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Aura de cada um

Fim de semana, Fábio sai do metrô, voltando de um curso, andando a pé pelo centro da cidade, ao atravessar o viaduto sente uma enorme angustia em seu peito, para num canto para se apoiar, respira fundo, temendo que uma nova crise estivesse para começar. Ao olhar na direção de uma multidão em frente ao Teatro Municipal sente algo estranho, e ouve baixinho em sua mente um apelo:

 "—Me ajude... por favor"

Olha para os lados e não vê nada. Continua a andar e, de novo, ouve a suplica: “me ajude”.  Fábio para de andar e olha ao redor sem saber o que fazer e sente uma agonia por não identificar quem o está chamando.  Nesse momento, tudo em volta dele se paralisa: os carros, as pessoas na rua, os pombos que voavam.

O letreiro digital de avanço de pedestres fica trepidando entre a cor verde e vermelha, numa frequência anormal.

A Luz dentro de cada um

Durante essa lacuna temporal Fábio fica imobilizado, enquanto surgem diversas colunas de luz, provenientes de cada pessoa que estava na rua, muitos emitiam luz, mas outros não irradiavam nada, somente possuíam uma aura escura (como uma fumaça preta), como se estivessem vazias. Ao olhar na direção de um beco, vê uma aura diferente das outras, a qual pairava sobre uma criança deitada no chão úmido, ondas luminosas saiam dessa criança, escapando em direção ao céu, enquanto que lá do espaço infinito descia uma coluna de luz branca, envolvendo-a dentro de espirais cintilantes. A cena comovente e perturbadora se interrompe e tudo volta ao normal, a duração daquela visão levara frações de segundo.

Fábio anda devagar em direção àquela criança que vira no beco, chega lá e vê uma menina de uns dez anos de idade, encolhida num cobertor sujo, era por isso que mal podia vê-la, também havia se machucado, sua mão tinha um corte visível.

Não havia outro adulto por perto, ela fora abandonada naquele lugar lúgubre, e quando se abaixa para observa-la melhor a menina abre um sorriso e fala com um grande suspiro de esperança:

—Moço, você é um anjo?

Ele puxa uma lata e senta perto dela.

—Anjo...??

—Eu implorei a Deus para mandar um anjo me ajudar?

Fábio fica atônito, teria ele sido enviado para ajudar alguém sem ele saber.

—O que aconteceu? Por que você pediu ajuda?

—Minha mãe foi atropelada neste cruzamento e quando voltei da esquina ela estava no chão caída, e as pessoas colocavam jornais encima dela, fiquei ao seu lado o tempo todo, gritei, chorei, mas ela não acordava, então chegou um caminhão preto que levou ela embora, as pessoas em volta dificultaram para chegar perto e não consegui ir junto com ela.

Fica emocionado com essa história dramática e agora entendia porque havia sido conduzido até ali.

—Qual o teu nome?

—Daniele.

—Dany, você está com fome?

—Estou (...) muita.

Aquela criancinha começa a esboçar um sorriso apesar de sua vida tão curta e sofrida. Fábio abraça a criança tão carente de carinho e a levanta nos braços, sem se importar com cheiro ou a sujeira, e a leva pela rua, pensando no que deveria fazer, a criança transbordava de felicidade, era o pai que nunca teve, e falava repetidamente:

—Deus me mandou um anjo, ele ouviu minha oração.

Fábio chora emocionado.

—Ele mandou sim (...) Deus ouviu você!

Ele leva a menina até a padaria, Compra comida para ela, passa numa loja e compra roupas novas para ela, vai até uma creche que conhecia lá perto, passa algumas horas com ela, as atendentes lhe dão banho, cuidam dela, lhe conseguem um quarto com uma cama limpa, o moço se compromete a ajudar a creche a cuidar da pequena Dany. Os dois sentam num banco:

—Dany, não posso ficar, mas virei te visitar sempre, ok?

A criança sabia de sua condição e sorriu compreensivamente, mas sabia que o “anjo” voltaria.

—Obrigada, anjo.

