O Inferno

Mamom entrou no quarto gritando com ela, parecia ainda maior quando estava bravo. Lily o desafiou na frente de uma das coletoras, e o impediu de matar a garota. Ela já estava inconsciente quando sua noiva segurou seu braço e o empurrou para longe aparando o corpo. Sumiu com ela para longe, Lily raramente usava o poder de sumir dessa forma, provavelmente viu que ele arrancaria a cabeça de Nahema se continuasse.

-Onde ela está Lily? Eu exijo que me responda! - Segurou o braço dela com violência e gritou a centímetros de seu rosto.

-Você saberá apenas quando se acalmar! Ela não teve culpa, você não ouviu o que ela disse? Não foi incapacidade, foi culpa do informante! - Olhou para as mãos dele em seus braços e fez uma cara de nojo. - O que eu dizia mesmo quando você me pediu para ser sua Senhora?

Ele a soltou levantando os braços como quem se rende, só o que faltava era ela desistir agora. Mas ainda estava com raiva.

-Não me provoque Lily! Eu prometi refrear meus impulsos, mas você está ultrapassando uma barreira bem importante aqui… 

Seu tom era de ameaça, mas tentava ficar calmo. Lily notou isso, sorriu internamente e respirou fundo o olhando muito séria.

-O que você vai fazer Mamom? Eu já levei chibatadas, já fui presa em suas masmorras mais de uma vez… O que falta? Você vai me matar? Tudo bem, vai em frente, eu vou morrer mas você perderá ainda mais, afinal, sem mim não será o senhor das almas. - Fez uma pausa e se aproximou dele segurando seu rosto. - Ela vai voltar amanhã para coletar a alma dele, tudo dará certo. De que ela serve morta? Se eu não o impedisse, ela teria morrido, você teria perdido uma coletora incrível, as meninas provavelmente se rebelariam, e você não teria seu precioso herdeiro ou sua esposa troféu para apresentar ao Lúcifer.

-Você faria mesmo isso? Abandonaria nossos planos apenas por uma delas?

-Não por uma delas, mas eu teria certeza que não posso ficar ao seu lado se você fizesse isso. Porque veria que você não é justo. - é claro que faria por uma delas ou qualquer outra seu idiota! pensou, furiosa.

-Eu sou justo Lil! E você não é uma esposa troféu! Será a poderosa Senhora das Almas, eu não quero exibir você para ninguém, quero que esteja ao meu lado. - Ele também diminuiu o tom, a olhando nos olhos. - Onde ela está?

-Em um local seguro, amanhã vai coletar a alma e você a terá. 

-Nós vamos para o Inferno amanhã Lily, não teremos tempo de aguardar por ela!

-Tudo bem, você a pega quando voltarmos, eu prometo que não vou querer dividir essa com você, e se ela ainda não tiver pego, eu mesma a matarei. Vamos, ele não vai se importar com a alma de um velho nazista Mamom. Ele terá uma filha de Lillith casando com um dos seus, e concebendo um herdeiro poderoso para o inferno. 

Demorou menos do que esperava, ele queria realmente essa união e essa criança. Em outros tempos já teria mandado prender ela e todas as demais coletoras. Mas finalmente concordou contrariado e a beijou com força, sempre que discutiam isso acontecia. Ambos ficavam mais animados do que o normal, e tudo era ainda mais violento. Nesta noite em especial, Lily queria comemorar sua pequena vitória, Nahema acreditou nela, era sua aliada agora, quando chegasse a hora poderia contar novamente com ela.

Na noite seguinte foram até os portões escondidos dos domínios absolutos de Lúcifer. Lily usava seu uniforme tradicional de guerreira, e Mamom vestia um terno elegante e sobretudo de couro. Foram recebidos por demônias fortes e bonitas, a guarda especial do grande Senhor do inferno. Elas foram corteses com ambos, mas pareciam mais interessadas em Lily, era uma filha de Lillith, isso era único ali. Nenhuma delas jamais foi até o inferno. 

Passaram por ruas escuras e arborizadas, Lily se surpreendeu com a aparência de lá, como era possível que fosse tão bonito? Ouvia histórias terríveis sobre o sofrimento e aflição do Inferno, até ali tudo parecia bem normal, parecido com seu mundo na verdade.

Em pouco tempo entravam no castelo imenso, uma fortaleza com torres altas e imponentes, seguranças por todos os lados, e muitos demônios superiores que os cumprimentavam, alguns com desdém, outros com simpatia desmedida. 

Entraram em uma sala grande repleta de livros e quadros, pinturas raras de artistas famosos, decoração elegante e tons claros. Lily olhou em volta e sorriu fazendo uma careta, Mamom apenas piscou um olho divertido.

-Por favor aguardem aqui, Nosso Senhor chegará em breve. - A demônia linda sorriu para Lily piscando um olho sensualmente.

-Hummm, acho que ela gostou de você. - Mamom, como qualquer macho escroto, se animou com a possibilidade de participar de algo para o qual não fora convidado.

-Também gostei dela. 

Lily sorriu de lado e andou próxima aos livros, raros exemplares que pediam para serem lidos. Se virou lentamente, - como se algo estivesse mudando naquele momento, e ela quisesse protelar essa mudança - quando ouviu a voz bonita de cantor de Blues, rouca e sonora, completamente hipnotizante.

-Meu caro Mamom! É um prazer recebê-lo em minha casa! 

Lúcifer se aproximou do outro e lhe estendeu a mão para ser beijada, logo depois o abraçou com mais intimidade do que ela esperava. Se virou para Lily e sorriu charmoso, era loiro, alto e esguio, parecia não ter mais do que 40 anos, apesar de ter, no mínimo, mais de  3000, mãos longas, que se moviam com graça e força ao mesmo tempo, olhos amarelos como o interior de uma chama, a pele muito clara e um sorriso que poderia matar algum desavisado. 

- A filha de Lillith! Melhor coletora de todos os tempos, e devo dizer, a mais encantadora delas. - Se aproximou e segurou a mão de Lily, ela ia fazer como Mamom e beijar a mão de seu senhor, logo depois da reverência, mas ele levou a mão dela aos lábios ainda sorrindo e lhe deu um beijo seguido de uma inspiração profunda. - E seu cheiro é de pimenta e canela, assim como me disseram!

