A obsessão de Marcos por Riveira era uma cicatriz antiga em sua alma, inflamada a cada nova pista, a cada rumor que o trazia de volta à superfície. Era como se uma parte de sua mente jamais houvesse deixado aquele momento inicial de perda e frustração, presa em um ciclo de reviver, revisar, reinterpretar cada detalhe do passado. Por nove longos anos, Riveira fora uma sombra escorregadia, um mestre do disfarce que parecia evaporar no ar a cada vez que a justiça se aproximava. Como um ilusionista cruel, ele deixava pistas falsas, nomes trocados, documentos forjados, e desaparecia sem deixar rastros sólidos. Mudava de identidade como de roupa, saltava de país como um fantasma, deixando para trás um rastro de destruição e impunidade, cada nova vítima parecia gritar em silêncio por justiça através dos olhos de Marcos.Marcos e sua equipe haviam perseguido inúmeras pontas soltas, desmantelado operações de traficantes de médio e grande porte, cada prisão os levando um degrau acima na hierarq
O cotidiano de Hayley havia se tornado um campo minado emocional, cada interação carregada de um peso que antes não existia. A rotina com as crianças e Marcos seguia seu curso, mas por baixo da superfície, um turbilhão de sentimentos conflitantes a consumia. A intimidade compartilhada com Sara deixara uma marca indelével, uma faísca proibida que teimava em brilhar em meio à normalidade de seu casamento.Era nos pequenos gestos ,os beijos rápidos pela manhã, o cuidado com o café das crianças, os jantares preparados em silêncio que Hayley sentia a fragilidade de seu mundo. Havia uma dissonância constante entre o que fazia e o que sentia, como se habitasse um papel que já não lhe servia, mas que continuava a vestir por obrigação. O esforço para manter a casa funcionando era quase automático, mas por dentro, ela se via cada vez mais desconectada da mulher que um dia fora.Olhar para Marcos agora era um exercício de ambiguidade. Havia o amor e a familiaridade de anos construídos juntos, a
O mundo de David era uma tapeçaria complexa de encontros discretos, telefonemas codificados e a constante sensação de caminhar na corda bamba. Para Sara, ele era um marido distante, absorto em "reuniões de trabalho" que o mantinham longe de casa por longas horas. Para seus associados, era um elo fundamental em uma rede intrincada, movendo-se nas sombras com astúcia e discrição. A verdade, porém, era um emaranhado de negócios ilícitos e segredos cuidadosamente guardados, onde a linha entre o legal e o ilegal se tornava cada vez mais tênue.Na mente de David, a distância crescente de Sara era uma nota dissonante em sua rotina cuidadosamente orquestrada. Ele percebia seus olhares frios, suas perguntas incisivas, a ausência de toque e de intimidade que antes permeava a relação. Atribuía essa frieza ao estresse, à insegurança feminina, talvez até a um ciúme infundado de sua dedicação ao trabalho. A ideia de que Sara pudesse suspeitar da verdadeira natureza de seus negócios mal cruzava sua
Três dias se arrastaram como uma eternidade para Hayley. O eco da intimidade com Sara pairava em sua mente, misturado à culpa e a uma crescente sensação de estranheza. O silêncio entre elas era palpável, uma barreira invisível erguida pela intensidade do que havia acontecido. Nenhuma mensagem, nenhum telefonema, apenas a ausência ensurdecedora da presença uma da outra em suas vidas cotidianas. Hayley se sentia isolada, dividida entre a vergonha e a saudade da amiga que sempre fora seu porto seguro.Naquela tarde, a campainha tocou, sobressaltando Hayley em meio aos seus pensamentos sombrios. Ao abrir a porta, encontrou Sara parada ali, segurando uma cesta de vime adornada com um laço singelo. O rosto de Sara estava um misto de nervosismo e resolução, os olhos evitando o contato direto com os de Hayley.— Oi — disse Sara, a voz um pouco hesitante, erguendo levemente a cesta. — Trouxe uns doces… pensei que poderíamos conversar. Precisamos conversar.Hayley sentiu o coração acelerar. Hav
O sol da manhã entrou suavemente pela janela, iluminando o quarto com uma luz dourada. Hayley estava deitada na cama, os pensamentos ainda borbulhando após a conversa que tivera com Sara no dia anterior. O toque das palavras parecia reverberar na sua mente, mas agora, ao acordar, ela sentia uma leveza que não sabia se era duradoura ou momentânea. Era como se uma parte de sua alma estivesse mais tranquila, mas a outra ainda tentava se ajustar ao que havia acontecido.Ela se levantou lentamente, o corpo um pouco cansado, mas o coração mais leve. A conversa com Sara a fizera enxergar as coisas de outra maneira. Elas haviam estabelecido uma barreira invisível entre o que havia acontecido entre elas e o que ainda eram como amigas. Apesar de todo o desejo e confusão que marcaram aquele momento, agora era hora de olhar para frente.No fundo, Hayley sabia que o que havia entre ela e Sara não poderia ser apagado com palavras. Mas as palavras que haviam trocado no fim da noite foram um começo.