Fábio volta a chorar, pega ela pelos braços, olha em seus olhos agora limpos e diz:

—Eu não vou te abandonar, viu.

(Os dois se abraçam)

Ele prometeu visitar Daniele sempre que pudesse, vai embora com um aperto no coração, mas tinha decidido ajudá-la como se fosse sua filha.

 

Primeira Foto

Volta para casa refletindo sobre os acontecimentos daquele dia, olha pela janela de seu apartamento e vê os turistas do hotel em frente, aproveitando o sol da tarde para pular na piscina. Imagina como seria bom estar no lugar deles, então vai para o quarto, j**a os sapatos em qualquer direção, cai na cama e apaga.

Números

Durante o sonho vê um dia nublado e triste, estava sozinho, perdido, imerso no silêncio sufocante do mar, enquanto uma pálida claridade pairava acima de sua cabeça, cintilando fragilmente na superfície. Não resistindo mais à falta de ar, já prestes a se afogar, sente suas forças se esgotarem e fica incapacitado de respirar, então se rende e fecha os olhos, quando de súbito uma luz amigável e quente se aproxima dele e passa a iluminar a superfície acima de si, nesse momento uma voz trovejante ecoa por todos os lados di­zendo:

“AINDA NÃO CHEGOU A HORA! ”

Sua visão estava escurecida, mas aquela voz lhe trazia paz, sente ser empurrado para cima da superfície, e em seguida vê seu corpo ser colocado no leito de uma sala branca. Fios de luz saiam de seu corpo, e se conectavam à uma pessoa no leito ao lado, a qual não conseguia reconhecer, mas o número “16” pairava sobre ela. Essa cena o faz olhar em volta de si e então percebe que o número “9” flutuava sobre seu próprio corpo.

Acorda de repente, olha o relógio e descobre que já era madrugada, fica chateado ao pensar que perdera o dia dormindo, ainda deitado liga a secretária eletrônica e várias mensa­gens se sucedem:

“—Você esqueceu o compromisso de tarde (Beep); Fábio, pode me ajudar num trabalho da facul­dade? (Beep); vamos à praia ama­nhã, liga aí! (Beep). “

Puxa o cabo da tomada, por não estar a fim de sair ou de retornar as chamadas, e ao verificar suas mensagens no celular depara com várias propagandas e se incomoda com a quantidade de spams, que faziam sua conta parecer uma lata de lixo. Começa a apagar mensagens aos lotes, quando sem querer seleciona a mensagem de Kimy, ela havia respondido:

“  Oi Fábio...  

Nossa és bem mais jovem do que eu imaginava, eu teclo de Blumenau / SC.

A foto é tua mesmo? Olhos de homem, rosto de menino...:) voltando ao nosso assunto... trabalho numa seguradora de carros e a gente lida com acidentes de todo o tipo, alguns são fatais... às vezes não consigo entender porque uma família com crianças pequenas pode interromper tão violentamente sua vida, que são jovens e tem tantas coisas para fazer, lugares para visitar, porque a vida é interrompida assim, tão friamente?

Tem sido legal me corresponder contigo...  Assisti a um filme certa vez, sobre um casal que, apesar de estar distante, sempre olhava para a mesma lua à noite.

Saiba que terá uma amiga sempre olhando para a lua à noite lembrando de ti.

Beijão 

Fábio acha divertida a descrição "olhos de homem, rosto de menino? ”  Parecia a Jane descrevendo o Tarzan (sor­ri). Desta vez Kimy mandara sua foto, e imediatamente lhe vem a lembrança do rosto que vira em seu estranho sonho horas atrás, fica intrigado pois parecia muito com o desta moça de olhar doce, meio oriental e com sorriso cativante, foi assim que se apaixonou por Kimy, através de uma simples foto. Não era casualidade, o universo rompera as barreiras do tempo e espaço para iniciar a união de ambos ali naquele instante, mesmo que através da internet.

Começa a escrever aquilo que lhe vem ao coração, não queria perder aquele momento de inspiração, envia a resposta para Kimy e vai dormir, com um sorriso enigmático no rosto.

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