A tarde estava quente, perfeita para um bom mergulho, como Alina adorava. A moça vinha em dias que sabia que o rio estava vazio, e esse era um dos dias esperado por ela. Enquanto caminhava, soltou seus cabelos castanhos e largou suas roupas novas em cima de uma pedra, se levantando para tirar seu vestido marrom velho para poder dar um longo mergulho. A água saltitou para cima quando seu corpo se chocou contra ela, indo até as profundezas do rio. Nada poderia ser mais relaxante do que um mergulho perfeito em um dia quente, ainda mais sozinha. Porém, não seria assim por muito tempo.

   Depois da conversa mais cedo, Atter não conseguia parar de pensar em cada palavra ouvida sobre o novo rei. O que ele devia esperar para essa nova fase? Como seu irmão reagiria? E o povo? Com certeza ele estava nervoso, mas ao mesmo tempo entusiasmado e confiante para entrar finalmente nessa nova realidade que até algumas horas atrás era completamente impossível. Enquanto caminhava em direção ao rio, ele logo já foi tirando sua camisa branca até avistar algumas roupas secas em uma pedra mais adiante. O rio estava parado e parecia não ter ninguém, então mesmo achando um pouco estranho, ele deu um grande mergulho na água, fazendo com que Alina, que estava mergulhando atrás de uma grande rocha, se assustasse nadando rapidamente até perto das margens do rio para sair o mais rápido possível, pois na pior das hipóteses, poderia ser um animal.

   Ouvindo um grito, Atter subiu rapidamente para fora da água vendo que tinha uma moça nadando até as margens, e antes que ela chegasse, ele a tranquilizou dizendo:

   – Calma! Ei! Sou só eu! Atter!

   Alina parou de nadar ao escutar a voz daquele homem. Era ótimo saber que era só uma pessoa, mas sendo quem era talvez fosse melhor outra.

   – O que faz aqui? – Alina perguntou se virando para ver o rosto dele.

   – Achei que o rio estava vazio, me desculpe. – Ele disse não se importando com a informalidade com que ela falava com ele.

   – Não viu minhas roupas naquela pedra? Como pode ter achado que não tinha ninguém? Você mergulhou aqui mesmo sabendo que eu estava... Nua?

   – Não! Não me interprete mal! Eu realmente achei que estava vazio... Mas eu irei embora se você quiser.

   – Deixa para lá, o rio é bem grande, não serei egoísta. Mas não chegue perto de mim!

   – Claro, não se preocupe... – Atter disse nadando em direção a grande rocha onde ela esteve uma vez e ficou nadando por lá.

   A água estava maravilhosa, ainda mais sabendo que Alina estava mergulhando nela também. Mesmo ela falando de forma brusca com ele, Atter imaginava nadar até ela e a beijar... Mas nunca faria isso sem que ela dissesse que também gostaria. Porém, seu corpo pedia para que ele desse uma rápida espiada em sua direção, mesmo ele lutando contra si próprio para não fazer isso.

   Enquanto Atter estava nadando para tentar se distrair de suas vontades, Alina nadava longe dele tentando afastar de si pensamentos que insistiam permanecer em sua mente.

   – Agora terei que vigiar bem o rio antes de entrar. E se da próxima vez ele estiver aqui? E se ele se aproveitar desses momentos em que eu estiver nadando? Sendo irmão daquele cretino, não tem como ser diferente. Talvez até pior que Abnorú, se fingindo de bonzinho... Eu nunca, jamais, cairei na lábia dele. – Sussurrava a moça tentando reforçar para ela mesma o quanto não gostava do sujeito.

   Enquanto jogava a água sobre seu corpo, seus olhos imediatamente se fecharam, vindo a imagem do príncipe em sua mente. Sua memoria a levou para alguns minutos atrás quando os dois estavam discutindo, e como suas palavras soaram em seus ouvidos.

   Acreditando que sua imaginação não a obedecia mais, sua mente criou um cenário aonde Atter veio até ela a olhando firme nos olhos enquanto acariciava seu rosto, a puxando para um beijo. Logo que finalmente percebeu o que se passava com ela, Alina abriu os olhos depois de se sentir arrepiada, dando um longo mergulho para esquecer o que sua mente havia imaginado. De qualquer maneira, Atter era um príncipe e ela apenas uma moça da aldeia, portando eles nunca poderiam sonhar em viver uma história de amor, além disso, Alina queria forçar seus pensamentos a fazerem acreditar que por ele ela não tinha sentimento nenhum.

   Do outro lado do rio estava Atter, se banhando e sorrindo sem perceber enquanto pensava em como Alina era bonita. Seu sorriso, seus olhos, como ele queria poder vê-la. Era tentador ouvir o som da água atrás dele e não poder virar, porém, antes que ele percebesse, seu corpo estava se virando e indo em direção à pedra para poder espiar de longe a bela moça por quem ele estava completamente apaixonado há muito tempo. 

