Ravens um história de rock
Ravens um história de rock
Por: E.J.L Spiekovski
1º Capitulo

Por trás da vidraça da grandiosa cobertura, Lílian olhava o sol nascente que começava a dar seus tons dourados e alaranjados por entre o azul perdido no horizonte, aquele seria um dia lindo, pensou e que sorte ele teria em ter um dia tão abençoado justamente quando completava seus 20 anos, Chuck se aproximou da porta e observou a amiga com semblante triste que parecia divagar em pensamentos.

- É hoje o grande dia?

- Sim, é hoje.

- Aposto que não dormiu a noite toda.

- Nem mesmo um minuto. – Disse ela sorrindo, apesar de parecer tranquila ele sabia reconhecer aqueles olhos, eram olhos tristes, os mesmos olhos tristes que há 20 anos á acompanhavam.

Calmamente ele se aproximou dela depositando suas mãos em seus ombros.

- Deveria deitar-se e descansar um pouco, não esqueça que tem plantão hoje, Catherine irá ligar assim que o presente for entregue e lhe detalhar cada momento, tenho certeza que ela não deixará nada passar despercebido.

- E você acha que isso basta?

- Não basta?

- Eu preciso vê-lo Chuck, eu preciso olhar para ele, ver o quanto está crescido, ver o seu sorriso, o olhar de surpresa a explosão de sentimentos que irá ficar registrada na memória dele para toda vida.

- É arriscado, você prometeu a Cat que não iria!

- Mas eu preciso e sei que como mãe ela irá me entender, vou estacionar o carro do outro lado da rua e ele nem mesmo me verá, prometo que irei tomar muito cuidado.

- Isso é loucura Lílian...

- Eu preciso ver o meu Tiago.

Dito isso ela cruzou por ele engoliu o café tão apressada que acabou derrubando um pouco sobre a blusa branca, Chuck observou a amiga impaciente e preocupado, mas o que poderia fazer? Trancá-la ali não resolveria nada, Lílian pegou a bolsa sobre a mesa e saiu, horas arrumando o cabelo, horas tentando andar sem tropeçar.

Enquanto isso em São Paulo...

Sebastien acordou depois das nove, espreguiçou-se demoradamente na cama quando a empregada entrou para limpar seu quarto.

- Mas já Thereza?

- O sol está alto, menino, você deveria levantar-se, tomar um banho um café e ir para aula, até por que mesmo que saísse agora chegaria atrasado à faculdade.

- Para mais uma aula chata de teorias da comunicação, por que mesmo eu faço jornalismo?

Thereza olhou para ele sorrindo.

- Seu pai acha que é um bom curso.

- Por falar nele, ele está?

- Óh não, saiu faz tempo para o trabalho, hoje ele iria receber uma comitiva muito importante, estava animado, a empresa dele vai finalmente firmar parceria com uma empresa de fora do país! Não acha isso muito chique?

Sebastien riu do sotaque da pobre mulher, Thereza era uma mulher muito humilde que trabalhava do nascer do sol até o cair da noite, apenas por que gostava de estar ali, até hoje ele se perguntava como ela podia estar a tanto tempo na família de seu pai, ninguém suportava seu pai, nem mesmo ele, porém Thereza sempre estivera ali, era o braço direito e esquerdo de Seven e mesmo não recebendo rios de dinheiro, ela permanecia, Seb sabia que o pai podia pagar a mulher muito mais, porém não se metia nos negócios da casa.

- Gosta muito de trabalhar para o meu pai, não é?

- Seu pai é o melhor patrão que há nesse mundo, acho que deveria dar mais crédito a ele.

- Você sabe que há controvérsias e discordâncias não sabe?

Ele falou sorrindo, a mulher se aproximou dando tapinhas em seu rosto com carinho.

- Ainda assim, não trocaria ver esse seu rostinho de sono por nada no mundo.

Thereza tinha praticamente criado Sebastien já que o mesmo tinha perdido a mãe ainda garoto, tinha apenas cinco anos quando Cibele faleceu, o pai emendava uma noite em outra, perdido em trabalho e mais trabalho para tentar suportar a dor, e ele... Bom, Thereza tinha sido muito mais que uma mãe normal, fazia o lanche, levava ao colégio, buscava, brincava no jardim, ajudava com a lição de casa e é claro acobertava suas peraltices, como toda boa babá.

Sebastien e Tiago compartilhavam coisas que eles desconheciam em comum, porém com algumas tragédias particulares bastante distintas, ao contrário de Sebastien que não tinha a atenção do reconhecido Seven Kirtman, Tiago apenas reconhecia aquele nome de ver em revistas antigas e cartazes, mas isso é uma história para ser contada aos poucos com bastante tempo e cuidado, vamos prosseguir nossa história falando um pouco sobre Tiago, que humildemente iremos chamar por vezes de Kurt, um apelido gentil dado a ele por sua irmã mais nova e por alguns fãs dos bares em que tocava.

