Capítulo 3

Noah me encarava com sua cara de pamonha, enrugou a testa levando a mão no queixo e estalou a língua no céu da boca. 

— Não sabia que tinha virado piadista.

Bufei virando o resto do meu saquê na boca enchendo o copo com mais. Sabia que não devia ter ido pedir ajuda logo para esse lesado.

— Estou falando sério. — resmunguei olhando para as pessoas em volta.

— Acho que a bebida está subindo na sua cabeça, não deveria beber a essa hora do dia.

— Noah eu estou ouvindo os pensamentos das mulheres, não é a porcaria da bebida. — me exaltei batendo o copo na mesa.

Que saco.

Senti olhares queimando em minha direção e Noah sorriu para as pessoas curiosas acenando.

— Acho que já chega de bebida por hoje, você precisa voltar para o trabalho. — Noah tentou pegar meu copo de bebida e eu o empurrei.

— Você é um idiota. — me levantei irritado levando minha garrafa de saquê.

— Dante, você não está bem. — ele me seguiu tagarelando.

Passei pelo meio de algumas mulheres ouvindo suas risadas e vozes começaram ecoar em minha cabeça ao mesmo tempo. Porra.

" Olha os gatinhos passando hum hum "

" Que vestido eu vou usar hoje? "

" O cabelo da Eliza está horrível, olha que cor desbotada. "

" Será que ela sabe que o rosa seco já saiu de moda mês passado? "

" Estou louca pelo capítulo da novela de hoje "

Tampei os ouvidos saindo dali o mais rápido possível, empurrei a porta de vidro caminhando em direção ao meu carro do outro lado da rua e senti as mãos de Noah em meu ombro.

— Relaxa amigo, acho que você está trabalhando demais, esta dormindo direito?

— Não acredita em mim não é?

— Sabe é meio que impossível alguém ler a mente de outras pessoas, já pensou em visitar um psicólogo? — ele riu  coçando a nuca.

O fuzilei com os olhos e entrei em meu carro batendo a porta com força. Bebi o resto da minha bebida e joguei a garrafa pela janela. Noah desviou da garrafa voadora e se aproximou apoiando os braços na janela do meu carro.

— Estou falando sério Dante, conheço ótimos psicólogos e psiquiatras. — disse me olhando com pena.

— Se fode.

Pisei o pé no acelerador deixando aquele idiota para trás. 

— Saco.

Ninguém me entende.

Segui o caminho para empresa e não demorou para que eu estacionasse em frente ao grande prédio de vidro. Já eram duas da tarde e eu já tinha ficado muito tempo fora. Preciso esquecer que estou enlouquecendo e voltar a trabalhar como se nada tivesse acontecido.

— Bem vindo de volta Senhor Lawrence . — Amélia  me cumprimentou assim que me aproximei da minha sala.

Ela não tirava o sorriso do rosto, quando estiver com câimbra quero ver se ela continua sorrindo.

— O Senhor está atrasado para sua reunião. — me alertou.

Arregalei os olhos dando meia volta seguindo em direção a sala de reuniões, Amélia  me seguiu estendendo um copo de café que eu bebi em um único gole.

"Ele tá parecendo um noiado, será que eu falo? "

Parei de andar dando meia volta para o outro lado seguindo para o banheiro. Joguei água e sabão em meu rosto enxugando com papel toalha. 

— Noiado? Era só o que faltava.

Sai do banheiro encontrando minha secretária me esperando na porta. Ela me analisou dos pés à cabeça e entortou os lábios.

"Agora ele molhou o terno com água e irritou o olho com sabão, deve esta doente tadinho"

— Aceita uma balinha de menta? — balançou a balinha nos dedos.

Meu olho começou a tremer em um tique nervoso e eu respirei fundo tomando a balinha de suas mãos voltando a seguir para a sala de reuniões, ignorando as ofensas e orações de pena da minha secretária.

— Senhores me desculpem pelo atraso. 

Entrei na sala cercada de sócios recebendo um olhar repreendedor de Robert e me sentei em minha cadeira com minha secretária ao lado. Cruzei as mãos sobre a mesa ganhando a atenção de todos, não deixei de perceber alguns olhares estranhos.

— Podemos começar? — perguntei e todos assentiram.

— Claro.

Eles começaram a falar sobre a nova parceria com as empresas vizinhas, mas eu não estava conseguindo me concentrar pois Amélia  não calava a boca.