-É uma honra conhecê-lo meu Senhor. - Lily sorriu surpresa para o último comentário dele, pimenta e canela? Que estranho…

-Não sabia que viria até pouco tempo, fico feliz que tenha se juntado a nós finalmente Lily.  

Ele a olhava de uma forma perturbadora, parecia pensar em sacanagem, e a fez pensar também. Mamom notou e se apressou a interromper aquele teatro, só o que faltava ele pensar que Lily era um presente.

-Meu Senhor, ela é essencial em nossos negócios no mundo dos humanos. Por isso a escolhi como minha noiva, será a Senhora das almas muito em breve, se nos der sua benção é claro.

-Ora ora vejam só! - Ele encarou Mamom com o que pareceu desprezo, mas logo sorriu e bateu palmas animado. - Um casamento! Isso é maravilhoso, espero que possamos celebrar ele aqui mesmo, como mandam as tradições?

-Essa é nossa intenção Senhor, se assim nos permitir. - Baixou a cabeça e fechou os olhos com respeito.

-Vocês têm minha permissão! É claro que tem, mas agora, Mamom, imagino que sua noiva possa nos dar licença. Temos assuntos para tratar, e você minha adorável coletora, poderá se acomodar em seu quarto e conhecer nosso mundo. Espero que estejam cientes a respeito de minhas regras, uma noiva dormirá sozinha até seu casamento, ao menos quando ele se realiza em meus domínios.

Lily arregalou os olhos com surpresa, riu por um breve momento, regras cristãs no inferno? Isso era doido. Apenas acenou, ainda sorrindo, e foi conduzida por outra das demônias até seus aposentos. Ficavam em uma das torres, a mulher alta e bonita que a conduzia pareceu animada ao mostrar que aquela era a torre do Senhor, e que apenas pessoas de confiança ficavam ali. Lily acenou agradecendo e entrou no quarto luxuoso, deitou na cama acendendo um cigarro. 

Ao menos tinha a simpatia dele, pensou que o tratamento seria um pouco menos cordial por ser filha de sua mãe. Mas Mamom também tinha essa simpatia, e notou que foi expulsa dali como uma dama que não se envolvia em nenhum assunto, eram todos iguais afinal. Ficou em seu quarto até ser chamada para o baile em honra dos visitantes, um belo vestido preto de renda, longo e justo como jamais deveria ser, a aguardava pendurado no fundo do closet em seu quarto. Presente de Lúcifer, exatamente de seu tamanho, apesar de justo, sapatos altos e confortáveis, quando estava saindo do quarto Mamom apareceu na porta sorrindo, com um smoking elegante.

-Você está deslumbrante Lil! - Entrou a puxando pelo braço e a beijou. Depois tirou uma caixa de veludo comprida do bolso interno e lhe entregou. - Finalmente encontrei algo que combina com seus brincos.

-Caramba! - Era um colar imenso, muito bonito com pedras iguais às dos brincos que ganhou da mãe. - Mas eu não usarei meus brincos essa noite, ele sabe que são dela e provavelmente isso pode prejudicar nossos planos.

-Não se preocupe com isso, ele me entregou esse colar, disse que deu os brincos a sua mãe e sabia estarem com você, que o colar foi feito aqui, assim como os brincos, e que deveria ser seu. Realçaria seu olhar. - Nesta parte o semblante dele ficou carregado.

-O que?

-Ele gostou de você Lil, talvez tente seduzi-la apenas para provar que pode, que conquistou uma das filhas de Lillith, já que nunca pôde encostar nela.

-É sério? Você não está com ciúmes, está? Que bizarro Mamom! - Se afastou dele brava, indo até o espelho ver como ficava o colar, jamais teve ciúmes dela, será possível que ao invés de melhorar ele estava piorando com o tempo!?

-Não estou não! Mas não gostei da forma como ele falou com você Lil, apenas fique atenta! - Segurou seus ombros e a beijou novamente, a conduzindo para fora do quarto, desceram lentamente as escadas da torre, observando os quartos dos lordes de confiança. - Esses não poderemos pegar, mas perto de meu quarto existem alguns Duques e Lordes hospedados, talvez possamos atacá-los antes de partir. Espero que depois do casamento meu quarto seja o seu quarto. Não conhecia essa regra estúpida, parece coisa de religiosos humanos!

Lily olhava tudo atentamente, mas falava pouco, pensava em talvez acabar com Mamom ali mesmo, depois do casamento, ou então fazer algo para que fosse preso, não seria nada definitivo, era arriscado, mas não queria descartar nenhuma ideia ainda. 

-É normal darem festas quando demônios mestiços que vivem na terra vem visitar?

-Ele gosta de mim, eu disse para você que sairemos daqui pela porta da frente, se ele já me tem em alta conta agora, imagina depois de nosso golpe. - Mamom sorriu orgulhoso de si mesmo, realmente não possuía problemas de auto estima. 

Lily não falou nada, estavam dançando entre quase uma centena de outros demônios, analisavam os lordes e duques, todos cheios de pompa, antipáticos e orgulhosos. Lúcifer se aproximou deles sorrindo, em um momento em que passavam próximos da beirada da pista de dança.

-Se importa se eu roubar sua noiva por alguns instantes Mamom?

-Mas é claro que não meu Senhor! - Mamom conseguiu disfarçar, mas uma sombra passou por seus olhos.

-E será que a linda noiva me concede uma dança?

Lily sorriu e segurou a mão que ele lhe estendia, achava bem escroto ele ter perguntado primeiro para Mamom, e depois para ela, se poderia dançar com ELA. Mas não iria criar caso com quem poderia m****r arrancar seu coração.

-Gostando da festa Lily? - Sorriu e segurou sua cintura com firmeza, as mãos quentes, encostando o nariz em seu pescoço.

-É uma linda festa Senhor.

-Mas você detesta este tipo de eventos, acertei? - Ele a olhou sorrindo brincalhão. Ela ia falar mas ele fez uma careta. - Tudo bem, Imagino o quanto deve ser aborrecida para você, mas podemos deixá-la mais divertida, basta que você queira.

