarelados que me observam de cima do sofá. Pantera vem em minha direção, se esfregando em minhas pernas como uma espécie de saudação, enquanto Sombra continua a me observar do mesmo lugar.

Opto por deixar as luzes apagadas, me chamem de louca, mas eu amo estar no escuro. Como conheço o apartamento como a palma de minha mão, não seria um problema me locomover pelos cômodos escuros.

Sigo para a cozinha, onde rapidamente acho o interruptor. Acendo a luz de tom meio azulado e reponho a ração dos donos do apartamento, afinal, pretendo dormir esta noite e não estou afim de acordar com dois pares de olhos amarelados no meio do escuro da madrugada.

Sinto calafrios percorrerem minha espinha e uma sensação de que estou sendo observada invade todo o meu corpo. Congelo por inteiro quando uma respiração quente se faz presente próximo à minha nuca.

— Você deveria ter acendido a luz ao entrar, talvez assim tivesse notado que tem visita. — A voz profunda e rouca se faz presente próximo à minha nuca. Meu corpo está paralisado em estado de choque, sinto como se fosse impossível me mexer.

Sinto o pânico tomando conta de mim, meu corpo treme freneticamente, minhas pernas fraquejam e chego ao meu ápice quando sinto a mão de quem quer que fosse pousar sutilmente em meus ombros.

Engasgo com um soluço silencioso enquanto as lágrimas descem por minha face como cascatas. Meu corpo inteiro treme e eu... Eu não consegui reagir.

— Me... Me deixa em paz... Me deixa em paz... por... por fa... por favor. — digo em meio a soluços, sem conseguir conter a sensação de medo que se apossa de mim a cada segundo.

— Livia, por favor, se acalme. Está tudo bem, você está segura... — a pessoa atrás de mim diz. Posso notar a preocupação em sua voz, mas eu não estava segura, não me sentia assim.

Grito alto quando mãos fortes envolvem meu corpo, me puxando para perto e me envolvendo em um abraço ao qual eu não desejava.

— Me solta, me solta. — digo em meio ao choro, enquanto me debato em seus braços.

— Por favor, se acalme, eu não farei mal algum a você. — ele diz tentando me acalmar. — Sou eu, Mason. Está tudo bem. Você está segura, por favor, se acalme. — ele diz com preocupação. Em um movimento brusco, ele me vira para sua frente, para me fazer observá-lo. Paro por um momento, a lucidez voltando ao meu ser.

O espanto que toma conta de mim faz com que me solte abruptamente de seus braços, me afastando imediatamente e cambaleando ao dar alguns passos para trás quando ele insiste em querer se aproximar.

— Você não tem o direito de estar aqui. — digo com raiva. Eu estava com raiva por ele ter invadido meu apartamento, com raiva por ele ter me assustado, eu estava com raiva por ele ter me feito reviver um dos momentos mais terríveis de minha vida, eu estava com raiva porque ele não tinha direito de estar aqui.

— Sinto muito, não queria assustá-la. Bem, eu, eu achei que talvez você quisesse... Bem, eu... — ele gagueja por um momento, fazendo meu sangue ferver ainda mais.

— Vá embora, não o quero em minha casa. Saia. — digo com firmeza, e percebo a expressão de espanto em seu rosto.

— Lívia, eu...

— Vá embora! — acabo por me descontrolar e gritar com ele. — Não vê que já me fez mal o suficiente para uma noite? Para uma vida, na verdade. Vá embora, Mason. — digo com as lágrimas tornando a escorrer pelo meu rosto.

— Não posso deixá-la nesse estado. — ele diz com preocupação, tentando se aproximar novamente. Antes que pudesse, minhas mãos alcançam a gaveta atrás de mim, e eu puxo o que quer que houvesse lá dentro. Notando ser uma faca de cortar carne, eu aponto para ele, que recua alguns passos, me observando com espanto.

— Livia, por favor. Deixe-me explicar, eu não queria lhe causar mal, eu... Eu... Merda, eu até trouxe algo para que você pudesse comer. Eu apenas queria, bem, eu queria lhe fazer uma surpresa e pedir perdão pelo acontecido desta madrugada. Errei ao tratá-la daquela maneira. — suas palavras saem com um misto de medo e receio, enquanto ele permanece estático em seu lugar.

