— Se demorar demais, eu desisto de sair.
Genesis esperava Aiden se aprontar para comerem fora, pois era aniversário de Genesis; dezoito anos que ele mal vira passar. Ele alisava o colete preto por cima da camisa branca de mangas dobradas, nervoso. Aiden apareceu vestindo algo semelhante e sorriu perante o “par de vasos” no qual haviam se transformado, estando quase idênticos, com exceção do colete de Aiden, que era vermelho sangue.
— Que coisa, não... Enfim, para onde vamos? — Perguntou Aiden.
— Tem um pub legal do outro lado da avenida, mais para frente.
Saíram do apartamento e esperaram o elevador lento, como sempre o faziam quando saíam. Genesis sentia a tristeza quase palpável de Aiden, que se mantinha irredutivelmente mal. Haviam se passado apenas quatro dias desde a morte de Rani e Gen não o forçava a ficar bem, deixando-o se curar em seu tempo, mas sentia-se incapaz de tudo quando percebia o olhar distante e dolorido de Aiden, ao vê-lo chegar da
O sangue escorria como um rio escarlate de seu nariz quebrado, pingando no chão de concreto da sala que os lutadores usavam para se preparar. Aksu tinha total consciência de todos os seus ferimentos: o nariz quebrado, o olho direito inchado e roxo, as costelas doloridas e o supercílio esquerdo cortado. O ar entrava dolorosamente e saía chiando do nariz, levando mais sangue consigo. Aksu arrancou a bandagem das mãos e as passou na cabeça molhada de suor. O cabelo cortado rente estava encharcado.A porta bateu e ele virou completamente a cabeça para poder ver quem entrava, afinal seu olho direito era cego – branco e sensível. Era seu agente, que ele chamava de Chocolate por causa de seu corpo quadrado e grande e sua pele negra lustrosa. Chocolate mantinha os cabelos crespos em tranças enraizadas com fios de lã vermelha e gostava de mostrar seu corpo em forma aos 40 anos usando regatas brancas e calças de moletom. Aksu não gostava do estilo dele, mas não ousava falar nada.<
Anmi saía do elevador de carga andando rapidamente até a porta do apartamento de sua prima, Adel. Anmi bateu algumas vezes e esperou. Adel estava sempre em casa, e quando precisava de algo, pedia à Anmi.Adel abriu uma fresta, espiando lá fora com um olho castanho. Anmi via mechas do cabelo laranja dela no rosto, grudados na pele suada.— Adelwise! Posso entrar? — Perguntou Anmi, alegremente.Adel tinha cara de quem estava tendo problemas naquele dia. Problemas com seu complicado dom. Ele era raro, era algo como captação do sentimento alheio que vinha em ondas, acertando Adel com força. Sair na rua e sentir milhares de coisas diferentes ao mesmo tempo era cruel e horrível, desgastante ao extremo. Em locais muito cheios, Adelwise captava tudo ao redor, sugando o que as pessoas próximas sentiam, enchendo-a. Chegava a vomitar e desmaiar em casos extremos, como quando estava em meio a uma multidão.— Não me chame de Adelwise, Anmi... — Sussurrou
— Se passar a mão nesse cabelo mais uma vez, ele cairá. — Reclamou Aksu.Zya encarou o reflexo de Aksu atrás de si no espelho, parecendo estranho com aquela roupa que não parecia condizer com ele; camisa social branca com colete cinza, calças skinny e botas pretas lustrosas. Ele parecia alguém de algum dos bairros ricos de Ghonargon, enquanto Zya se misturava bem ao subúrbio, vestindo uma regata bege com centenas de crucifixos pretos estampados, a jaqueta de couro que tanto gostava – jaqueta essa que tinha deixado em seu apartamento quando fugiu para Sunfalls – e calças cargo com os inseparáveis coturnos cheios de fivelas. Aksu mantinha erguida uma sobrancelha, esperando.— Só estou arrumando. Se você parasse de reclamar de cinco em cinco minutos, talvez eu já estivesse pronto.— Sem frescura. Vamos.Saíram do apartamento de Aksu, que trancou a porta e jogou a chave para Zya, pois não tinha bolsos para guardá-la e desceram as escadas que rangiam c
— A Lou está demorando. Ela está aí? — Perguntou Henrik.Ele mantinha o celular encostado na orelha, segurando-o com o ombro enquanto passava as roupas pequenas e delicadas de Louisa. Falava com Janis – apelido da dona da loja onde Lou trabalhava, pois ela era fã da Janis Joplin e se parecia com a cantora.— Não. Tentou ligar para ela? — Disse Janis com a voz ligeiramente distorcida pela ligação.— É claro que liguei. A ligação cai na caixa postal.Henrik dobrou a camiseta branca com uma estampa de um peão de xadrez preto, colocando-a na pilha das camisetas. Henrik era organizado e metódico para algumas coisas e relaxado para outras, mas gostava de deixar as coisas de Louisa limpas e arrumadas; mesmo ela sendo autossuficiente o bastante para lavar as próprias roupas.— Ela deve estar na Anmi. Quer que eu vá olhar? — Ela sugeriu.— Não, tudo bem, Janis. Ligo pra você quando ela chegar.— Está bem. Até mais, Henrik.&nbs