Ela arregalou os olhos surpresa, ele piscou um olho e continuaram dançando, falava bem próximo de seu ouvido, e notou a pele arrepiada de seu pescoço, com satisfação. Contou algumas coisas engraçadas e ela riu bastante, ele parecia saborear suas gargalhadas. Quando a música terminou ele segurou sua mão saindo da pista, fez um sinal para os músicos e eles começaram a tocar uma música mais pesada, mais ao estilo de Lily.

-Acredito que agora você se sentirá mais animada, mantenha seu copo cheio e seu sorriso aberto Lily, essa festa é somente para isso, para você. - Beijou sua mão e se afastou caminhando até alguns demônios que o chamavam animados.

Lily o olhou bastante surpresa, talvez ele não soubesse, mas não precisava de tanta pompa para levá-la para cama, lindo daquele jeito, e com aquele sorriso, precisava de bem menos do que uma festa. Para falar a verdade, não gostava muito desses galanteios, essas coisas mentirosas e cheias de frescura. Assim como não fazia cerimônia se queria alguém, não gostava que fizessem com ela. Depois de pensar isso fez uma careta, era bobagem, ele era o Senhor de seu mundo, ela estava parecendo Mamom, com aquela pretensão toda. 

A festa acabou tarde, ficou um pouco melhor com a música diferente, e de fato, sempre que seu copo esvaziava, algum demônio ou demônia com uma bandeja aparecia sorrindo cordial. Foi para seu quarto e tirou os sapatos os atirando em um canto, abriu o vestido e o tirou com cuidado, pendurou em um cabide e vestiu uma camisola preta e curta, acendeu um cigarro e sentou na janela, observou o movimento no pátio do castelo, lá era sempre noite, os demônios andavam por todos os lados bebendo e conversando como em uma eterna festa. 

-Gostou de seu quarto Lily? - A voz de cantor de blues, em um tom divertido, quase a fez cair da janela.

Virou em posição de ataque e arregalou os olhos assustada, tentou disfarçar mas não conseguiu fazer isso muito bem.

-S.. Senhor, é um ótimo quarto, obrigada. - desceu tropeçando nas cortinas e endireitou as costas sem graça.

-Eu imaginei que gostaria da vista, soube que vive em um apartamento no centro da cidade, com muito movimento próximo de sua janela. - Se aproximou mais dela e parou olhando a rua.

-Posso perguntar como o senhor sabe disso?

-Eu sei de muitas coisas Lily, - Virou de frente para ela e sorriu tirando seus cabelos de cima dos ombros. Ela não havia tirado as jóias ainda - Esse colar e os brincos combinam mesmo com seus olhos, sua mãe me disse que daria para a filha, que ela tinha cheiro de canela e pimenta, e que um dia eu a conheceria, não pensei que demoraria tanto.

-Senhor, eu por acaso não sou… - Não completou a frase.

-Não! Eu jamais toquei em sua mãe Lily, não que não tenha tentado, mas ela não me queria, hoje eu vejo que foi melhor assim. Ela sempre foi uma sabia mulher.

-Pensei que o Senhor a odiasse, ao menos é o que todos dizem.

-Mas evidente que não! Eu e sua mãe fomos bons amigos, e depois deixamos de ser, mas jamais fomos inimigos. - Sorriu e deu mais um passo na direção dela.

-E então, foi ela quem falou do meu “cheiro”? E que falou dos meus olhos?

-Ela falou sim, mas confesso que havia me esquecido disso, até que, algumas centenas de anos atrás, uma das coletoras que trabalharam com você retornou e passou a trabalhar no castelo, me parece que vocês se conheciam bem, e que você a salvou de um sofrimento muito grande.

-Nana… - Lily encheu os olhos de lágrimas mas as segurou e engoliu o choro. - Ela ainda está aqui?

-Em missão atualmente. Lamento.

-Eu também, gostaria realmente de vê-la.

-Você poderá vê-la sempre que quiser, agora que veio a primeira vez, sempre poderá retornar.

-Senhor?

-Por favor, me chame por meu nome Lily, essas formalidades não são necessárias entre nós.

-Não são? - O encarou apertando os olhos. - Com todo o respeito, Lúcifer, mas do que se trata essa visita?

Ele sorriu, e ela poderia jurar que o sol morava naquele sorriso, era bonito, mágico e encantador, mais do que costumavam falar.

-Também me disseram que você não gostava de enrolações, que preferia as conversas diretas. Isso é uma grande qualidade.

-A Nana também lhe disse isso?

-Não, ela não foi a única que me trouxe informações a seu respeito. 

-E por que eu seria tão importante para que trouxessem informações ao senhor?

-Minha linda Coletora de Almas, eu a observo há muito tempo. Não gostei de muitas decisões suas, viver com Mamom, amá-lo, ele não é digno de você Lily.

-Começo a desconfiar que o senhor de fato é meu pai, está agindo como um meu Senhor. - Sorriu debochada, não estava gostando do rumo daquela conversa.

-Eu não sou seu pai Lily, seria errado até para mim se eu fosse. - Sorriu e acendeu um dos cigarros dela, lhe entregou e pegou outro para ele. - Vamos conversar, imagino que você tenha muitas perguntas, e eu tenho algumas também. - Foi novamente até a janela e escorou os braços no parapeito. - Venha, contemple meus súditos comigo. - A chamou com a mão e quando ela se aproximou, ele a puxou pela cintura fazendo com que ficasse perto dele. - Você já tem a alma do tal Papa?

Se afogou com a fumaça do cigarro, o olhou assustada mordendo o lábio. Mas teve certeza que ele não estava blefando, sabia quase tanto quanto ela a respeito de seus planos,  estava apenas confirmando informações, e testando sua sinceridade, é claro. Lembrou do que Empuza falou, sobre ele ser mais esperto do que ela, sobre ter cuidado.

-Uma das coletoras a tem, eu a terei assim que retornarmos.

-Você vai matá-lo aqui ou vai aguardar o retorno?

-Vou aguardar, pensei em acusá-lo de algo aqui, para que permanecesse preso mas…

-Ele um dia sairia, e você seria caçada como uma zebra na savana.

