Capítulo sete

Cause I can't make you love me if you don't

You can't make your heart feel something it won't

Here in the dark, in these final hours

I will lay down my heart and I'll feel the power

But you won't, no you won't

Cause I can't make you love me, if you don't

Dave Thomas Junior - I Can't Make You Love Me

— Vem, querida, vamos deitar. — Monica passava as mãos em minhas costas, com cuidado.

— Não, eu preciso terminar o jantar. O Adam, ele...

— Meu Deus, Melanie! Ele te bateu! A merda ia estar feita se eu não interferisse! Larga de pensar naquele puto e pensa em você; nos seus filhos, que porra! — Ela gritou comigo. Abaixei a cabeça.

— Monica, ele é seu irmão — falei, chorando.

Depois que Pedro subiu, por insistência dela, me levantei do chão e limpei tudo. Estava começando a refazer o jantar quando Monica me interrompeu.

— Eu já te disse que não é para fazer jantar, que o sem-vergonha fique com fome!

— Mas, Monica... — tentei falar.

— Nem vem com o papo de que ele é meu irmão, pois você também é! — Ela se aproximou e segurou as minhas mãos. — É aquela que sempre me estendeu a mão e sempre irá estender. Você é mais minha irmã que aquele sem-vergonha. Vamos deitar, as crianças ficarão com a gente no meu quarto. Isso não é um pedido, é uma ordem. — Ela me olhava expressando súplica.

— Tudo bem. — Funguei, passando com cuidado a mão no nariz. — Vou me limpar e arrumar o quarto.

— Ok. Eu vou arrumar tudo aqui, já subo. — Ela disse, pegando as panelas de cima do fogão; mas nem deixou eu me afastar.

Abraçou-me forte e deu-me um beijo na cabeça.

Chorei um pouco nos braços dela e a larguei.

Corri para o meu quarto. Suspirei aliviada ao ver que Adam não estava ali. Limpei meu rosto, escovei os dentes, minha boca, meu nariz...

O meu estômago doía demais, assim como minha cabeça, então eu peguei um comprimido para dor e tomei com água da pia.

Assim que fechei o espelho, me encarei. Meus olhos estavam inchados, assim como a minha boca. Uma dor profunda se instalou dentro de mim. Como ele podia fazer isso, como?!

Sentei no chão do banheiro, segurei meus joelhos, e as lágrimas caíam em abundância. Não sabia mais nem o que pensar.

Às vezes palavras sobram quando sofremos demais. Às vezes precisamos sangrar para entender que nada nessa vida é eterno; e às vezes, quem mais amamos é quem mais nos machuca.

— Mel... — escutei Monica me chamar. — Você está aí? Vem, vamos deitar. Já peguei as crianças. — Ela sabia ser dócil quando queria. Eu queria que ela nunca tivesse visto Adam daquele jeito, não queria destruir o que os dois tinham.

— E o Pedro? — perguntei, passando a manga da blusa no rosto e tentando parar de chorar.

— Dormiu. Quer conversar, Mel? — Dei de ombros. Na verdade, eu queria sumir! — Vem, está frio, sai desse chão!

Ela me ajudou a me levantar. Saímos do banheiro. Monica pegou meu travesseiro e me puxou pelo braço para que eu fosse ao quarto dela. As crianças estavam deitadas em seus colchões, no chão, em volta da cama. A cama dela estava arrumada. Monica pulou na cama e deu um tapinha na mesma.

— Vem, delícia. — Sorriu. Subi na cama, e ela me abraçou apertado. — Vai ficar tudo bem.

— Será que vai mesmo?

— Claro que vai, Mel. Nada é para sempre: nem felicidade, nem sofrimento... Me conta, quanto tempo isso vem acontecendo?

— Pouco tempo!

— Melanie, não mente.

— Ok, descobri um pouco mais de um ano.

— Como assim, “descobri”?! — Ela indagou, com um tom de voz apavorado.

— No começo ele não me batia, mas me proibia das coisas. Me fez sair do emprego; depois, da faculdade; daí passou a me insultar, a dizer que sou gorda, que não sirvo para nada; me proibia de sair com minhas amigas, de ter um relacionamento maior com meus pais; daí um dia, do nada, ele se irritou por eu ter quebrado um vaso e me deu uma cusparada na cara.

