Catarina
Estou há uma semana em Belo Horizonte e já fiz duas entrevistas de emprego. Tenho me alimentado bem e até já marquei uma consulta com uma ginecologista/obstetra. Sinto que tudo está entrando nos eixos. Agora, só falta conseguir um emprego e, pela primeira vez em toda a minha vida, ser inteiramente responsável por cada um dos meus passos. A única coisa que ainda me atrapalha é a tristeza que sinto pelo que aconteceu com os meus pais. Apesar de estar dormindo bem melhor do que de costume, ainda acordo sobressaltada em algumas noites, revivendo o horror da morte deles. É como se ficasse presa em um pesadelo repetitivo, que gira em looping pelo meu subconsciente traumatizado. Sei que vai ser difícil me livrar dessas imagens e que, muito provavelmente, nunca vou superar totalmente essa perda. Mas preciso seguir em frente.
Estou fazendo o almoço quando o meu telefone toca. Sinto um arrepio inevitável de me
Theo Depois de dois meses de muito trabalho, eu e Arthur conseguimos reunir provas concretas contra Heitor: o suficiente para mostrar para a cidade e para o resto do mundo o canalha corrupto que ele é. Ligo para Cibelle, a jornalista que investiga o caso dele há anos e que já foi responsável por tornar públicos muitos podres do sistema judiciário. Conto as últimas novidades e envio, por e-mail, cópias de tudo aquilo que meu padrinho conseguiu apurar. É o bastante para que ela dê um furo de reportagem e desbanque o todo-poderoso Heitor na sociedade, desmistificando a sua imagem de homem honrado. Desde a briga que tivemos na casa dele, tenho evitado circular pelas ruas. Ainda estou surpreso por não ter havido nenhum tipo de retaliação, principalmente considerando o poder que ele tem. Mas a sua vaidade é maior do que qualquer outra coisa e, com certeza, a sua ânsia por evitar escândalo falou mais alto. Basta ter como parâmetro a
Catarina Estou no computador do trabalho quando vejo a notícia sobre a morte de Heitor. Fico chocada e, ao mesmo tempo, tomada por um alívio enorme. Começo a ler a matéria e descubro sobre o escândalo envolvendo o seu nome e sobre a suspeita de suicídio. Se isso for mesmo confirmado, ele terá morrido exatamente como seu pai. A vida é mesmo repleta de ironias e dá muitas voltas. Tem uma menção a Theo na reportagem, dizendo que ele estava deixando a casa quando o disparo aconteceu. Gelo na hora, imaginando o motivo que o levou de volta a Mendes e a razão para estar visitando Heitor. Fico me perguntando o que eles podem ter conversado para o encontro terminar com um tiro na cabeça. Completamente atordoada com tudo o que descubro, sinto vontade de procurar Theo. Chego a cogitar fazer uma ligação para ele, revelar que será pai e dizer onde estou morando. Mas, após passar o d
Theo O meu chefe me chama para uma reunião privada e fico ansioso para saber do que se trata. Chegando lá, ele elogia a minha performance nos últimos meses e informa que, por conta do meu excelente desempenho, vou ser promovido e ganhar quase trinta por cento a mais a partir do mês que vem. Fico radiante, agradeço muito e me dou conta de que estou conseguindo alavancar a minha carreira e conquistar, gradativamente, a minha independência. Penso em Catarina e em como ela teria orgulho de mim neste momento. Onde será que ela está e o que deve estar fazendo? Será que ainda pensa em mim? Faço esses questionamentos todo santo dia e, sem nenhuma exceção, fico completamente sem resposta. Chego em casa cansado, mas satisfeito. É muito bom poder descansar em um lugar que tem a minha cara e reflete a minha energia. Tudo que tem aqui
