Capítulo um - Magrela?
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"Quando o amor é sincero ele vem com um grande amigo,
e quando a amizade é concreta ela é cheia de amor e carinho"
- William Shakespeare -
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Londres – 1841
~ Daniel ~
Em uma época em que os casamentos arranjados e de conveniência eram um fato normal à sociedade, duas pessoas unidas pelo amor representavam algo raro e, ao mesmo tempo, comovente.
Mas esse, definitivamente, não era o caso do casal à minha frente.
Sempre soube que meu irmão Adam seria o primeiro do grupo a se casar. Bastava que ele encontrasse a moça ideal. Cada um tem os seus próprios conceitos de pessoa ideal, e certamente qualquer um deles é composto por um conjunto de requisitos. Para o meu irmão, no entanto, o requisito era apenas um: ser de boa família. Claro, ele sempre emendou dizendo que, se ela fosse também bonita, seria ainda melhor.
— Mas o que tem de bela, tem de chata! — Meu amigo e sócio Alex, sempre direto, comentou com a voz baixa, de modo com que o casal que discutia à nossa frente não ouvisse.
Eu balancei a cabeça, concordando. Se Lady Nicole já era chata em seu estado normal, agora, com uma barriga enorme de gravidez, estava ainda pior. Mal os dois chegaram para visitar Alex e eu no nosso escritório de advocacia, e já iniciaram uma discussão, aparentemente porque Nicole queria ter vindo a Londres três meses antes, mas, por conta de compromissos, Adam só pôde ir naquela ocasião, em que a barriga dela já estava grande o suficiente para que ela se sentisse indisposta para viagens tão longas.
— E é por isso que eu não quero me casar! — Alex reforçou.
Eu até tinha planos de algum dia me prender a alguém, mas confesso que adiava tal planejamento sempre que meu irmão e minha cunhada iam a Londres nos visitar.
Dando um fim à discussão, Nicole saiu junto à sua mãe (que a aguardara esse tempo todo na porta do escritório) para fazer compras. Finalmente, Adam pôde se aproximar e nos cumprimentar com um aperto de mãos.
— Amigos, sigam o meu conselho: nunca se casem!
Alex e eu rimos, e meu sócio concordou:
— Nem pretendo, amigo. E todas as vezes que vejo o que sua esposa faz com você, eu tenho ainda mais certeza disso.
Alex era ainda mais festeiro e mulherengo do que eu. Gostava da liberdade, dos bailes e de seduzir belas damas. Aliás, colecionava amantes por toda Londres. E desconfio que a fama dele de sedutor se espalhasse ainda além dos limites da cidade.
Puxando uma cadeira, Adam se sentou, e nós começamos a colocar os assuntos em dia. Meu irmão era um cara sério, centrado, responsável e... Acho que “chato” é a palavra que melhor se aplica. Um ótimo Lord, como manda o figurino. Alex, como já mencionei, era festeiro e mulherengo. Se levou os estudos adiante, foi por pura insistência do pai. Sua família era composta por comerciantes. Tinham uma boa condição financeira, mas não nome ou títulos de nobreza. Tínhamos o escritório juntos há dois anos, mas era evidente que eu me dedicava ao trabalho bem mais do que ele.
E quanto a mim... Bem, eu devia ser um meio-termo entre os dois. Não tão certinho quanto o meu irmão, nem tão maluco quando o meu amigo. Mas era o mais bonito dos três, esse é um fato inegável.
Definitivamente, não era o mais modesto.
— Não pretendo ficar aqui por muito tempo — Adam explicou. — Tenho assuntos políticos a resolver. E seria desconcertante passar pela cidade sem lhes fazer uma visita.
— Que bom que você lembra que tem família! — Alex retrucou, num tom divertido. Ironicamente, ele era o que mais se referia a nós três assim, embora não tivesse nenhum laço sanguíneo com nós dois.
