Parte 5

"A desconfiança é a mãe da segurança."

Mariana

Dores em meu corpo inteiro.

Tentei me mover com muita dificuldade e a dor que senti na cabeça me fez murmurar. Tentei abrir os olhos e so vejo borrões. Exigi o máximo da minha visão e tudo começou a tomar formas.

Estou em um quarto. As paredes são rosadas igualmente ao teto e estou em uma cama enorme de casal cheia de colchas finas e brancas. Alguns móveis bem delicados de cor clara tomam o resto do quarto. Mas aonde é que eu estou?

Me levantei e tentei abrir a porta desesperadamente, mas estava trancada e não sou tão forte assim para arrombar. Olhei ao redor e não vi nenhum sinal de vida ou de como posso sair daqui, havia apenas uma folha em cima da escrivaninha. Caminhei até ela hesitante e a peguei na mão.

  Querida Mariana, não fique assustada. Logo logo nós dois nos veremos e várias coisas serão passadas a limpo. Seu passado te espera.

Ass: Yekun

Analisei bem o pepel antes de amassa-o e joga-lo fora. O que está acontecendo?

Me lembrei do que aconteceu. Flashes invadiram minha cabeça e isso não pode ser real. O que eu vi não pode ser real. Mas o que explicaria o homem com asas negras em meu quarto?

Me sentei tentando achar alguma resposta, algum sinal que passou despercebido por mim, mas não me lembrei de nada.

Porque eu estou aqui? O que querem comigo?

Ouvi passos largos se aproximando da porta. Corri o mais rápido que pude para trás da cama com medo de poder ser aquele homem outra vez.

Primeiro um barulho de chaves balançando e depois o trinco girou. Me abaixei atrás da cama com o coração acelerado e com o corpo trêmulo, com medo do que me aguarda. Medo de ter aquele olhar frio e negro em mim outra vez.

- Apareça logo. Não tenho tempo pra joguinhos. Melhor você sair antes que eu te pegue.

A voz rouca e grossa me fez arrepiar de medo. Me levantei lentamente, temendo o que ele faria comigo se não o obedecesse. Pude ouvir até o barulho de meus dentes tremendo, e vi em minha frente o mesmo homem que estava em meu quarto e que me trouxe aqui.

- O... Onde eu estou? - Perguntei com a voz trêmula, apertando minha blusa com força tentando parar a tremedeira.

- Logo saberá, princesa. - Ele falou em um tom risonho, praticamente rindo do meu medo. Me ajeitei e tirei a expressão de assustada do meu rosto.

- Porque me trouxe aqui? Quem é você ou... O que é você...

Ele fechou a porta e ficou passeando pelo quarto, como se estivesse analisando a cor das paredes e dos móveis, uma coisa bem estranha. A porta estava destrancada, e me deu uma grande vontade de sair correndo.

- Meu nome é Samyaza - Falou caminhando até mim - Sou um anjo caído.

- Um o que? - Perguntei curiosa. Isso explica as asas, mas também explica a minha loucura.

Ele tapou minha boca com a mão direita e ficou em minha frente, com seus olhos cravados aos meus. Minha respiração acelerou. Ele me encarou e quando percebi, estava perdida em seus olhos. Uma grande escuridão tomou conta da minha vista.

- Não é um sonho meu amor - Ele maneou a cabeça para o lado - É a mais pura realidade. Pra você tudo é novo, mas depois se acostuma.

Ele me soltou e pude voltar a respiração normal. Minha visão ficou embaraçada oitra vez e aos poucos também voltava ao normal.

- O... Que são anjos... Caídos? E quem é Yekun?

Perguntei ainda atrás da cama. Ele tem um cabelo preto que vai até o ombro e está sem camisa, com a mesma calça de antes. Suas costas não tem nenhuma asa ou marcas, o que me fez acreditar que o que vi antes não era real, não podia ser real.

- Porque acha que vou te explicar alguma coisa? - Perguntou sarcástico.

- Se quisesse me matar ou algo do tipo, j-já teria feito. O que quer comigo?

Ele me olhou de cima a baixo surpreso e bateu palminhas. Suspirei, espantando a insegurança do meu corpo.

- Até que você não é tão burra - Ele disse sorrindo e voltando outra vez para minha frente. - Usam a expressão Anjos Caídos para os anjos que foram expulsos do paraíso, ou céu como vocês humanos chamam.

