“Transforme as pedras que você tropeça
nas pedras de sua escada.”
Sócrates
― Que susto PC! Quer me matar do coração ― gritou dando de cara com o moleque que ia batendo na porta.
― Foi mal fiel. O Carlão mandou chamar vocês.
― Valeu. A gente já tá indo.
Deco fechou a porta e olhou intrigado para Nico.
― O que será que ele quer tão cedo?
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“A cada momento de nossa existênciatemos que escolher entre um caminho e o outro.Uma simples decisãopode afetar uma pessoa para o resto da vida.”Paulo Coelho Nico chegou à quadra da Associação de Moradores e todos o cumprimentaram alegremente. A comunidade estava em festa. As pessoas dançavam animadas ao som dos Dominados. Nico estava muito elegante, agradecia a presença de todos e dançava com maestria os passos de funk. Não queria despertar suspeitas, precisava agir com naturalidade. Dona Maria chegou trazendo o bolo, que colocou delicadamente na mesa arrumada com os doces. Deu um forte abraço em Nico e neste momento ele
“Não tropeçamos nas grandes montanhas,mas nas pequenas pedras.”Augusto Cury Nico acordou sentindo uma enorme dor de cabeça. Não fazia idéia de quanto tempo havia dormido. Olhou em volta. Ficou um tempo sentado em silêncio. Encostou a cabeça na parede, inspirou fundo e deixou as lágrimas descerem. Seu peito pesava. Depois de alguns minutos desabafando toda a sua tristeza tentou levantar. Colocou a mochila nas costas e com passos pesados caminhou. Entrou em uma lanchonete e pediu um café. Sentado, cabeça baixa, tentava organizar seus pensamentos. Olhou para a televisão. Os repórteres estavam no morro. Nico
“caminho mundo...a treva negraenvolve tudo...”Luís Aranha No dia seguinte, quando abriu os olhos Nico estava na mesma posição. De bruços, cabeça e pés pendurados para fora do colchão. Procurou pela mancha de sangue e não encontrou nada. Estava confuso, não sabia direito o que havia acontecido. Levantou-se com enorme dificuldade. Cada músculo do seu corpo doía ao mais leve movimento. Procurou pelas marcas dos tiros em seu corpo. Nenhum sinal de ferimento, nenhuma gota de sangue, tudo parecia exatamente no seu devido lugar. Colocou a palma da mão sobre a testa e balançou a
“As decepções, as derrotas, o desânimo são ferramentas que Deus utiliza para mostrar a estrada.”Paulo Coelho Mais de um mês se passara desde a morte de Jonny. Lia estava muito preocupada com o estado da mãe. Nada a fazia sair do quarto do filho. Era como se a vida tivesse abandonado o seu corpo. Lia entrou no quarto carregando uma bandeja de café da manhã. Colocou-a sobre a mesinha de canto e sentou na cama, ao lado de sua mãe. Clara estava deitada em posição fetal, agarrada ao travesseiro e às roupas de Jonny. ― Mãe, por favor. Você já está há semanas d
“Quando tudo está perdido sempre existe um caminho, quando tudo está perdido sempre existe uma luz.”Dado Villa-Lobos/ Renato Russo/ Marcelo Bonfá Se Lia pudesse imaginar o que aconteceria aquela noite jamais teria tirado sua mãe da cama. Na manhã daquele sábado, Lia havia tomado uma decisão: tirar sua mãe de vez daquela depressão. Ela preparou um café da manhã com muitas frutas, um delicioso suco de abacaxi e levou a bandeja até o quarto dos pais. Depois da consulta com a Dra Marlene, sua mãe havia melhorado muito. Aceitou sair do quarto de Jonny e já se alimentava melh
"Nem tudo o que enfrentamos pode ser mudado.Mas nada pode ser mudado enquanto não for enfrentado."James Baldwin A noite fora do hospital foi um pouco assustadora para Nico. Apesar de continuar tomando os medicamentos, tinha medo de que a fissura voltasse e ele acabasse fugindo dali. Dormiu no quarto de hóspedes. O sono veio rápido devido ao calmante receitado pelo Dr. Carlos. Mas quando acordou no dia seguinte sentiu um intenso desconforto. Receio em encontrar o pai de Lia. Sentia-se como um intruso naquela casa. Não havia motivo para receber tantos cuidados, mesmo tendo ajudado as duas. Ele não pertencia àquele mundo, não pertencia àquela família. A única c
“Nossa maior fraqueza está em desistir. O caminho mais certo de vencer é tentar mais uma vez.”Thomas Edison Nico aproveitou um momento de distração dos monitores e escalou o muro que ficava atrás dos quartos. Atravessou a rede de arame farpado e pulou de uma altura de três metros. Quando chegou ao chão torceu o tornozelo. Sentiu uma dor terrível, mas começou a correr em direção à mata. Quando os monitores perceberam a fuga, Nico já estava muito longe. Ele caminhou por horas até chegar a uma estrada. Com as pernas trêmulas sentou em um banco no ponto de ônibus. Pediu dinheiro às pessoas que esperavam a condução. Depois de
“Recria tua vida, sempre, sempre.Remove pedras e planta roseirase faz doces. Recomeça.”Cora Coralina Débora estava grávida. Nico demorou alguns segundos para organizar seus pensamentos. Tentava entender a dimensão dos últimos acontecimentos. Com a ajuda de Lia, Débora sentou no degrau da escada e sentiu o odor desagradável que Nico exalava. Mesmo assim estava emocionada. Nico olhou em seus olhos ainda tentando entender o que aquilo tudo significava. Débora não conseguia parar de chorar. Ela estava completamente assustada com o estado de Nico. Magro, debilitado, os olhos fundos. Aqueles olhos tão azuis e brilhantes q