De fato: crescemos juntos e sempre fomos inseparáveis. Éramos, os três, como irmãos, afinal.
Alex prosseguiu, tentando nos convencer de que deveríamos fechar o escritório e sair para beber. Enumerávamos para ele o quanto a ideia era irresponsável, quando a porta do escritório, de súbito, se abriu. Nossos olhares voltaram-se para lá e avistamos uma figura um tanto quanto peculiar. Um sujeito de estatura baixa, magro, usando um casacão que parecia engolir todo o seu corpo e uma boina sobre os cabelos que pareciam ter uma cor clara.
Cumprimentando-nos brevemente com um informal “boa tarde”, e ele permaneceu de pé, diante da nossa mesa. E olhava fixamente para mim.
Pensei logo se não seria o noivo de alguma moça com quem eu poderia ter saído em alguma noite em que o Alex me convenceu a ser um babaca irresponsável. É, a ser um sujeito igualzinho a ele.
Só que mais bonito, claro!
Levantei-me, aproximando-me do sujeito.
— Pois não? — indaguei.
Ele não moveu um único músculo. Permaneceu parado, olhando-me seriamente.
A tal noiva devia ser bem bonita, para ele estar tão revoltado assim.
— Pois não? — repeti.
Nada. Comecei a pensar que talvez eu tivesse feito coisa bem pior. Sei lá... talvez me deitado com a noiva e com a mãe dele.
O Alex gostava de sair com algumas mulheres mais velhas. Natural que me apresentasse alguma, de vez em quando. Mais natural ainda que elas insistissem para que ele me apresentasse.
— Pois não? — Eu já começava a perder a paciência.
Então, para a minha surpresa, o sujeito enfim teve alguma reação. E foi a menos esperada possível: ele simplesmente socou o meu ombro. Assim, sem mais nem menos! Olhei por um instante para Adam e Alex, percebendo que tinham ficado tão surpresos e atônitos quanto eu.
Então, fui novamente socado, no mesmo local. E mais uma vez. No quarto ataque, eu finalmente tive alguma reação, socando-o de volta, também no ombro. Ele cambaleou e recuou alguns passos. Levando a mão ao local atingido, ele finalmente disse algo:
— Qual é a sua, Branquelo?
Mesmo sem olhá-los, pude ouvir um ruído de espanto vindo de Adam e Alex. Não era para menos. Aquela voz era feminina demais para um homem. E mais: feminina e familiar. E se referiu a mim com um apelido de infância com o qual apenas uma pessoa me chamava.
Puxando a boina, o sujeito revelou um longo cabelo aloirado e cacheado. Estreitei os olhos, observando-a melhor. Que inferno! Como pude não reconhecer aquele par de olhões verdes que mais pareciam duas enormes esmeraldas? E aqueles soquinhos ridículos que trocávamos desde que tínhamos... sei lá... oito ou nove anos.
Mas... Já fazia tanto tempo!
— Magrela? — A interrogação tinha um tom de descrença.
Ela sorriu, empolgada.
— Achei que não fosse lembrar de mim, Branquelo.
Foi a minha vez de sorrir. Que felicidade era reencontrar aquela louca!
— Magrela!
— Branquelo!
E, felizes como dois adolescentes, nós nos abraçamos. Depois me virei para os meus amigos, percebendo que pareciam meio confusos com tudo aquilo.
— Olhem quem está aqui! — anunciei, animado.
— É... uma... mulher? — Alex fez careta.
Ao seu lado, Adam não estava menos horrorizado. Tanto pelas atitudes da visitante quanto pelas minhas.
— Meu irmão, por que está chamando uma dama de... “magrela”?
Alex a encarou de baixo a cima, naquele típico olhar de análise que ele costumava direcionar a toda e qualquer mulher.
— Olhando bem... Até que ela não parece tão magra assim.
— Alex! — Adam o repreendeu, parecendo envergonhado.