— Meu Deus, Mel!!! — Ela parecia horrorizada.

— Eu achava que o problema era eu, sabe? Eu que não sabia fazer nada direito, eu que comia demais... — Comecei a chorar compulsivamente. — Eu o amava, amava muito! Sentia-me bem ao seu lado, sentia-me no céu quando ele me tocava.

— Mel, meu irmão já... — Hesitou — Ele já forçou sexo com você? — Ela indagou com dificuldade, como se não quisesse me fazer aquela pergunta.

— Sim, ele força sempre. Ele me machuca, pois eu não sinto mais vontade de me deitar com ele. Sempre que ele termina, tomo banho. Às vezes me esfrego tanto, que eu sangro.

— Por que continua com ele?! Por que não pede divórcio?! — Monica falava com uma certa raiva.

— Eu já tentei, ele ameaçou matar as crianças, me tirar elas e até matar minha mãe; e sem eles não sou nada, Monica; nada! — Ela abaixou a cabeça.

— Mel, eu sinto tanto por isso; mas, tanto...

— Eu também, eu... — Senti-me hesitante em falar, não queria que Monica sofresse ainda mais com isso.

— Você o quê? Anda, termina! Eu não acredito que tenha mais coisas.

— Desculpe, é difícil para mim. — Eu olhei para baixo, remexendo na barra da minha camisa.

— Por Deus, Melanie, fala logo! — Ela deu um grito que me fez dar um pulo na cama.

— Tenho medo de ele abusar da Bea. Às vezes ele olha muito para ela, de um jeito estranho. — Monica levou as mãos à boca. — Já pensou: nossa garotinha sendo abusada por ele? Deus, acho que eu o mataria!

— Eu... Eu...

— Eu sei, é assustador. Quem diria isso, né?!

Lágrimas desceram dos olhos de Monica.

— Não acredito! Esse não parece ser o meu irmão! Como ele pôde ficar desse jeito?!

— Eu também não entendo! — falei, e ela respirou fundo.

— OK, a gente vai resolver tudo isso, eu prometo. Decidi ficar mais tempo, adiar meus planos. Se quiser, você e as crianças vêm comigo, a gente foge dele, mudamos nosso nome, e ele nunca mais nos encontrará.

— Não posso fugir, tem minha mãe e... O que eu faço se ele machucar ela?

— Levamos ela também, se esse for o problema.

— Eu... Eu não queria te meter nisso, me perdoe! — disse, chorando ainda mais.

Isso é algo que eu queria evitar. Não queria meter ninguém nesse problema, porque meu medo era enorme. Tinha medo de Adam fazer algo contra todos que pudessem me ajudar.

— Você não tem culpa, deveria ter me falado isso antes.

— É que é difícil.

— Imagino, mas sou tua amiga, tua irmã. Você e as crianças têm prioridade em minha vida, sempre. Nunca se esqueça disso, eu morreria por vocês.

— Não quero que ninguém morra. Tá ficando maluca, Monica?

— Não, Mel. Só disse que faria tudo por vocês, e é o que vou fazer.

— Mãe, tudo bem aí? — Vi a cabeça do Pedro se levantar.

— Sim, meu amor. Volte a dormir, eu e sua tia faremos isso também.

Ele balançou a cabeça e deitou novamente. Eu fiz a mesma coisa. Monica me abraçou apertado e dormiu agarrada a mim, assim como quando éramos mais jovens.

Adam não dormiu em casa, simplesmente sumiu depois de ter brigado com a irmã.

Beatriz e Jonas estavam alheios ao que aconteceu noite passada. Pedro estava com uma cara péssima, Monica também. Eu nem me atrevi a olhar no espelho. Eu sabia que deveria estar um caco.

— Vamos, meus amores? — chamei-os para irem à escola.

— Sim, mamãe! — Beatriz pulou da cadeira, pegou sua mochila e a colocou nas costas. Embora ela ainda fosse só para a creche, adorava a escolinha!

Assim entramos no carro e partimos.

