Descumprindo uma regra

Enxugo as minhas mãos no pano de prato, apoiando as minhas costas no armário gelado, meus olhos estão fixos na pequena criança que olha com atenção para o mesmo desenho que havíamos pintado na tarde anterior. Cecilia é tão diferente de Timothy, ela é quieta e extremamente comportada.

- Cecilia, eu tenho um filho, ele é um pouco mais novo que você. - Comento, me aproximando lentamente dela. Precisava encontrar algum assunto para me aproximar dela. - Ele gosta muito de Alvin e os esquilos, você já assistiu?

Seus olhos pequenos e brilhantes me encaram com uma leve curiosidade, o que me faz criar alguma esperança de ter mais interações com ela.

- Não. O que é? - pergunta baixinho, piscando rapidamente.

- São esquilos que cantam. - ela inclina levemente o corpinho e franze o cenho, apertando os olhinhos.

- Esquilos não cantam.

Solto uma risada baixinha, gostando da sua resposta sabichona. Me aproximo um pouco mais dela, a olhando nos olhos.

- Posso te contar um segredo? - pergunto baixo, atraindo ainda mais a sua atenção. Ela concorda com a cabeça e eu me aproximo do seu ouvido. - Esses são os únicos que conseguem cantar, mas você não pode contar para ninguém.

Cecília arregala os olhinhos e coloca uma das mãos na boca.

- Você pode me mostrar? – questiona baixo.

- Claro. – um sorriso imenso está em meu rosto, quando eu a ajudo a descer da banqueta em que estava sentada, segurando a sua mãozinha para que pudéssemos ir até a sala juntas.

Ela se senta no sofá e eu agarro o controle, antes de me sentar ao seu lado. O filme dos esquilos começa a passar em questão segundos, ganhando a atenção imediata da criança, que parece extremamente animada com a nova descoberta.

Timothy e ela se dariam bem.

Quando o filme chega na metade eu ouço o barulho de passos pesados se aproximando, hoje o Sr. White estava trabalhando de casa.

- O que estão fazendo? – a voz séria soa atrás do sofá e eu sinto uma tensão imediata.

Na maioria das vezes era incômodo estar no mesmo ambiente que ele.

- Assistindo filme. – tento o encarar por cima do ombro, mas tudo o que vejo é a sua camisa.

- Cecília, você já comeu? – a garotinha assente, ainda com os olhos fixos na tv. – Então suba para o seu quarto, Bella já vai subir para te dar banho.

Ela não discute, apenas faz um pequeno beicinho e se levanta.

- Eu vou pausar, depois a gente continua de onde paramos. – falo para animá-la.

Cecília me olha por um momento, parecendo meio incerta. Antes de subir no sofá e se aproximar do meu ouvido.

- Vou guardar segredo, prometo. - abro um pequeno sorriso ao vê-la se afastando rapidamente.

Quando ela some da nossa visão, eu me levanto do sofá e encaro o meu chefe.

- Tem algo para dizer?

- Você leu todas as regras sobre os cuidados da Cecília? – ele cruza os braços.

Abro a minha boca para responder, mas ele é mais rápido do que eu.

- Foi uma pergunta retórica. Claramente você não leu. – sua voz está mais séria agora e eu percebo que alguns músculos do seu braço estão tensionados. - A mãe dela não permite uso de telas.

- Eu sinto muito. – falo com pressa, me sentindo extremamente culpada. – Eu me esqueci de ler tudo.

- Esse tipo de erro não pode mais acontecer, Jones. Quero que siga a risca todas as regras impostas.

- Sim, sr.

Observo melhor o rosto do White e algo nele me soa extremamente familiar, não é como se eu já o tivesse conhecido. Mas a sensação que tenho é que ele se parece com alguém.

Percebo que ele solta um pigarro, aparentemente incomodado com o meu olhar atento. Abaixo os olhos no mesmo segundo, sentindo a vergonha me atingir por ter sido notada o olhando mais do que devia.

- Agora suba e dê um banho rápido na Cecília, temos um lugar para ir.

O encaro novamente.

- Temos?! Isso me inclui? – franzo o cenho e ele me encara como se eu fosse um inseto irritante.

- Você é a babá dela, então sim. Isso te inclui. – responde com tédio.

- Tudo bem.

Me afasto dele em passos rápidos e assim que um dos meus pés toca o primeiro degrau, a sua voz soa novamente.

- Espero que não cometa mais nenhum erro grotesco como esse, porque na próxima, eu não serei tão bondoso.

Engulo seco e mordo levemente o lábio.

- Prometo que serei eficiente. – respondo sem me virar para ele, começando a subir os degraus.

Eu não tinha opções, tinha que ser boa o bastante para manter esse emprego.

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