- O que se passa, Ryan? - perguntou o lobo branco com patas pretas.
Ryan era um lobo com pêlos da mesma cor que as folhas ficavam no outono, o que não o favorecia muito, pois uma pelagem avermelhada dava muito nas vistas numa paisagem coberta de neve. Mas até agora nunca tinha tido problemas com isso, apesar das dificuldades era um grande caçador. É claro que Kioushiro não podia gostar dele completamente, Ryan nunca tinha tratado Raika muito bem desde o dia em que se conheceram. E, desde então, Kioushiro decidiu não dar muitas confianças a Ryan.
- Farejamos um intruso no nosso território - explicou Ryan, ainda um pouco ofegante.
- O quê?! - rosnou Kioushiro - De manhã o Cinza disse-me que não tinham encontrado sinais de um intruso!
- Isso foi de manhã... - disse Ryan dando uns passos para trás - Farejamos agora mesmo... Eu vim avisar-te o mais rápido que consegui.
- Desculpa, Ryan... - suspirou Kioushiro - Não queria descontar em ti... Estou apenas cansado.
- É melhor ires dormir um pouco - aconselhou o lobo de pêlos avermelhados.
Kioushiro inclinou um pouco a cabeça em sinal de agradecimento e dirigiu-se para a sua toca.
- O que se passa, Mano? - perguntou Raika, vendo que o irmão estava com uma expressão pensativa.
- Nada para te preocupares, Maninha - disse Kioushiro, deitando-se perto da irmã.
- Então porque estás nesse estado? - insistiu Raika, dando uma lambidela na orelha do irmão.
- O Ryan disse-me que tinham farejado um desconhecido - disse Kioushiro, contendo um rosnado que se formava na sua garganta.
- Esse lobo podia estar apenas de passagem - disse a loba branca encostando o seu focinho ao do irmão, em sinal de carinho - Agora dorme um pouco.
Passado um bom bocado, Raika viu que a respiração do irmão já estava mais calma, o que significava que ele tinha finalmente adormecido. A loba branca pousou a sua cabeça em cima do pescoço de Kioushiro, onde também acabou por adormecer.
« Estava escuro, muito escuro. A única coisa que Raika conseguia ver era escuridão e isso assustava-a. Olhou á sua volta mas não havia nenhum sinal de vida, decidiu então caminhar. Mas, por mais que andasse parecia que não saia do sitio e que a escuridão não acabava, muito pelo contrário, ficava cada vez mais assustador. Estava tudo silencioso até que a loba branca ouviu um rugido de um urso muito perto de si.»
Raika acordou desesperada e com a respiração acelerada, olhou á sua volta até encarar com as grandes patas pretas do seu irmão.
- O que foi, Raika? - perguntou o lobo branco com patas pretas. A loba olhou para ele, o irmão parecia que tinha acordado muito antes dela, pois não parecia sonolento.
- Á quanto tempo estás acordado? - perguntou ela sentando-se, ainda um pouco assustada.
- Á um tempinho - respondeu Kioushiro, logo em seguida, olhou para a irmã - Ainda não me respondes-te.
Raika suspirou, sabia que tinha que dizer ou o irmão não a iria deixar em paz enquanto não contasse o que se passava.
- Eu... Tive um pesadelo... - explicou a loba branca.
- Sobre o quê? - perguntou Kioushiro.
- Bem, ao inicio estava tudo escuro... Mas depois - Raika fez uma pausa e baixou as orelhas, como se o som a assustasse só de se lembrar - Depois ouvi um urso...
Kioushiro prendeu a respiração e conteve a sua surpresa para não assustar ainda mais a irmã.
- Foi apenas um sonho, nada para dar muita importância - disse o lobo branco com patas pretas para tentar acalmar a irmã - Parece que ontem consegui ajudar o Cinza - falou Kioushiro dando uma lambidela na testa da irmã.
- Como assim? - perguntou Raika.
- Vi o Cinza e a Melody agora, quando te vinha acordar. Parece que eles se entenderam - disse Kioushiro sorrindo logo em seguida.
- O cupido Kioushiro! - brincou Raika, já de pé. O lobo branco com patas pretas mordeu a orelha da irmã na brincadeira e com cuidado para não a magoar, quando ela se conseguiu libertar, correu para fora da caverna com o irmão a persegui-la um pouco mais atrás. Raika estava tão divertida com a brincadeira que acabou por chocar com um lobo com pêlos castanho-avermelhados.
