8-PERSONA NON GRATA

****LIARA ALMEIDA****

— Já está pronta, princesa. Aiiii… está tão linda! — beijo a bochecha de Chloe e cheiro seu pescocinho, fazendo ela rir.

Já faz uma semana que deixou o hospital e graças a Deus não teve nenhum dano permanente pelo efeito do excesso de medicação.

— Agora, como uma mocinha comportada que é, você vai ficar quietinha esperando a tia Líli trocar de roupa, tudo bem?

— Eu fico com ela.

— Ah! Não vi você aí. — Tomo um susto quando me deparo com Felipe escorado no batente da porta.

— Desculpe se a assustei. — ele dá passos para dentro do quarto — Vocês estavam tão entrosadas, não quis interromper.

O pai estende os braços para pegar a filha, mas eu continuo parada olhando para ele feito uma bocó. É sempre assim, basta Felipe chegar perto e fico besta.

Que raiva de mim por ainda permitir que esse homem me afete dessa maneira.

Felipe abaixa os braços, franze a testa e dá mais um passo a frente.

— Liara, está tudo bem?

— Dadadadada….

O olhar inquisidor dele e as balbucias de Chloe me tiram do transe.

— Ah, oi, sim.

— Você travou de repente?

— Ah, não… desculpe, eu… eu…

“Pensa rápido e fala direito, caramba.” — Xingo-me mentalmente por gaguejar.

Engulo em seco e respiro fundo, mas inspirar o aroma almiscarado do seu perfume não ajuda muito.

— É, eu tava repassando na minha cabeça se já tinha feito tudo que tinha para fazer antes de ir trocar de roupa pro jantar da Diana.

— Hum… então tá. — seu olhar desconfiado denuncia que ainda está decidindo se acredita em mim ou não — Vai lá, deixa que fico com a pequena.

Ao pegar Chloe do meu colo, mão dele resvala de leve na lateral do meu seio esquerdo e o toque, mesmo sendo breve e acidental, causa um reboliço nas minhas entranhas.

Felipe nem parece perceber, ele aconchega a filha em seus braços e abre o sorriso mais lindo que eu já vi.

— Cadê a princesinha do papai?

— Dadadad… — a banguelinha, parecendo compreender o quanto de amor seu pai tem por ela, responde com outro sorriso de derreter nossos corações.

Como se formigas estivessem me picando, saio quase correndo e vou para o meu quarto tomar banho. Entro, fecho a porta, apoio a testa na madeira fria e solto o ar que estava prendendo.

“Ele é seu chefe e é casado, Liara, pelo amor de Deus!”

Bom, tecnicamente não é. Além disso, ele e Britney estão dormindo em quartos separados.

Os dois tiveram outra briga feia na tarde em que Chloe voltou para casa. Fiquei com a menina no quarto, coloquei um desenho na TV para abafar o som da briga, mas ainda pude escutar quando Lipe disse que não tinha mais volta.

Como descarada que é, a megera impôs a condição de só mudar quando terminarem as reformas no apartamento dela e se ele insistir em mandar ela embora antes, fará de tudo pra ficar com a filha.

A jararaca vai usar a menina para manipular Felipe, não há dúvida.

Depois de um tempo refletindo, acalmo o meu coração e entro no banheiro para me preparar para o jantar de Diana. A irmã de Felipe e eu nos tornamos amigas desde o primeiro instante em que começamos a conversar, ela é um amor de pessoa.

Filha do segundo casamento do pai de Felipe, Diana nasceu e cresceu nos Estados Unidos, por isso eu não a conhecia.

Minha mais nova BBF é o oposto de Britney, sempre alegre e gentil, tem me ajudado com tudo, inclusive a resolver minhas pendengas no Brasil. Graças a ela comprei um celular novo e agora posso falar com a minha mãezinha quase todos os dias.

Felipe e a irmã são muito próximos, tanto que ela comprou um apartamento nesse mesmo prédio, apenas dois andares abaixo.

Hoje ela está oferecendo um jantar de inauguração e também vai apresentar o noivo, que eu só vi em fotos. O cara vai se mudar pra cá também, os dois pretendem morar juntos.

Minutos passados, saio do banho, seco e arrumo o cabelo, faço maquiagem e verifico as opções de vestido.

Acabo optando por um vermelho, presente da minha mais nova amiga. A peça tem mangas compridas, mas o comprimento vai até a metade das cochas.

Pronta, vou para a sala encontrar Felipe e a nossa princesa.

“Nossa princesa? Sério Liara? Ponha-se no seu lugar, mulher” — ralho com meus pensamentos.

Quando entro, o homem arregala os olhos, certamente porque está acostumado a me ver de jeans, camiseta, jaquetinhas ou suéteres.

