OliverO ar na fazenda estava carregado de algo que eu raramente experienciava: calor humano. Não o tipo de calor que vem de uma lareira ou de um cobertor, mas aquele que exala de um lar, de uma família que encontra alegria nas coisas simples. Eu nunca tinha passado um Natal assim, e a ideia de me envolver em tradições tão diferentes da minha rotina era ao mesmo tempo desconcertante e intrigante.Emily estava na cozinha com a mãe, rindo enquanto preparavam biscoitos de gengibre. O aroma doce e quente preenchia o ambiente, contrastando com o ar frio do lado de fora. Seu pai estava na sala de estar, desencaixotando enfeites de Natal antigos. Eu estava sentado em uma poltrona, tentando processar tudo. Era estranho, mas de um jeito bom. Eu queria entender o que fazia esse momento tão especial para eles.Emily surgiu da cozinha com farinha nas mãos e um sorriso no rosto.— O que foi? — Perguntou, me pegando olhando fixamente para ela. — Nada. — Respondi, mas era mentira. Não era só ela, e
EmilyO dia seguinte amanheceu calmo, com os raios do sol atravessando as janelas da fazenda e preenchendo os espaços com uma luz quente. Eu estava na varanda, segurando uma xícara de café, enquanto observava o campo que parecia se estender até o infinito. Aquela tranquilidade era tudo o que eu precisava.Oliver apareceu pouco depois, vestido de maneira casual, mas ainda exalando sua presença imponente. Ele se aproximou, trazendo outra xícara de café.— Bom dia. — Disse, sua voz baixa e rouca, como se ainda estivesse se acostumando à manhã.— Bom dia. — Respondi, sorrindo.— Seus pais já estão trabalhando? — Perguntou, apontando para o campo.Assenti.— Eles nunca param. Acho que é isso que os mantém tão... vivos. Há sempre algo a ser feito aqui.Ele ficou em silêncio por um momento, como se absorvesse aquelas palavras. Então, inclinou-se para frente, apoiando-se na grade da varanda.— Tem algo que você gostaria de fazer hoje? — Perguntou, me olhando de lado.Eu pensei por um momento,
O calor da tarde era abafado, e a sombra das árvores que ladeavam o rio oferecia um refúgio refrescante. Caminhando ao lado de Oliver, senti uma mistura de conforto e expectativa. O lugar para onde o levava era mais do que especial — era o refúgio que eu sempre buscava quando queria fugir do mundo. Não tinha certeza de como ele reagiria ao cenário rústico e simples, mas algo me dizia que seria mais do que um momento de descanso.— Está tentando me levar para o meio do nada? — Ele brincou, ajeitando o chapéu de palha que minha mãe insistira em emprestar a ele mais cedo.— Talvez. — Respondi com um sorriso. — Ou talvez eu esteja te mostrando um pedaço da minha alma. Depende de como você encarar.Ele olhou para mim, seu sorriso suave se transformando em algo mais sério.— Nesse caso, eu quero ver cada pedaço.Chegamos ao rio, e o som tranquilo da água corrente criou uma melodia natural que parecia nos envolver. O local era quase mágico — cercado por árvores altas que formavam uma cúpula
Oliver O silêncio. Ele sempre foi meu aliado mais confiável. Aqui, no meu escritório no 42º andar, o som abafado da cidade nunca chega a penetrar. Apenas o som suave das teclas do meu computador, enquanto reviso o relatório financeiro mais recente da Blake Industries, me acompanha. É assim que prefiro. Sem distrações.A Blake Industries, minha criação, meu império. Líder em tecnologia de inteligência artificial, fornecendo soluções para as maiores empresas globais. Milhares de funcionários, bilhões em contratos. E no centro de tudo isso, eu. Aqui, nada escapa ao meu controle.Meus olhos percorrem os números na tela, em busca de qualquer desvio. Encontrar um erro aqui é inaceitável. Tudo deve estar exato. Sem margens para falhas. Um deslize e a confiança de investidores e clientes pode evaporar como fumaça. Isso é algo que jamais permitirei.Um número incorreto aparece no relatório. Um pequeno erro, quase imperceptível para qualquer outra pessoa, mas não para mim. Aperto o interfone.
