Mil graus de miopia? Isso não podia ser verdade.Florence lembrou da última vez em que viu Fernando e Daphne juntos, trocando beijos, enquanto ele ainda usava uma jaqueta de couro com o emblema de uma equipe profissional de automobilismo.Por causa disso, ela até pesquisou na internet sobre o assunto. Mas, talvez por ter confundido o logotipo, não encontrou nada que ligasse Fernando a nenhuma equipe. O que encontrou foram vários critérios rígidos para pilotos profissionais.Entre eles, um chamou sua atenção: a exigência sobre a visão dos pilotos. Para ser piloto profissional, não podia ser míope com grau tão alto. Quem tem mais de mil graus de miopia simplesmente não passa nos testes.Por alguns instantes, Florence ficou sem saber se acreditava ou não. Será que era só mais uma jogada de Fernando para enganar?Ela pensou nisso por alguns segundos e levantou os olhos para Fernando. Ele estava de lado, examinando a radiografia, e ela pôde ver de outro ângulo as lentes dos óculos.Através
Antes mesmo que Florence pudesse se despedir, Cláudio já havia girado a cadeira de rodas e a levado para fora do consultório de Fernando.Quando desceram, o céu já estava escuro. O motorista, atento, correu para abrir a porta do carro assim que os avistou.Vendo a cena, Florence tentou se levantar sozinha da cadeira:— Tio, eu posso chamar um carro no celular, não precisa se preocupar comigo.Mas, no instante em que ela deu o primeiro passo, sentiu as pernas falharem. O corpo cedeu e ela quase caiu de joelhos diante do homem à sua frente, não fosse Lucian segurá-la a tempo.Que vergonha! Florence ficou de cabeça baixa, sem coragem de levantar o olhar.De cima, Lucian soltou uma risada abafada:— Não precisava agradecer se ajoelhando.Florence mordeu os lábios, sem conseguir rebater.Lucian passou o braço pela cintura dela e a ergueu, obrigando-a a encará-lo de frente.— Engraçado, com os outros você é toda educada.— Obrigada. — Florence murmurou, desconfortável.— O quê? Não ouvi dire
Quando Florence pensou em se virar, ouviu uma voz conhecida.— Tio, quanto tempo... Fico feliz em ver que você está bem.A voz de Ronaldo continuava absurdamente suave, com uma gentileza que parecia fazer parte do seu próprio sangue. Tudo o que ele dizia soava envolto em doçura, mesmo quando deixava claro o tom de provocação contra Lucian.Florence levantou os olhos devagar e encontrou o olhar de Ronaldo, que já estava bem à sua frente.Ele sorriu do mesmo jeito de sempre e murmurou baixinho:— Flor.Para Florence, porém, aquela voz parecia fria como o toque de uma serpente, silenciosa se aproximando da presa, pronta para dar o bote.— Boa noite, Ronaldo. — Ela respondeu gelada.Ela lembrava do que Lyra tinha contado: que Melissa, sob o pretexto de cuidar dos pais, tinha levado Ronaldo de volta para a casa dos Nunes.Agora, Ronaldo era o cérebro por trás do Grupo Nunes, quase nem aparecia mais no Grupo Avery, o que vinha deixando Theo irritado com tudo e todos.Ainda por cima, o Grupo
Ela olhou surpresa para Lucian. Como ele sabia que ela estava querendo sopa de tomate?Lucian virou o rosto para ela e disse, sem alterar o tom:— Pode tomar.— Tá bom. — Florence assentiu e começou a tomar a sopa, sentindo o calor aliviar um pouco o desconforto.Ronaldo observou a cena com um olhar indecifrável, apertando com força o garfo entre os dedos.Melissa passou o guardanapo nos lábios, deu um sorriso enviesado e comentou:— Flor, por que você saiu para jantar com o Lucian? Falo por bem, mas fica o aviso: certas coisas não podem se repetir. Para mulher, o mais importante é a reputação.O rosto de Florence ficou pálido. Ela sabia muito bem que Melissa estava falando do caso entre ela e Lucian. Já fazia tempo, e ninguém da família Avery ousava tocar no assunto, mas Melissa fazia questão de constrangê-la diante de todos.Nesse instante, o som do café sendo servido ecoou pela mesa.Lucian largou a cafeteira com calma, pegou a xícara e lançou um olhar gelado para Melissa:— Não sab