Catarina 2018 Henrique vai completar dois aninhos na semana que vem. Às vezes, nem consigo acreditar que o tempo passou tão rápido. Ele é uma criança adorável e esperta, que ri o tempo todo e se ajusta a qualquer ambiente. Dorme bem, come que nem um leão e é muito carinhoso. Agora que está bem crescido, as semelhanças físicas com o pai são gritantes: os cabelos castanho-claros e os olhos verdes como uma límpida e brilhante esmeralda. Toda vez que ele me encara com profundidade, faz com que eu pense em Theo. Ele se tornou uma lembrança boa, que provoca uma saudade gostosa. Não sinto mais nenhum tipo de raiva e até consigo entender que foi muita pressão para ele, com tão pouca idade. Não que isso justifique a maneira como ele me deixou, mas pelo menos ameniza o estrago que isso causou em mim. &nbs
Theo 2018 Consegui fechar um negócio milionário para a empresa e, com certeza, vou ganhar um bônus que vai compensar toda a dedicação dos últimos tempos. Nas duas semanas que passaram, virei noites para dar conta do projeto e praticamente abandonei a minha vida pessoal. Natália tem reclamado que quase não apareço em casa, sempre me cobrando por mais atenção. Gosto muito dela e de tudo o que construímos juntos, mas me incomoda essa mania de querer sempre mais, como se o que eu ofereço nunca fosse o suficiente. Namoramos há quase um ano e já moramos juntos há cinco meses. Ela entrou na minha vida e, quando me dei conta, já estava dentro da minha casa. Agora, fala o tempo todo em casar, em fazer uma enorme festa e até em ter filhos. Estou feliz, mas, quando fecho os olhos, não me imagino ao seu lado pela vida inteir
Catarina Ando meio sem rumo, completamente atordoada com o que acabou de acontecer. Claro que pensei em Theo quando vim para o Rio, mas quais as chances de esbarrar com ele, no primeiro dia, em uma cidade tão grande e cheia de gente? Estou com a boca totalmente seca e, sem querer, analiso a roupa que visto, o estado do meu cabelo, os sapatos nos pés. Eu me sinto uma adolescente. Penso no encontro que teremos logo mais, tentando não criar qualquer tipo de expectativa. Pego um táxi e vou direto para o hotel. Tomo um banho relaxante e me deito para tentar relaxar. Preciso decidir o que estou disposta a contar. Penso em Henrique e sinto, de repente, uma saudade enorme do meu filhinho. Ligo para casa, falo com Fernanda e confiro se está tudo bem. Depois, tento tirar um cochilo, mas a adrenalina não me deixa pegar no sono. Faço
TheoSaio do hotel em que Catarina está hospedada radiante e preocupado. Sinto uma alegria incontrolável pela noite que tive com a mulher que eu amo, mas também carrego a culpa pelo que fiz com Natália. E, principalmente, com o que ainda terei de fazer. Ela estava possessa ao telefone, e não ajudei muito: fui completamente evasivo em todas as minhas respostas. Ela SABE que alguma coisa séria aconteceu, mas não sei se consegue imaginar a dimensão do que foi.Ligo para o trabalho para avisar que chegarei mais tarde e vou direto para o meu apartamento encarar a minha namorada. Chegando lá, a encontro sentada na sala, com a cabeça apoiada nas mãos, com o rosto já inchado de chorar. Vê-la desse jeito faz com que eu me sinta um babaca, e, para ser sincero, é isso que sou.Deixo as minhas coisas em cima da mesa e me sento ao
Catarina A noite inteira parece um conto de fadas, mas nada me prepara para o seu desfecho: Theo ajoelhado aos meus pés, segurando uma aliança reluzente e me pedindo para ser a sua mulher. Eu não penso em mais nada e voo no seu pescoço, perdendo a compostura e gritando repetidas vezes o “SIM” mais sonoro que já falei na minha vida. Sem cerimônia, ele me tira para dançar e ficamos os dois, no meio do salão do restaurante, completamente alheios a tudo o que está à nossa volta. Vamos para casa abraçados e fazemos amor demoradamente, com delicadeza e paixão. Dormimos abraçados, totalmente extasiados de felicidade, mal acreditando que vamos ficar juntos. No dia seguinte, penso na questão geográfica e me preocupo. Não vai ser fácil viver em uma ponte aérea entre Rio e Minas, principalmente tendo uma criança no esquema. Resolvo dividir o meu receio com Theo, que abre um sorriso gigante e me conta que vai se mudar par