- Desculpa Ryan, estava distraída - disse Raika levantando-se. Sabia que não era a loba preferida de Ryan, desde que eram pequenos o lobo estava sempre a implicar com Raika por tudo e por nada. E agora em adultos não era muito diferente, apesar de raramente falarem um com o outro.
- Não faz mal - disse ele ainda deitado no chão.
- Estás bem, Maninha? - perguntou Kioushiro aproximando-se. Raika acenou positivamente com a cabeça e voltou a encarar o lobo com quem tinha chocado. Apesar dos seus conflitos, Raika até achava Ryan um lobo atraente, era alto e forte, mas mesmo sendo alto, Kioushiro conseguia ser ligeiramente maior. A loba branca nunca pensou em ter um companheiro, não era propriamente o estilo dela, ficar confiscada a uma vida já traçada, por enquanto só queria divertir-se e aproveitar a vida. E talvez também se devesse ao facto de ter um irmão ciumento e protetor.
- Kioushiro, precisamos que mais caça - informou Ryan.
- Podemos ir caçar - sugeriu Kioushiro olhando para a irmã.
- Por mim, tudo bem - respondeu a loba branca.
Os três lobos caminharam em silencio até à floresta. Estava tudo muito sossegado, nem o canto dos pássaros se ouvia, eles acharam estranho, mas não voltaram para trás e continuaram a andar pela floresta a dentro.
- Que estranho... - disse Kioushiro ao fim de um bocado, rodando as orelhas para os lados - Não estou a captar nenhum som.
- Que estranho... - disse Kioushiro ao fim de um bocado, rodando as orelhas para os lados - Não estou a captar nenhum som.Assim que ele acabou de falar, um esquilo passou por eles e subiu para uma árvore, parecia que estava a fugir de alguma coisa. Raika com movimentos ágeis, também saltou para a árvore e conseguiu apanhar o esquilo antes que ele entrasse para a sua toca, aterrando logo de seguida, na neve com ele na boca.- Boa, Maninha! - exclamou Kioushiro abanando a cauda orgulhoso e contente - Afinal as técnicas que te ensinei servem para alguma coisa.Raika remexeu as orelhas contente, largando o esquilo às patas do irmão, que logo cavou um buraco na neve, enterrando lá o animal.- Vimos buscá-lo mais tarde - disse Kioushiro.Eles andaram durante mais um pouco e, quanto mais fundo iam na floresta, mais silencioso ficava.- Isto está estranho...
- Está tudo bem, o urso já não está aqui - voltou a dizer o irmão, que agora olhava atentamente para os olhos de Raika. Estavam diferentes, o que antes era preenchido por um brilho de alegria, agora estavam tristes e perdidos. E Kioushiro sabia muito bem o motivo.- Eu... O urso... Não consegui... - a loba branca tentou explicar, mas ainda estava demasiado assustada para conseguir falar.- Tem calma, Maninha - disse o lobo branco com patas pretas, colocando a sua cabeça por cima da cabeça da irmã - Vem comigo.Kioushiro guiou a irmã de volta a casa, durante o caminho, Raika ia encostada ao irmão como se estivesse com medo de ser atacada a qualquer momento. Assim que chegaram ela correu para a caverna. O lobo branco sentou-se a observar, Raika nunca iria ultrapassar o seu medo de ursos, simplesmente tinha sido um choque muito grande para ser esquecido.Os seus pensam
- Não faz mal, Cinza - interrompeu-o Kioushiro - Apesar de tudo, Raika está bem e se depender de mim vai continuar a estar.Ouviram passos a aproximarem-se, os dois lobos viram-se e Ryan estava perto deles com um esquilo na boca.- Para que é o esquilo? - perguntou o lobo cinzento confuso.- Foi o esquilo que a Raika apanhou - começou a explicar - Vou levar-lho, talvez ela tenha fome.Kioushiro remexeu as orelhas incomodado. Ryan nunca se tinha importado com Raika, então porque o estava a fazer agora?- Não! - exclamou Kioushiro mais brusco do que pretendia, recebendo olhares confusos de Cinza e Ryan - Quer dizer... Eu levo.Kioushiro baixou-se e pegou no esquilo, dirigindo-se para a sua caverna.- Raika? Tens fome? - perguntou o lobo branco com patas pretas posando o esquilo perto da irmã - Este foi o esquilo de apanhas-te de manhã.- Obrigada - agradeceu a
