Maeve
A cabeça doía, meus olhos estavam pesados, mas imagens confusas se formavam em minha frente. Não reconheci o lugar. O teto não era simples como o da minha casa, era alto e decorado. Cortinas pesadas de um azul intenso pendiam das janelas cobrindo parte da claridade que vinha fora. O dia estava claro, podia ver através da fenda entre as cortinas.
O cheiro do quarto também era diferente, tinha um cheiro que minha mente lutava para reconhecer, mas não conseguia me lembrar onde e quando senti aquele aroma. Era como madeira molhada e flores silvestres. De alguma forma ele me trazia conforto e uma sensação boa.
A cama onde eu estava era muito confortável, não que a minha não fosse, mas aquela era quase como estar flutuando. Arrastei minhas mãos sobre o tecido macio sem me lembrar bem do que havia acontecido e como tinha ido parar naquele lugar. Meus dedos esbarram em algo e viro meu rosto lentamente para ver o que era, na verdade, quem era.
Fiquei admirada quando percebi que havia um homem com os braços sobre a cama e sua cabeça apoiada sobre eles. Sua pele era morena, um de seus braços fortes estava enfeixado, o cabelo escuro dele e o corpo grande e forte me fizeram lembrar do que acontecera no bosque.
Aquela empregada havia tentado me matar e ele salvara a minha vida. Se ferira no processo e agora está aqui, adormecido ao meu lado na cama como se tivesse vigiado meu sono durante a noite. Isso é um milagre. Sean havia salvado a minha vida e agora estava ao meu lado adormecido, ainda não conseguia acreditar.
Foi impossível conter o sentimento que aqueceu meu coração ao me lembrar do que acontecera, mas eu precisava me lembrar que esse homem me ignorou por quatro anos e assim que eu me recuperar fará o mesmo. Tornará a me ignorar e se eu alimentar qualquer sentimento que seja, meu coração se partirá em pedaços.
Meus dedos acariciam a pele dele, sentindo os músculos de seus braços fortes. Aquele homem é meu marido, eu não deveria ter medo de tocá-lo nem receio, mas é isso o que sinto. Recolho a mão no momento em que ele levanta o rosto de seu braço.
Sean leva as mãos ao seu rosto e ergue o corpo, mostrando a mim a camisa de linho aberta expondo seu peito e abdome definidos. Ele estava sentado em uma poltrona, somente seu tronco estivera apoiado na cama, ele não dividira a cama comigo. Por algum motivo isso fez meu coração doer. E mais um detalhe veio em minha mente: estava no quarto dele, na cama dele, e o cheiro que senti no quarto é o mesmo que senti quando ele me pegou no colo. O cheiro dele.
Encaro-o enquanto ele desperta e esfrega o rosto. Seus olhos escuros me fitam, percebendo que eu havia acordado e o encarava.
— Oi – cumprimento com a voz rouca e baixa.
— Oi – ele fala ainda me encarando – Como está? – Questiona sem muita empolgação por ver que despertei.
Tento me sentar, mas uma dor aguda faz com que eu volte meu corpo na posição inicial e relaxada.
— Um pouco dolorida – respondo depois de alguns segundos, tempo necessário para que as dores me deixassem em paz.
— Descanse – Ele se põe de pé e seus dedos trabalham nos botões da camisa, fechando-a.
Não sei o que está acontecendo comigo, mas mesmo com todo esse desprezo da parte do rei, eu queria que ele olhasse para mim sem essa frieza; queria que ele não fechasse a camisa para esconder seu corpo de mim; queria que ele tivesse dividido a cama comigo esta noite e dividisse nas noites seguintes.
— O médico virá em breve para examiná-la – continuou a falar.
— Sean – chamei-o. O rei se virou na minha direção me observando. – Obrigada. – Agradeci.
— Não foi nada – Ele pegou sua capa vermelha e colocou-a sobre os ombros, preparando-se para deixar o quarto.
Fiquei confusa. O homem passa a noite encurvado na cama, sentado em uma poltrona e quando desperto mal fala comigo. Tive a esperança que a tentativa de assassinato tivesse feito Sean mudar de ideia, tentar se aproximar de mim, mas vejo que o fato de ele ter salvado a minha vida foi realmente um milagre. Decido fazer um pedido a ele, já que esse homem não me quer como mulher.
— Sean – chamo-o novamente e vejo seu olhar irritado na minha direção. – Deixe-me viver livre em qualquer lugar do reino, por favor.