— Querer se desculpar não lhe dá o direito de invadir meu apartamento. — Digo com raiva por toda aquela situação. — Eu poderia tê-lo matado, Mason, e acredite em mim, eu não iria presa por uma ideia idiota sua.

— Novamente peço desculpas, bem, não foi minha intenção. — ele diz um pouco sem jeito.

— Perdoado, agora vá embora. Eu preciso ficar sozinha. — digo tentando parecer calma o suficiente.

Contudo, o turbilhão que se formou dentro de mim ainda estava ali presente, como se esperasse por algo, um pequeno deslize para vir à tona.

— Tem certeza que está bem?

— O que realmente fez você vir até aqui? — pergunto por um momento. Apesar de tudo e do aperto que ainda está presente em meu peito, consigo me acalmar o suficiente para, não sei, tentar descobrir o que diabos meu chefe faz em meu apartamento no meio da noite.

— Já falei, queria me desculpar, então...

— Por favor, Mason, pelo tempo em que trabalho para você, seja sincero uma vez na vida. — digo com firmeza. Graças aos céus, minha voz soou melhor do que imaginei em minha mente. A boca de Mason se abre brevemente, para se fechar logo em seguida, o mesmo movimento repetido diversas vezes. — É isso, não é? Claro que sim. Por que mais se daria ao trabalho de cruzar a cidade e invadir meu apartamento se não soubesse que vou sair com seu irmão amanhã? — Jogo as mãos para o alto em sinal de frustração. Ele ainda me observa, paralisado no mesmo lugar. — Achou que eu aceitei sair com seu irmão pelo dinheiro ou status que sua família possui, estou certa?

— Peço que entenda meu lado, Lívia. Christopher acabou de sair de um relacionamento e está se reerguendo agora. Eu não gostaria de ver meu irmão... — Quanto mais palavras saem de sua boca, pior se torna o rancor e amargura que sinto pelo homem à minha frente.

— Não vou sair com seu irmão, satisfeito? Agora, por favor, vá embora. Não suporto olhar para você e sinceramente não pretendo fazer isso até segunda-feira. — digo, sentindo um embrulho no estômago, o mal-estar e a vontade de vomitar subindo por minha garganta.

— Eu sinto muito, Lívia. Você me entende, certo?

— Vá embora, Mason.

Agradeço aos céus quando ele simplesmente desiste de seus pedidos irritantes e sai pela porta da frente sem dizer uma só palavra. Corro para a sala e tranco a porta, acendo a luz que ainda estava apagada e vejo, sobre a mesa de centro, uma embalagem de alguma lanchonete, a qual Sombra e Pantera estavam rodeando.

Sinto meu estômago revirar e corro para o banheiro novamente, me ajoelhando próximo à bacia e pondo para fora tudo que comi nas últimas horas. M*****a situação em que ele me colocou. Tudo isso que acabou de acontecer, todo esse choque... Mason não faz ideia do quão mal isso me fez. É horrível se sentir impotente da forma como me senti momentos atrás.

Acontece que há alguns anos sofri horrores em um relacionamento abusivo. Até hoje, tenho algumas cicatrizes espalhadas pelo corpo, contudo, as piores cicatrizes são aquelas que ninguém pode ver. Meu último relacionamento me destruiu por completo, e quando esse imbecil que eu chamo de chefe fez a merda de invadir meu apartamento, eu simplesmente senti como se tudo estivesse voltando à tona.

O medo tomou conta de mim e eu não sabia como reagir. Por um momento, eu me senti impotente como há muito não me sentia. Mesmo após tanto tempo, as feridas continuam lá, os traumas ainda me perseguem. Com exceção de meus pais, Summer e sua família, ninguém mais conhece essa parte do meu passado e bem, eu torço para que continue assim.

Levanto-me de onde estava ao lado da bacia, dou descarga no meu vômito e ponho minha banheira para encher. Após um tempo, me permito submergir nas águas mornas, na tentativa falha de lavar a alma e me livrar de todos os fantasmas que acabaram vindo à tona.

Se há uma coisa da qual posso ter certeza, é que essa será uma longa noite.

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