Tiago abriu os olhos calmamente naquele dia, ao levantar-se da cama ele pensou se deveria fazer o que sempre fazia no dia 13 de dezembro, abrir a vidraça sair na varanda e ficar ali, cuidando o movimento dos carros e as pessoas na rua, durante 20 anos essa tinha sido sua sina esperar por ela, e um dia, um dia ele sabia que isso aconteceria, ela cruzaria os limites daquele portão de madeira e viria até ele de braços estendidos dizendo: “hei, sou eu, sou sua mãe” e mesmo a odiando ele a perdoaria e os dois poderiam começar a viver tudo que não tinham vivido.

Porém, naquela manhã ele se levantou da cama e caminhou sem querer até lá, chegou a segurar a cortina, mas parou, ele estava fazendo 20 anos, ela nunca tinha aparecido, ela não tinha visto as inúmeras esculturas com massa de modelar que ele tinha feito na escola e tinha guardado com tanto amor, ela não tinha recebido suas cartas, “feliz dia das Mães” quem as tinha recebido tinha sido Catherine, aliás, o que teria sido dele se Cat não o tivesse adotado? Ele olhou para os próprios pés tentando jogar os pensamentos para longe e pela primeira vez em 20 anos ele não abriu a janela para esperar por ela ele era um homem agora e ela... Ela tinha sido apenas um fruto da sua imaginação de criança.

Do lado de fora, Lílian aguardava por aquele momento de dentro do carro ela olhou para a varanda esperando por ele, todos os dias 13 de dezembro ela fazia isso, vinha ali e ficava com o carro estacionado, esperando por ele que apareceria na varanda, e então ela se enchia de coragem e colocava a mão na maçaneta do carro, abria a porta e quando estava decidida a sair e ir até lá algo dentro do seu coração a fazia sair dali e acelerar o mais rápido possível, mas hoje... Hoje ele não apareceu.

Ele caminhou até o banheiro e lavou o rosto, ficou um tempo olhando fixamente os próprios olhos refletidos no espelho, com quem será que ele se parecia, seria mais com seu pai ou com sua mãe? E aqueles olhos tão azuis e claros? Seriam os mesmos olhos dela? Balançou a cabeça afastando os pensamentos novamente e então bagunçou os cabelos, nessa hora ele ouviu um barulho no quarto e sorriu.

- Faça silêncio, Erika! Vai acordá-lo!

- Não sei por que estamos aqui, ele está fazendo 20 anos e não cinco, tem necessidade de todos esses balões?

- Pare de reclamar e me ajude...

Kurt podia ouvir as duas cochichando de dentro do banheiro e como o esperado assim que ele abriu a porta, deu de cara com o maior sorriso do mundo, Catherine estava ali com um enorme bolo de aniversário e Érika segurava os balões à contra gosto, os dois não se davam muito bem, mas ele sabia que ela estava fazendo um grande esforço em apenas estar ali, assim que ele abriu a porta ela soltou os balões que voaram pelo quarto e em um coro bastante animado elas cantaram os “parabéns a você” mais lindo que ele já tinha ouvido, naquela hora ele se sentiu novamente culpado por ter pensado em sua mãe biológica que o tinha abandonado e não ter pensado em Cat como sua mãe, ela se esforçava tanto, não esquecia uma apresentação, um aniversário, sempre estivera ali, tanto que Érika morria de ciúmes, e ainda assim quando chegava o seu aniversário, a primeira pessoa em quem ele pensava era... Naquela desconhecida.

- Feliz aniversário, meu amor!

Emocionado ele a abraçou em uma tentativa desesperada dela não ver que seus olhos estavam emocionados, talvez fosse bom não dizer obrigado em voz alta para que sua voz não soasse embargada.

- Não precisava fazer bolo mãe.

- São 20 anos! Como eu iria deixar passar em branco?

E certamente ela não iria, Cat adorava uma festa, ao sair do quarto Kurt viu que não eram apenas os balões que Érika tinha soltado no quarto que ela havia enchido, certamente elas tinham passado a noite inteira fazendo isso, por que quando saiu no corredor, viu que havia sinais de festa para todos os lados.

Ele deu um cutucão em Erika.

- Prometo não contar para ninguém se admitir que ajudou com os balões...

Ela olhou para ele fechando o rosto.

- E eu por acaso tenho alguma escolha?

Ela o abraçou de leve, não com tanto carinho como Cat, mas já era alguma coisa vindo dela.

- Parabéns bastardinho...

Catherine olhou para a filha lhe repreendendo com o olhar.

- Oras, Érika consegue fazer melhor que isso, não tem necessidade de chamar seu irmão assim...

- Ah mãe, sem essa néh, por favor, não vai brigar comigo por causa disso, nem mesmo o Kurt se importa com isso.

Não ele não se importava, tinha aprendido a ignorar os comentários dela, algo que sem dúvidas a deixava ainda mais irritada pensava ele, como ele gostava de ver aqueles olhos verdes nervosos pegando fogo, Érika era sem dúvidas uma cópia fiel de Cat, porém uns 30 anos mais nova é claro, as duas tinham o mesmo cabelo loiro e os mesmos olhos verdes, a diferença é que Catherine estava sempre de bom humor e Érika já tinha nascido azeda feito um limão, ou pelo menos era extremamente azeda com ele.