" Ai essa calcinha está me incomodando, porque eu fui inventar de usar calcinha fio dental? acho que vou tirar"

— O que você acha Dante? — ouvi a voz de Robert.

— Pode tirar.

— Tirar o quê?

— A calcinha. — murmurei imaginando minha secretária sem calcinha.

— Que calcinha? — ele rosnou me fuzilando e eu tossi falso me recompondo.

Todos me encaravam com caretas estranhas, inclusive Amélia . Que merda estava acontecendo comigo?

— O que você disse? — sorri amarelo.

— Dante gosta de fazer piadas. 

Robert mudou de assunto e todos riram voltando à reunião. Resolvi ficar calado ignorando Amélia  que cantava uma música mexicana em minha cabeça. Tampei os ouvidos apertando os olhos ouvindo aquela gritaria desafinada.

" Y tu lo olvidarias

Pero vas a ver, y vas a ver

Vas a querer volver

Y vas a ver, tu vas a ver

Vas a querer volver "

Sai daquela sala apressado com os olhos arregalados. Minha cabeça doía depois do Show que Amélia  deu, ela canta desde músicas mexicanas a tailandesas. E sua voz não era nada afinada.

Eu estava prestes a demiti-la por desafinação.

— O que foi aquilo Dante? — Robert me seguiu até minha sala.

Me joguei em minha cadeira massageando as têmporas.

— Não estou me sentindo bem.

  — Percebe-se, olha o seu estado, você andou se drogando? — ele bufou jogando as mãos em minha direção.

— Claro que não seu bastardo. — resmunguei o olhando feio.

— Essa reunião foi muito importante Dante, e você parecia estar no mundo da lua.

Estava no mundo em que Amélia  era uma cantora famosa que cantava mal pra caralho e achava que estava brilhando.

— Hn.

— Não sei o que está acontecendo com você, mas é melhor se tratar.

Por que todo mundo resolveu que preciso me tratar agora? eu não estou tão ruim assim.

É só uma fase difícil.

— Você está horrível. — ele continuou a me avacalhar.

— Sai daqui seu bosta. — lhe joguei uma caneta na testa.

Povo chato.

— Vai trabalhar, talvez isso tire esse seu estresse. — ele balançou a cabeça pegando a caneta antes que atingisse seu rosto e se virou indo embora.

— Se lasque.

Tentei me concentrar no trabalho e na medida que o tempo se passava eu me sentia menos doido. O silêncio me fazia bem. 

Terminei o que tinha que fazer até as 5 da tarde e organizei minhas coisas pronto para ir embora. Afrouxei minha gravata saindo da sala e encontrei minha secretária conversando com a de Robert, mas assim que me aproximei elas cortaram o assunto.

A loira me cumprimentou com um aceno discreto e uma cara fechada e Amélia  abriu um sorriso juntando as mãos na cintura.

Por um momento me perguntei se ela tinha tirado a calcinha.

— Já está de saída Senhor Lawrence?

— Sim.

— Então até a próxima segunda.

— Tudo bem.

Passei por elas seguindo para o elevador ouvindo suas vozes em minha cabeça.

" Canalha gostoso "

" Vou fazer meu pudim hoje "

Respirei fundo e entrei na lata de metal agradecendo aos céus por hoje ser sexta. Passarei o final de semana hibernando, bem longe de mulheres sem noção que não conseguem controlar os próprios pensamentos.

Que Deus ouça minhas orações.

Quando cheguei em casa fui direto para o quarto, tirei a roupa a jogando em qualquer canto e entrei no banheiro tomando um banho frio para esfriar a cabeça.

— Ouvir pensamentos de mulheres, essa é boa.

Me enrolei em uma toalha e saí do banheiro me jogando em minha cama morto de cansaço.

— PAI, VOCÊ TA AI? — ouvi o grito de Alana e resmunguei.

— Tô. — murmurei quase dormindo.

Ouvi a porta ser aberta e latidos.

— Olha o cachorrinho que a vovó mandou pelo correio. 

Senti algo subindo em cima de mim me melando de baba e vi uma bola peluda branca lambendo meu rosto. 

— Sai de cima de mim. — fiz uma careta tentando empurrar aquele bicho pra longe e gritei de dor quando aquele maldito mordeu meu saco.

Caralho.

Caí da cama gritando de dor, eu juro que ainda mato alguém hoje.

— Não seja escandaloso pai, tá assustando o Jacke. — Alana me repreendeu.