Deixei as crianças no portão. Passei em alguns lugares antes de ir para casa. Assim que chegamos, Monica correu para atender ao telefone, e eu fui para a cozinha, guardar as compras que fizemos. Comprara muitas frutas e saladas.

— Mel? — Ela me chamou.

— Oi, querida! — falei.

— É da escola dos meninos. — Ela disse com o telefone apoiado ao peito.

— Aconteceu algo? — Ela deu de ombros, e meu sorriso sumiu do meu rosto.

— Atende logo! — mandou.

— Alô. — Eu disse ao telefone, preocupada.

— Melanie Oliveira.

— Sim, sou eu mesma... Aconteceu alguma coisa com meus filhos?

— Um incidente com o Pedro. Poderia, por favor, comparecer na escola?

— Mas ele está bem?

— Sim está. Ele machucou o nariz após uma briga.

— Ok, estou indo agora mesmo.

— O que foi, Mel? As crianças estão bem? — Monica perguntou assim que eu pus o telefone no gancho.

— Sim... Não, o Pedro, ele se machucou.

— Meu Deus! Ele está bem?! O que aconteceu?! — Ela falava sem parar, enquanto eu pegava as chaves do carro.

— Não sei ao certo. Ele entrou numa briga e machucou o nariz!

— Deixa que eu dirijo. — Assenti com a cabeça, e Monica tomou as chaves de minhas mãos, então peguei a minha bolsa, e saímos.

Mais que depressa, entramos no carro e partimos para a escola.

Quando chegamos lá, demoraram para me atender, e quando me chamaram, não gostei nada do que vi.

— Pedro, querido, o que aconteceu? — perguntei, segurando seu queixo.

— Nada! — Ele disse, olhando para baixo, sem querer me encarar.

— Impossível! Olha seu rosto como está!

— Sra. Oliveira! — o diretor chamou. — A Senhora está bem? — perguntou, me olhando enquanto estendia a mão para me cumprimentar.

— Olá, Sr. Sousa. Estou sim. Quero saber o que aconteceu — respondi, olhando-o.

Nem me abalei pelo fato de ele ver minha cara roxa.

O Sr. Sousa era um senhor barrigudo de cabelos brancos e olhos azuis. Ele tinha um sorriso simpático e olhar gentil.

— Pedro brigou, deu um soco em um amigo, e ele se defendeu. Gostaria de falar com a Senhora sobre isso. — Ele disse, fazendo eu encarar Pedro com a boca entreaberta.

— Claro! — respondi, depois de alguns segundos digerindo o que ele falou.

O diretor falou, falou e falou mais um pouco. Passei exata meia hora com ele reclamando do comportamento do Pedro nos últimos dias. Sempre arranjando briga, respondendo aos professores, não fazendo o dever de casa e dormindo durante as aulas. Tudo fora uma surpresa para mim. Ele foi suspenso por três dias, e o diretor disse que da próxima seria expulso.

Agradeci pela atenção e me despedi.

Eu precisei levar Pedro para o hospital.

— Pedro, o que deu em você? — perguntei, preocupada.

— Nada. — Ele cruzou os braços no peito.

— Não mente para mim! — disse, puxando-o pelo braço.

Assim que Monica nos viu, correu para perto da gente.

— Pedro, o que foi? — Ela tentava segurá-lo pelo queixo e ver o que aconteceu, mas ele relutava em deixar a tia olhar.

— Ah! Não enche, você também! — Ele disse, de modo ríspido.

Olhei de maneira assustada para ele. Eu sabia que ele estava estranho! Desde a noite passada ele vinha agindo assim, como se não ligasse para nada.

— Me esperem aqui! — pedi.

— Aonde você vai, Mel? — Monica perguntou, mas eu não respondi.

Saí pisando duro. Fui até a secretaria, falei com o diretor novamente e, em dez minutos, saí com Jonas e Beatriz.

— Mas, o quê... — começou Monica, mas logo a cortei:

— Quero eles comigo hoje, nem deveria ter deixado eles na escola. Vamos para o hospital!

Sem falarmos nada, entramos no carro e rumamos para o hospital. Pedro precisava de um raio-X, para ver se estava tudo bem com o nariz dele, embora eu achasse que não estivesse quebrado e que iria apenas ficar roxo.