-Exatamente… - O olhou, impassível fazendo as perguntas, enquanto observava o movimento ao longe, e se virou para ele com o queixo erguido. - Vamos Meu Senhor, qual o plano afinal? Apenas saber o que eu farei? Ou vai me impedir, me acusar de traição e me manter presa aqui pela eternidade?

-Me chame de Lúcifer por favor. - A olhou e sorriu segurando seu rosto e se aproximando enquanto cheirava seu pescoço. - Exatamente como imaginei… - Beijou a pele arrepiada e segurou seus cabelos a olhando no fundo dos olhos bonitos. - Eu estou tentando decidir se você precisa de ajuda Lily, ou se tem tudo sob controle. Posso sumir com ele em um estalar de dedos, se você quiser.

-Não é necessário Lúcifer! - Se afastou a tempo de escapar do beijo, ele parecia exercer um poder forte demais sobre ela. Não gostou daquilo, de nada daquilo. - Se quer me ajudar, porque me expulsar durante sua conversa mais cedo? 

-A conversa? Ora! Mamom fala bobagens a todo momento, quis poupá-la do tédio, ele estava apenas me passando informações sobre as coletas, e me entregando almas é claro.

Ele falava e ficava cada vez mais próximo, sua voz linda e tranquila, e seu andar bonito, a empurrou contra a parede mesmo sem encostar um dedo em seu corpo, e sorriu para a surpresa em seu rosto, mas não havia medo ali, talvez um pouco de raiva. Pouco antes dele a beijar ela fechou mais a expressão, e falou com a voz debochada, parou de recuar e chegou mais perto dele.

-Você quer me oferecer ajuda apenas por uma transa? Poderia continuar me dando joias, ou poderíamos beber algumas doses e talvez fosse até mais fácil. - Ela se irritou finalmente, ele a perturbava, nunca a perturbavam daquela forma.

-Minha filha disse que você só fazia o que queria, eu gosto disso. - Riu da expressão dela. - Sim, minha maior informante é uma de minhas filhas, Nahema.

-Porra! - Tentou se afastar, queria respirar ar puro, se sentiu sufocada com aquele corpo extremamente quente ali, próximo dela. - Por favor eu… me solta por favor.

Ele soltou e se afastou, mordeu o lábio e a olhou de cima abaixo, um pouco decepcionado. Depois sentou no divã rosa escuro do fundo do quarto.

-Qual a jogada aqui Senhor?

-Por favor me chame de…

-Senhor, é isso o que é, o Senhor de todos nós, seres infernais. Prefiro chamá-lo pelo que o senhor é. - O encarou com  olhar duro e ergueu o queixo parando em frente a ele.

-Você se parece com ela, mas é ainda mais brava devo dizer. - Sorriu debochado, e fez sinal para que ela sentasse ao seu lado.

Lily sentou, mais porque não queria desafiar demais aquele ser poderoso que poderia matá-la do que por vontade própria.

-Por que sua filha estava me espionando? Era a mim que ela deveria espionar ou ao Mamom, e apenas mudou o alvo quando eu iniciei meus planos?

-Era você Lily, eu soube sempre de tudo em sua vida, normalmente enviava demônios inferiores para ficarem à espreita, mas você gostava de se relacionar com eles, e isso era um problema.

-Por que? O Senhor é adepto ao celibato?

Ele soltou uma gargalhada sonora atirando a cabeça para trás. Uma gargalhada gostosa, ela fechou os olhos por um momento, ouviria aquela risada para sempre se pudesse.

-Longe de mim! - Fez uma pausa e seus olhos se tornaram maus. - Mas esse não era o trabalho deles, deveriam me dar informações, não dormir com você. Então minha filha se candidatou, afinal, alguém de confiança pôde se aproximar de você. E eu sabia que ela não cederia.

-Infelizmente devo dizer. - Sorriu irônica. - Por que? - Ele fez uma expressão surpresa e ela pareceu perder a paciência. - Por que me espionar, que importância a filha de Lillith, que foi expulsa pela mãe, de seus domínios, tem para o Senhor, para o Nosso Senhor?

-Você fará grandes coisas Lily, por isso sua mãe a manteve afastada. Você deveria liderar e não ser outra das filhas dela. Você é única, e tem um destino único em nosso mundo.

-Que é? - Não estava acreditando naquilo, e ele era o pai da mentira afinal.

-Você não confia em mim? Isso é novo, e estranho… - Sorriu virando o corpo para ela e a encarando novamente como se ela estivesse sem roupas.

-Qual meu destino Senhor?

-Me chame de Lúcifer, por favor.

Ela respirou fundo e fechou os olhos um momento, chegou perto dele com raiva, e falou com a voz abafada como um sibilo.

-Lúcifer, por favor me diga qual o jogo, o que eu devo fazer para que me permita fazer aquilo que quero da minha vida? 

-Diga sim para mim.

-Uma noite de sexo? Claro por que não! - Riu e se levantou passando a mão na testa. - Não seria ruim para mim, Lúcifer, mas talvez não seja suficiente para você. Não esqueça que os demônios com quem dormi eram inferiores, eu não sou assim tão espetacular que mereça essa consideração por uma foda. - O encarou com raiva, então era isso. O supra sumo do machismo sendo aplicado ali, deveria pagar uma promoção no trabalho com o corpo! Era um trabalho diferente, e teria muito mais poder, mas a essência era a mesma praticada pelos humanos escrotos.

Ele levantou e parou em frente a ela sorrindo de uma forma que deixava as pernas fracas, segurou seu rosto e a beijou, e foi como se todo o seu corpo fosse beijado por ele. Batidas na porta os interromperam e ele se afastou ainda sorrindo.

-Seu noivo está ali, deveria impedir que entre, isso é contra as regras da minha casa.

-É claro, somente Nosso Senhor pode dormir com a noiva antes do casamento. - Rosnou para ele e foi até a porta. - O que você quer aqui?

-Como assim o que eu quero Lil… - Mamom sorriu malvado e tentou entrar. Ela segurou a porta e viu, com o canto dos olhos, Lúcifer ao seu lado fazendo sinal para que não dissesse nada. - Vamos Lil! Me deixa entrar.

