O vento soprava forte contra as janelas do apartamento, carregando um frio cortante que fazia os meus ombros se encolherem levemente enquanto fechava a mala, mesmo estando em casa, embora o aquecedor estivesse agora desligado.Cada peça de roupa estava dobrada com precisão quase obsessiva. Os meus dedos ajustavam o tecido de um dos sobretudos que havia colocado cuidadosamente na mala, agradecendo silenciosamente às vendedoras que me convenceram a comprá-los.Olhando-me rapidamente no espelho ao lado da porta, ajeitei o sobretudo preto sobre o vestido vermelho que abraçava a minha barriga de maneira óbvia, mas elegante. O tom carmesim era ousado, mas o tecido macio e a forma que me caía lembravam-me que, mesmo grávida, eu ainda poderia me sentir bonita. Os scarpins de salto baixo e as meias de vidro completavam o visual, proporcionando um toque de classe e uma praticidade necessária. Os meus cabelos estavam presos em um rabo de cavalo firme, evitando que o vento me transformasse em uma
MILENA CHRISTIANO vento carrega consigo uma temperatura úmida e morna, fazendo os meus cabelos esvoaçarem com a brisa. A paisagem se vangloria em tons de laranja, amarelo e vermelho, tornando a época extremamente agradável e bela.Memórias distantes fazem-me afirmar sempre que outono é minha época preferida do ano, nem sequer a primavera e nem mesmo o inverno tem o mesmo encanto que o outono.E, ao mesmo tempo, doces e velhas lembranças tomam a minha mente em nostalgias leves, que de certa forma me fazem sorrir.O que considero extremamente inapropriado agora.Suspiro e fecho a janela de vidro, notando que algumas folhas úmidas entraram no cômodo quente e pousam na carpete bege que toma todo o piso da sala.Sento na mesa, e o álbum de fotos aberto descansa ao lado do envelope na mesa de escritório — como se fosse apenas um objeto, se é que ele não passasse apenas disso — ou pelo menos deveria.Suspiro e passo os dedos, delicadamente, sobre a peça dourada que adorna o meu dedo anelar,
MILENA CHRISTIANSem chuva, sem flores...Quando eu tinha dezanove anos, eu era apenas uma simples jovem garota, não tinha muita noção das questões profundas que envolviam o coração e a vida em si.Portanto, a chegada de um homem maduro não foi indiferente para mim, eu poderia aprender com ele a ser uma mulher madura, afinal ele com certeza tinha muito mais experiências da vida do que eu.Lembro que Enrique chegou como um furacão, derrubando qualquer muralha que houvesse. Ele era estonteante para um diretor do departamento de projetos arquitetônicos na faculdade de artes.E por céus, bastante inteligente e charmoso, fazendo questão de demonstrar todo o seu esplendor em qualquer lugar por onde passasse.De fato, eu fui a primeira em conquistar-lhe, mesmo sabendo que a competição em chamar a atenção do galã era enorme.Mas independentemente de tudo, foi para mim que os seus olhos brilharam, foi para mim que aquele sorriso cheio de segundas intenções foram direcionados, foi tudo exclusiv
EDWARD PORTMAN— Para ser sincera, eu aprecio as minhas terras e a Ruby sabe se cuidar perfeitamente tal como tem se cuidado nos últimos anos — Giullia enfatizou e um resmungo nada delicado escapou da minha boca.— Eu sei disso tão bem quanto você, mammina, é tão ruim assim sair um pouco da Itália para se aventurar nos bons ares de Nova Iorque? — tentei convencê-la uma vez mais.— Você tem o sentido de humor tão aguçado quanto o do seu pai, arrivederci, Edward.— Arrivederci, mammina — despedi de volta e desliguei o aparelho, guardando no bolso da calça.Convencer ela a sair da Itália é igual a tentar dar banho em gato, só o fazemos quando necessário, e mesmo assim, sempre que preciso voltar para a minha terra natal — com um certo desagrado — tento convencer a Giullia a ir comigo, porque eu sei que o pai jamais iria se a minha mãe não fosse junto.E aparentemente, o nosso desagrado pela bela cidade é mútuo.E mesmo que eu adore profundamente a minha irmã mais nova e ela partilha do mes
