Capítulo 0002

Sete Anos Antes

Winnipeg, Canadá.

— Parabéns, Hanna! – Isaac grita, pulando em cima de mim, e nós dois caímos no chão, atraindo olhares curiosos no parque. Me levanto entre risadas; ele era o melhor de todos, o melhor amigo que poderia ter.

— Já sabe como vai comemorar sua aceitação em Oxford? – Ele sorri malicioso, estragando seus cabelos. – Você e o Liam vão fazer um bacanal? Safada!

Dou um tapa em seu braço, e Isaac gargalha ao perceber minhas bochechas corarem. Seus olhos me encaram brincalhões.

— Este é um belo presente de aniversário, não acha? Logo um dia antes do meu aniversário, recebo o e-mail de aceitação! – Sorrio emocionada, ele bagunça meu cabelo. – Sinceramente, não estou acreditando nisso tudo.

Seus olhos negros me encaram com emoção; Isaac me conhecia a vida inteira, éramos inseparáveis. Tê-lo torcendo por mim era um dos motivos para não desistir, ainda mais agora que as coisas entre Liam e eu andavam estranhas.

— Pode se orgulhar, você é muito inteligente, e agora estará estudando em uma das melhores faculdades! Nosso sonho de infância está prestes a começar. – Isaac beija minha testa. – Agora, trate de ir para casa curtir sua aprovação e comemorar com aquele gringo insuportável!

Rindo, pego minha mochila e me despeço com um beijo em sua testa, correndo em seguida em direção ao ponto de ônibus.

(...)

Ao me deparar com a porta completamente aberta, uma sensação estranha percorre meu corpo. Adentro na casa e sou recebida pelo ambiente escuro, as cortinas fechadas contrastando com a televisão ligada em volume máximo. Suspiro ao avistar o controle remoto caído no chão e o pego, desligando o aparelho com um gesto automático.

— Liam? Cheguei! – Minha voz ressoa pela sala.

O silêncio na casa era apenas quebrado por uma música suave vinda do final do corredor.

Percebo uma caixa de bombons vazia no sofá, isso me faz arquear uma sobrancelha. Liam sempre desprezou doces, então aquilo definitivamente não era dele.

Deixo a caixa na mesa de centro ao notar a luz do corredor acesa. Meu coração b**e mais rápido enquanto percorro o corredor, a melodia distante ecoando em meus ouvidos, criando uma aura de suspense que me envolve a cada passo em direção ao nosso quarto.

— Liam, acho que alguém entrou na casa. – A voz feminina soa preocupada.

— Deixe de paranóias, gatinha. – A voz ofegante de Liam responde. – Vamos nos divertir.

O som das molas da cama ressoa pelo corredor, mesclado aos gemidos e risadas que cortam o silêncio.

Uma lágrima solitária desce pelo meu rosto. Como ele pode fazer isso comigo? Conhecia aquela voz feminina, mas recusava-me a acreditar que minhas paranóias estivessem corretas.

A porta do nosso quarto está fechada, mas os sons escapam. Abro-a lentamente e sinto meu peito apertar ao ver um corpo feminino sobre Liam, que a encara com desejo. Suas mãos passeiam pelo quadril dela, enquanto ela se apoia em seu peito.

Os cachos loiros balançam no ritmo dos movimentos, e eu recuo assustada, cobrindo minha boca, tremendo. Um nó se forma em minha garganta, e as lágrimas deslizam por meus olhos.

— Vamos, Samantha. Goze para mim. – Liam diz, puxando-a para um beijo.

O nojo invade meu corpo com a revolta. Samantha? Sua prima, que foi criada como sua irmã? Ele sempre negou que havia algo entre eles, Liam sempre me disse que ambos eram como irmãos. Agora estavam transando na minha cama na véspera do meu aniversário!

Empurro a porta e o ódio cresce em mim ao ver Liam me olhando sem se surpreender. Samantha pula para seu lado na cama, escondendo sua nudez com os lençóis.

— Hanna... Não é isso que você... – A voz trêmula de Samantha é interrompida pelo meu grito de dor.

— Como é dramática! – Liam se levanta, ainda nu.

Ele anda em minha direção, a única coisa que consigo fazer é estapear seu rosto, mas suas mãos são mais rápidas ao segurarem meus pulsos.

Mordo sua mão forte, fazendo-a sangrar. Liam solta minha mão e eu soco seu rosto com toda a minha força, fazendo seu nariz esguichar sangue.

— Desgraçada! – Ele grita e me dá um tapa forte no rosto, me deixando atordoada.

Liam me j**a contra a parede, com o impacto, minha cabeça b**e rachando o gesso.

— Eu nunca te suportei, Hanna. Você é apenas uma vadia escandalosa. – Sua voz é fria, sem nenhum sentimento.

— Vamos embora, Liam. – Samantha diz surgindo na porta do quarto, agora vestida.

Seus olhos me encaram com nojo, a única coisa que consigo fazer é permitir as lágrimas rolarem pelo meu rosto.

— Se você nunca me amou, por que ficamos juntos todos esses anos? – Minha pergunta é um sussurro fraco. – Deve existir pelo menos um pingo de sentimentos no seu coração.

Sua risada ecoa pelo quarto, como se rasgasse meu coração com uma navalha.