- Certo. - Disse revirando os olhos. - Vamos fingir que eu acreditei... E porque você foi expulso?

- Convenci os anjos de descerem à terra atrás dos melhores prazeres que existem no mundo. Principalmente as mulheres. - Disse se vangloriando - Ficar observando as belas mulheres de longe não era o suficiente para mim, logo, achei injusto que não pudéssemos satisfazer nossos desejos como os sortudos que vivem aqui na terra.

Engoli em seco. Ele deve estar fazendo alguma analogia á sua vida.

- Seja como for, não me arrependo, e nenhum dos outros se arrependem do que fizeram para ser expulsos também. Okey que eles não se arrependem porque quando viram caídos, suas personalidades mudam.

- E o que isso tudo tem a ver comigo? - Ignorei todo o papo.

Ele andou até mim com rapidez e se aproximou ainda mais. Seus olhos estavam outra vez fincados aos meus. Ele pegou em meus punhos e os apertou com força, não consegui segurar um gemido de dor.

- Você ainda acha que é mentira, minha linda Mariana? - Ele disse com um sorriso - Então observe atentamente.

Ele soltou os meus punhos e afastou um pouco, virando de costas. Relaxou os músculos e pude ver algo se mexendo dentro de suas costas, como se fossem ossos se movendo de um lugar para o outro. Uma cena agoniante. Logo um par de asas negras saiu de dentro das suas costas. Tapei minha boca para segurar o grito ao ver as asas negras ficando maiores tomando forma.

Ele se virou e sorriu ao me ver completamente horrorizada. Caí sentada na cama.

- Ai está. - Disse olhando para as asas. - Elas pegaram uma cor escura quando saí do céu, mas eu gostei assim. Me deixou mais sério, mais assustador...

- Não, não, não... Não pode ser real. Nada aqui é real - Começei a chorar de nervosismo - Quero acordar! Me tira daqui! ALGUÉM ME AJUDE!

Gritei sem saber o que fazer. Não pode ser real. Nada disso pode ser real.

- Você acha que sou seu amiguinho? - Ele perguntou e saiu do chão rapidamente, parando em minha frente e me fazendo ficar paralizada. - Se me derem a ordem de te matar, será feito sem pensar.

- O... Q... Que vocês q... querem comigo? - Perguntei trêmula.

- Você logo saberá - Disse parando em frente a porta e a abrindo, fazendo um gesto para que eu saísse do quarto.

No mesmo instante...

- Eu. Não. Consigo! - Falei nervoso.

- Tem que conseguir! Seus feitos na humanidade são históricos, você consegue fazer isso.

- Não consigo fazer nada quando estou nervoso, Miguel. Não dá simplesmente para rastrea-la no estado em que me encontro.

Bati em minha testa me reprimindo por não conseguir acha-la. Estamos no topo da torre Eiffel, tentando achar um jeito de encontrar Mariana. Miguel foi o primeiro a vir em minha mente quando começei a me desesperar ao ver o quarto vazio e vestígios dos A.C.

- Você deveria estar com sua protegida, Miguel. - Falei olhando pra ele, já frustrado - Não ocupe seu tempo aqui comigo, afinal, a culpa de te-la perdido foi toda minha.

- Você é meu amigo e minha protegida está bem. Temos que encontrar Mariana, sei o quanto ela é importante pra você. - Falou com a mão em meu ombro - Nós poderiamos pedir ajuda aos arcanjos...

- Não. Eles vão falar que ela pode ter sido sequestrada ou sumiu por algum acontecimento mundano e que eu não prestei atenção. Não vão querer ajudar.

- Você tem certeza que foram os A.C?

- Certeza absoluta. Eu sei que eles estão atrás dela, e sei disso há muito tempo, procurei respostas, mas não sei ainda o porque... - Falei me lembrando de alguns anos atrás quando o Anjo Rafael me alertou que há algo obscuro por trás de Mariana, isso me deixou bastante pensativo e apreensivo.

- Se concentre! - Miguel falou dando um tapa em minhas costas. - Feche seus olhos e respire direito.

Fechei meus olhos e respirei fundo, tentando localiza-la.

- Pense nela - Ouvi a voz de Miguel - Pense no desejo de ve-la.