Quando Ronaldo falou em “atacar onde dói”, ele lançou um olhar direto para Florence.Ela ficou desconfiada, prestes a perguntar o que ele queria dizer, mas foi interrompida por uma voz grave atrás de si.— Florence.Lucian apareceu com passos largos, vestindo o clássico terno preto e camisa branca. Não precisava de detalhes para impor respeito; só a presença dele já era esmagadora. Em poucos passos, ele tomou conta de todo o ambiente. O cigarro de Ronaldo se consumia até o filtro entre seus dedos, mas, diante do olhar de Lucian, ele ficou paralisado, só o ódio borbulhando nos olhos.Sem dar a mínima para Ronaldo, Lucian passou direto, segurou Florence e a pegou no colo, saindo dali sem olhar para trás.— Tio. — Ronaldo chamou, com a voz carregada de rancor.Lucian parou, mas não virou.Florence olhou para Ronaldo por cima do ombro. O olhar dele estava cada vez mais obcecado, deixando-a inquieta.Ronaldo soltou uma risada fria:— Tio, aposto que você não sabe... A Florence me disse que
Os dedos dele deslizaram pelos cabelos dela, com uma delicadeza inesperada, quase carinhosa.Florence fechou os punhos, sem dizer nada, sentindo o corpo esfriar ao invés de aquecer. Ela levantou o olhar e sustentou o dele:— Ter dormido juntos não significa nada. Você não se importa, eu também não. Se pintar uma chance, eu vou embora.— Você não vai.Florence ficou tensa, a coluna arrepiada. Ela sabia que aquilo era uma ameaça velada. Lucian conhecia o peso da família Avery sobre sua mãe.No instante seguinte, porém, ele pousou um beijo leve, quase tímido, sem a força de antes, apenas um toque suave.Enquanto ela ainda estava surpresa, ele puxou de leve o colar no pescoço dela. A esmeralda balançou entre os dois, brilhando num verde hipnotizante.Ele repetiu, em tom calmo:— Você não vai.Florence tentou pegar a corrente de volta, mas ele desviou com facilidade.Ela retrucou, mantendo a pose:— Esqueci de tirar.— Sei.Ele não insistiu. Pegou-a no colo mais uma vez e a depositou no sof
De acordo com as regras, ninguém da família podia assistir à cremação no crematório. Florence Winters, no entanto, pagou o que foi necessário. Com passos lentos, ela empurrou a maca de ferro gelada para dentro da sala de cremação. O ar tinha um cheiro metálico de queimado, e no feixe de luz que atravessava a janela, partículas de cinza flutuavam no ar. Talvez fossem restos de ossos. Em breve, sua querida filha também se tornaria isso. Vestida com um longo vestido preto, Florence parecia ainda menor do que era. Nem mesmo o menor tamanho escondia sua silhueta magra e abatida. Seus olhos, inchados e vermelhos de tanto chorar, estavam agora estranhamente serenos. Ela passou a mão pelo lençol branco que cobria o corpo imóvel e pálido da filha e, cuidadosamente, colocou na palma da mão fria da menina duas estrelas de papel cor-de-rosa. — Estela, espera a mamãe. Quando o tempo acabou, um funcionário aproximou-se e puxou Florence gentilmente para o lado. Ele ergueu o lençol, re
Ela tinha voltado à vida! Florence havia ressuscitado!Ignorando os olhares incrédulos ao seu redor, ela cravou as unhas em seu braço, apertando com força. A dor aguda percorreu-lhe o corpo, e seus olhos logo se encheram de lágrimas.— Chorando por quê? — Uma voz grave e autoritária ecoou pelo salão. — Quem deveria pedir desculpas aqui é você, não a nossa família Avery!Florence voltou a si e ergueu o olhar, encontrando os olhos frios e impacientes de Theo Avery, o patriarca da família.Imediatamente, ela baixou a cabeça, assumindo a postura submissa de sempre. Mas, por dentro, seu corpo tremia, não de medo, mas de excitação.Ao redor, ouviam-se risinhos abafados e cochichos venenosos.— Jovem desse jeito e já com coragem de drogar o próprio tio para seduzi-lo? Fez a maior confusão na cidade só para tentar obrigar o Lucian a assumir responsabilidade. E agora finge que nada aconteceu! Quem educou essa garota?— Isso não é coisa de gente da nossa família. A família Avery nunca criaria al