Louisa recobrou a consciência aos poucos, sentindo-se meio fora de seu corpo. Os sons à sua volta estavam abafados e distantes, contrastando com a sensação gelada em seu peito como se sua alma estivesse congelando lentamente. Lou ergueu a cabeça tentando ver através da nuvem de cabelos bagunçados e claros. Tirou-os do rosto com uma das mãos e ergueu o tronco, permanecendo sentada no chão frio, encolhendo as pernas e abraçando os joelhos. Lou deixou os olhos se acostumarem à luz forte e branca do lugar, tentando entender onde estava. Para se situar, refez os últimos passos daquele dia: lembrava-se de estar conversando animada com Anmi sobre a futura lojinha fixa que Anmi queria tanto abrir para vender sua comida e os quadros da prima. Repentinamente, Louisa sentiu uma fisgada violenta em suas costelas e percebeu, tardiamente, que estava incapacitada de se mover direito, sendo arrastada para um caminhão estranho. Levou minutos para perceber que Elya a havia encontrado.Virando a
Aksu se sentia como um touro preso em uma baia estreita de metal. Ele observava com pavor os homens de farda liquidarem os invocadores indefesos presos dentro das jaulas. Os tiros ecoavam até ele como badaladas de um sino infernal, lembrando-o do exato momento em que dezenas de pessoas inocentes eram massacradas sem chance de defesa. Fazia quase uma hora que Aksu estava desperto, embora ainda levemente desorientado. Se tivesse mais alguns minutos poderia invocar fogo, derreter a fechadura da jaula, sair e tentar a sorte para libertar a todos ali.Um homem calvo e fora de forma, na casa dos cinquenta anos, preso na jaula ao lado, abaixou-se e colocou os braços entre as grades para alcançar o chão, murmurando palavras de incentivo para si próprio. Ele havia dobrado as mangas da camisa social molhada de suor e acariciava o concreto molhado, feliz. Aksu pensava que o homem havia enlouquecido quando notou várias outras pessoas fazendo o mesmo. Ele se aproximou da grade mais p
Genesis sentia a euforia corroer seu corpo. Achou que morreria ali, sem a menor pena, porém Louisa havia acendido uma chama de esperança para todos que estavam enjaulados. Lágrimas brotaram de seus olhos e escorreram por seu rosto alvo e anguloso, lágrimas da mais pura vontade de viver. Ele mantinha as mãos no concreto liso à espera do sinal de Louisa. Os policiais pensavam ser alguma espécie de ato de submissão e sequer os mandaram levantar, continuando com a maldita matança. Gen tremia levemente de frio com a chuva fina que caía pela enorme abertura no teto daquele poço quadrado, fitando tudo à sua volta com os olhos bem abertos.Sairiam dali vivos, disso ele tinha certeza naquele momento.No centro de seu ser, Genesis acolheu as faíscas rebeldes com amor, deixando-as tomarem seus olhos e, em breve, todo o seu corpo. Ele jamais fora tão grato pelo dom que tinha como o era naquele momento, desejando que Saul pudesse vê-los trabalhando em equipe. Genesis voltou a o
Elya sentia o peito estourar de felicidade. Finalmente havia capturado uma quantidade absurda de invocadores, beirando os mil “espécimes” – como gostava de dizer às vezes. Enchendo aquele lugar mais umas vinte vezes, provavelmente acabaria com os malditos invocadores naquela cidade e seria visto como um herói.O som de projéteis perfurando crânios era como música para o ouvido de Elya, que permanecia em pé na entrada de portas trancadas com as mãos atrás das costas. A rápida interrupção o deixara nervoso, ainda mais se tratando de projéteis defeituosos. Odiava pagar caro por munições que não funcionavam e aquele não era o momento para que elas falhassem. O cheiro ferruginoso de sangue e os pedaços de ossos e cérebros tomavam o chão das primeiras fileiras de jaulas feito uma pintura dantesca macabra. Uma rápida olhada no canto direito daquele poço foi o bastante para deixá-lo curioso; um garoto abaixado na jaula com as mãos para fora dela, tocando o chão. Elya balançou a