— Por que está pedindo isso?
— Porque sinto que estou sendo punida por algo que não fiz. Não tenho culpa das atitudes de meu pai. Me sinto sozinha naquela casa, você nunca tentou uma aproximação... – desvio meu olhar do dele, mas não me acovardo e concluo meu pedido. – Não aguento mais viver dessa forma.
— Não – Sua resposta é dura e sinto a negação reverberar dentro de mim.
— Vai me manter por quanto tempo assim? Isolada em uma casa onde você pode me monitorar vinte e quatro horas por dia e esfregar na minha cara as mulheres que traz pra sua cama?
A face de Sean se contorceu, mas ele não me respondeu mais nada, deixando claro sua palavra final. Ele não me libertaria daquele martírio. Se o que ele queria era me punir pelas maldades de meu pai, ele estava conseguindo.
***
Sean
Deveria ter passado a noite em uma casa de prazer qualquer, nos braços quentes de uma mulher, mas não, passei a noite ao lado de Maeve. Não queria parecer desrespeitoso, apesar de ser seu marido, mas como nunca tivemos qualquer intimidade, não achei apropriado dividirmos a cama.
Aida me aconselhou a me aproximar de minha esposa, conquistar seu amor, mas não será fácil. Como ela disse, a moça parece ser carente de amor, mas é justamente esse tipo de comportamento nela que me irrita. Mas não posso negar que seu pedido me deixou surpreso. Justamente quando estou disposto a tentar uma aproximação, mesmo que não seja pelos motivos certos, ela pede para se afastar. Ela não quer mais viver nas dependências do castelo, quer ser livre e isso me incomodou mais do que eu poderia imaginar.
Nego veementemente, muito irritado por vários motivos. Deixo o quarto no momento que vejo uma lágrima escorrer pelos olhos de Maeve, batendo a porta com força. Agora tenho algo importante a fazer: ter uma conversinha com a empregada que tentou matar Maeve.
— Aonde vai com tanta pressa, Sean? – Ouço a voz de Aida atrás de mim, encaro-a com meu mau-humor totalmente explícito em meu rosto.
— Onde você acha? Na prisão – falo, mas continuo a andar.
— Pelo jeito a noite não foi boa – comentou com um sorrisinho idiota no rosto e eu senti vontade de esganá-la ali mesmo.
— Como poderia passar uma noite boa sentado em uma poltrona, sem posição confortável para dormir?
As pessoas que passavam por nós nem nos cumprimentavam, já podiam identificar em meu rosto que eu não estava em um dia bom, e sábias como eram, fingiam que não viam e seguiam com seus afazeres.
Os corredores iam ficando mais estreitos conforme descia os andares do castelo.
— Tem certeza que todo esse mau-humor é devido a uma noite mal dormida na poltrona? Parece que há algo mais.
— Ela pediu para ir embora.
— Como? – A incredulidade tomou a face da maga. – Ela quer voltar para aquele reino de horrores?
— Não. Ela quer que eu a liberte, que a deixe viver em qualquer lugar do reino, mas longe de mim.
— Não consegue imaginar o motivo desse pedido, Sean?
— Não, só consigo ver que justamente quando decido me aproximar, ela quer se afastar.
— Mas esse é o melhor momento para você se aproximar. Ela está mostrando a você o que quer, e não é se afastar.
Encaro-a confuso. Essa maga deve ter tomado um barril de vinho na noite anterior e todo o álcool ainda não deixou seu corpo.
— Se você me explicar, agradeço.
— Ela está se apaixonando por você e não suporta seu desprezo, dê a ela o que quer e em breve terá o amor de Maeve.
Decido não responder, pois acabamos de chegar na prisão onde a empregada que tentou matar Maeve esta presa. Peço a um guarda que abra a porta do cubículo onde ela se encontra.
Entro com Aida atrás de mim e encaro a mulher encolhida. A cela fria fazia meus pelos arrepiarem, podia imaginar o que a mulher havia passado naquele lugar durante a noite, mas era um bom castigo enquanto estava presa neste lugar.
— Acho bom começar a falar o que aconteceu naquele lugar.
Falo e meu tom não é nada agradável, vejo que ela se encolhe ainda mais.
— Não sei do que está falando, majestade.
A garota responde levantando seus olhos acinzentados na minha direção.
