Gabriela narrando (continuação)Assim que a porta se fechou, deixei a caneta cair na mesa e afundei o rosto nas mãos.O Rodrigo tinha esse efeito em mim. Um silêncio que falava muito. Um olhar que cutucava fundo. Ele não forçava nada, não fazia rodeio… mas quando me olhava daquele jeito, parecia que enxergava tudo o que eu tentava esconder.E isso me desequilibrava.Porque desde que entrei na empresa, há dois anos, ele sempre esteve ali. Sério, firme, competente. Era o tipo de homem que impunha respeito só de estar presente. E por mais que eu nunca tenha dito em voz alta… eu já tinha reparado nele.Claro que tinha.Rodrigo era lindo. Alto, corpo forte, barba sempre por fazer, aquele jeito de quem viveu muito, mas fala pouco. Ele era o tipo de homem que entrava em uma sala e ninguém ousava interromper. E eu? Eu era só a filha do chefe. A novinha metida a empresária, tentando provar que merecia o cargo que me deram.Durante muito tempo, me convenci de que o que eu sentia era pura admira
Gabriela narrando (continuação)O trajeto até o restaurante foi tranquilo, mas por dentro… eu tava uma bagunça.Rodrigo não forçou conversa. Só comentou rapidamente sobre o trânsito e sobre alguns números da empresa que ele ia me mostrar mais tarde. E eu agradecia por isso. Porque meu cérebro ainda tava tentando processar tudo, a traição, a dor, o vazio… e agora, esse homem ao meu lado, me tirando da minha própria cabeça sem fazer esforço.Chegamos num restaurante discreto, daqueles mais afastados do centro, que quase ninguém conhece. Fachada rústica, varanda de madeira, cercado por plantas. O tipo de lugar que meu pai adorava vir pra fechar negócio, e que, claro, Rodrigo também conhecia.Ele estacionou com calma, desligou o carro e saiu primeiro. Deu a volta e abriu a porta pra mim.Sim. Ele fez isso.— Obrigada — falei meio sem graça, descendo do carro.— Sempre — ele respondeu, sem nem me encarar direito. Mas o jeito como falou… ficou ecoando na minha cabeça.Entramos e fomos diret
Gabriela narrando :Continuei comendo em silêncio, focando no prato, mastigando como se a comida pudesse abafar o gosto amargo que Henrique e Luísa deixaram só de aparecer. Cada garfada era uma luta pra não explodir.Rodrigo não disse nada. Só comia também, devagar, me respeitando no silêncio. Sem cobranças. Sem perguntas.E eu agradeci mentalmente por isso.Terminei meu prato com dificuldade, limpando a boca com o guardanapo, tentando engolir a humilhação junto com a comida.Rodrigo pediu a conta, discreto como sempre, e a garçonete logo trouxe a maquininha. Tudo parecia controlado. Tudo parecia que ia acabar sem mais dramas.Mas claro que não ia ser assim.Antes da gente levantar, eu vi pelo canto do olho a sombra se aproximando da nossa mesa.E quando olhei direito, lá estava ele.Henrique.De braços cruzados, um sorriso de escárnio nos lábios, como se ainda tivesse direito de aparecer na minha frente depois de tudo que fez.— Achei que você ia demorar mais pra arrumar alguém, Gabi
Rodrigo narrandoQuando ouvi a voz dela me chamando, parei no mesmo segundo.Me virei devagar, já imaginando que ela ia pedir mais alguma coisa sobre o trabalho.Mas o que veio… não tinha nada a ver com contrato.— Obrigada. Por hoje… por tudo. De verdade — ela disse, parada na porta da sala dela, com os olhos brilhando, a voz cheia de sentimento.Por alguns segundos, eu só consegui encarar.Aquela menina que eu vi crescer.Que eu acompanhei virando mulher, dona de si.Que agora, mesmo machucada, mesmo ferida, ainda tinha uma força no olhar que me fazia querer proteger ela do mundo inteiro.E, ao mesmo tempo…Me fazia desejar ela de um jeito que eu odiava sentir.Respirei fundo, tentando manter o controle.Afastei qualquer pensamento que não fosse respeito, amizade, proteção.— Não precisa agradecer, Gabi — falei, com a voz mais firme do que eu realmente sentia. — Cuidar de ti… não é favor. É o mínimo.E era mesmo.Não tinha nada que eu quisesse mais do que isso.Estar do lado dela.Ga