Jacke o caralho.

— TIRA ESSA PORCARIA DAQUI. 

— Depois não reclama quando eu não conversar com você. — ela grunhiu saindo do quarto a passos pesados batendo a porta.

" Aquele idiota, não sabe nem dar a atenção que eu quero, queria ter sido filha do tio Noah "

Choraminguei de dor e de ego ferido, acabei dormindo no chão mesmo. Tava acabado demais para me levantar.

Por que tudo resolveu dar errado? que onda de azar do cão é essa?

— Senhor Lawrence ? — ouvi alguém me chamar e resmunguei abrindo os olhos.

— Apaga essa luz Samara.

Cobri o rosto com os braços.

— Me desculpe incomodar, é que eu vi o Senhor aí no chão e fiquei preocupada.

"É uma tentação dormindo apenas de toalha "

Me sentei todo dolorido esfregando as mãos no rosto vendo que já tinha amanhecido. Tentei me levantar e Samara me ajudou. Estralei as costas me sentindo todo quebrado.

— O Senhor quer alguma coisa?

— Faça um café pra mim e me dê um remédio para dor no corpo. — resmunguei segurando a toalha em volta da minha cintura.

— Sim Senhor. — ela assentiu saindo do quarto.

— Merda de vida. 

Segui para o banheiro e fiz minhas higienes matinais, tentando não escorregar e cair com a cabeça no vaso.

Vesti um short e uma camisa mais solta e calcei um tênis saindo do quarto. Alana passou por mim pelo corredor e me ignorou totalmente.

— Alana. — A chamei sendo ignorado.

— Me esquece.

— Eu vou correr no parque, quer ir comigo?

— Chama alguma puta pra ir com você.

Eu realmente devo ser um péssimo pai.

Resolvi deixar Alana quieta e fui para cozinha tomar meu café e remédio. Ignorei os pensamentos pervertidos de Samara, eu iria fazer isso de agora em diante. Ignorar essas mulheres malucas.

— Tenha um bom passeio Senhor Lawrence . 

— Hn.

"Tomara que caia e quebre a cara"

Ouvi a voz de Alana assim que passei por ela.

— É bom saber que me ama tanto assim, filha.

Com uma filha dessas nem preciso de inimigos.

Revirei os olhos saindo de casa e me alonguei vendo a rua pouco movimentada. Comecei a correr em direção à praça central ouvindo as mulheres me tarando na rua. Vou começar a andar armado, tenho quase certeza que vou ser sequestrado qualquer dia desses por um bando de mulheres no cio querendo me obrigar a ser escravo sexual delas.

" Com um homem desses em minha casa eu estaria realizada "

" Olha que bunda durinha "

" Eu podia sequestrá-lo pra mim, onde foi que eu coloquei minha arma? "

Tá legal, tô começando a me assustar.

Corri para longe daquela doida que fuçava na bolsa provavelmente à procura da arma. Atravessei a rua entrando no parque que estava bastante movimentado e parei ofegante apoiando as mãos nos joelhos.

Estou me sentindo um velho acabado.

— CUIDADO. — ouvi um grito feminino cnhecido e levantei a cabeça assustado sentindo algo esbarrar contra meu corpo me fazendo cair igual jaca podre.

" Ai meu Deus é o Senhor Lawrence  "

A coisa em cima de mim falou e eu ergui o olhar encontrando olhos verdes bem próximos do meu. 

— Amélia .

Minha secretária se sentou no meu quadril com o rosto corado e começou a falar sem parar.

— Me desculpe Senhor Lawrence, por favor não me demita, eu perdi o controle dos meus patins. — disse exasperada balançando as mãos e se esfregando em meu colo.

Franzi o cenho analisando aquela pequena criatura que estava começando a me deixar duro. Diferente de como vai trabalhar ela estava mais exposta, regata vermelha colada marcando a cintura fina e os seios medianos, o short era curto mostrando as pernas torneadas que eu estava começando a gostar de admirar.

" Droga é agora que eu perco meu emprego, péssimo dia para andar de patins"

Ela me olhava aflita com um bico na boca e logo arregalou os olhos pulando do meu colo, acho que sentiu meu parceiro animado. Me sentei estralando minhas costas, estava todo acabado que nem sentia mais dor.

" Meu deus que vergonha eu preciso encontrar um buraco no chão pra me enfiar "

Não aguentei e sorri do desespero dela. Aquela mulher era hilária, realmente diferente de tudo que eu já vi. 