-Não! Ele disse que eram as regras dele, não podemos quebrar pra fazer isso!

-Isso? É algo que você gosta bastante Lily, e normalmente nada a impede de fazer quando realmente quer.

-Exato! Mas eu não quero, porque não vou prejudicar nossos planos só para dormirmos juntos, isso vai acontecer muito em breve, e pela eternidade. - Sorriu e o beijou encostando todo o corpo no dele, o soltou e fechou a porta encarando Lúcifer. - Ainda não sei por que não o deixei entrar, seria bom que ele brigasse com você e você acabasse com ele, me pouparia trabalho.

-Você não precisava beijar ele daquela forma, mas sei que fez apenas para que eu visse que você só faz o que quer, não é mesmo? - Ele a encarou muito sério, e se aproximou novamente dela, mas não a tocou. - Você não o deixou entrar porque quer matá-lo com suas próprias mãos, e porque, talvez… - Sorriu novamente. - Você queira saber como seria uma noite comigo.  

-Sim, e sim… Quem não ia querer saber isso afinal? Fuder o diabo deve ser incrível! - Riu debochada, fez questão de deixar claro que ele seria apenas uma boa transa, assim como ele pensava sobre ela.

-Não faça isso Lily, eu compreendo que você, por ser quem é, não gosta desse tipo de imposição, que até o momento pareceu que sou um homem poderoso e devorador de mulheres, e que o que quero com você é apenas uma noite. Mas não me trate como trata a Mamom, eu não quero uma noite de prazer com você, se quisesse já a teria convencido e não precisaria sequer contar sobre meus informantes. - Ela finalmente o deixou bravo, ele sentou novamente no divã e cruzou as pernas passando os dedos sobre os lábios como quem pensava em continuar. 

-Então me diga, com toda a sinceridade que lhe é possível, Meu Senhor, o que exatamente o senhor quer de mim?

-Ainda não Lily, mas posso adiantar que terá uma amostra do que lhe aguarda quando atingir seus objetivos, venha comigo. - Levantou e esticou a mão para ela, Lily exitou olhando para a própria roupa, estava de camisola. - Não se preocupe, vamos andar sem que nos vejam.

Ela foi, mais por curiosidade do que por bom senso, e claro, não poderia negar nada a ele, ao menos era o que parecia, segurou sua mão e saíram do quarto sem usar a porta, andaram por todo o castelo, sem serem vistos por ninguém, estavam invisíveis, era bom estar assim. Ela gostou, mas não disse nada, estava avaliando se poderia demonstrar satisfação perto dele ou se isso a prejudicaria de alguma forma.

-Aqui, veja! - Ele parou diante de uma porta fechada e entraram, era o quarto de um dos Lordes dele, que tinha 36 legiões a sua disposição. - Este, se chama Alloces e honestamente, não gosto dele. Tem almas suficientes para que você se torne muito poderosa, e para que arranque a cabeça de Mamom e devore seu coração sem passar trabalho.

O demônio charmoso estava fazendo uma pequena orgia com três demônias e um demônio, era bizarro, mas até que bem legal, Lily sorriu olhando Lúcifer debochada.

-Ou talvez você tenha me trazido aqui para me constranger, porque sabia o que ele estaria fazendo. Quer me convencer finalmente a dormir com você, acertei?

-Eu não precisaria disso para convencê-la Lily, se continuasse beijando você já atingiria esse objetivo. - Sorriu e saíram dali. Ela pensou que ele era bem pretensioso, mas que não estava errado de todo. Ele continuou. - Você fará isso sozinha, ou com Mamom é claro, mas deve entender que ele tentará se vingar, e que não poderei impedir. Mas sei que estará forte o suficiente para derrotá-lo, e que Mamom adoraria fazer o trabalho sujo desta vez, eles têm problemas antigos para resolver.

-Então ele poderia matar Mamom?

-E então teria as almas novamente, não Lily, quem mata o demônio fica com tudo o que ele possui. Isso inclui as legiões, que são melhores do que as almas, acredite. 

-Então eu devo matá-lo. - Acenou entendendo onde queria chegar. Ele a levou para um outro quarto, cores claras e decoração extremamente sofisticada, uma cama imensa, nunca vira uma cama daquele tamanho em sua vida. - Que lugar é esse?

-Meu quarto, raramente alguém entra aqui.

-Ah… Entendi, um tour com final feliz. 

-Não se preocupe Lily, você só usará essa cama, hoje, para descansar seu corpo da intensidade das almas que ingerir.

-Eu o que?

-Venha, você vai provar de meu acervo particular. - A levou até uma sala no canto esquerdo do quarto, abriu portas duplas com o mesmo tecido da parede, de forma que pareciam não estar ali.

Lily se sentiu entrando em um grande forno industrial, o calor era quase insuportável, prateleiras de madeira grossa de todos os lados, com vidros pequenos onde se viam chamas, emitiam também sons estranhos, como gritos abafados. Entendeu finalmente, os demônios inferiores não conseguiam guardar as almas por muito tempo em seus corpos, e os superiores também não, mas conseguiam deixá-las por perto em recipientes especiais, onde a “danação eterna” acontecia, até que fossem devoradas finalmente.

-Devo ter coletado algumas delas, estou certa? - Se aproximou dos vidros e passou os dedos pelas prateleiras.

-Exato! Muitas delas, na verdade, eu prefiro as suas, porque vem com um resquício seu é claro. Mamom costumava devorar quase todas que você entregava para ele, mas é um menino obediente, e eu deixei claro quais preferia que me desse. Ele nunca a matou ou a afastou realmente do trabalho por isso também, eu não deixei que fizesse. 

-Mas fez parecer que foi ideia dele. - O olhou apertando os olhos.

Lúcifer sorriu e pegou um vidro do fundo de uma prateleira, e outro de outra, piscou um olho e saiu da sala, fazendo sinal para que o acompanhasse.

-Essas são extremamente fortes, você deve entender que sentirá dor, mas que isso não é ruim. Pegue a dor delas e transforme em poder, absorva tudo, e torne-se forte como deve ser. - Ofereceu o primeiro vidro para ela com expressão séria, antes que ela pegasse ele afastou a mão e apontou a cama. - Chegue mais perto, você pode querer se apoiar em algo.