Fiz o que mandou. Logo a imagem do rosto de Mariana tomou meus pensamentos. O rosto angelical e os olhos castanhos claros, junto com algumas sardas na bochecha que eu gosto de ver e seus lábios rosados e carnudos. Ver seu rosto em minha mente ja me deixa um pouco mais calmo.

Pensei no desejo de ve-la com todas as minhas forças. Cada centímetro do meu corpo ânsiava em encontra-la antes que acontecesse algo mais grave.

- Pense no quanto você se preocupa e no quanto se importa com ela. Mostre sentimentos. Deixe fluir de dentro para fora.

Ouvi sua voz como um sussurro em meu ouvido, eu já estava perdendo a consciência.

Pensei no quanto me importo, a ponto de ser descoberto por salva-la de algo que seja mundano. Não consigo ve-la passando por alguma dificuldade, o desejo de ajudar é maior que tudo.

Sentimentos?

Logo a imagem de Mariana apareceu outra vez em minha mente, quase como uma lembrança. Ela estava na frente do espelho arrumando o cabelo. Me aproximei e fiquei ao seu lado, observando-a contornar seus olhos com o lápis preto. Ela tinha apenas doze anos.

De repente ela olhou para algo específico no espelho, olhou em meus olhos, mesmo não me vendo. Ficou me encarando por um bom tempo e depois sorriu. A partir desse momento, eu senti. Senti que devia protege-la, senti carinho, amor fraterno, algo puro e especial... E até humaninade florescendo dentro de mim.

- Agora ache-a! - Outro sussurro.

Tudo o que eu estava imaginado ou lembrando, foi embora, e apenas um borrão branco apareceu.

Eu a vi.

Estava caminhando por um corredor com os olhos assustados e meio trêmula. Não reconheci o local, apenas vi o semblante de quem estava ao seu lado. Samyaza. Eu Sabia!

Mas como é que vou tira-la de lá?

É como se eu estivesse caminhando ao seu lado, só que não posso ser visto por ninguém.

"Mariana!"  tentei chamar sua atenção. Ela não ouviu, continuou seguindo Samyaza.

Peguei em seu pulso em um ato já desesperador. Ela olhou para o braço na mesma hora e se assustou. Parou de andar e ficou imóvel olhando para o braço, enquanto Samyaza perdia a paciência.

"Vamos garota, não tenho o dia todo"

Ele falou, puxando-a.

Meu sangue ferveu. Vê-lo tocando-a dessa forma me fez esquecer onde eu estava. Perdi os sentidos.

Ele a levou para uma sala com apenas uma cadeira que estava virada de costas, alguém estava sentado nela... Eu já posso imaginar quem seria.

Nervoso, peguei em seu braço outra vez, mas não soltei. Senti que dessa vez foi mais forte. Aproveitei e puxei-a para mim com força e ela se soltou dele.

A apertei em um abraço forte e desesperado, ouvindo alguém gritar enfurecido. Senti Mariana em meus braços e desejei com todas as minhas forças sair dali, ir embora e ficar na paz com ela, sem problemas e sem perigo. 

Logo, os barulhos cessaram.

Foi muito rápido.

Ainda sentia o abraço quente e confortável entre nós dois. Nenhum barulho ou grito, vento ou brisa. Meus olhos estavam quase doendo de tão apertados.

- Você conseguiu... - Ouvi a voz de Miguel, o que me fez abrir os olhos.

Estou na torre Eiffel, junto a Miguel que me olhava assustado.

Afrouxei o abraço sem acreditar que deu certo e encarei Mariana. Ela estava assustada, com a respiração cortada e o coração acelerado. Senti-o batendo contra meu peito, que descia e subia junto ao meu. Ela então percebeu o que estava acontecendo. Olhou para o lado e para o outro, por fim, levantou seu rosto em direção ao meu.

Seus olhos me fitaram assustados. Ao me ver, pareceu lembrar de alguém.

Esse momento não deveria estar acontecendo, mas estar junto dela me fez querer ficar assim eternamente.

- É vo...- Falou baixinho, com os olhos brilhantes. - É você.

Ela disse com a testa franzida. Seus olhos pareciam querer me dizer milhares de coisas.

Acariciei seu rosto e coloquei uma mecha de cabelo atrás da orelha. Abri um sorriso terno. Ela fechou os olhos sentindo meu toque, e a sensação anestésica que eu quis transmitir.

- Sim, - Observei-a adormecer lentamente em meus braços. - Sou eu sim.

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