— Não foi um insulto, Adam! Estou dizendo que, se olhar bem, verá que ela, apesar de magra, até que parece ter alguma carne. Sabe, mulheres com carne são boas para...
— Alex! — Adam o interrompeu, ainda mais envergonhado.
Eu ri da situação. É claro que eles não tinham reconhecido a Magrela. Pensei se ela teria lembrado deles, já que tinham se passado tantos anos e eles não chegaram a ter tanto contato assim.
— Lembra deles, Magrela? Meu irmão Adam e meu amigo Alex.
Ela de fato não devia ter se lembrado, pois a expressão no rosto dela se alterou quando eu disse quem eram. Ela deixou de sorrir, parecendo tensa.
— Lo...Lo...Lord Adam! — Gaguejou. E, apreensiva, fez uma, duas, três... Várias reverências seguidas.
— Ele é um lord, e não a rainha da Inglaterra! — resmunguei. Ela sempre ficava tensa na presença do meu irmão. Desde criança!
Finalmente reconhecendo-a, Adam apontou-lhe o dedo indicador e recuou um passo.
— A transgressora de regras! — Já ele, sempre teve medo dela.
Aliás, ele tinha medo de tudo o que fugisse da normalidade ou legalidade. Como já mencionei: um chato, sem mais!
Alex também a reconheceu.
— Não acredito! É aquela garota chata!
Ela o encarou, com a mesma hostilidade dos velhos tempos.
— Continua o mesmo babaca, senhor Alex.
— E você continua a mesma... Não, espera... — Novamente, a analisou de baixo a cima. — A mesma não. Até que você ganhou umas curvas, quem diria! Mudou bastante!
Confesso que não tinha reparado nas tais curvas. Aliás, só mesmo o meu amigo Alex para conseguir enxergar algum corpo dentro daquele casacão masculino. Mas, não poderia negar que ela, de fato, tinha mudado bastante. E, animado, comentei a respeito disso:
— Agora que você falou... É verdade! Ela tinha o cabelo bem mais loiro, e era meio arrepiado assim, sabe... — Gesticulei, com as mãos acima da cabeça, tentando mostrar até onde iam os cabelos revoltos dela. — Não sei o que ela fazia, ou não fazia... E as roupas dela eram sempre largas... Bem, na verdade, era ela que era bem mais magra. Por isso eu a chamava de magrela.
Qualquer mulher ficaria ofendida com tais lembranças. Mas a Magrela não era qualquer mulher. Por isso, apenas riu, e confirmou:
— É! E sair daquele internato até que te fez bem também. Você está bem mais corado. Era tão pálido, que parecia um fantasma.
— Muito engraçadinha!
Continuamos na conversa, e até nos esquecemos dos outros dois presentes ali no escritório. Há quanto tempo eu não via a Magrela? Sei lá, devia ter uns três ou quatro anos. Mas parecia que não tinha se passado nem uma semana, porque continuávamos a ter assunto e eu me sentia tão à vontade na presença dela quanto quando éramos adolescentes. Amava Adam e Alex, como irmãos. Mas era inegável que a Magrela sempre foi a minha melhor amiga. E era bom vê-la novamente.
— Então, Branquelo, — ela disse, em determinado momento — estarei em Londres até amanhã, vou embora ainda pela manhã. E gostaria de conversar com você. Mas não quero atrapalhar o seu trabalho. Podemos nos encontrar hoje à noite?
— É claro que podemos.
— Então, eu passarei por aqui no início da noite, e resolvemos para que lugar nós vamos.
— Perfeito!
Despedimo-nos com os (estúpidos, eu sei!) socos nos ombros e ela saiu. Voltei a me sentar e bati os olhos em alguns relatórios de um caso, que estavam sobre a mesa. Apanhei e, despreocupadamente, comecei a lê-los. Adam pigarreou, fazendo-me lembrar que os dois ainda estavam ali. Eu os olhei e percebi que me encaravam de uma forma inquisitiva, como se exigissem uma explicação. E eu só tinha uma coisa a comentar:
— Ela é gente boa!
