Trento
Eu pensei que finalmente eu ficaria em paz. E eu fiquei, por um tempo, mas tudo voltou.
Estou tentando engolir o desejum que eu pensei que não fosse senti-lo tão amargo nunca mais.
— Querido, não entendo! Encontrou o seu filho, realizou a missão da sua vida! O que lhe tormenta agora? — Diane lamenta passando as mãos em minhas costas.
— Creio eu que eu já me acostumei com a dor, agora a dor não quer sair de mim. Maldição! — Levanto-me da cadeira completamente perturbado.
— Entendo, sinto muito. — Vejo a pena estampada na face de Diane. A pena sempre esteve ali ou é só agora que eu consigo perceber? Eu estive tão ocupado na procura pelo meu filho esses anos todos que nunca parei pra pensar se eu gosto disso. Contudo, me fez bem.
Eu sempre faço isso, sempre tento encontrar problemas em minha união com a Diane, e sempre chego à conclusão de que se não fosse por ela e pelo amor ou pena que ela sente por mim, tudo seria bem mais
Lívia— Francamente, Lívia! Como você pode ter tão pouca consideração por tudo o que o seu pai faz e já fez para proteger você? — Minha mãe está muito zangada.Quando Vicent e eu começamos adentrar na estrada que nos trouxe ao castelo, já começamos a observar o tumulto de soldados e pessoas agitadas à nossa procura. Eu sabia que haveria um certo alvoroço da parte de meu pai, contudo, nunca imaginei que se estenderia até a cidade toda.— Mãe, eu estava com o meu noivo. Não vejo motivos para essa tempestade toda. — Respondo retirando as minhas vestes com uma certa dificuldade.— Vocês ainda não estão noivos! Sabe o quanto o seu pai ficou nervoso? Você quase matou o seu pai, Lívia!— Por favor, mãe! Eu já vivi presa por muito tempo, eu apenas fui até a praia com o meu noivo. Não vejo nada demais nisso. Podemos parar de falar nesse assunto?Minha mãe faz gestos negativos com a cabeça, me encarando com olhos acusadores.
TrentoÉ claro que eu mudei de ideia. Não vou me suicidar, por enquanto. Porém, não terei coragem de enfrentar a sepultura da Hadassa depois do que eu farei hoje.— Algo o incomoda? — Willian está sentado de frente para mim, estamos ambos viajando na carruagem real rumo ao calabouço da ponte Trinphendom. Esteve desativado por séculos, e agora é moradia exclusiva da Daisi.— Tudo me incomoda... A minha respiração me incomoda. — Soei mais dramático do que eu gostaria, mas é a minha amarga realidade.Fico observando os olhos irônicos de Willian sob mim. Eu gostaria tanto de abraçá-lo, sentir o cheiro dele, sentir a pele do rosto dele tocar o meu rosto.Esse olhar irônico e debochado não está ali à toa... Ele também está sofrendo. Eu sei, eu conheço essas armaduras. Foi eu quem as inventei, na juventude. Eu me lembro muito bem de eu ter as atitudes ainda piores que as de Willian.— Eu sei como é, também me incomodo.— Minha respiração
VicentEstar aqui é mil vezes mais tenebroso do que eu imaginei. A vontade de sair correndo igual um garotinho é enorme.Todas as vezes que eu me senti diferente, me senti sozinho... Todas as vezes que eu chorei escondido quando criança, pois se meus pais me vissem chorar eu iria pro castigo. Eu engoli o mau trato, a falta de atenção e carinho que um menininho precisa pra crescer com o mínimo de conforto mental, engoli tudo e deixei escondido. Cresci frio e calculista, pensando apenas no meu benefício e em ser mais reconhecido pelos meus pais. Eu queria ser amado por eles e por isso eu lhes dava tudo o que eu roubava. Sir Filipe tem razão... Eu não roubei a riqueza das pessoas com a intenção de deixá-los pobres e sim com a intenção de deixá-los tristes, alegrando-me com o fato de que eu lhes fazia isso.— Me responda uma coisa, rei, só uma coisa. — Digo sentindo o peso desses sentimentos horríveis.— Sim? O que é?<