— Não se preocupe, eu não vou te demitir. — disse me levantando atraindo sua atenção.

— Sério? eu posso lavar seu carro se você quiser. — ela tentou se levantar deslizando nos patins cor de rosa e eu a segurei antes que ela levasse um tombo.

— Não precisa. — sussurrei próximo ao seu rosto corado e ela sorriu tímida. 

" Ai meu Deus "

— O Senhor é gentil.

— Não me chame de Senhor, eu me sinto velho.

— Ah, tudo bem. 

Ela tirou timidamente minhas mãos de sua cintura e se afastou se equilibrando nos patins, a olhei dos pés a cabeça e decidi que precisava saber mais sobre aquela mulher. 

Amélia  conseguiu atrair minha curiosidade.

— Quer me acompanhar em meu passeio? — perguntei limpando meu short lhe lançando um olhar mais sedutor que sempre deixava as mulheres loucas.

— Não quero atrapalhar. — ela balançou as mãos em frente ao corpo.

— Não vai, não é legal correr sozinho.

Lhe dei um sorriso torto.

— Tudo bem, uma corrida não faz mal a ninguém. — Amélia  sorriu começando a deslizar em seus patins em um ritmo devagar e eu a acompanhei.

— Você mora aqui perto? — puxei assunto.

— Ah não, só os ricos moram por aqui. — respondeu cruzando os braços atrás das costas olhando para os pássaros passando.

Acabei descobrindo o motivo por ela não ter me visto, Amélia estava bem desatenta.

— Gosta de Natureza? — perguntei atraindo sua atenção e seus olhos se iluminaram.

— Amo, é tão tranquilo e harmonioso.

— Hn.

— Soube que você tem uma filha, ela está por aqui? — perguntou animada.

— Ah não.

— Ela não gosta de parques?

— Sim, mas ela não quis vir hoje. — respondi me lembrando o quanto minha filha me amava.

— Entendo.

Ficamos em silêncio e eu a observava deslizar em seus patins, dava até algumas piruetas.

— Então Amélia, você tem namorado? — perguntei a vendo arregalar os olhos e se desequilibrar caindo dentro de uma moita com as pernas para cima.

" Ai, parabéns Amélia  você esta se superando, será que se eu falar que o único namorado que eu tenho é minha cama ele vai rir de mim?

— O que o Senhor disse? — ela colocou a cabeça para fora com os cabelos cheios de folhas.

Aquela imagem ficaria guardada em minha memória por um bom tempo.

— Quer sair comigo? — sorri a vendo arregalar os olhos corada.

— Sa..ir? — gaguejou.

" O que está acontecendo aqui meu deus? "

— É sair. — respondi a ajudando sair de dentro da moita.

Ela bateu as mãos contra o corpo tirando a sujeira e umedeceu os lábios erguendo o olhar em minha direção que agora estava sério. 

— Me desculpe Senhor Lawrence, mas não vai dar. — respondeu cruzando as mãos em frente ao corpo.

" Que situação constrangedora "

Meu sorriso morreu na hora, o quê?

— Por que não? — a olhei indignado.

— Nossa relação é somente profissional, me desculpe se eu dei a entender algo errado. Bom, eu preciso ir agora, boa corrida. — ela sorriu fraco e acenou indo embora.

Abri a boca incrédulo, a vendo se afastar.

Levei as mãos à cintura balançando a cabeça vendo a primeira mulher que me deu um fora na vida ir embora me deixando igual um paspalho. 

— Eu levei um fora? — murmurei indignado.

Não acredito no que meus olhos estão vendo.

— Isso sempre acontece comigo, se preocupe não que logo passa, é só a velhice chegando, quer jogar xadrez? — ouvi um velho que estava sentado em uma mesa jogando xadrez.

Tsc.

— VELHICE CHEGANDO O ESCAMBAU. 

O velho me olhou estranho e eu soltei um rosnado voltando a correr a passos pesados.

— Velhice chegando o caralho. Ta pra nascer a mulher que vai me dar um fora. Amélia  não perde por esperar.

" Aha achei minha arma." — encontrei a mulher de agora a pouco que queria me sequestrar.

Arregalei os olhos a vendo me dar um sorriso sinistro.

— SOCORRO.

Atravessei a rua correndo e quase fui atropelado por um carrinho de mão.

" Volta aqui meu gostosão, a tia Josefina quer brincar com você"

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