Naquela mesma noite os dois encontraram-se naquele local da propriedade, exatamente como haviam combinado, na hora que acontecia o jantar dos funcionários da fazenda. Como a casa era espaçosa e cheia de cômodos era fácil se ocultar nela sem que alguém percebesse sua ausência, além do que era costume não descer a qualquer uma das salas se o Coronel estivesse viajando a negócios e seus observadores relaxavam na vigilância.
Acreditavam que sendo noite a menina não ousaria tentar fugir naquela escuridão sem conhecer bem a região. Aquele era o momento exato para tentar uma fuga, contando com a parceria de Carlos Eduardo que mesmo acovardado seria de grande valia, pois cresceu naquelas terras e as conhecia muito bem.
Mostrando-se competente, o medroso rapaz providenciou duas montarias para escaparem, que se encontravam escondidos a pelo menos um quilômetro de onde estavam. Após ter certeza de que o caminho estaria realmente livre para seguirem viagem, partiram o mais breve
epois de serem apreendidos pelos policiais corruptos a delegacia em Castanhal e entregues a seus inimigos os dois amigos foram levados de volta à fazenda de onde fugiram dias antes. Enquanto ela foi trancafiada no seu quarto sob forte vigilância, Carlos Eduardo foi grandemente espancado por ordens de Santiago e em seguida lançado num porão escuro e cheio de ratos, amarrado pés e mãos, para que morresse aos poucos, sem alimentar-se e contaminado com as doenças transmitidas pelos roedores. Durante vários dias Walquíria permaneceu presa dentro de seus aposentos sem receber qualquer visita, nem mesmo do Coronel, para que pudesse ter notícias do amigo. Sua alimentação lhe era entregue por uma pequena passagem localizada por baixo da porta e ao gritar para que alguém a ouvisse e lhe prestasse ajuda, a resposta era um total silêncio. Ouvia passos no corredor, mas pareciam ser de fantasmas que nunca respondiam a seus clamores, as janelas fechadas e o teto forrado de ge
Amanheceu e percebia-se um grande alvoroço na fazenda, com os empregados correndo de um lado para o outro, matavam-se bezerros, organizava-se a casa, espalhavam-se muitas mesas e cadeiras por todo o grande terreiro da propriedade, bebidas, muitas frutas e comidas diversas eram preparadas na espaçosa cozinha... Ela apenas observava tudo por trás do vidro escuro da janela do quarto de horrores onde vivia trancada como um animal enjaulado, aguardando o dia da matança. Completava naquele domingo de primavera mais um ano de vida, aqueles preparativos eram para a festa que aconteceria em sua homenagem. Cinicamente o Coronel decidiu comemorar seus dezesseis anos e trazer vários de seus convidados para conhecer aquela que dizia ser sua “sobrinha”, filha de uma irmã distante. Mentira que era confirmada pelos subalternos, que não correriam o risco de perder a vida caso falassem o contrário. Somente os amigos mais próximos dele, igualmente pedófilos, sabiam a verdade. Por
Maurício, apesar de ainda muito moço, era o responsável por todas as propriedades agrícolas do pai que depois de alcançar certa idade decidiu aproveitar os anos de sua velhice divertindo-se na prostituição com meninas, um costume característico dos coronéis daquela época. Filho único de um casal de imigrantes espanhóis, morava sozinho com o pai viúvo, na grande mansão construída numa das dezenas de fazendas que possuíam no Sul do Estado paraense. Até o dia anterior não passava de um jovem milionário, criador de gados, dono de mais terras que qualquer outro na região, bem mais que o Coronel Santiago. O mesmo maldito pedófilo que o tinha convidado para o aniversário daquela que disse ser sua sobrinha. Desde o dia em que teve aquele inesquecível encontro com aquela mulher encantadora nunca mais conseguiu tirá-la de seus pensamentos. Em algumas ocasiões a vontade de voltar a vê-la era tanta que chegou a querer criar situações que lhe permitissem retornar ao lugar o
Os dois amigos passaram vários dias preparando um minucioso plano para libertar a jovem que a muito tempo vivia como prisioneira do temido Coronel e o principal cuidado no planejamento era evitar que ele pudesse voltar a repetir a façanha anterior, quando, além de capturar os dois fugitivos ainda teve a chance de executar Eduardo de formar horrível. Aumentando ainda mais o domínio sobre seus subalternos e o respeito de seus aliados sobre seu nome, que já era bastante temido por toda a região. Após concluírem os pormenores da ação passaram a colocar em prática suas teorias. Antônio reuniu cerca de cem homens que atuavam como pistoleiros de aluguel. Eram jagunços demitidos de fazendas que faliram ou não precisavam mais de seus serviços e decidiram viver prestando serviços de pistolagem a quem os contratassem. Durante a reunião foram orientados do objetivo central da missão e deram o preço que acharam justo pelo trabalho a ser prestado, pediram um altíssimo valor.