- Ao que parece, sim - respondeu o lobo castanho claro. A loba branca curvou um pouco as orelhas face ao tom rude daquele lobo. « Quem é que ele pensa que é? Não está no território dele e ainda fala assim comigo... Tenho que o levar a conhecer o meu irmão...» pensou Raika.- Tens nome? - perguntou a loba branca também rude.- Carter.- Bem, Carter... Queres vir comigo? - perguntou Raika, destacando o nome do lobo.- Para onde? - perguntou o lobo castanho claro olhando nos olhos da loba branca. Raika sentiu um arrepio percorrer-lhe o corpo quando aconteceu essa troca de olhares, mas não deu muita importância.- Para a minha alcateia - disse ela. O lobo castanho acenou positivamente com a cabeça e Raika indicou-lhe o caminho. &nbs
- Kioushiro! - ouviu-se um uivo desesperado - Temos problemas!- Cinza? - disse Kioushiro olhando para o amigo, que estava com uma expressão aflita - Qual é o problema?- É a Melody... Ela está estranha - explicou o lobo cinzento.- Onde é que ela está? - perguntou Kioushiro mantendo a calma para não assustar ainda mais o amigo. Sabia que Cinza não estaria naquele estado se não fosse nada de grave.Cinza saiu e guiou os dois lobos para uma caverna pequena. Lá estava Ryan acompanhado de outros lobos machos. Kioushiro, Cinza e Raika aproximaram-se de Melody, que estava deitada numa cama de musgo improvisada. Ela parecia realmente estranha, arfava como se estivesse com dificuldade em respirar e tinha manchas esbranquiçadas nas patas e na barriga.- O que aconteceu? - perguntou Kioushiro baixando o focinho para tocar na loba creme. Raika estava logo atrás
- Devo avisar-te de que aquilo não é a cura, serve apenas para atrasar o desenvolvimento da doença - disse Carter. Antes que Kioushiro pudesse responder, Cinza aproximou-se todo contente aos saltinhos.- A Melody melhorou! - exclamou o lobo cinzento.- As ervas não são a cura, Cinza... - informou Kioushiro, olhando para Carter com ódio - Servem apenas para atrasar o desenvolvimento da doença.- Como assim?! Se não são a cura, elas ainda estão infetadas e podem morrer! - exclamou Cinza. O lobo branco com patas pretas voltou a encarar Carter.- Onde está a cura? - rosnou.- Na cidade - respondeu Carter.- Na cidade?! Isso é mentira! Kioushiro, não podes confiar nesse lobo solitário! - rosnou o lobo cinzento, mostrando os dentes para Carter.Kioushiro também pensava que aquilo poderia ser mentira, mas preferia correr o r
- Tens a certeza do que acabaste de dizer? - perguntou Cinza.- Não... - admitiu um lobo branco num suspiro, sabia que estava a pôr a irmã em risco se a levasse naquela viagem, mas também sabia que ela estaria mais calma se estivesse perto dele - Apenas não quero que ela sofra mais do que já sofreu... Eu não assisti à morte do nosso pai, mas sei que foi doloroso para ela - fez uma pausa e olhou para o céu - Logo depois a nossa mãe também morreu, de uma forma desconhecida para nós até hoje... Nessa altura eu já conseguia sobreviver por conta própria mas a minha irmã continuava uma cria indefesa e magoada pela morte dos pais... Ela precisava de mim, por isso cuidei dela com medo que ela se voltasse a magoar. E agora ela está doente e em risco de vida - Kioushiro terminou de falar e encarou o amigo com um olhar triste.- Sinto muito, Kioushir
- Raika? - chamou Kioushiro aproximando-se, olhou melhor e viu que as orelhas e a ponta da cauda eram pretas, por isso só podia ser a sua irmã - Raika? - voltou a chamá-la, mas a loba branca não se mexeu - Raika, fala comigo! - exclamou Kioushiro desesperado. Não podia ter chegado tarde para salvar a sua irmã.- Kioushiro? - suou a voz de Raika num sussurro - És tu?O lobo branco com patas pretas soltou um suspiro de alívio, baixou a cabeça e tentou encostá-la ao pêlo de Raika através das grades.- Aguenta Maninha, vou tirar-te daí...- Eu... Eu vi - disse Raika ofegante. Kioushiro sentiu o coração pesado quando viu que as patas e a barriga da irmã estavam cheias de manchas esbranquiçadas.- Quem? - perguntou ele.- O lobo que tem a cura... Ele está... Numa jaula no fundo do corredor... - explicou a loba