Pegou o vidro e o olhou curiosa, depois caminhou até uma poltrona distante da cama, antes de abrir e levar a boca parou e o olhou debochada.

-Por que? O que eu precisarei fazer para pagar por essas almas que você está me dando, tão generosamente?

-Nada Lily, ao menos não por enquanto. Não se preocupe, o que você fará com Alloces, e também com Mamom, já será um grande favor para mim. 

-Eu não acredito em você, Lúcifer. Mas não importa, algo me diz que não terei escolha daqui para frente. 

Fez uma careta e bebeu de uma vez, a dor e queimação em seu corpo foram instantâneas, gritou e se contorceu, sentindo sua pele arder como se tivesse fogo por baixo dela, perdeu os sentidos pouco depois de sentir, além da dor, um poder extraordinário. 

Acordou com Lúcifer a colocando deitada na cama, sentou com um tranco, empurrando ele. Olhou seus braços e mãos, estavam vermelhos, levantou e se olhou em um espelho grande perto do que deveria ser o closet, toda sua pele era vermelha.

-Não se preocupe, logo o efeito passa e sua pele voltará ao normal, mas se serve de algo, eu gostei de você assim. - Se aproximou parando atrás dela com as mãos em seus ombros e ofereceu o segundo vidro. - Faça novamente, você terá uma prova do que será muito em breve.

Ela bebeu e a dor foi ainda maior, o empurrou quando tentou segurá-la e gritou caindo no chão. Mas não perdeu os sentidos dessa vez, pareceu ainda mais forte do que a anterior. Era uma sensação muito boa, depois que se acostumava com a dor. Se esticou no chão colocando as mãos na frente dos olhos, a pele ainda muito vermelha, como se tivesse nascido daquela cor. Pegou o cigarro que ele lhe oferecia e fumou em silêncio, sorrindo como se estivesse sozinha.

-E agora? - Ela ainda estava deitada, mordendo o lábio, aquela sensação a deixou animada. 

-Agora você volta ao seu quarto, dorme algumas horas e amanhã conversamos mais. Imagino que seu casamento será na próxima noite, não é mesmo? - Ele esticou a mão e a ajudou a levantar, ajeitou as alças da camisola dela e segurou seu rosto lhe dando um beijo demorado.

Lily correu as mãos pelo corpo dele e sorriu beijando seu pescoço, abrindo sua camisa lentamente, viu que ele queria, por isso se surpreendeu quando ele a afastou sério e a fez aparecer em seu próprio quarto, sozinha. Então todo o teatro tentando dormir com ela era mentira? Confusa, resolveu deitar e descansar, não que se sentisse cansada, nunca se sentiu mais forte e disposta. Mas precisava tentar entender o que estava acontecendo com ela.

Saiu de seu quarto depois de algumas horas, era sempre noite no Inferno, o que fazia com que não tivesse muita noção das horas, mas ainda tinha bastante tempo antes de seu casamento. Andou pelos corredores do castelo tranquilamente, Mamom estaria ocupado com a preparação do noivo, um ritual antigo e cheio de significados, onde o noivo era vendado e transava com um número incontavel de mulheres, Lily conhecia o ritual de ouvir falar, a noiva cabia esperar por seu noivo pacientemente, ou algo do tipo, não conhecia bem todos os rituais, nunca quis casar. Por isso, estranhou quando as demônias da guarda de Lúcifer a cercaram rindo e soltando gritinhos animados, e a conduziram para uma sala perfumada e com luz amarela, repleta de flores e bebidas. 

Alguns demônios, bonitos e sensuais, dançavam em um palco, e ela foi confortavelmente deixada em um sofá rodeado pelas novas “amigas”. A demônia do dia anterior, que se mostrou interessada por ela quando a deixou na biblioteca do castelo, sentou ao seu lado e lhe deu um beijo demorado, jogando todo o corpo sobre ela. Lily não era de recusar, então aproveitou o momento, depois de algumas bebidas, danças sensuais em seu colo, feitas por demônios que realmente sabiam o que estavam fazendo, e beijos quentes na menina demônio, ela foi levada até uma porta vermelha que se abria para um jardim bonito, repleto de árvores e folhagens estranhas, com uma piscina, cheia até a borda de sangue, bem no meio.

-Nosso Senhor disse que a filha de Lillith merecia um tratamento especial, por isso ordenou que a trouxéssemos aqui para se banhar no sangue dos condenados. É um ritual antigo que fortificará você e a fará dar a luz com vigor e sem nenhum problema, independente do tipo de criança que carregue.

Lily olhou confusa para a demônia que lhe beijou a testa e ajudou que tirasse suas roupas, pensou que entrariam ali juntas, mas ela acenou de forma negativa e piscou um olho.

-Este ritual é privado Lily, você deve ficar só e absorver os poderes de todo o sangue dos condenados.

Lily entrou ali e sentiu o sangue espesso e fresco, gostava dele também, quando ainda não ingeria almas, comia corações e às vezes bebia o sangue de algumas vítimas. Mergulhou até desaparecer completamente na imensidão vermelha e quente, sentiu que tudo ficava mais quente, como se borbulhasse. Voltou à tona e se assustou com a forma que apareceu em sua frente, um homem sem dúvidas, mas coberto pelo sangue ficava quase completamente irreconhecível. Bem, quase...  

-Pensei que deveria ficar só nessa piscina.

-Eu sou como o deus daqui, estou em todos os lugares. - Lúcifer sorriu e se aproximou, apenas o branco dos olhos e os dentes eram visíveis.

-Porque me mandou para este lugar? Sabe que eu não vou ter nenhum filho com Mamom, bem, com ninguém na verdade.

-Ele na realidade já pensa ter plantado um demoniozinho em seu ventre. - Riu debochado.

-Não, eu sei como evitar isso.

-Não é necessário, Mamom não pode ter filhos. É, como todos os demônios, seus irmãos de legião, estéril. Porque no final Lily, é isso que ele é. Um demoniozinho qualquer, como os milhões que vivem por aqui, apenas foi mais esperto do que os outros. Mas sua esperteza e ganância vão matá-lo, é irônico não?