Gabriela narrandoEu tava na minha sala, ajeitando os contratos da reunião da tarde, tentando me manter ocupada pra não pensar em tudo que tinha acontecido nas últimas vinte e quatro horas.Repetia pra mim mesma que era só mais um compromisso profissional. Que eu precisava focar no trabalho, mostrar que ainda era forte, que o que o Henrique fez não ia me derrubar.Mas por mais que eu tentasse fingir que tava cem por cento... A cabeça teimava em fugir.Principalmente toda vez que eu lembrava dos olhos do Rodrigo me encarando naquela manhã.Ou do jeito que ele se levantou pra me defender no restaurante, sem pensar duas vezes.Balançei a cabeça, como se pudesse expulsar esses pensamentos dali. Peguei os papéis, conferi tudo de novo, ajeitei meu blazer claro por cima da blusa básica e respirei fundo.Era só trabalho.Ajeitei o cabelo num coque bagunçado e conferi o horário no relógio.Faltava cinco minutos.Levantei, peguei a pasta e caminhei até a porta.Quando saí pro corredor, dei de c
Gabriela narrando :Saí da sala com a cabeça fervendo, tentando ignorar tudo o que tinha acabado de acontecer.Fui direto pra minha sala, guardei a pasta de documentos, peguei minha bolsa e respirei fundo. Queria sair dali.Queria esquecer essa tarde.Queria respirar um pouco sem ter que provar nada pra ninguém.Atravessei o corredor, apertei o botão do elevador e esperei em silêncio, sentindo aquele cansaço pesado tomar conta de mim.Quando as portas abriram, entrei sozinha e desci.O andar térreo tava movimentado, como sempre no final do expediente, mas eu passei direto. Cumprimentei o pessoal com um aceno rápido e segui em direção à saída.Assim que passei pelas portas de vidro…Parei. Encostado no carro que estava ali na calçada, tava ele.Matheus.O tal fornecedor sem noção.Ele tava de costas, falando ao celular, apoiado com um braço no teto do carro branco, todo casual, como se nada tivesse acontecido.Mas assim que me viu, desligou o telefone na hora.E, claro, veio direto na
Gabriela narrando :Fiquei mais um tempo ali, encostada no colo da minha mãe, sentindo o carinho dela tentando costurar os pedaços soltos que o dia tinha deixado.Mas logo o cansaço pesou de um jeito que não dava pra ignorar.Me levantei devagar e ajeitei o cabelo, soltando um suspiro cansado.— Mãe, eu vou subir. Preciso descansar um pouco — falei, tentando sorrir.— Vai, filha. Toma um banho bem gostoso e esquece esse dia. Amanhã é um novo começo — ela disse, apertando minha mão de leve.Assenti, peguei minha bolsa largada no canto da sala e subi as escadas com passos lentos.Cada degrau parecia pesar uma tonelada. Mas quando entrei no meu quarto e fechei a porta, senti uma paz diferente me invadir.Tirei os sapatos, larguei a bolsa no canto e fui direto pro banheiro.Abri a porta e acendi a luz.O banheiro era espaçoso, todo em tons claros, com aquele cheiro suave de sabonete e essência de lavanda que eu adorava.Me aproximei da banheira e comecei a enchê-la, girando o registro da
Henrique narrandoMeu nome é Henrique, tenho 24 anos.Nasci em berço de ouro. Meus pais sempre tiveram dinheiro, boas empresas, bons contatos. Eu cresci tendo tudo o que quis, sem precisar me esforçar pra nada.Carro, viagens, mulherada... era só pedir.E talvez por isso... eu nunca aprendi a dar valor de verdade pra nada. Nem pra ninguém.Quando conheci a Gabi... eu pirei.Uma morena linda, de sorriso fácil, cheia de sonhos, toda certinha.Virgem.Intocada.Do jeito que eu nunca tinha visto antes.Me envolvi com ela rápido. Me apaixonei também. Não vou mentir. Mas o problema é que... eu nunca consegui ser de uma só.Eu precisava da adrenalina. Da novidade.Mesmo com a Gabi sendo perfeita pra ser minha mulher, vinda de família boa, estudiosa, linda, com futuro brilhante, a verdade é que dentro de mim sempre teve esse lado podre que eu nunca consegui controlar.Traí ela.Muitas vezes.Mas sempre escondido. Sempre calculado.Gabi confiava em mim como uma idiota.E eu sabia aproveitar