   Ela estava perfeita, com os ombros para fora da água. Alina molhava seus cabelos com os olhos fechados, parecendo fazer parte daquele cenário maravilhoso. Com certeza sem ela ali, a beleza do lugar não estaria completa, ele pensava enquanto seus olhos ficavam bem atentos a cada movimento dela.

   Seu corpo pedia para ir ao encontro do dela, mas sabia que não deveria, pois depois de tanto tempo pensando em como se aproximar da moça, essa não seria uma boa opção. Por isso, Atter voltou ao seu normal e se virou de costas, um pouco apreensivo por ter visto a garota sem seu consentimento, mesmo que só do ombro para cima. Atter queria fazer tudo certo, e isso precisava ser desde o início. 

   Depois de algum tempo, a moça resolveu ir embora, pois, de qualquer maneira não dava para relaxar com alguém que ela acreditava não gostar tão perto. E depois de ter certeza de que não havia ninguém a espiando, Alina saiu rápido pegando um pano para secar seu corpo, para enfim vestir suas roupas.

   – Estou indo embora, até mais. – Ela disse sem esperar uma resposta, se virando para continuar seu caminho.

   O príncipe não sabia o que deveria responder, pois seu coração queria acompanhá-la, mas sabia que ela não aceitaria. Por isso nadou até as margens do rio percebendo que ela já havia ido embora.

   Depois de se secar, Atter vestiu suas roupas pensando ter perdido a oportunidade de tentar conversar com Alina novamente, porém, depois de alguns passos, o homem percebeu algo estranho.

   O caminho de ambos era passar pela floresta, e Alina relembrando o ocorrido há algum tempo, além das outras vezes em que se encontraram fisicamente e apenas com olhares, estava com a mente tão ocupada que acabou tropeçando em um galho preso no chão caindo de joelhos em algumas pedrinhas espalhadas pela terra seca. A dor veio forte a fazendo fechar os olhos e sentar no chão para erguer seu vestido e ver que uma das pernas estava começando a sangrar.

   Atter andava igualmente pensativo, desta vez sobre o que lhe contaram mais cedo. Ser rei era algo muito forte e tinha que ser analisado com calma, mas o que insistia em ficar preso em sua mente era com quem ele dividiria esse poder. O que ele mais desejava era ter como sua rainha a Alina, mas seria difícil conquistá-la.

   Enquanto pensava sobre isso, o homem notou que quem não saía de seus pensamentos ainda estava ali, porém machucada, ao que parecia. Então Atter correu até ela e percebeu que suas pernas estavam feridas e seu semblante demonstrava a dor que sentia.

   – O que houve? Pensei que já estaria longe agora.

   – Eu estava indo, mas... Acabei tropeçando naquela raiz ali. – Ela disse apontando para o lugar onde aconteceu.

   – Isso deve estar doendo muito... – Ele disse olhando para os joelhos da moça, que erguia o vestido para não encostar nos machucados. – Deixe que eu leve você até sua casa, está sangrando muito e com certeza será ruim andar assim até a aldeia.

   – Não é necessário. Eu estou bem e consigo... – Ela tentou dizer enquanto se erguia para caminhar, com seu sangue escorrendo por suas pernas.

   – Não seja teimosa, eu levarei você, não precisa se preocupar e se esforçar assim. Mas antes, deixe que eu cuide disso. – Atter disse rasgando logo em seguida sua camisa para poder enrolar nos joelhos da moça para que segurasse o sangue até que eles chegassem.

   Alina observava atentamente o rapaz cuidar de seus ferimentos com todo o cuidado para que ela não sentisse dor, enquanto pensava o porquê de ele estar a ajudando. O que ele pensava que ganharia com isso? Ela não era como Adelly, portanto receberia apenas um obrigado e um adeus.

   – Pronto, está melhor. – Ele disse olhando para os ferimentos enfaixados, levantando seu olhar até os olhos da garota. – Eu posso? – Perguntou se referindo a pegá-la em seus braços.

   Ouvindo um sim um pouco tímido e receoso, Atter a ergueu, virando seu rosto para olhá-la de tão perto. Alina do mesmo modo levantou lentamente seu olhar até os olhos do rapaz percebendo algo diferente nele. Atter parecia querer demonstrar como ele era bom, e de alguma maneira quando Alina o olhou nos olhos naquele momento, isso parecia a coisa mais verdadeira do mundo, e sinceramente, era tudo o que Alina queria, que Atter fosse realmente diferente.

   Atter e Alina começaram a se encontrar frequentemente depois daquele dia, quando Alina percebeu que era impossível viver sem acabar se encontrando com ele acidentalmente. Em cada encontro Atter demonstrava ser um homem muito melhor do que seu irmão, e com isso a moça percebeu que havia se enganado em relação à Atter.  