Fiz sua ficha na recepção.

Ele consultou com o pediatra e tirou um raio-X. Eu estava furiosa com o Pedro.

Estávamos sentados de frente para a enfermaria. Ele faria um curativo e, depois, poderíamos ir para casa. Eu estava cansada. Exausta, para falar a verdade. Tudo isso me esgotava de uma tal maneira, que o que eu mais queria era sumir e não deixar ninguém mais me encontrar.

— Tá de castigo por um mês! — disse, furiosa, enquanto batia o pé no chão.

— Ok. — Ele falou, abaixando a cabeça.

— Um mês não, um século! O que deu em você, garoto?! — falei, ainda mais irritada. Já começava a gritar.

— O QUE DEU EM MIM?! Sério que a Senhora está me perguntando isso?! — Ele me olhava com uma raiva que eu desconhecia no meu filho. Eu não o reconhecia. — Olha o que ele fez ontem! Ele ia te jogar água fervendo, mãe! Ele te agrediu de novo, e se não fosse pela tia, sabe-se lá o que iria acontecer!

— Mas, Pedro...!

— Não tem “mais”! Eu odeio ele, odeio! Entendeu?! Queria ser adulto, para poder acabar com ele!

— Não, filho, não diga isso — disse, me sentando ao lado dele. — Nada justifica violência, Pedro! Nada! Violência só gera violência! Não é certo bater nos outros por causa de problemas pessoais! Não é certo jogar para o mundo suas frustações e suas mágoas!

— Para, pode parar! Você diz que isso não é certo, mas o Adam faz isso com você sempre! E não me dê sermão por não chamar aquilo de “pai”, ele nem homem é!

Uma enfermeira pigarreou em uma das portas. Tentou sorrir e o chamou. Levantei-me, mas no final, desisti. Deixei ele entrar sozinho, pois eu estava tremendo de raiva.

Sentei-me no banco de espera e bufei. Encostei minha cabeça na parede e fechei os olhos. Como eu queria que as coisas fossem diferentes, meu Deus...

Senti alguém sentar ao meu lado, mas continuei com minha bronca mental. Pedro ficaria de castigo até ter idade para ir para a faculdade.

Escutei um pigarreio, mas fingi que não ouvi.

Talvez eu só o liberasse quando tivesse filhos. Isso aí, só quando ele tivesse filhos.

Escutei outro pigarreio. Abri os olhos, irritada. Já ia dar uma bronca quando vi quem era.

— Oi.

— Oi — respondi, surpresa de início; mas logo depois sorri.

Era o Will, lindo como sempre, sorrindo para mim daquele jeito amável que só ele tinha.

— Você está bem?

— Sim, claro, Will. Vim trazer meu filho!

— Aconteceu algo com ele? — Parecia preocupado, apesar de não conhecer meu filho.

— Sim, brigou na escola, e isso me deixou extremamente irritada! — Discordei com a cabeça e soltei um suspiro.

— E ele está fazendo curativo?

— Sim.

— Vou ver como ele está! — Ele se levantou.

— Dê uma bronca nele, por favor!

— Tudo bem. — Will sorriu e entrou na enfermaria logo em seguida.

 Alguns minutos depois, Pedro saiu de cabeça baixa; e Will, com a mão em seu ombro.

— Desculpe, mamãe, não deveria ter brigado... — Ele me deu um abraço. — Nunca mais farei isso, prometo. Seu amigo Will conversou comigo, ele é muito legal!

Soltei-o, sorri para ele e passei a mão em seu rosto. Era incrível! Só de olhá-lo, a raiva já passou um pouco.

— Me conta por que fez isso — questionei.

— Mamãe, eu... — Ele parecia receoso.

— Pode falar, não estou mais brava com você, meu amor.

— Por causa de ontem, daí os meninos começaram a zombar de mim. Pedi para pararem, mas eles não me escutaram, então acabei dando um soco na cara de um deles, porque eu estava muito nervoso, sem paciência para aguentá-los!

— Tudo bem, vem cá e abraça a mamãe!

Ele me deu um abraço apertado. Will estava parado atrás do Pedro, com os braços cruzados e sorrindo.

