A clínica de Andrea, minha psicóloga, localizava-se no Bairro do Varadouro, bem próximo ao Mercado Eufrásio Barbosa, onde eu pretendia dar uma passada após a sessão.
Pretendia relaxar um pouco e dar uma olhada no Museu do Mamulengo, que sempre me deixava num transe misto de sensações que iam da alegria ao ver os bonecos engraçadas, admiração pela inventividade das pessoas que produziam aqueles bonecos artesanalmente com escassez de recursos, e uma espécie de nostalgia por entrar num túnel do tempo que levava até mais de um século atrás.
Eu também pensava em comprar ítens para reabastecer minha dispensa, que pela rapidez da decomposição dos alimentos orgânicos, exigia preenchimentos frequentes.
Minha sessão começava às oito horas da manhã.
Resolvi aproveitar o sol mais frio desse hor&a
Eu estava na amurada da varanda da minha casa saboreando um chá de capim santo e uma tapioca de coco com queijo coalho.Havia escolhido aquele queijo a dedo um dia antes, na padaria do Seu Juquinha.Não me julgue por ainda frequentar aquela padaria que não tem café pronto de manhã cedo, mas é a mais perto da minha casa e onde eu moro é um centro histórico.O seu Juquinha era um dos poucos que não tratava os moradores locais como turistas e pegava leve nos preços.Depois de rejeitar três outras provas insípidas, fiquei feliz por sentir o sabor salgado na língua.Seu Juquinha soltou um suspiro de alívio "Até que enfim, Dona Maria" ignorei o irritante Dona Maria.Aquele nojento só me chamava assim, fazendo eu me sentir uma dona de casa de setenta anos.Com pequenos goles em meu chá, eu admirava a mandala em forma
Eu estava muito nervosa.Era meu primeiro encontro depois de um ano solteira!Quando recebi a mensagem com o convite para jantar fiquei relutante e demorei para responder.Mas as palavras de Manu reverberavam na minha mente.Eu já fui mais enérgica e cheia de vida.Nos últimos anos não estava vivendo por mim.Por prazer.Por isso eu disse que sim para esse encontro repentino.Embora, o tempo todo, eu lutasse para não dar meia volta e desaparecer.
Por mais que tentasse, não consegui conter as lágrimas ao sair da faculdade.Quanto mais tentava prender o choro, mais ele insistia em explodir carregado com mais uma crise existencial.O que estava fazendo lá?Até hoje não sei.Eu havia sido afastada do trabalho, mas na faculdade as aulas continuavam se acumulando e chegando num nível de complexidade que me dava uma sensação de perturbação e sufoco.Sentia-me como um caranguejo que tentava sair do fundo do mangue, mas não conseguia sequer ver a luz do sol escaldante do Recife.Encarar as aulas depois de te
Quem estava na minha casa?A criatura que eu menos iria querer encontrar!Olha que de criaturas eu entendo.Tanto desse quanto do outro mundo.Opa!Não posso falar muito mais do que isso, por enquanto, mas - spoilers a parte - eu tinha sido pega desprevenida.Justo no momento em que eu havia baixado a guarda...Um par de olhos que brilhavam como dois faróis naquela casa escura encaravam-me se aproximando com suas pupilas em formato de fenda.Um grunhido estranho, como o motor de alguma máquina mortífera, podia ser ouvido num tom cada vez mais alto, à medida em que aquele ser chegava mais perto.Sua respiração era fraca.Eu quase podia sentir cada inspiração e cada expiração.Sua boca exibia presas afiadas como agulhas.Suas garras...Sim...Garras pontiagudas podiam ser vistas a cada passo que a besta dava.
No dia seguinte eu estava sentada no meu sofá púrpura, sentindo o incômodo no meu pescoço causado pelo lenço para esconder o chupão deixado por Luiz.Veja bem, o Recife é muito quente, até mesmo nos períodos de inverno.Lenços, luvas, botas ou qualquer outro acessório para o frio não são bem vindos com o nosso clima.O calor é tanto que dá vontade de andar nu.Felizmente, aqui é quente, mas é úmido.E o que não falta é vento.Como é um arquipélago abaixo do nível do mar, &eac
O vento levantava os caracóis de cabelos sobre o meu rosto.O dia estava mais colorido.O céu azul sem nuvens e o sol brilhante.Recife, sempre quente como o inferno.Não é à toa que a gente chama carinhosamente nossa cidade de Hellcife.Ou talvez eu, simplesmente, estivesse mais perceptiva.E se eu estava mais perceptiva, isso certamente era por causa da meditação em minha vida.Justamente o contrário do que eu costumava pensar.Antes eu achava que fosse uma dessas
Minha cabeça estava explodindo!Massageando a cabeça, eu buscava algum alívio para a minha têmpora direita que palpitava de dor.Mas era inútil.Uma vez mais eu estava morta de cansaço, mas não conseguia pregar o olho para voltar a dormir.A claridade do dia entrava doendo pelos meus olhos apertados.O barulho da vizinhança invadia meus ouvidos.Meu corpo estava todo dolorido.Mas a cabeça...Eu só queria poder pegar aquela parte do meu cérebro que estava doendo e jogar para bem longe dali.Pior que, além da dor física em si, esses momentos geralmente acompanhavam memórias dolorosas também.A última vez que eu senti algo parecido foi no fatídico dia em que toquei fogo na empresa.No dia anterior, eu havia reprovado mais uma vez uma disciplina que me perseguia no curso de engenharia.P
Funguei o conteúdo em minhas mãos sentindo o cheiro de novo da encomenda que chegou naquela manhã.Tão bom...Folheei as páginas sentindo sua textura lisa em meus dedos.O Livro Completo da Meditação de Osho.Sorri em contemplação.Estava tão louca para ler que levei o livro comigo para o trabalho.Era impossível ler naquele inferno, mas pelo menos poderia sentir o cheirinho dele e curtir as energias que eu já estava sentindo fluir.Não que eu acreditasse que de uma coisa inanimada emanaria algum tipo de energia.Mas sabe aquela sensação quando uma encomenda chega?Pronto.Eu não só queria aproveitar, como eu realmente estava precisando me agarrar a esse tipo de vibração.Falando em vibração, eu mal conseguia curtir o cheiro do livro com o meu c