MILENA CHRISTIANEncontro-me em meio a um vendaval de emoções, uma tempestade que parece não ter fim. A notícia da gravidez já me havia trazido à tona sentimentos confusos e contraditórios. Alegria, medo, esperança e incerteza misturaram-se dentro de mim com as cores desbotadas numa tela desgastada pelo tempo.Desde o momento em que soube que carrego um ser no meu ventre, o meu coração encheu-se de amor incondicional. A ideia de ser mãe encheu a minha mente com sonhos de um futuro repleto de risos infantis, abraços apertados e um amor que transcende qualquer explicação.A minha mãe morreu muito cedo e desde então o meu pai não colocou nenhuma outra mulher na nossa vida, ao menos, não a ponto de gerar outro filho que pudesse fazer-me companhia.Tive uma boa infância, não posso negar, mas sempre sonhei em ter uma família grande, e isso estendeu-se para o meu casamento mais tarde, sempre desejando ter filhos de Enrique.No entanto, essa felicidade foi rapidamente ofuscada por uma sombra
MILENA CHRISTIAN Bati a porta com urgência, e por momentos sinto-me muito mal, mas Ruby abriu quase que imediatamente, como se o Universo deixasse claro que eu não deveria dar meia volta e ir embora. A primeira imagem que tenho é das minhas duas melhores amigas me encarando com extrema preocupação, já que fiquei o dia todo incontactável. Sem muita força para explicar, não que precisasse, estiquei os meus braços e elas acolhem-me rapidamente, sendo o porto seguro que eu estava procurando para descarregar todo esgotamento emocional. ........ Um pouco mais calma, sentei-me no aconchego do sofá, a sala iluminada por uma luz suave que emanava das velas dispostas sobre a mesa de centro. O aroma tranquilizante preenchia o ar enquanto eu esperava as duas mulheres, Ruby e Sophia, se sentarem junto a mim. O meu coração estava pesado, e a confissão que estava prestes a fazer pesava como uma âncora na minha mente. Enquanto as outras duas se acomodavam no sofá, procurei respirar fundo, sent
MILENA CHRISTIAN Durante a semana que fiquei em São Francisco, o meu pai teve a gentileza de não questionar mais nada acerca do “pai” do seu futuro neto, o que, convenhamos, não me deixou menos preocupada. Eu realmente precisava desfrutar dessas folgas que Elisabeth cedeu para mim, mas manter-me em casa só é uma oportunidade para eu me afogar nas minhas preocupações e ansiedades, portanto nada melhor do que trabalhar, certo? Errado! Sinto-me como se fosse um coelho enjaulado e que a qualquer momento um predador irá devorar-me, estilhaçar-me completamente. Abro a porta da sala fechada por algumas semanas. A minha sala é um refúgio de tranquilidade no meio do frenesi da empresa de arquitetura. Cada detalhe foi escolhido com carinho para criar um ambiente acolhedor e inspirador. A luz do sol entra através das grandes janelas, enchendo o espaço com uma luminosidade suave que reflete nas paredes de um tom neutro e calmante. Uma estante de prateleiras abertas exibe modelos em miniatu
MILENA CHRISTIAN Depois de um tempo, a sensação de mal-estar começou a se dissipar lentamente, deixando para trás apenas uma leve sensação de exaustão. Respirei fundo, tentando reunir forças e determinação antes de subir de volta para a sala de reuniões. Ainda havia uma discussão pendente, mas agora eu precisava concentrar-me no meu trabalho e deixar as emoções tumultuadas de lado. Ao entrar na sala ainda vazia, os meus olhos pousaram imediatamente em Enrique e Elisabeth, que estavam envolvidos numa conversa animada. Elisabeth, com o seu sorriso caloroso e olhos cheios de carinho de mãe, percebeu a minha chegada e acenou para mim. — Milena, querida, venha se juntar a nós! — ela convidou-me, estendendo a mão num gesto acolhedor. — Você já está melhor? O ar fresco fez-lhe bem? Respirei fundo novamente, reafirmando a determinação, e aproximei-me da mesa onde eles estavam sentados. Enrique lançou-me um olhar breve, e eu pude perceber uma sombra de preocupação nos seus olhos, como se el