-É sim, e também um alívio. E pensar que já fiquei preocupada tantas vezes enquanto estivemos juntos, me pouparia bastante estresse se soubesse disso antes, sempre detestei a ideia de ser capaz de ter filhos! Invejava minhas colegas de trabalho. - Fez uma careta. - Mas então por que me m****r pra cá? Queria tomar um banho comigo? - Ela riu debochada e desapareceu mergulhando até o fundo da piscina. Sentiu as mãos a puxando e trazendo de volta à superfície, ele parecia mesmo ter um propósito ali.

Não disse nada, apenas a beijou e fez seus corpos se encostarem, depois abriu o pulso com a unha, abrindo o dela em seguida. Lily tentou puxar o braço mas ele sorriu enquanto segurava firme e falou calmamente.

-Você provou as almas Lily, agora nosso sangue será um, aqui nesta piscina. E então selaremos nosso acordo.

-Que acordo?

-O acordo que a fará Senhora das Almas na Terra, que a fará a mais poderosa das mestiças de nosso mundo. Que a tornará responsável por uma mudança única no mundo dos humanos. O tornando o mundo dos demônios poderosos, nós comandaremos finalmente, aquele mundo sórdido e mal administrado!

-Vejo muitas vantagens para mim, e nenhuma para você.

- Eu terei Lily, não agora, mas logo. 

Ela o olhou de lado, não estava dizendo tudo, conseguia perceber isso, mas algo a fazia querer ele, mais do que na noite passada. O beijou novamente, montou em sua cintura e segurou seus cabelos com força, ele a deixava maluca. Já não queria mais resistir, também não queria ser dele, já que seria poderosa, queria apenas curtir seu poder, mas isso diria depois. Por enquanto, queria absorver os poderes daquele sangue e se divertir com o melhor dos amantes. 

Ele parecia ter mil mãos, e nunca sentiu algo parecido aquele prazer, estava completamente entregue, tão entregue que esqueceu de onde estava e quem era. Esqueceu que casaria dali a pouco tempo, ele a abraçava com força, e pareciam conseguir fundir os corpos um com o outro, e com aquele sangue no qual mergulhavam, tudo era quente, eles, o sangue, o ar. 

Terminaram em uma das bordas, com Lily sentindo as costas contra o material frio e duro de louça, que revestia toda a piscina, e Lúcifer grudado nela, com força, exatamente como ela gostava. 

Lily riu se afastando dele, saiu dali e deitou na borda da piscina, sua pele estava vermelha novamente, ele deitou ao seu lado, com o corpo virado de frente para ela.

-Eu já preciso ir? Não sei mais que horas são…

-Não… eu acertei tudo para que tivéssemos tempo. 

A beijou deitando sobre ela e recomeçando, ela gostou daquilo, gostou da sensação de poder que estava sentindo quando subia em cima dele e segurava suas mãos com força, de quando mordia seu peito e sua coxa, e ele soltava alguns gemidos de satisfação e dor. Gostou de fazer o Diabo sentir dor, se sentiu muito bem fazendo aquilo. E também gostou quando ele segurou suas mãos com força contra o piso do chão, com uma das mãos, enquanto a outra apertava seu pescoço, primeiro de leve, para saber se ela estava gostando, e depois cada vez mais forte. Era tudo o que ela queria, foi assim que terminaram da segunda vez, ela gritou e ele sorriu satisfeito. 

Depois, deitaram de barriga para cima, exaustos e sorrindo. Ele segurou a mão dela e beijou cada dedo lentamente. Enquanto falava de forma tranquila, como se contasse uma história.

-Sabe Lily, essa piscina de sangue não é exatamente o que lhe disseram ser…

-Não? Então é aqui que você traz as demônias pra fazer um amor gostoso, não é? - Soltou uma gargalhada e procurou os cigarros na roupa atirada sobre um banco de madeira perto deles. 

Ele esperou que ela pegasse os cigarros, aceitou um e fumou em silêncio por um tempo, a olhando de uma forma estranha.

-Não, eu nunca fiz sexo nessa piscina, ela está aqui desde a fundaçao do inferno, é onde todo o sangue dos condenados vem parar depois que eles são pegos, apenas aqueles que trago inteiros para cá, os que venderam suas almas e viveram sem elas por algum tempo. Os piores seres que já viveram sobre a terra. Ninguém jamais entrou nela, você foi a primeira.

Ela viu que algo estava errado, se isso fosse mesmo verdade, então havia mais por trás dessa coisa toda de comer almas e comandar as coletoras. Sentou abraçada nas pernas e o olhou desconfiada.

-E por que? Qual o significado dela?

-Ela é uma piscina ritual para que os noivos se banhem e tenham forças, coragem e potência, para que possam conceber o herdeiro da terra, aquele que tomará o poder para si e transformará tudo.

Foi como se tivessem lhe dado um choque de alta voltagem. Ela pulou e se encostou em uma árvore, apavorada, não conseguiu falar por um tempo, tremia e suava e agora já sentia nojo de tudo ao seu redor. 

-Seu desgraçado filho da puta escroto de merda!!!! - Gritou quando recuperou a fala, foi até ele com o dedo apontado. - Você acabou de me engravidar? Assim, como se eu fosse obrigada a carregar uma criança, não importa o otário que queira transar comigo? Isso foi injusto, e criminoso! E não vai acontecer, entendeu? Melhor que você me mate de uma vez porque seu filho, se é que está aqui, não vai viver por muito tempo!

-Você não vai fazer nada, se fizer não será bem sucedida. Ele vai viver a qualquer custo, Lily, e você vai gostar de tê-lo. Não se preocupe, eu não a forcei a nada, isso foi como nosso casamento. Foi previsto por sua mãe, não por mim. Você nasceu para isso, foi o que ela me disse quando eu tentei tocá-la, que sua filha seria minha esposa, a única que eu teria em toda a minha existência, e a única que me daria o filho poderoso que herdaria a Terra, E eu seria seu marido de verdade, e teríamos nosso casamento, de verdade, aqui.  Não como o que você vai encenar com Mamom agora, eu sou seu e você é minha. Aceite, e seja grata.