— Ele é um bom garoto — disse, passando as mãos na cabeça dele.

— Sim, eu sei que é — falei sorrindo e olhando para o meu filho.

— Ele me ofereceu um sorvete, mas eu estou de castigo — Pedro disse, um tanto cabisbaixo.

— Sim, está! — concordei.

— Não posso ir, então? — perguntou, voltando a olhar para mim, agora com os olhos brilhantes.

— Acho que podemos começar o castigo amanhã! — falei, pois não conseguiria negar um sorvete a ele.

— Sério? — Sorriu.

— Sim! — Sorri de volta.

Ele sorriu mais e me abraçou, me deu um beijo estralado na bochecha e correu pelo corredor.

— Não corre! — logo pedi.

— Tá.

Levantei-me e olhei para o Will, que sorriu.

— Vamos? — Ele me chamou.

— Não tem que trabalhar? — perguntei.

— Não, estava saindo quando te vi sentada aí.

— Jonas e Beatriz estão comigo, e também a minha cunhada. Algum problema? — perguntei.

— Nenhum. — Franziu a testa de repente — Mel? — chamou-me.

— Sim — respondi, pegando minha bolsa do chão.

— O que foi isso no seu rosto? — Ele perguntou, passando a mão em meu rosto.

— Caí! — menti.

— Hum... Já passou pelo médico?

— Não, não é preciso — disse, com a intenção de pôr fim na conversa.

Andamos lado a lado no corredor. Quando chegamos à recepção, Beatriz se soltou de Monica, que estava com Jonas no colo, e correu até nós, agarrando as minhas pernas.

— Vamos, mamãe? — Ela me chamou.

— Sim, mas a gente vai tomar sorvete — disse, pegando-a no colo.

— Antes do almoço? — Ela indagou, logo em seguida, colocando as mãos em meu rosto e me dando um beijo na ponta do nariz.

Sorri. Coloquei-a no chão.

— Sim, querida — respondi.

— E você, quem é? — Beatriz perguntou, olhando para Will.

— Meu nome é Wil, sou amigo da sua mamãe. — Ele se agachou para ficar na altura dela, que segurou o rosto dele e sorriu.

— Você é bonito.

— Obrigado. Você é muito bonita também!

— Eu sei. Vamos logo, quero sorvete de morango. Ele é meu preferido.

— Ah é? — Ele falou.

— Sim. E o seu, tio?

Beatriz chamando Will de “tio” era engraçado. Ele conversava com ela parecendo que se conheciam há muito tempo. A danada não teve vergonha dele.

— Monica, lembra do Will!? — falei, assim que me aproximei dela e do Jonas.

Ela o colocou no chão e sorriu para nós.

— Claro, oi!

— Oi. — Ele respondeu com Beatriz no colo.

— Mãe, vamos? — Jonas me chamou.

— Claro, querido. Vem cá, Jonas. Esse é meu amigo Will.

— E aí, cara? — Ele esticou a mão para Will e o cumprimentou.

— E aí, carinha? Tudo bem? — Will pegou sua mão e a apertou.

— Sim.

— Mel, eu lembrei que tenho um compromisso. Não vou poder acompanhar você! — Monica falou rapidamente.

— Não, Monica, imagina! É só um sorvete, vem com a gente! — Eu pedi.

— Não dá, querida. Preciso mesmo ir. — Dirigiu o olhar para Will — Will, leva ela para casa depois?

— Claro, sem problemas! — Ele disse.

Monica colocou os óculos escuros e saiu mais rápido que uma bala. Ela iria me pagar por isso!

— Mel? — Will me chamou.

— Oi.

— Vamos? — Ele pediu.

— Claro! — falei, e voltamos a andar.

— Tem uma sorveteria a duas quadras daqui, podemos ir a pé. O que acha? — Ele sugeriu.

— Seria perfeito! — respondi.

Eu estava sorrindo mais do que deveria. Qual era o meu problema? Eu sabia que não poderia me envolver com ninguém, e lá estava eu, feito uma idiota, sorrindo a cada palavra que ele falava.