Trento— Diga logo as suas loucuras, Daisi. — Esfrego as mãos lentamente uma na outra, em expectativa do que ela irá dizer.Daisi me olha com um olhar sofredor, carregado de acusações.— Você sabe as condições em que eu vivi todos esses anos? — Pergunta.— Melhores do que eu planejei, visto como não mudou e nem se arrepende de nada. — Respondo ríspido.Eu achei que ela estivesse sofrendo e pagando pelos pecados, mas, pelo visto, não sofreu o suficiente.— Sabe o que me ajudou a aguentar e manter a minha sanidade?— A sua loucura, talvez?— Talvez você esteja certo, talvez eu realmente sou louca, mas, de qualquer forma, eu sempre tive uma carta na manga.— Do que você está falando? Fale de uma vez! O que você quis dizer quando disse que ela está viva?— Você parece bem interessado no que eu tenho à dizer... Eu deveria propor algumas exigências, não acha?— Daisi, eu
VicentNão passou de uma palhaçada.Não sei como o rei Trento tem coragem de se intitular rei com toda essa covardia em baixo da coroa. Eu não deveria ter vindo aqui. Já estou há mais de uma hora aguardando o que for que estiver acontecendo.Será que o Trento realmente sofre com tudo o que aconteceu? Será que ele não está aqui para matar a saudade da amante?- Alteza, o rei ordenou que eu lhe escoltasse de volta à Hasgueit. - Um guarda, reconheço-o, ele nos acompanhou em nossa viagem.- E onde está o rei? Ele não virá? - Pergunto encarando-o sem entender, procurando pelo rei com os olhos.- O rei seguirá outro rumo, alteza, apareceu um assunto de suma importância e que não poderia ser adiado. O rei teve que partir. Por favor, permita-me lhe acompanhar de volta à Hasgueit.- Onde está a prisioneira? Onde está a Daisi? - Encaro-o, sentindo-me muito confuso.- E-eu não s-sei, alteza. — Está estampado na face deste soldado que ele es
LíviaEu não fazia ideia do quão impulsiva eu poderia ser. Sim, já fiz algumas coisas na força do momento, mas, isso? Não. Eu jamais imaginei que poderia ser capaz de invadir os aposentos de um homem... E o pior: um homem que mexe exageradamente com a minha alma.— Espero que você não cause problemas, já está tudo acertado. Partiremos para Kahabe ao amanhecer. — Meu pai diz enquanto caminha até a saída do meu quarto.Ele veio se certificar de que eu estou aqui. Por minutos ele não encontrou o quarto vazio.— Pai, por favor. Estou com dores de cabeça. — Reclamo com os olhos fechados.— Certo, tenho certeza de que você me ouviu. — Diz antes de fechar a porta e sair."... — Pra mim, aquele momento foi uma benção.— Pois foi naquele momento que tudo começou a dar errado em minha vida... Então, me perdoe por não compartilhar de sua opinião.— Não, você está errado. Você não queria estar me dizendo i
No dia anterior à partida de LíviaTrento- Partiremos imediatamente. Leve-me até Hadassa, como você disse que faria.- Não antes de você escrever uma carta e carimbar com o seu selo. Eu preciso de segurança quanto ao meu futuro.- Você terá tudo o que quiser, contanto que me entregue a Hadassa.Eu sei. Eu finalmente enlouqueci. Para estar prestes a sair em viagem na companhia de Daisi, ao encontro de minha falecida rainha, eu realmente devo estar louco.Acho que me acostumei com a idéia de estar sempre à procura de alguém: há décadas atrás eu procurei desesperadamente por Hadassa, por décadas eu procurei pelo meu filho... Acho que eu me senti perdido sem ter por quem procurar. E aqui estou eu, indo à procura de Hadassa.Maldição!Seria possível?Eu não planejo envolver o Willian nessa busca. Sairei escondido. Ele não precisa sofrer mais com essa história
⚠️Cenas de violência e tortura⚠️ cenas de violência sexual⚠️Vinte e seis anos antes...HadassaAbro os olhos, porém uma escuridão abafada me impede de ver onde estou. Nunca estive em um lugar tão escuro desse jeito. Torno a fechar os olhos, estilhaços de lembranças: a festa em homenagem à mim, estávamos muito felizes, apesar de eu estar angustiada pelo meu filho, me vejo sendo atacada por uma flecha e então tudo se torna mais lento... Não consigo focar a consciência, só sinto a dor aguda e o medo de morrer... Morrer sem contar ao Trento o meu mais tenebroso segredo, deixando o meu filho perdido para sempre. Entretanto, agora me lembro que eu consegui contar à ele. Revelei ao amor da minha vida que temos um filho perdido por este mundo, contei em um momento de desespero e dor, e foi um alívio. De repente eu fechei os olhos e então tudo escureceu. Foi uma sensação boa, eu estava fugindo dessa realidade assustadora que me prometia muita do