EmilyEu estava concentrada no design de uma nova campanha publicitária quando vi o buquê de flores sobre a minha mesa. O aroma doce preencheu o pequeno cubículo, e minha mente quase imediatamente voltou a flutuar, distraída pela mesma pergunta que vinha me atormentando nas últimas semanas: Quem está por trás disso?Já fazia três meses que comecei a trabalhar na Blake Industries, e desde então, tenho recebido flores regularmente. Primeiro, foi um buquê simples de lírios brancos. Depois vieram rosas amarelas, orquídeas, e agora, uma combinação de tulipas e gérberas. Sempre com um pequeno bilhete, curto e impessoal: "Para alegrar seu dia" ou "Um pequeno gesto". Nada que desse qualquer pista concreta sobre quem poderia ser o remetente.No começo, pensei que fosse um erro. Talvez algum outro funcionário estivesse recebendo presentes e eles estavam vindo parar na minha mesa por engano. Mas quando as flores começaram a chegar de maneira consistente, ficou claro que não era coincidência. Eu
OliverA sala de reuniões ainda tinha o cheiro familiar de café e papel novo, misturado ao ar-condicionado incessante, quando me levantei para sair. A apresentação da campanha de marketing terminou sem grandes complicações, como deveria ser. Emily Carter se movia com desenvoltura, embora discretamente, no canto da sala. Ela manteve o silêncio enquanto seu colega de equipe, Daniel, liderava a apresentação, mas eu a observava de perto. Sempre.É impressionante como ela parece alheia à atenção que atrai. Três meses na Blake Industries e eu já conhecia bem o seu trabalho, a sua dedicação. No entanto, ela não fazia ideia do que estava por trás das flores que sempre encontrava em sua mesa. E é exatamente assim que deve ser.A verdade é que controle é o que define minha vida, e permitir que qualquer coisa, ou qualquer pessoa, comprometa isso seria um sinal de fraqueza. Eu não posso ser fraco. Não na minha posição. Não com tantas pessoas observando, esperando pelo menor sinal de erro para ata
OliverEu não deveria estar fazendo isso.Enquanto a luz fria da tela iluminava o escuro do meu escritório, observei Emily Carter mais uma vez pelas câmeras de segurança. Ela estava em seu cubículo, a essa hora em que a maioria dos funcionários já havia ido embora. Todos os outros andares estavam vazios, exceto pelo fraco brilho da luz sobre seu local de trabalho. As mãos dela se moviam ágeis, organizando papéis e pastas, e eu estava ali, observando, como um maldito stalker.Senti a familiar onda de frustração tomar conta de mim. O que estou fazendo? Eu, Oliver Blake, CEO da Blake Industries, assistindo uma funcionária pela tela das câmeras de segurança. Isso era insano. Eu sabia que era. Mas, ao mesmo tempo, algo em mim me mantinha grudado à tela, incapaz de desviar o olhar.Tentei justificar isso para mim mesmo inúmeras vezes. Fiquei convencido de que o que me prendia a Emily era sua dedicação, sua capacidade de mergulhar tão profundamente no trabalho que se esquecia de tudo ao redo
EmilyMeus olhos permaneciam fechados, como se, ao mantê-los assim, eu pudesse segurar aquele momento por mais alguns segundos. Minha respiração ainda estava acelerada, o coração martelando no peito, e os lábios formigavam.O beijo. Aquele beijo.Ainda podia sentir a pressão suave, mas ao mesmo tempo intensa, de seus lábios nos meus. A forma como o calor do seu corpo tinha me envolvido, o toque de suas mãos deslizando por minha pele. Era como se eu tivesse sido arrancada da realidade por alguns instantes. O elevador voltou a descer, e eu sentia o mundo ao meu redor girar.E então, as portas se abriram, e o som foi o suficiente para me puxar de volta ao presente.Ele se foi. Sem dizer uma palavra, o homem que me beijou – o homem misterioso que eu sequer consegui ver – desapareceu para fora do elevador. Minhas mãos ainda tremiam, como se meu corpo não tivesse compreendido que o momento havia acabado, que eu estava ali, sozinha.Meus olhos, que ainda estavam se acostumando com a luz, foc