Durante o caminho, ele conversava com as crianças de modo empolgado. Até agora, sabia que adorava os filmes da Marvel, tendo como seu preferido o Homem-Aranha. Sorri enquanto via ele e Pedro debatendo sobre seu herói preferido.

Beatriz revirava os olhos e achava o assunto chato. Jonas era mais tímido, e pouco falava.

Atravessamos o farol, e Beatriz desceu do colo de Will e começou a andar mais à nossa frente. Os meninos fizeram o mesmo. Will colocou as mãos no bolso e me olhou rapidamente.

— E você, Mel, tem um herói preferido? — Ele perguntou para mim.

— Hum... Deadpool — falei, depois de pensar por alguns instantes.

— Sério?

— Sim, ele é engraçado! — respondi.

— Achava que ia dizer outro.

— Qual? — perguntei, olhando-o de maneira curiosa.

— Não sei. — Ele deu de ombros. — Deadpool é feio!

— Aparência não é tudo.

— Não, claro que não. Eu não queria...

— Will... — Eu o cortei.

— Sim.

— Pedro te contou o motivo da briga na escola? — perguntei, um tanto receosa com o que os dois poderiam ter conversado. Queria aproveitar que as crianças não estavam por perto.

— Mais ou menos. — Olhou para frente — Chegamos! — Ele disse, parecendo não querer falar do assunto.

Will abriu a porta para mim. As crianças já estavam de olho na vitrine. Beatriz quase chegava a babar nos confeitos. Cada um pegou uma casquinha com alguma cobertura extra, e sentamos junto a uma das mesas do lugar. As crianças riam do Will, que fazia altas caretas para elas.

 A sorveteria era enorme. Tinha uma vitrine linda com bonecos, almofadas e um apanhador de sonhos. As paredes eram coloridas, e as luzes nas paredes tinham formato de casquinhas de sorvetes. O lugar cheirava a doce. Atrás do balcão tinha uma enorme lousa onde continha escrito todos os cento e cinquenta sabores. Eu sempre vinha a esse hospital por ser o mais perto de casa, e nunca tinha visto essa sorveteria. Certamente iríamos nos tornar assíduos, pois esses sorvetes eram uma maravilha!

— Mamãe, olha só!

Beatriz deu um pulo da cadeira e foi até a vitrine, onde descobriu um gato peludo se escondendo entre as almofadas.

— Mamãe, me dá um gato? — Ela falava enquanto alisava o felino, que ficava de pernas para o ar, recebendo os afagos da minha pequena.

— Querida, já conversamos sobre isso — falei, suspirando.

— Eu prometo saber cuidar dele — disse rapidamente a espertinha.

— Responsabilidade, querida — falei.

Pedro e Jonas também foram afagar o gatinho, que agora lambia os dedos melados de Beatriz.

— Isso mesmo, mamãe. Eu prometo ter isso! — Ela falou.

Suspirei sem paciência. Ela iria me vencer pelo cansaço.

— Tenha calma com ela, Mel. Ela é pequena! — Willian a defendeu.

— Eu tenho, mas é que todo dia ela me pede um! — respondi.

— Dê um a ela, então. — Ele falou.

— Não posso.

— Por quê?

— Adam. Ele não gosta de gatos — disse, olhando para as crianças.

— Hum... O “mala”. — Ele falou. Entendi que ele estava falando de Adam.

— Mala? — perguntei, com as sobrancelhas franzidas.

—Mala? — Ele repetiu, depois abriu a boca de um jeito estranho.

— Sim, você disse “mala”. Quem?

— Não, eu não disse isso.

— Então?

— Sabe, eu tenho um gato! — Ele trocou rapidamente de assunto, e Beatriz já o olhou com um enorme sorriso no rosto.

— Sério, tio?? — Ela indagou.

— Sim, pequena — respondeu.

— Qual o nome dele?

— Akira.

— Como ele é?

— Folgado — Will respondeu, e Beatriz riu alto.

— Não, tio, como ele é: ele é fofinho, como esse aqui? — Ela perguntou.

— Akira é todo cinza, tem olhos verdes, é gordinho e super manso.

— Os olhos dele são bonitos como o seu? — Ela pulou no colo dele e pegou seu rosto com suas mãos miúdas.

— Você os acha bonitos?