— Estou apresentável?

— Apresentável?

— Sim, você está me olhando de um jeito esquisito, me fez duvidar se estou bem para a ocasião.

Provoco dando uma voltinha. Ele pisca diversas vezes e engole em seco.

— Você não está apresentável, está linda! Não é filha? Diz pra ela… — ele faz uma voz engraçada, imitando criança — Você está deslumbrante dia, Líli!

Felipe desvia o olhar do meu e esfrega o nariz na bochecha da filha para disfarçar o quanto ficou impactado com meu novo visual.

Perceber que consigo mexer com ele de alguma forma só torna mais complicado ignorar o quanto esse homem me afeta.

Há anos venho convencendo a mim mesma de que meus sentimentos por Felipe não passavam de fantasia infantil, um sonho adolescente. No entanto, desde que nos reencontramos, não estou sabendo lidar com esse turbilhão de sensações que sua presença desperta em mim.

— Estão todos prontos? — a voz enjoada de Britney me arranca dos meus devaneios.

A megera escaneia meu corpo e faz uma cara de entojo.

— Não acha que está muito arrumada para uma babá?

Felipe abre a boca para responder, mas eu estico a mão num pedido silencioso pra que pare, o que faz de imediato.

— Pode deixar Lipe, eu mesmo respondo.

Empino o queixo e encaro a tiranossaura de frente.

— Em primeiro lugar, não se julga as pessoas pelas roupas que elas usam, Britney. Em segundo lugar, de forma alguma eu estou muito arrumada para esta noite. E sabe por quê? — dou um passo intimidante na direção dela e a encaro com as mãos na cintura — Estou indo nesse jantar como convidada, é a casa da minha amiga e Lipe acabou de afirmar que esta roupa está mais do que apropriada.

Vejo Lipe suprimir um sorriso, seu olhar está cheio de admiração, enquanto a mulher só falta espumar pela boca e eu me sinto plena.

— E por fim, não sei onde você pensa que vai. Que eu saiba, não recebeu convite.

— Está vendo, Lipe? Essa garota é uma abusada. — ela reclama chorosa — Dê asas a cobras e elas te picarão.

— Britney! — ele dá a ela um olhar de advertência, a bruaca faz bico e segue a espichar o assunto.

— Além disso, não estou julgando. Apenas acho que dão muita liberdade para uma simples babá.

Indignado por mais um comentário tosto da mãe de sua filha, Lipe suspira impaciente.

— Liara não é uma simples babá, como você diz. — ele fala sem subir o tom de voz — Ela pode estar aqui prestando um serviço, mas acima de tudo, é uma amiga da família. Exijo que a trate com respeito.

Meu coração erra uma batida e me sinto emocionada pelas palavras dele. Sendo assim, a fim de evitar uma nova briga na frente de Chloe, interrompo a conversa.

— Podemos ir? — pergunto já pegando minha bolsa e a bolsa da bebê. — Quer que eu leve a Chloe?

Me dirijo ao homem que ainda está de cara amarrada, mas que ao olhar para a filha, desfaz o cenho franzido e seu rosto se ilumina.

— Não, eu levo o meu pinguinho de gente.

Como se entendesse tudo, a pequenina abre um sorriso lindo e contagiante, faz até a gente esquecer a mãe inconveniente que ela tem.

Saio na frente e vou chamando o elevador. Felipe demora a sair, ele fala baixo, mas ouço quando questiona a jararaca.

— Sério, não vejo motivo para você ir, Britney. Nosso relacionamento acabou e, além disso, você e Diana não são a pessoa favorita uma da outra.

— Eu vou, sou a mãe da sua filha, ainda moro aqui e para todos os efeitos, permanecemos casados.

— Nós nunca fomos casados. — o timbre de voz dele soa bem irritado e eu só queria ver a cara da demônia.

Escuto a batida do salto fino no porcelanato, sei que ela está vindo com aquela cara azeda.

Enquanto o elevador desce os andares que nos separam do apartamento de Diana, penso que pela segunda vez Felipe afirmou não estarem mais juntos e mentalmente solto fogos. Não que eu tenha esperança que ele me veja além de amiga e funcionária, mas fico feliz pela menina Chloe, ela merece viver em um ambiente menos hostil

."Ah, Deus! A quem eu quero enganar?"

Descemos no andar correspondente, pelo barulho que vem de dentro do apartamento, somos os últimos a chegar.

Não demora nada e Diana abre a porta sorridente.

— Sejam bem-vindos à minha humilde residência! — minha amiga fala quando abre a porta

No entanto, o sorriso dela morre quando se depara com Britney agarrada ao braço de Felipe, fingindo ser a família perfeito.

Nãna Nascimento

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