Hayley voltou para dentro de casa e como sempre, o ritmo acelerado de sua rotina começou logo ao preparar o café da manhã para os filhos. Ela se esforçava para se concentrar nas tarefas cotidianas, tentando manter a mente ocupada com o que já sabia fazer de melhor: cuidar de sua família.Com as crianças brincando pela casa, Hayley sentia que precisava se distanciar do turbilhão de pensamentos que a consumiam. Por mais que a conversa com Sara tivesse sido um alívio, ela ainda sentia um nó no estômago quando pensava em David. A tensão entre eles parecia crescer a cada encontro, mesmo que estivessem tentando manter as coisas leves e amigáveis.Ao longo do dia, Hayley se dedicava à rotina da casa, mas suas pausas, mesmo que curtas, eram preenchidas por olhares furtivos para a casa de David. A janela da cozinha, que sempre fora apenas uma abertura para o mundo exterior, agora parecia um portal para seus pensamentos mais profundos. Ela não sabia o que a atraía tanto para ele, mas o simples
O sol estava começando a se pôr quando Hayley passou pela porta da cozinha, seus filhos já na sala assistindo a um desenho. Ela olhou para fora, onde David estava novamente no jardim, mexendo em algo ao lado de sua garagem. Ele parecia tão absorvido em sua tarefa que não percebeu quando ela o observou discretamente pela janela. Não era algo incomum, mas dessa vez havia algo diferente na forma como ela o encarava. O coração dela bateu mais rápido, uma sensação de que algo estava prestes a mudar.Mas, por mais que quisesse se afastar dos sentimentos confusos que surgiam, ela sabia que teria que lidar com o que estava começando a acontecer entre ela e ele. Era a terceira vez que se encontravam sozinhos fora de uma situação cotidiana, e a tensão entre eles estava crescendo.David não demorou para perceber que ela o observava, e, quando seus olhares se cruzaram, ele fez uma pausa no que estava fazendo. Seu sorriso era discreto, quase tímido, e isso fez Hayley sentir uma leve mistura de des
Hayley estava no sofá, com uma xícara de chá nas mãos, tentando se distrair das incessantes preocupações que não saíam de sua mente. O som da campainha a tirou de seus pensamentos, e, ao abrir a porta, encontrou Sara, com o semblante cansado e um pouco abatido.— Hayley... posso entrar? — perguntou Sara, a voz baixa, como se estivesse carregando algo pesado.Hayley assentiu e a deixou entrar, percebendo imediatamente que algo estava incomodando sua amiga. As duas se sentaram no sofá, e, por um instante, o silêncio se instalou entre elas, até que Sara, com um suspiro profundo, começou a falar.— Eu não sei mais o que fazer... — começou, com a voz tremendo um pouco. — Eu olhei o celular do David de novo, e, juro, achei que dessa vez eu ia encontrar algo. Qualquer coisa que explicasse o que está acontecendo entre nós.Hayley franziu a testa, surpresa com a confissão, mas não a interrompeu. Sara parecia mais vulnerável do que nunca, e Hayley sentiu uma onda de empatia por ela.— Você não