— Sim, são. Você é todo bonito. — Olhou para mim — Não é, mamãe? — Eu quase engasguei com a pergunta dela.

— Sim — limitei-me a apenas confirmar.

Meu rosto estava quente, e decerto minhas bochechas estavam vermelhas. Will apenas sorria. Era incrível ver como meus filhos se deram bem com ele!

Eles então começaram a conversar sobre o gato. Agora os meninos também entraram no assunto; e até Jonas, que era um poço de timidez, começava a tagarelar com eles. 

— Crianças, vamos embora. — Eu disse, saindo dos meus devaneios.

— Ah, mamãe, não quero! — disse Beatriz, de modo triste.

— Temos que ir. Está ficando tarde, e vocês precisam almoçar.

— Por que não almoçam comigo? Iria adorar ter a companhia de vocês! — Will sugeriu, a cada palavra, me olhando no fundo dos olhos.

— Não, você deve estar cansado — falei rapidamente.

— Que nada! Hoje eu até tive um dia calmo no hospital. Vamos lá em casa, assim as crianças conhecem Akira, almoçamos e levo vocês para casa.

— ISSO! — Beatriz gritou, batendo palmas.

— Não, crianças... — tentei insistir.

— POR FAVOR! — disse Will, fazendo bico feito uma criança; e foi impossível não sorrir.

— Já que você está rindo, não tem como me falar “não”. Vamos lá. Prometo que assim que terminarmos de almoçar, levo vocês para casa! — Ele continuou insistindo.

— Não vai adiantar eu falar “não”, não é mesmo? — perguntei.

— Não. — Ele disse, sorrindo.

Nós nos levantamos. Ele não me deixou pagar a conta.

Fomos até o estacionamento do hospital. Coloquei as crianças no banco de trás, apertando seus cintos. Will abriu a porta para mim e me ajudou a pôr o cinto de segurança. Achei desnecessária a ajuda, mas era uma delícia sentir seu perfume de perto novamente.

Meia hora depois, estávamos parados, de frente para uma casa enorme, toda pintada de branco e azul. Tinha um belo jardim na frente da casa.

Ele estacionou, e nós saímos do carro. Will manobrava para guardar o carro na garagem. Rezei um terço e uma Ave Maria para que as crianças não tocassem em nada. Não queria dar prejuízo, eu já me achava louca o suficiente em vir até a casa dele.

— Vamos entrar? — Ele falou.

— Claro. — Eu disse, ainda um tanto sem jeito.

Ele abriu a porta da casa para nós, e as crianças foram logo entrando. A casa era enorme por dentro e decorada com muito bom-gosto. O hall de entrada tinha um móvel, onde ele colocou a carteira e as chaves. Em seguida, retirou a jaqueta que usava e colocou-a em um armário. O corredor seguia um pouco adiante. No fim dele, uma mesa redonda com um lindo arranjo de flores. Franzi uma sobrancelha. Isso estava cheirando a mulher.

À esquerda tinha uma grande e espaçosa sala decorada com bom-gosto em tons de cores claros.

— Akira — Will chamou o gato, que desceu de cima da estante e se enroscou em sua perna. — Garoto, temos visitas, se comporte.

O gato olhou preguiçosamente para o seu dono e para as crianças. Ele andava com cuidado. Parou e se sentou diante dos meus filhos. Lambeu a pata e a passou na orelha.

— Posso tocar nele, tio? — Beatriz pediu.

— Claro, pequena. Ele é bonzinho — Will respondeu.

Ele se sentou no chão. As crianças, na frente dele; e entre eles, o gato. De repente, o gato deitou e levou as pernas para o ar. Enquanto eu os olhava, acabei me perguntando: por que os gatos têm mania de ficar de barriga para cima?

Meus filhos o atacaram, fazendo carinho em sua barriga grande e peluda.

— Viu, ele é manso! — Will disse, afagando a cabeça do gatinho.

— Sim, e gordo — Beatriz completou.

Will sorriu e se levantou. Em seguida, veio até mim e piscou.

— Venha, Mel. Deixe as crianças com Akira. Não se preocupe, ele é bonzinho.

Apenas assenti com a cabeça e fui atrás dele.

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