— A única coisa que quis de você foi me aproximar da sua família. – Liam agacha em frente ao meu corpo e segura meu rosto, me forçando a olhar em seus olhos. – Acha mesmo que eu ficaria com alguém como você? Meu único objetivo era conseguir arrancar o máximo de dinheiro que conseguisse de você. E bem... Eu consegui.

— Já chega, Liam. Vamos embora da casa da Hanna! – Samantha diz impaciente. – Vamos sair logo daqui.

— Agora vem a melhor parte, Sam. Esta é a minha casa. Hanna passou tudo para o meu nome ao assinar papéis sem ler. – Ele sorri sarcástico, fazendo meu estômago embrulhar.

— Você... Você não pode estar falando sério. – Meus olhos se arregalam, meu coração se aperta. – Você não faria isso comigo.

Samantha observava a cena em silêncio, seus olhos estavam marejados, como se ainda tivesse compaixão por mim.

— Samantha, vocês não podem fazer isso comigo! Eu sempre fui legal com você, não deixe seu primo fazer isso! Por favor, esta casa é tudo que eu tenho! – Imploro, olhando para seus olhos verdes, mas a loira vira o rosto, cortando o contato visual.

Estou em choque, não há uma reação que possa demonstrar o quão destruída estou por dentro. Então é isso? Ele me usou, destruiu tudo pelo qual lutei e agora iria me descartar como um brinquedo quebrado?

Liam se levanta e caminha em direção à porta, abaixando e pegando suas roupas.

— Vamos sair para buscar as coisas da Sam. Quando eu voltar, não quero vê-la aqui. – Ele diz sem me olhar, suas palavras são como facadas em meu coração.

— Mas... Mas... Eu não tenho para onde ir! – Digo entre soluços.

— Isso não é problema meu. – Liam diz antes de sair.

— Eu sinto muito. – Samantha sussurra enquanto me olha com pena. – Se você quiser, eu... Eu posso falar com seus pais adotivos e pedir para que você fique na casa deles.

Ótimo! Agora estava tendo a piedade da amante do meu namorado. A olho em silêncio, sentindo o ódio e a sensação de injustiça percorrerem meu corpo.

— Vá para o inferno, não preciso da sua piedade. – Minha voz rouca ecoa no quarto, seus olhos me analisam com pena.

Samantha sussurra "desculpa" e sai do quarto, me deixando sozinha.

Abraço meu corpo, sentindo o medo me consumir. Agora estou sozinha no mundo, tudo pelo qual lutei está arruinado, tudo que acreditei era falso.

Não posso voltar para a casa dos meus pais adotivos; eles não me suportam, me expulsaram de lá. Não existe a remota possibilidade de ser aceita por eles.

Suspiro, secando as lágrimas. Preciso ser rápida, nem meu carro tenho mais à minha disposição. Minha única saída seria pedir ajuda a Isaac.

Assim que ligo, ele atende no primeiro toque. Não consigo dizer uma palavra, apenas soluçar.

— Hanna? Você está bem? – Sua voz é preocupada.

— Só me tira daqui. – Digo entre soluços. – Só me ajude a sair dessa casa.

— Hanna, não estou entendendo. Você está na sua casa? Estou próximo, estou na casa da Kendall. Vamos aí te ajudar. – Sua voz é nervosa, antes da ligação ser encerrada por mim.

Levo as mãos ao rosto, abafando meus soluços, as lágrimas descem pelos meus braços, molhando as mangas da minha blusa.

Minutos depois, escuto passos ecoando pelo corredor. Meus músculos se contraem instintivamente, temendo que fosse Liam e Samantha retornando. No entanto, um suspiro de alívio escapa de meus lábios ao ver a porta se abrir e Isaac entrar, seguido por Kendall, sua noiva.

— Meu Deus, o que aconteceu aqui? – Kendall pergunta, visivelmente chocada. – Foi um assalto? Sua casa está completamente revirada, e a porta estava escancarada.

Os olhares meu e de Isaac se cruzam, e parece que ele já compreendeu quem foi o responsável por toda a bagunça. Seu maxilar se contrai, e ele caminha determinado em direção ao meu closet.

— Eu sabia que aquele desgraçado uma hora ou outra te machucaria! – Ele grita de dentro do closet. – Não quero ouvir desculpas, vamos te levar para a casa da Kendall e depois iremos à polícia!

Os olhos de Kendall se arregalam, e ela se aproxima rapidamente de mim, seus braços envolvendo-me com proteção.

— Ele nunca mais vai encostar um dedo em você! – Sua voz soa chorosa, seus braços tremendo. – Vamos, vou te ajudar a chegar até o carro e depois iremos direto para a delegacia.

— Vocês estão loucos? Esqueceram quem é o Liam e a família dele? – Deixo escapar uma risada amarga, afastando-me do abraço de Kendall. – Vocês só podem estar malucos se acham que vou enfrentar um membro dos Fisher legalmente!

— Você não pode estar falando sério. Expulse esse monstro da sua casa e... – A voz de Kendall é interrompida pelo som do meu soluço.

— Ele tem tudo agora. A casa está em seu nome, todos os meus bens e a herança da minha família biológica. – Soluço ao levantar-me. – Não tenho mais nada, acabou!

Os olhos de Kendall ficam marejados, e o silêncio pesado preenche o quarto. Até mesmo Isaac parece atordoado.

— Vamos dar um jeito nisso. – Isaac sai do closet com duas grandes malas em mãos. – Você não está sozinha, somos sua família.
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