Como de costume, naquele sábado pela manhã o casal de fazendeiros chegou bem cedo a feira livre localizada no centro do pequeno vilarejo. A maioria dos comerciantes que os conheciam iam cumprimentá-los por respeito ao apoio que deles sempre receberam. Infelizmente, meio aos feirantes estavam os homens de Santiago, aguardando que eles chegassem para conferir a informação que receberam. O carinho que a população demonstrava ter pelos dois era imensa, por cada canto que passavam multidões se aglomeravam para cumprimenta-los. Agir contra eles meio a população seria suicídio e seus inimigos não pretendiam cometer este erro, apenas observavam de longe. O objetivo central era ter certeza de que a jovem era mesmo a fugitiva e depois de confirmar isso eles partiram em regresso a fazenda Santa Maria, trazendo as novidades ao feroz Coronel. Quem levou o fato a Santiago foi o capataz: — Bom dia Coronel, trago novidades sobre a investigação que o senhor recomendou ser feita
A viagem de volta foi cansativa e a única satisfação que trazia na alma era que iria chegar em casa, poder abraçar seu filho, beijar sua amada e descansar ao seu lado como acontecia sempre que retornava de uma viagem de negócios. Mas o que na verdade o aguardava eram momentos de completo desespero angústias. Várias vezes Walquíria teve presságios de que um dia Santiago invadiria aquela fazenda e destruiria a paz que juntos criaram para eles e seu filho, mas ele nunca acreditou nas suas advertências. Por causa do poder econômico que possuía achava-se intocável, mas ela sabia que o mal não mede limites e, quando decide agir não importa quão forte sejam as barreiras de defesas que se criem para evita-lo. Por causa de sua incredulidade agora retornaria para casa e encontraria suas terras invadidas e sua esposa desaparecida. Ao chegar em sua propriedade ficou estarrecido com o que encontrou, exigiu explicações de seu capataz. Queria saber onde estavam sua espo
Sua indignação era tamanha que, olhando seriamente para seus subalternos ordenou-lhes, dizendo: — Levem este maldito de volta para suas terras, quero vê-lo pagar por suas atrocidades no mesmo lugar onde meus amigos perderam suas vidas de forma cruel e impiedosa! — Vamos voltar? Não seria mais prático me dar um tiro certeiro no peito ou na cabeça e acabar logo de vez com essa palhaçada? Acha mesmo que alguma coisa que fizer contra mim vai vingar a morte daqueles inúteis? Eles morreram como mereciam morrer, eu os matei como se deve matar uns cães sem qualquer importância! Ela o golpeia com um forte chute no queixo, estando ele de joelhos, enraivecida ao ouvi-lo menosprezando aqueles a quem amava e os viu sendo mortos sem que pudesse ajuda-los. Depois daquelas coisas, seguida por Maurício e seus homens, chegou depois de várias horas ao destino. O local de seu cativeiro e o palco de execução do casal de amigos que se compadec
Naquela manhã de inverno, quando chovia forte e uma ventania oriental soprava lentamente sobre os telhados da belíssima casa na fazenda, cercada por um florido jardim, cheio de rosas vermelhas e jasmins do campo. Durante sua passagem, o vento fazia um barulho suave, gostoso de se ouvir junto ao trepidar dos pingos de chuvas que caiam sobre as telhas de barro. Fabricadas nas olarias locais, pelas mãos calejadas dos muitos colonos que sobreviviam deste ofício. Às janelas, com seus vidros escuros, mal permitia se ver lá fora. Mas o frio que acompanhava o anoitecer era bom demais de ser sentido e propicio para o amor, e o casal permanecia ali. Diante da lareira, completamente entregues a paixão do momento,aproveitando cada segundo da felicidade que lhes foi permitido viver, depois de tantos sofrimentos. Depois de finalmente vencer e destruir o mal que lhes perseguia, os dois poderiam finalmente recomeçar a felicidade que foi bruscamente inte