4.1

Maria

Olhei meu reflexo no espelho pela milésima vez antes de sair do meu apartamento, eu estou bonita usando um vestido com um decote discreto, os cabelos soltos em cachos bonitos e definidos, a maquiagem também está lindíssima, caprichei sem saber o motivo ou eu sabia bem.

Esses eventos familiares, não são só familiares, mamãe tem a mania irritante de tornar algo íntimo e familiar em um evento para amigos e parentes, eu sempre me senti deslocada, como se estivesse no lugar errado e com a família errada. Uma sensação que me persegue desde criança, eles nunca me trataram mal, pelo contrário.

Porém, não há nada que mude o fato de que não sou parte deles, que existe uma lacuna vazia em minha vida. Já chorei muito no passado pensando nisso, sendo na grande maioria das vezes melancólica e depressiva. Depois que Eduardo se declarou, piorou ainda mais, minha mãe pensou ser algo da minha cabeça ou outro motivo igualmente sem sentido já que sempre fui muito amada.

Fiz tratamento com psicólogos que surtiam um melhor efeito quando fui embora para Europa, mas ter voltado acendeu em mim aquele sentimento esquisito e incomodo. Resolvo empurrar toda e qualquer sensação ruim para o fundo da mente saindo do meu apartamento para ir até a mansão da minha mãe.

Entro no meu carro segurando o volante com força, não sei se estou preparada para estar no meio de tantas pessoas, coloco uma música no som do carro dirigindo em direção da casa dos meus pais, gosto de MPB e ouvir músicas desse gênero me deixam bem mais tranquila.

— Eu amo essa.

Palavras ao vento tocava no aparelho de som, eu amo pensar que há alguém em algum lugar me espera, a música tem um poder de me acalmar e transportar para um lugar bom, no final, já estava mais calma ouvindo os Tribalistas e cantando junto. Assim que chego na portaria da mansão sorriu pensando que não será tão ruim assim estar aqui.

A mansão dos meus pais foi o lugar que eu cresci há muitas lembranças boas aqui, um casarão projetado pelo meu pai com um jardim lindo na parte frontal da casa e também aos fundos com flores e arbustos junto com várias estátuas de anjos e fadas feitas de mármore, um lugar extremamente luxuoso e rico.

Minha mãe é uma herdeira que se casou com um homem de classe média, meu pai não era rico como ela, mas usou de toda inteligência e contatos para se tornar um dos homens mais poderosos e ricos da cidade.

Assim que entrei percebi o movimento de pessoas, vejo uma mesa farta como também os amigos dos meus pais e seus filhos no jardim frontal da casa com alguns parentes do meu pai. Eu sabia que eles iam inventar uma porra de reunião com pessoas que realmente não fazem sentido estarem aqui hoje. Ainda bem que vim preparada, meus pais gostam disso, e consequentemente pensam que também gosto.

Eu sorri disfarçando minha indignação querendo sumir no mesmo instante que vi a palhaçada que minha mãe inventou, ela fingi não saber que detesto isso. Eduardo e Carina foram os primeiros a levantar para me cumprimentar já entendendo que odiei tudo isso.

— Sorria e finja que está amando, mamãe também nos pegou de surpresa.

Logo a linda e elegante Rita de Cássia Cortês foi até nós sorrindo enquanto me abraçava, pegou em minha mão acariciando como fazia quando era criança, no fundo, ela não se conforma que eu não seja sua filha de sangue, talvez isso tenha sido um dos motivos que me tornou uma pessoa tão melancólica na adolescência.

Queria que tivesse vindo da sua barriga, e sei que sua maior dor é ser sua filha adotiva, já aprendi a lidar com isso mesmo que ainda cause um certo incomodo em mim. Toda essa exibição da minha figura como se fosse parte disso tudo é desproporcional, e eu realmente odeio.

— Filha, você veio, fiquei com medo que não viesse. Mamãe estava com tantas saudades, minha lindinha.

— Mãe, eu prometi que venha, estou aqui, mas pensei que só seria nossa família, sua saudade é sempre no coletivo.

Ela gosta de auto afirmar para todos que sou sua filha quando na verdade sou apenas adotada por ela, seus amigos e parentes sabem disso. Eu sou uma mulher preta com peitos fartos e bunda grande com cabelos cacheados negros, já ela parece uma boneca de porcelana de tão branca e ainda tem olhos verdes como também cabelos loiros.

— Filhinha linda, a mamãe gosta de momentos assim e você sabe bem disso, e minha saudade é individual, porém não quer dizer que não posso comemorar a visita da minha filha com as pessoas mais próximas de mim.

Eu sorri não querendo deixar um clima chato. A amo com todo meu coração pois ela jamais fez distinção de mim e Eduardo dando amor e atenção igual para nós dois. Por ela decido ser simpática, cumprimentando todos e sorrindo para eles.

Percebo que papai não está aqui imaginando que com certeza está em cima de vários projetos, ele não para com seus trabalhos, nem mesmo mamãe consegue pará-lo. Está a pouco tempo de se aposentar, mesmo assim, sei que fará questão de continuar com seus projetos.

O almoço foi servido entre risos e conversas, de repente vejo meu pai chegando ao lado de Pedro Lobo, senhor Jesus Cortês e essa mania de fazer amizade com todos os clientes, não me admira que tenha convidado um total desconhecido para um almoço familiar. Além de ser um viciado em trabalho, sempre coloca seus clientes próximos dele para parcerias futuras, e isso sempre dá muito certo, não é atoa, que meu pai ficou rico fazendo isso.

Os nossos olhares se encontraram como se ele soubesse que tive um sonho sexual com ele, desvio o olhar para Eduardo que não gostou da presença de Pedro aqui, meu irmão as vezes pode ser bem implicante.

— O que esse cara está fazendo aqui?

— Você esqueceu como nosso pai é? Com certeza ligou para ele para conhecer o cliente mais lucrativo do momento e o convidou para este evento, se nossos pais não fossem expansivos dessa forma, não teria que conviver com seu novo desafeto.

Eduardo me irrita com essa implicância com Pedro, é só um cliente dos vários que a empresa do nosso pai tem. Meu pai fez questão de apresentar Pedro para todos os seus amigos e parentes, as garotas ficaram loucas com Lobo que não tirava os olhos de mim. Droga! Minha mãe percebeu, a vejo chamando para se sentar perto de nós com certeza não desistiu da sua missão de encontrar um marido para mim, e agora com Pedro olhando para mim como se fosse uma rainha, minha mãe encontrou o que tanto procurava.

— Esse aqui, querida, é Pedro Lobo, nosso novo cliente. Meus filhos, você já conheceu como minha nora, se sente perto de nós, é nosso convidado de honra.

Minha mãe se levantou da cadeira que estava, deixando Pedro sentar ao meu lado, parece que o universo está conspirando contra mim com a ajuda da minha mãe, só isso explica o fato desse homem que atormenta minha mente estar aqui.

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