Alex riu.
— Que ela é “boa”, meu amigo, eu percebi. Apesar das vestes completamente impróprias.
Adam concordou com a segunda parte:
— Onde já se viu? Uma dama usando calças! É o fim do mundo!
— Se fossem só as calças. Já viu o jeito como o Daniel a trata? Parece que está conversando com um amigo!
Não entendi a colocação.
— Mas ela é uma amiga.
— Meu caro amigo, — Alex começou a explicar — quis dizer que você a trata como se ela fosse, sabe... como nós. Um amigo homem. Mulheres são para se cortejar, não para ter amizades.
Eles, definitivamente, não compreenderiam. Voltei a desviar os olhos para os relatórios, embora não os estivesse, de fato, lendo. Apenas deixei que minha mente me remetesse ao passado. Nisso, contei:
— Ela não se dava bem com as outras garotas. Por isso, se vestia como um rapazinho, e estava sempre fugindo para o nosso alojamento. Principalmente durante os fins de semana. Assim como eu, ela raramente recebia visitas. Ah... E às vezes ela ia para lá no meio da noite também. Ficávamos até tarde conversando.
— Conversando? — Alex pareceu horrorizado.
Meu irmão Adam não estava diferente:
— E sobre o que um casal de adolescentes tanto conversava?
— Incrivelmente, tínhamos assuntos que não terminavam mais! Política, Literatura, garotas...
— Garotas? — Dessa vez, o espanto foi de ambos.
Achei graça.
— Sim. Assim como eu falava sobre garotas com vocês, também falava com ela.
— Daniel, meu irmão, percebe que fala dela como quem fala de um garoto?
Existia algum problema nisso?
— Ela é minha amiga.
— Mas é uma mulher — Adam insistiu. — Mesmo que se vista daquela forma e tenha com você a liberdade de um amigo, tente não se esquecer de que ela é uma mulher.
Não sei onde ele estava querendo chegar com tudo aquilo, mas não insisti mais no assunto. Ao invés disso, perguntei a ele como andavam as coisas em York. Adam começou a contar sobre os recentes problemas da cidade e, assim, mudamos o rumo da conversa.
* * * * * * * * * *
~ Lydia ~
Quando saí do escritório, o meu coração batia muito mais forte. Quando fui procurar por Daniel, jamais contava com a possibilidade de esbarrar com Lord Adam Harrington. Nunca contei a ninguém, mas ele havia sido o meu primeiro amor. Possivelmente o único. E é patético o fato de que o único rapaz de quem gostei na vida nunca tivesse dado a menor atenção para mim (na verdade, era um pouco pior: ele sempre teve medo de mim). Mas isso tinha ficado no passado, enterrado nos anos de juventude. Minhas prioridades, agora, eram outras. E o motivo pelo qual tinha ido procurar por Daniel era muito mais importante do que qualquer outra coisa.
Ainda passei algumas horas caminhando pelas ruas de Londres, tentando colocar a minha cabeça no lugar, ao mesmo tempo em que pensava na melhor forma de dizer a Daniel o motivo pelo qual eu o procurei depois de todos aqueles anos. Quando estava prestes a anoitecer, passei na hospedaria onde passaria a noite e troquei minhas roupas por algo que era menos impróprio para uma dama, apesar de não ser, ainda, o melhor modelo de elegância. Coloquei um vestido de um tom claro de azul e com mangas compridas, feito de um tecido bem quente e de qualidade. No entanto, o corte era bem simples e o modelo um pouco antigo, porque eu não me importava muito com tendências da moda. Por cima, joguei o mesmo casaco que usava antes, porque a noite prometia ser bem fria. Mantive os cabelos soltos, mas coloquei sobre a cabeça a boina masculina com a qual havia saído pela manhã. Quando me olhei no espelho, não desejava checar se estava bonita, mas apenas me encarar por alguns instantes, criando coragem para o que estava prestes a fazer. Fitando os meus próprios olhos verdes, através do reflexo, repeti baixinho que tudo terminaria bem e, enfim, voltei a sair pelas ruas frias de Londres.