Sorriu e se aproximou dela, pensou mesmo que ela não fosse fazer mais nada, por isso o soco em seu rosto foi uma surpresa. E o segundo soco o acertou mais forte ainda, o derrubando. Ela foi para cima dele e segurou seu pescoço com força, com raiva e sua voz saia abafada junto com as lágrimas.

-Seu cretino miserável! Então você acha que tem o direito de invocar o nome de minha mãe apenas porque não tenho contato com ela, que acreditarei nessas mentiras de merda porque ela não está aqui para comprovar?

Ele levantou a mão e a fez apagar, depois a levou para seu quarto, deu uma chuveirada de água fria nela e a deitou em sua cama. Acordou e viu que estava limpa e vestida, e que ele a olhava sorrindo deitado ao seu lado. 

E ela voltou a carga, avançou sobre ele apertando novamente seu pescoço enquanto sua outra mão fechada descia sobre seu rosto. Antes do soco ele segurou suas mãos e a afastou, seus olhos estavam como os de um louco, mas não se comparavam aos dela.

-Já chega Lily! Eu sei que você está brava, que se sente enganada e que parece ter sofrido um abuso, mas isso não é verdade, se você se acalmar eu explico. Se ainda assim você não concordar comigo, pode fazer o que quiser, está bem?

Ela não respondeu, mas parou de lutar, até porque não tinha grandes chances contra ele. A soltou e sentou de frente para ela, tentou segurar suas mãos mas ela o afastou com repulsa.

-Muito bem, ainda não é o momento, o que é uma pena. Nós nos entendemos muito bem até pouco tempo atrás.

-Ou você fala agora ou eu me suicido, acabo com minha própria vida e você não tem seu herdeiro!

-Você não fará isso! - A olhou preocupado, mas tentou não dar ordens. - Eu sei que ainda está com raiva, mas ouça, por favor. - Ela o olhou feio, mas concordou com a cabeça, ele falou com sua voz rouca, bonita, explicando pacientemente. - Existe uma profecia Lily, de que a filha da primeira mulher geraria o filho do primeiro caído, e este filho salvaria a todos, dominaria a terra como um líder misericordioso, e de pulso firme também. Eu não profetizei nada, e por muito tempo sequer acreditei em sua mãe, ela falava como se não houvesse forma de fugir a isso, e eu nunca gostei de imposições em minha vida. Mas ela me disse que eu serviria a uma de suas filhas, e ela serviria a mim. Que seríamos um e teríamos essa criança, que essa filha tinha olhos como esmeraldas e cheirava a canela e pimenta. E que não resistiríamos um ao outro. - Ele riu debochado. - Quando ela me disse isso, naquele seu tom profético e aborrecido, eu apenas tentei beijá-la e seduzi-la. Ela me rejeitou, é claro, e me falou para ficar de olho em você, que você seria uma criatura pouco bondosa e muito competente, que seria do mundo, e não dela. E que eu deveria me certificar de estar por perto, porque na hora certa você e eu nos encontraríamos finalmente.

-Por que você não me disse isso ontem, quando encenava aquele teatro? Por que não me disse hoje antes que fizéssemos qualquer coisa! - Gritou a última parte, levantou e cerrou os punhos o olhando com um desprezo que jamais deu a ninguém em sua existência. - É claro, porque você é apenas mais um macho escroto, não é? É talvez o mais poderoso deles, mas ainda assim, precisa dominar as mulheres, nos acha seres inferiores, pensa que precisamos seguir ordens, ou então ser conduzidas como incapazes criaturas que devem ser ludibriadas. Vocês abusam de nós, todas nós, nos tratam como reprodutoras, como marionetes… Eu odeio você, e seu mundo maldito, odeio a forma como pensou que o que fizemos foi especial! Nós trepamos Lúcifer! Foi ótimo, mas é algo que faço com frequência, não é especial. 

-Não diga isso Lily! Você sabe que foi especial, você sentiu mais do que jamais poderia ter imaginado.

-Bem, foi o equivalente humano a flores, champanhe e chocolates. Eu gosto de sangue e de sexo forte, você fez o mesmo que quaquer otario humano faz, normalmente, para poder transar. 

-Não! - Se aproximou dela e segurou seus ombros. - Não me compare aos humanos Lily! Eu jamais faço nada parecido com o que eles fazem.

Ela primeiro sorriu, o sorriso se alargou e virou uma gargalhada. Aquele maldito estupido, depois de um tempo parou de rir e o olhou debochada.

-Seu idiota! Você é exatamente igual a eles, ou aos demônios que chama de inferiores - Ergueu a mão o interrompendo, não discutiria mais essas bobagens. - E agora? Eu tenho que vantagens por carregar o bebê de Satã dentro de mim?

-O que mais você quer?

-Quero ficar sozinha, e que meu vestido seja entregue aqui.

-Lily, o que você vai fazer? Por favor não tente nenhuma loucura, eu…

-Você porra nenhuma Lúcifer, eu vou me casar em pouco tempo, certo? Então quero me preparar, acho que tenho direito de ficar sozinha, não é mesmo?

-É claro que tem, vou m****r que entreguem seu vestido aqui.

-Ótimo. 

Sentou na cama e acendeu um cigarro fumando em silêncio até que saísse, ele a encarou desconfiado, mas não quis falar mais. Talvez se ficasse sozinha pudesse pensar com clareza. E veria que isso era o melhor para todos.

Lily esperou que ele fosse embora, e que trouxessem seu longo e decotado vestido de casamento. Foi até a sala onde as almas estavam armazenadas, pegou cinco delas e tomou de uma vez, fez isso já deitada na cama, gritou e se contorceu, mas também se sentiu mais forte do que nunca. Sua pele ficou vermelha instantaneamente, depois foi perdendo a cor de forma lenta. Se vestiu, além do vestido longo, encontrou uma capa preta com capuz que jogou por cima dos ombros. Olhou a parede decorada com algumas armas e acenou mordendo os lábios, pegou uma espada ritual, uma arma bonita e pesada, com cabo incrustado de diamantes, além é claro de ser mortal para qualquer demônio. 

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