   O lugar de encontro era sempre no rio, onde eles nadavam juntos, ou ficavam deitados no chão conversando, ou até mesmo fazendo um piquenique à beira do rio. Mas desta vez ambos queriam fazer coisas novas.

   Não ficava muito longe, e de lá era possível ver o rio onde se encontravam, além de ser o lugar mais bonito para ver o pôr do sol, onde o mesmo pousava sobre as águas do rio. Os pássaros voavam pelo céu recheado de nuvens douradas, enquanto cantarolavam sua melodia única. A paz que aquele lugar trazia era realmente impressionante, mesmo sendo o divisor de parte do reino tão bonito e o Vale da Escuridão, onde só havia destruição e ruínas.

   – Esse lugar é lindo... Surpreendo-me nunca ter vindo até esse monte.

   Alina olhou sorrindo para o príncipe que estava admirado com tamanha beleza que seu reino tinha. Para ela ainda era inacreditável saber que ele seria o rei, embora concordasse que Abnorú seria um fracasso. Sem dúvidas Atter era diferente do irmão, e o seu jeito, sua maneira de pensar era parecido com ela, e isso fazia a moça se interessar cada dia mais pelo rapaz, porém, com medo de ele pensar que ela só estaria pensando em se tornar a mulher mais importante do reino.

   – É realmente fantástico. Vim aqui poucas vezes, mas nunca esteve tão bonito como hoje.

   – Deve ser porque estamos juntos hoje.

   – Estou feliz que viramos bons amigos, e sei que devo desculpas por ter sido tão dura no começo. Eu realmente acreditava que você era como seu irmão, mas percebi o quanto você é diferente e único. – Alina disse escorando sua cabeça no ombro do rapaz.

   – Eu fico realmente feliz em saber disso, eu não fazia ideia de que você não gostava de mim por esse motivo. Devo confessar que meu irmão é alguém muito difícil, e mesmo querendo estar do lado dele e o ajudar, ele me afasta até mesmo com ameaças. Algo que me preocupa bastante é o que ele pode fazer quando descobrir que eu serei o novo rei. Além disso, o que ele pode fazer durante o meu reinado.

   Alina suspirou ao escutar aquelas palavras. Com certeza viver debaixo do medo era terrível, e a vida dele seria resumida a temer o irmão. Ele não precisava passar por isso, se não quisesse, mas a determinação e a compaixão pelas pessoas era uma das muitas coisas que faltariam no reinado de seu irmão.

   A moça encontrou a mão do jovem e a acariciou, em uma forma de demonstrar que o entendia e que estaria lá sempre que precisasse.

   – Que bom que eu tenho você. Não sei com quem compartilharia momentos tão bons e ao mesmo tempo momentos em que só você sabe que estou com medo. Você me faz tão bem, é como se todos os meus problemas diminuíssem com você ao meu lado.

   Alina sentiu seu corpo arrepiar ao ouvir aquelas palavras tão sinceras vindas do príncipe. Seria aquilo uma declaração discreta? O coração da moça começou a bater mais rápido ao pensar em como responder, ela poderia enfim falar o que sentia por ele? Ou ela estava confundindo as coisas?

   – Eu... – A moça pensava por alguns segundos tomando coragem para abrir seu coração. – Sinto o mesmo. Quando eu olho para você meu corpo todo se arrepia, e eu não consigo, simplesmente não consigo parar de pensar em você quando não estamos juntos... Eu sei que você será o rei deste reino, mas... Eu não quero que pense que estou falando isso por interesse. Acho que... Eu acabei me apaixonando por você, Atter.

   Suas mãos tremiam e seu corpo estava quente, sentia que iria desmaiar a qualquer momento quando terminou de falar o que estava trancado a sete chaves em seu coração.

   Atter estava surpreso com as palavras da moça, sentindo vontade de chorar e gritar por finalmente ser correspondido em seu amor por ela. Durante muitos anos o rapaz esperava por uma simples oportunidade de trocar algumas palavras com Alina, e com isso, ele sentia estar vivendo o dia mais feliz de sua vida.

   – Você não faz ideia de quanto tempo eu sonhei em ouvir isso de você. Essas com certeza foram as melhores palavras que eu já ouvi em toda a minha vida... – Ele disse sorrindo enquanto pegava na delicada mão da moça.

   Alina sentiu algo tão forte dentro dela, uma felicidade que nunca sentiu antes, ao ver o sorriso de seu amado. Principalmente quando sentiu seus grandes braços a envolvendo em um abraço caloroso e aconchegante. Ambos foram se afastando lentamente enquanto olhavam um nos olhos do outro, até que apenas movidos por aquele sentimento, seus lábios se tocaram iniciando um beijo, no qual puderam ter certeza de que ali, naquele momento, os dois foram feitos um para o outro e que não deveriam se afastar nunca mais.