Como combinado, passei pelo escritório de Daniel. Ele e Alex encerravam o expediente e tive que aturar aquele mala sugerindo ao meu amigo que “deixasse essa maluca para lá” e fosse com ele beber e “cortejar algumas gracinhas”. Daniel negou e deixou o babaca seguir sozinho para qualquer lugar que eu nem queria saber onde era, perguntando-me se eu havia jantado. A verdade é que eu mal tinha tomado meu desjejum pela manhã e, apenas nesse momento, me dei conta de que estava faminta. Sendo assim, fomos juntos a um restaurante. O local não era sofisticado, mas era aconchegante e nos protegia do frio absurdo que fazia lá fora.
Enquanto jantávamos, Daniel me contava o que havia feito nos últimos anos. Sobre o escritório de advocacia, a sociedade com Alex, sua relação com o pai – que havia falecido há alguns anos – e com o irmão. Percebi que, ao contrário da minha, a vida dele havia evoluído bastante desde a última vez que nos encontramos. Apenas um assunto não foi mencionado. Mas eu perguntei, sem qualquer cerimônia:
—Escuta, Branquelo... Não se casou?
— Ah, não! Para quê? Gosto da vida assim, sem maiores preocupações.
— Mas você sempre disse que pretendia se casar, algum dia.
— Exato: algum dia. Mas ainda não encontrei a moça certa para isso.
— Sei. Aquela tão doce quanto a Bianca de Shakespeare.
Ele riu.
— Shakespeare. Ainda gosta dos livros dele?
— Releio alguns, às vezes.
Achei que o assunto fosse seguir para o campo da Literatura, mas me enganei. Daniel repassou-me a pergunta:
— E você? Não se casou?
— Ah... É claro que não! De onde tirou isso?
— Imaginei! Você não faz o tipo “moça para casar”.
Pois é. Ele me conhecia melhor do que ninguém.
— Para o desespero da minha mãe! — Deixei de sorrir. — Ou para a alegria...
~ Daniel ~
Não entendi bem a última frase, mas preocupei-me ao reparar a tristeza que se instalou nos olhos da minha amiga. Ia perguntar o que estava acontecendo, mas ela adiantou-se em revelar:
— Branquelo... Eu... vou ficar noiva.
Eu tomava um gole de vinho, mas engasguei-me no momento em que ouvi tal revelação. Após tossir por algum tempo, indaguei:
— Como é? Noiva? Desde quando você...
— Desde que nasci, na verdade. É um daqueles contratos de famílias, sabe?
— Está prometida a alguém?
— Na verdade, o contrato diz que, se aos vinte anos eu não estiver comprometida com algum homem, deverei ser “entregue” ao Lord Gregory, caso ele também não esteja comprometido. Ele tem apenas seis anos para reclamar isso. Quando eu completar vinte e seis, o contrato perde o valor.
— E por que você nunca me contou isso?
— Porque eu nunca me preocupei. Ele é quinze anos mais velho que eu, e já havia se casado. Só que, há três meses, ficou viúvo. Então, daqui a uma semana, ele irá pedir a minha mão durante um dos bailes chatos que minha mãe volta e meia oferece lá em casa.
Fiquei perplexo com a situação.
— Mas... Que contrato estranho é esse?