— Impossível não saber sobre o ataque à minha esposa no bosque do castelo. – A maga se posiciona ao meu lado de braços cruzados, encarando a empregada. – É melhor começar a falar, antes que eu perca a paciência e faça uso de métodos nada agradáveis para tirar de você tudo que eu quiser saber.
A empregada se senta e coloca as mãos entre as saias, retorcendo-as de maneira nervosa, mas balança a cabeça de forma afirmativa.
— O que o senhor deseja saber, majestade?
Sean Eu encarava a empregada que me observava com seus olhos acinzentados. A mulher não parecia nervosa, mas sim determinada e nada arrependida do que fizera. Isso só despertava mais raiva em mim.— Quero saber quem foi o mandante do crime. - Exigi.A empregada deixou de me encarar e voltou a contorcer as mãos no tecido de suas saias.— Não houve mandante, majestade - respondeu a jovem, deixando-me incrédulo, pois com essa resposta ela praticamente confessara o crime.— O que quer dizer com isso? - questionei.— Majestade, meu pai e meu marido foram mortos pelo pai dela. - Pude ver ódio brilhar nos olhos da garota enquanto desviava o olhar para as paredes de pedra úmida. - Seu sogro atacou nosso reino naquela guerra idiota, sem nenhum motivo que não fosse a ganância, a vontade de ampliar um reino que já era grande e poderoso.A maga suspirou, chamando minha atenção. É claro que havia muitas pessoas no reino que alimentavam seu ódio pelo rei Leon, mas tentar descontar esse ódio sobre
SeanEstava me xingando de todos os nomes internamente, minhas atitudes durante todo esse tempo custaram a Maeve um desprezo por parte dos empregados do castelo e de outros súditos do reino. Desejava me vingar do rei Leon, matando sua filha, mas as palavras de Aida faziam sentido não só para a empregada que mandei executar como para mim. O pai da moça não se importaria com sua morte, tudo o que ele quer é poder.Caminhei pensativo desde as escadas até meus aposentos, onde Maeve repousava. Estava sendo cruel com a jovem, e no entanto, a pessoa na qual deveria punir e me vingar era o pai de minha esposa.Decidido a tratar melhor minha mulher daquele momento em diante, abro as portas de meus aposentos e vejo uma cena que, não sei dizer o motivo, mas faz meu coração doer: meu amigo, o homem mais fiel a mim, e minha esposa que se diz doente, abraçados em uma cama bagunçada, cheia de coisas espalhadas sobre ela.— O que está acontecendo aqui?Os dois se espantam e me encaram assustados.— S
MaeveEram tantos livros, tantas coisas que eu nem sabia o que fazer primeiro. Nem mesmo em meu reino de origem tinha tantas coisas para me distrair nos últimos anos.Como eu estava muito pálida, decidi começar pela maquiagem. Consegui sentar em uma posição um pouco melhor para me maquiar com um pouco de dificuldade, posicionei o espelho escorado em minhas pernas que estavam cobertas pelos lençóis macios e abri a caixa com maquiagem. Tinha tanta coisa que muitas delas eu precisaria de ajuda para usar, pois nem sabia do que se tratava. Talvez Aida posso me ajudar.Uso o que sei usar. Peguei uma esponja com um pó claro e passei em meu rosto, depois uma esponja menor com um pó rosa claro. Este último somente nas maçãs do rosto. Sorri diante a minha imagem no espelho, já estava com um aspecto mais saudável. Por último, peguei um bastão com uma cor rosa mais viva e passei nos lábios. Agora sim, parecia uma mulher saudável e não um defunto.A posição não estava muito confortável, então com
Sean Ao chegar no quarto e encontrar Maeve maquiada, me senti instantaneamente atraído por ela. Ela era uma mulher bonita, mas ainda não havia observado seus traços delicados. A maquiagem com certeza contribuiu para que eu prestasse atenção nos detalhes. Mas essa atração acabou me deixando um pouco mais irritado, pois aquela era a filha do homem que matou meu pai. Eu deveria fazê-la sofrer; queria que o pai dela sofresse. Não era o plano admirar a beleza da moça. É claro que me recompus, mas a conversa acabou tomando caminhos que eu não desejava e ver a maneira como ela falava comigo, sem temor ou respeito, fez um instinto primitivo brotar. Como rei, preciso manter todos com um certo temor do que represento. Porém tudo saiu do controle quando a pressionei contra a cama com meu corpo. Ver seus olhos arregalados e a boca entreaberta de Maeve que parecia sugar toda minha sanidade, me fez ser duro com ela, ainda mais do que eu pretendia, mas as lágrimas que brotaram em seguida e todas as