- Eu não me importo mãe, é sério, deixe Érika em paz, ela certamente está aqui apenas para fazer um grau.

Ela mostrou a língua para ele e cruzou os braços fazendo biquinho como costumava fazer.

Érika tinha 16 anos e estava no segundo ano do ensino médio, Kurt já tinha terminado há algum tempo e trabalhava desde os 16 anos em uma empresa de turismo, tinha entrado como jovem aprendiz e crescido muito no serviço, hoje ocupava o cargo de gerente e assumia tudo quando Emanuel seu chefe precisava viajar.

Nessa hora eles ouviram um toque de buzina do lado de fora, o coração de Kurt disparou quem seria? Será que era ela? Seria sua mãe biológica?

Cat sorriu como se soubesse bem do que se tratava e fez um sinal para que ele aguardasse, demorou um pouco até que ela abriu a porta.

- Tiago, querido venha cá!

Ele olhou para ela sem entender nada e Érika tinha pelo menos uns três pontos de interrogação na testa desenhada.

- Seu presente acabou de chegar.

Kurt saiu para fora e seus olhos não quiseram acreditar no que viam, em uma explosão de felicidade e emoção ele deu um salto para cima ao ver o carro preto e reluzente encostado em frente à casa.

De longe Lílian assistia a comemoração dele com lágrimas nos olhos, seu menino agora era um homem, como podia o tempo ter passado assim tão rápido?

- Um carro mãe? Fala sério! Não acredito que apertadas como estamos que eu nem pude fazer meu curso de francês você ainda comprou um carro para ele!

Cat mais uma vez repreendeu Érika com o olhar, Kurt parou de comemorar.

- A Érika tem razão mãe, um carro é demais, deve ter custado muito caro e não estamos podendo gastar.

Cat balançou a cabeça.

- Não, eu pensei muito nisso e acho que está mais do que na hora de você ter seu próprio carro e parar de pegar o meu emprestado, quanto ao seu curso Érika eu não concordei com ele não por falta de dinheiro, mas por que só nesse mês você começou outros dois e logo não terá nem mais tempo para estudar as matérias do colégio, e Tiago merece essa felicidade!

- Tiago, Tiago, Tiago... É sempre o Tiago nessa casa, por que você não admite logo que só me teve por um acaso e que o seu filho de verdade é ele?

- Érika pare com isso!

- Estou cansada de você fazer todas as vontades dele!

Érika entrou na casa furiosa com Catherine.

- Desculpe por isso querido, hoje é um dia tão especial para você não pensei que Érika fosse complicar tanto.

- Tudo bem mãe, no fundo ela tem razão, é um presente muito caro, eu nem sou seu filho de verdade.

Ela fez uma cara de ofendida.

- Óh não pare com isso, sim... Você é meu filho sim e sempre será mãe é quem cria e não quem faz! Agora aproveite o seu presente, vou te deixar aí com ele e vou entrar para ter uma conversa com Érika ela anda muito agressiva ultimamente.

- Não mãe, não briga com ela, Érika não me contou nada, mas eu sei que ela está assim por que mais uma vez Nicholas não respondeu os e-mails dela, no fundo ela esperava que ele concordasse dela fazer o último ano do ensino médio no Rio de janeiro e morar com ele, você sabe, ela sempre quis conhecer o Rio.

- O pai dela? Não sei por que ela ainda vai atrás dele, ele nunca se importou! E agora que está em campanha política acha mesmo que terá tempo para uma filha fora do casamento? Claro que não! Ele quer que a mídia o fotografe apenas com a família de verdade, para mostrar o quão bom ele é, ridículo!

- Eu sei, mas dá uma relevada... Ele é pai dela, e apesar de tudo, ela o ama.

Cat sorriu e passou a mão no rosto dele.

- É impressionante como você está crescido, mesmo com tudo isso ainda se preocupa com ela.

Eles voltaram a se abraçar demoradamente e depois Cat entrou para falar com Érika, mas quando chegou em seu quarto ela não estava mais, apenas a janela aberta, ela bufou, e caminhou até o armário vendo que a mochila escura tinha sumido.

Ela gostaria de saber para onde ela tinha ido, mesmo sabendo que sua filha não era bem uma princesinha como ela gostaria que fosse ela desconhecia todas as suas ramificações extraordinárias, desde que Érika tinha nascido de um relacionamento muito complicado com Nicholas, Catherine a tinha criado junto com Tiago com muito esforço, ela sabia que a filha tinha uma amizade grande com Chuck o amigo estranho de Lílian, mãe verdadeira de Tiago, mas não fazia ideia de até onde aquela amizade ia, e em partes isso a preocupava, afinal o relacionamento das duas era conturbado, e no fundo ela morria de medo de perder Tiago para Lílian, imagine só perder seus dois filhos então.

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