— Digamos que seja a incomum mistura de uma mãe ambiciosa e um pai amoroso. — Ela riu e tomou um gole de água, antes de prosseguir. — Eu tinha poucos meses de vida, e minha família estava passando por sérias dificuldades financeiras. O antigo Lord ajudou os meus pais para não perdermos a casa, mas, em troca, pediu-lhes a filha, para seu primogênito, ou uma quantidade significativa em dinheiro, que eles não tinham na ocasião. Minha mãe achou que o contrato fosse uma salvação dupla: pagaria a dívida com o Lord e proporcionaria uma estabilidade para a família no futuro, com o meu casamento com o sucessor ao título. Já o meu pai, só concordou com o contrato para que desse tempo, até que conseguisse juntar todo o dinheiro para a dívida. Mas, por medida de segurança, disse que só assinaria se colocassem essa cláusula. Tinha esperanças de que eu conseguisse algum partido antes dos vinte... Mas, como vê, ele se enganou.
— Mas... Disse que ele ia tentar juntar esse dinheiro.
— E juntou. Levou os oito anos seguintes, os últimos de sua vida, juntando esse valor. Não sei a quanto ele chegou, mas... Sei que foi tudo transformado em vestidos e joias, depois que ele se foi.
Vi-me completamente sem fala. O que dizer em uma situação como aquela? Magrela sempre me contou sobre sua mãe ser uma “víbora”, o que de início julguei como absurdo. Afinal, tudo o que sempre desejei na vida foi ter uma mãe... E ela, em contrapartida, tinha uma, mas sempre a ofendia. Sempre julguei os laços familiares como sagrados. Aprendi a respeitar – embora não a amar – o meu falecido pai, mesmo com tudo o que fez a minha mãe e a mim. Mas, agora, enfim eu era capaz de entender. Como era possível que uma mulher, vendo todo o sacrifício do marido em juntar uma quantidade significativa de dinheiro para livrar a filha de tal compromisso imposto, fosse capaz de algo assim? Após a morte do marido, havia gastado em futilidades todo o dinheiro que seria a salvação de sua filha.
Magrela continuou:
— Não tenho outra saída, Daniel. — Ela suspirou e me olhou no fundo dos olhos. O fato de ter me chamado pelo nome e não por “Branquelo” já mostrava que, fosse o que fosse, o que tinha a dizer era muito importante. — Eu vim pedir a sua ajuda.
Segurei a mão dela juntos às minhas e, olhando-a nos olhos, garanti:
— É claro, Magrela! Farei tudo o que estiver ao meu alcance. Amigos são para essas coisas. Pode pedir, qualquer coisa! No que posso te ajudar?
— Quero que se torne meu noivo.
Então, soltei as mãos dela, de súbito.
Aquele pedido ia um pouquinho além de tudo o que eu poderia imaginar.
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Capítulo dois - Entrando em problemas* * * * * * * * * *“Se você se sente só, é porque ergueu muros em vez de pontes"- William Shakespeare -* * * * * * * * * *~ Lydia ~ Eu ainda aguardava por alguma resposta. Ensaiei aquele momento tantas vezes, que esperava por qualquer tipo de reação da parte dele. Esperava que ele gargalhasse, que dissesse que eu estava louca em lhe pedir algo daquele tipo, ou mesmo que levantasse e saísse correndo. Mas nunca, em momento algum, imaginei que ele, simplesmente, não tivesse reação alguma. Ficou parado, estático, me encarando com os olhos azuis arregalados. Sequer piscava!— B
Capítulo três - "Você o ama"?* * * * * * * * * *“O amor não se vê com os olhos, mas com o coração”- William Shakespeare -* * * * * * * * * *~ Daniel ~ Se, posteriormente, fosse perguntado sobre aquilo, eu certamente não saberia como me explicar. Não conseguiria dizer o que me levou àquela atitude. Foi como se os olhos dela tivessem atraído os meus, como dois ímãs, causando em mim um incontrolável desejo de beijá-la. Apenas me dei conta do que estava prestes a fazer quando nos afastamos subitamente, assustados com uma vassoura que havia caído – após a mão de Lydia, acidentalmente, esbarrar nel
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