SeanAo chegar na sala de reuniões do castelo, percebo que fiz bem em me aprontar com toda pompa de rei. Estes nobres se acham mais do que deveriam se achar apenas por serem mais velhos do que eu. Me chamam de incompetente pelas costas que eu sei. Então, nada melhor que lembrá-los quem eu sou de verdade.Os homens me observam com a coroa de meu pai na cabeça e se curvam imediatamente, o manto vermelho pende de meu ombro e o cinto grosso com uma fivela portando o símbolo de nosso reino se destaca em minha cintura.Caminho até meu lugar na cabeceira da mesa e ordeno que todos se sentem, somente depois de todos acomodados que eu me sento. Retiro a coroa e a coloco sobre a mesa. Inicio a reunião que sei muito bem qual será o tema dela. A maga se senta ao meu lado, me dando o apoio que preciso.— Vocês exigiram uma reunião e aqui estou. O que queriam tanto falar com o rei de vocês?— Majestade, peço licença para falar por todos que estão comigo nesta mesa. - O duque pede a palavra, ele é o
MaeveFaz uma semana desde a nossa briga, e Sean tem me visitado com mais frequência. Tem se mostrado preocupado, pedindo para ver alguns dos ferimentos e perguntando com frequência como eu me sentia. Confesso que essa atenção está amolecendo meu coração, ele parece estar se esforçando para se aproximar de mim.Para a minha surpresa, Sean conseguiu o animal de estimação que pedi. A maga trouxe no dia seguinte um lindo filhote de tigre branco. Meus olhos se arregalaram ao ver o animal, pois eu não imaginava que Sean iria conseguir um tigre para mim e agora eu me preocupava com o que eu faria quando esse animal ficasse adulto. Mas a maga me entregou uma coleira e me deu a instrução de que meu bichinho deveria sempre usa-la, mesmo agora que ele era apenas um bebê, para que se acostumasse.Peguei a bolinha de pelos brancos e o aninhei em meu colo. A coleira continha um feitiço que o deixaria sempre calmo e que não estranharia seus donos, mas quanto a estranhos tentando fazer algo contra n
SeanTive uma possível noite agradável ao lado de Maeve interrompida devido a uma guerra que está novamente nos ameaçando. Ontem a noite deveria ter dado nosso primeiro beijo e dormir ao lado de minha esposa, sei que ela está gostando da aproximação. Aida acertou quando disse que era o momento certo de me aproximar dela. E eu também não posso negar que estou começando a gostar de estar perto de minha mulher.Mas em vez de passar a noite ao lado de minha esposa, demonstrando preocupação e construindo uma relação mais íntima com Maeve, tive que virar a madrugada estudando estratégias de guerra com os soldados.O rei Leon havia passado os quatro anos em silêncio, provavelmente esperando que sua filha fizesse seu trabalho sujo, mas como ela não fez, ele resolveu agir.Quatro anos de paz foi tudo o que tivemos com seu “acordo de paz”. Agora, Leon estava concentrando seu exército ao redor do meu reino, preparando-se para atacar. Resta a mim somente fazer o melhor por meu reino.Depois de ho
MaeveOs dias passam e fico sabendo que a guerra está a cada dia mais intensa, me preocupo com Sean. Todos os dias meu marido sai cedo para as trincheiras e volta a noite para cuidar de meus ferimentos e para me dar atenção. Ele não sabe como essas coisas estão me deixando mais feliz com nosso relacionamento, vejo que ele está realmente disposto a melhorar nossa relação.Já não desejo ir embora, meu desejo agora é ficar e ajudar Sean da maneira que eu puder, seu reino agora é o meu, e se realmente há uma magia dentro de mim e eu posso ajudar, gostaria muito de saber como.Depois de nossa última discussão, ele não tocou mais no assunto, mas algo me diz que ele fará isso em breve. O tratamento com o bálsamo da maga foi milagroso, a cada dia meus ferimentos estavam melhores e agora eles estão completamente curados. Sean ainda insiste para que eu não me esforce, mas me sinto muito bem. Me levanto da cama sem qualquer dor, e passo o dia olhando pela janela do quarto, quando não estou na ca